UTILIZAÇÃO DE “CEROL” E “LINHA CHILENA” – ASPECTOS JURÍDICOS RELEVANTES
Por Eduardo Vieira Costa | 07/02/2017 | DireitoFérias escolares associadas a fortes ventos tem como resultado um panorama propício para uma das brincadeiras mais antigas que se tem registro – “empinar” pipas.
Com surgimento na China antiga, aproximadamente por volta do ano 1200 a.C., as pipas tinham como escopo principal a sinalização militar.
No Brasil, estima-se que estas tenham chegado pelas mãos dos portugueses à época da colonização.
Com o passar do tempo a ferramenta cuja finalidade era estritamente militar, tornou-se atividade recreativa, apreciada tanto por crianças quanto por adultos. Deparamo-nos hoje com clubes criados pelos amantes dessa prática.
Neste diapasão surge a realização de disputas cujo objetivo precípuo é manter-se no ar, “cortando”, desta feita, a linha dos demais “competidores”.
Ocorre que assim como em todas as atividades humanas, há sempre os bons e os maus desfrutadores. É nesse ínterim que chegamos ao ponto principal da presente discussão: o “cerol” e a “linha chilena”.
Cerol: é o nome atribuído a uma mistura de cola com vidro moído (ou limalha de ferro) que é aplicado em linhas de papagaios, também conhecidos como pipas.
Linha chilena: material composto de cola de madeira e óxido de alumínio com poder de corte quatro vezes maior que o do cerol.
A ocorrência de acidentes fatais pela utilização destes materiais tem se tornado cada vez mais acentuada, principalmente no que tange a motociclistas ou pedestres que tem seu pescoço cortado.
A grande incidência de tais infortúnios fez com que alguns Estados e Municípios brasileiros elaborassem dispositivos legais que proíbem o uso e a venda tanto do cerol quanto da linha chilena.
O Estado de São Paulo através da Lei 12.192/2006 estabeleceu penalidades em âmbito administrativo ao indivíduo que utiliza do cerol ou qualquer produto semelhante que possa ser aplicado em linhas de pipa.
Em contexto federal não há qualquer dispositivo que discipline especificamente o fato, seja a venda ou o uso do cerol ou similares.
Apesar da existência das normas estaduais, o objetivo da presente análise é a esfera penal, considerando a adequação do fato com os tipos penais advindos do ordenamento jurídico.
Há que se ter em mente que o “Direito Penal somente deve intervir nos casos de ataques muito graves aos bens jurídicos mais importantes. As perturbações mais leves do ordenamento jurídico são objeto de outros ramos do Direito” [1]. Trata-se do chamado princípio da intervenção mínima (ou ultima ratio).
No mais, considerando o perigo à vida e a integridade física causado pela utilização do cerol e da linha chilena, aduz-se pela aplicação do art. 132 do Código Penal, qual comina pena de detenção àquele que expõe “a vida ou a saúde de outrem a perigo direto e eminente”, devendo ser lavrado pela autoridade competente, Termo Circunstanciado de Ocorrência, vez que se tratando de crime de perigo concreto.
[1] MUÑOZ CONDE, Francisco. Introducción al derecho penal. Barcelona: Bosch, 1975, p. 59-60.