Visitação
Por Nara Junqueira | 20/10/2009 | PoesiasEste buraco escuro oprime todos os sentidos do homem que fui um dia.
Desde a soleira da porta tudo é cheiro de morte e urgência de ganhar a rua.
Ao meu lado geme um velho vagabundo esquecido de si e do mundo.
Mais à frente, um marinheiro tatuado assovia uma canção indecifrável.
Na parede de concreto um relógio fiel bate horas tristes e de agonia.
Do outro lado do muro a vida segue em largas passadas a despeito de nós.
Rompe um dia após o outro sem que o filho veja o pai que teve.
E na lembrança do pai o rosto do menino aos poucos desaparece.
Neste buraco fétido não há flores, cheiro da chuva que fecunda a terra.
Nem um só instante de alegria, um só rasgo de felicidade.
Tudo aqui é dor de estar perdido da vida que pulsa lá fora.
Tudo é uma imensa solidão de sonhar-se livre e dono de si.
Tenho pensamentos constantes sobre portas e janelas.
Tenho uma voz que sussurra a libertação de minha alma cativa.
Quisera acreditar que o último dia me encontrará logo a seguir!
E que aquele imenso portão de ferro tombará cansado ao solo.
— Ó Deus de minha infância e miséria, envia teus anjos a mim!