VIA DE MÃO DUPLA NA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA EM JUÍZO FALIMENTAR

Por TAYANE MIRANDA BARBOSA | 11/05/2017 | Direito

VIA DE MÃO DUPLA NA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA EM JUÍZO FALIMENTAR *

 

 

Caroline Soares Silva**

Tayane Miranda Barbosa**

Mailana Holanda Costa Ferreira**

José Humberto G. de Oliveira***

 

 

SUMÁRIO: Introdução: 1. O processo de falência: do conceito à finalidade. 2. Da pessoa Jurídica e suas responsabilidades. 3. Desconsideração da personalidade jurídica. 4. A desconsideração da personalidade jurídica no curso da falência. Conclusão. Referências.

 

 

RESUMO

 

O referente trabalho aborda sobre a possibilidade da desconsideração da personalidade jurídica em caso de abuso da personalidade jurídica ou fraude no processo falimentar, desta forma inicialmente será abordado como ocorre o processo de falência e suas principais características. Aborda-se ainda o conceito da pessoa jurídica assim como sua responsabilidade e suas obrigações e como ocorre a desconsideração da personalidade jurídica, o trabalho como dito anteriormente irá focar nessa desconsideração no processo de falência.    

 

PALAVRAS-CHAVE:

Falência. Pessoa Jurídica. Desconsideração da personalidade jurídica. Fraude.

 

INTRODUÇÃO

Delimita-se o presente estudo como aplicar a desconsideração da personalidade jurídica em processos falimentares, destacando a presença de fraudes.

Em suma, nos processos falimentares tem como objetivo fazer com que todos os credores fiquem em circunstâncias iguais, proporcionando que todos tenham seus valores proporcionalmente.

Sendo assim, nos processos falimentares quando necessários aplicar-se-á a desconsideração da personalidade jurídica, sendo utilizado para impossibilitar que ocorra fraudes a terceiros.

Um dos critérios importantes para a aplicação da desconsideração da personalidade jurídica é quando estiver constatado que há desvio de finalidade, ocorre quando sócios da empresa querem fraudar terceiros fazendo uso de autonomia da pessoa jurídica como defesa. Ocorre também, quando há confusão patrimonial, presente quando no exercício patrimonial não há distinção do patrimônio do sócio com o da pessoa jurídica.

Portanto, a desconsideração da personalidade jurídica pode ser utilizada em processo falimentar, quando preenchidos os requisitos legais do art. 50 do CC, como adiante se verá a conceituação do processo falimentar, sua finalidade, juntamente com a desconsideração da personalidade jurídica em processo falimentar.

 

1 O PROCESSO DE FALÊNCIA: DO CONCEITO À FINALIDADE 

A falência segundo Almeida é “um instituto ligado à evolução do próprio conceito de obrigação” (ALMEIDA, 2014, p. 29), uma vez que falência existe desde o direito romano sob uma ótica totalmente diferente da atual, nessa época o devedor quando não tinha mais como pagar os credores era privado da sua liberdade ou pagava a dívida com a própria vida. Mas com o decorrer do tempo isso mudou e atualmente “... se alguém não cumpre com obrigação, legal ou contratual, de pagar o que deve, o sujeito ativo pode promover, perante o Poder Judiciário, a execução de tantos bens patrimônio do devedor quantos bastem à integral satisfação de seu crédito. ” (COELHO, 2012, p. 260).

No que diz respeito também sobre falência, Sérgio Campinho remete que falência:

“Revela-se como o conjunto de atos ou fatos que exteriorizam ordinariamente um desequilíbrio no patrimônio do devedor. O instituto da falência faz emergir um complexo de regras, estabelecidas como o escopo de disciplinar e oferecer uma solução a esse desequilíbrio verificado, revelador de um estado de insolvência do devedor, que não possui patrimônio capaz de atender ao cumprimento de suas dívidas” (CAMPINHO, 2012, p. 4).

 

Desta forma a falência hoje em dia é considerada uma instituição social já que essa tem um aspecto econômico- social sobressaindo o interesse público, portanto a falência na legislação atual é usada apenas a casos extremos (ALMEIDA, 2014), pois antes de se aplicar o processo falimentar há a tentativa da recuperação judicial ou extrajudicial que possibilita que o empresário devedor “a oportunidade de se reorganizar e para cumprir, em parte que seja, suas obrigações” (COELHO, 2012, p. 263), ou seja, a Lei 11. 101/05 que regula todos esses processos concede para o devedor:    

Pelo instituto da recuperação de empresas, reparte-se entre determinados credores empresários o risco de insucesso inerente às atividades econômicas.

Outro benefício do devedor empresário consiste na extinção das obrigações, desde que satisfeita uma parte das dívidas; o devedor não empresário não se exime de pagar a totalidade do devido para ver extintas suas obrigações no curso do processo de insolvência civil. (COELHO, 2012, p.264). 

 

O que se percebe é que com a vigência dessa Lei na doutrina há uma divergência sobre a divisão das etapas do processo falimentar, Almeida, por exemplo, divide esse processo em três fases: fase preliminar da falência a fase falimentar e a fase pós falimentar, já Campinho diz que essa Lei trouxe a adoção de dois processos especiais ao insolvente que é a recuperação judicial e o processo de falência, considerando como um processo único. Aqui será considerada a divisão feita por Almeida e Coelho, além que no artigo 105 da Lei de falências diz que o devedor poderá solicitar o processo falimentar quando não preencher os requisitos exigidos da recuperação judicial.

Sendo assim para haver o processo falimentar é necessário preencher os seguintes requisitos determinados pelo artigo 94 da Lei de Falência:

Art. 94. Será decretada a falência do devedor que:

        I – sem relevante razão de direito, não paga, no vencimento, obrigação líquida materializada em título ou títulos executivos protestados cuja soma ultrapasse o equivalente a 40 (quarenta) salários-mínimos na data do pedido de falência;

        II – executado por qualquer quantia líquida, não paga, não deposita e não nomeia à penhora bens suficientes dentro do prazo legal;

        III – pratica qualquer dos seguintes atos, exceto se fizer parte de plano de recuperação judicial:...

 

Em relação à decretação de falência se faz importante ressaltar que somente poderá se submeter a falência os sujeitos que exploram atividade econômica de forma empresarial, em razão que a Lei de Falência não foi clara sobre o que se deve entender por empresário, então se considera empresário aquele conceituado pelo Código Civil- empresário civil ou comercial-por isto as sociedades cooperativas, empresa pública, sociedade de economia mista, fundação, funcionário público e etc., ou seja, sujeitos de direito que não são considerados empresários e não exercem a atividade de cunho empresarial não se submetem ao processo falimentar, a eles é decretada a insolvência civil regulamentada pelo Código de Processo Civil.

Sobre o pressuposto da insolvência Almeida fala que esse inciso I pode induzir a um engano, visto que a insolvência seria um fator determinante para caracterizar a falência (ALMEIDA, 2014), no entanto para se declarar a falência se faz importante é impontualidade justificada e execução frustrada. É o que remete Coelho:

“Para se declarar a falência da sociedade empresária, é irrelevante a “insolvência econômica”, caracterizada pela insuficiência do ativo para a solvência do passivo. Exige a lei a “insolvência jurídica”, que se caracteriza, no direito falimentar brasileiro, pela impontualidade injustificada (LF, art. 94, I), pela execução frustrada (art. 94, II) ou pela prática de ato de falência (art. 94, III). ” (COELHO, 2012, p. 270)

 

Com isso tendo esses preceitos o pedido de falência é feito através de uma petição inicial, no artigo 97 da Lei de Falência estabelece quem são as pessoas legitimadas para solicitar esse pedido, em relação a competência para análise do processo o juiz competente será aquele em que se encontra o estabelecimento do devedor- artigo 3º da Lei de Falência- todo esse trâmite é chamando fase pré-falimentar que se inicia na petição e vai até a sentença de declaração de falência, assim, sendo aceitado o pedido de falência pelo juiz esse decretará a falência e o devedor deve seguir tudo o que determina o artigo 99 da Lei de Falência além do que  o juiz estabelecer, há divergência na doutrina se essa sentença emitida pelo juiz quanto ao pedido de falência seria declaratória ou constitutiva, pois o direito processual classifica sentença em: declaratória, condenatórias e constitutivas, assim há essa discussão pois uns consideram a sentença como sendo constitutiva pois instaura um novo estado jurídico é o que reforça Fabio Ulhoa Coelho “ A sentença declaratória da falência não é declaratória, mas constitutiva, porque altera as relações entre os credores em concurso e a sociedade devedora falida, ao fazer incidir sobre elas as normas especificas do direito falimentar.” (COELHO, 2012, p. 286), outros a consideram como declaratória, é o que preleciona Walter T. Álvares, “ Por conseguinte, o devedor é falido não por motivo da sentença, que, então, não é constitutiva, mas pelo fato de não ter pago, o que a sentença, sendo declaratória, somente reconhece e declara. ” (ÁLVARES apud ALMEIDA, 2014, p. 129).

Após essa sentença se iniciará a fase falimentar que será instituída por órgãos da falência- administrador judicial, assembleia dos credores e o comitê dos credores- que vão auxiliar o devedor na administração da empresa para a satisfação do crédito dos credores, sendo realizado esses pagamentos o juiz pronunciará nova sentença extinguindo a falência. Sendo desfeita a falência a Lei permite a recuperação judicial.

Portanto, o processo falimentar tem como finalidade ajudar a empresa que junta todos os bens para pagar credores que não tiveram a possibilidade de pagar materialmente, fazendo que não haja um prejuízo ao meio das relações empresariais e na economia de um lugar.

2 DA PESSOA JURÍDICA E SUAS RESPONSABILIDADES 

A pessoa jurídica é constituída por pessoas que tem como finalidade o alcance de objetivos comuns ou de interesse social, assim são sócios que juntam dinheiro, bens e esforços para uma finalidade comum.

Assim para entender o que seria pessoa jurídica é necessário conceituar pessoa na interpretação jurídica, para a doutrina tradicional pessoa

 

“é ente físico ou coletivo suscetível de direitos e obrigações, sendo sinônimo de sujeito de direito. Sujeito de direito é aquele que é sujeito de um dever jurídico, de uma pretensão ou titularidade jurídica, que é o poder de fazer valer, através de uma ação o não- cumprimento do dever jurídico, ou melhor, o poder de intervir na produção da decisão judicial. ” (DINIZ, 2005, p.117- 118).

 

Pessoa, portanto, representa cada sujeito na vida civil sendo caracterizado pelo art. 1º do Código Civil que diz que toda pessoa pode ser sujeito em relações jurídicas adquirindo assim personalidade jurídica que segundo Diego Espín Cánovas essa “liga-se à pessoa a ideia de personalidade, que exprime a aptidão genérica para adquirir direitos e contrair obrigações” (CÁNOVAS apud DINIZ, 2005, p. 118), então basta a existência do homem, desde a sua concepção que esse já tem personalidade jurídica- art. 2º do Código Civil, mas é importante ressaltar que personalidade jurídica não significa capacidade jurídica que é “ a medida jurídica da personalidade” (GOMES, 1971, p.149), ou seja, todo homem existindo é pessoa e tem personalidade jurídica, mas para a capacidade é preciso preencher alguns requisitos exigidos por lei para poder agir por si em uma relação jurídica.

Como dito anteriormente os homens que se unem com um objetivo comum tem uma finalidade social e é necessário personalizar essa união para se ter uma vida jurídica o que faz surgir as pessoas jurídicas que tem certa individualidade, nome próprio, personalidade jurídica e capacidade jurídica. Pessoa jurídica segundo o que diz o Código Civil “ é a unidade de pessoas naturais ou de patrimônios, que visa à consecução de certos fins, reconhecida pela ordem jurídica como sujeito de direito e obrigações”. (CUNHA apud DINIZ, 2005, p. 222). 

Desta forma é uma pessoa fictícia que desempenha atividades e adquire personalidade jurídica quando é concedida por lei sendo assim a pessoa jurídica tem obrigações e deveres na vida civil o que faz com que a pessoa jurídica adquira individualidade não se confundido com a individualidade dos sócios assim como seu patrimônio, ou seja, o princípio da autonomia patrimonial. Pereira enfatiza ele diz que é preciso “a conjunção de três requisitos: a vontade humana criadora, a observância das condições legais de sua formação e a liceidade de seus propósitos. ” (PEREIRA, 2010, p.256).

Portanto só a união de determinadas pessoas não configura como personalidade jurídica é necessário como remete Caio Mário da Silva Pereira “... além do fato externo da sua aglomeração, se estabeleça uma vinculação jurídica específica, que lhe imprima unidade orgânica. ” (PEREIRA, 2010, p.256), ou seja, o que prevalece é vontade comum do grupo para aquela finalidade.

A pessoa jurídica se classifica segundo sua ordem em: de direito público- interno ou externo e de direito privado. O artigo 41 e 42 do Código Civil diz o rol das pessoas jurídicas de direito público- interno: a União; os Estados, o Distrito Federal e os Territórios, os Municípios; externo: os Estados estrangeiros e todas as demais pessoas regidas pelo direito internacional público- já o 44 exemplifica quem são as de direito privado- as associações, as sociedades, as fundações as organizações religiosas, os partidos políticos, as empresas individuais de responsabilidade limitada. Em relação a pessoa jurídica de direito privado o elemento comum dessas é a

“origem o quesito na autonomia privada, para a realização de interesses coletivos ou particulares. É importante a natureza da pessoa jurídica, pois ela determinará a posição de seus membros quanto a direitos, obrigações, responsabilidades, bem como vinculação ou não vinculação entre eles.

O elenco é apenas exemplificativo, contemplando algumas das pessoas jurídicas de direito privado. Leis especiais podem definir outras pessoas dessa natureza, como as empresas públicas e as sociedades de economia mista, conforme o decreto-lei n. 200/67” (MACHADO; CHINELATO, 2012, p.69-70). 

  

O surgimento da pessoa jurídica diferentemente da pessoa natural se dá pela inscrição do ato constitutivo no respectivo registro “ Começa a existência legal das pessoas jurídicas de direito privado com a inscrição do ato constitutivo no respectivo registro, precedida, quando necessário, de autorização ou aprovação do Poder Executivo, averbando-se no registro todas as alterações por que passar o ato constitutivo. ” – Artigo 45, Código Civil- em vista disso sendo registrada a pessoa jurídica

“torna-se pessoa, isto é, sujeito de direitos e capaz de contrair obrigações na vida civil; adquire individualidade, não se confundindo com a figura individual dos sócios; adquire autonomia patrimonial, com o que o seu patrimônio não se confunde com o patrimônio dos sócios; pode alterar a sua estrutura jurídica, optando por constituir-se em qualquer outro tipo de sociedade(limitada, sociedade anônima, simples etc), e econômica, com a entrada e saída de sócios” ((REQUIÃO, 2008, p. 397).

 

Sobre as responsabilidades da pessoa jurídica tanto a de direito público quanto a de direito privado referente a um negócio jurídico deve-se cumprir o que está disposto no contrato, conforme estabelece o art. 389 do Código Civil, assim descumprindo uma das obrigações estabelecida, responde pela responsabilidade objetiva, responsabilidade subjetiva e responsabilidade extracontratual.   

 

 

 

 

 

 

 

 

REFERÊNCIAS

 

ALMEIDA, Amador Paes. Curso de Falência e Recuperação de Empresa. 27ª. Ed. São Paulo: Saraiva, 2014.

 

CAMPINHO, Sérgio. Falência e Recuperação de Empresa: o novo regime da insolvência empresarial. 6ª Ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2012.

 

COELHO, Fabio Ulhoa. Curso de direito comercial: direito de empresas. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. 3 v.

 

GOMES, Orlando. Introdução ao direito civil. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1971.

 

MACHADO, Costa; CHINELATO, Silmara Juny. Código civil interpretado. 5. ed. São Paulo: Manole, 2012.

 

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil: introdução ao direito civil, teoria geral de direito civil. 23ª Ed. Rio de janeiro: Forense, 2010.

 

REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. 27. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. 1 v.

 

TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. Volume Único. São Paulo: Editora Método, 2009.