USUCAPIÃO FAMILIAR: Da natureza inconstitucional do usucapião especial familiar

Por Cláudia Ferreira Fontinhas Nogueira da Cruz | 31/03/2017 | Direito

USUCAPIÃO FAMILIAR: Da natureza inconstitucional do usucapião especial familiar [1]

 

Cláudia Ferreira Fontinhas Nogueira da Cruz

Pedro Paulo Romano Lopes[2]

Viviane de Brito[3]

 

INTRODUÇÃO; 1 OS CONCEITOS E CARACTERÍSTICAS DO USUCAPIÃO FAMILIAR; 2 DAS VANTAGENS E DESVANTAGENS DO USUCAPIÃO FAMILIAR TRAZ PRETENSOS USUCAPIENTES; 3 DAS LESÕES AOS DIREITOS FUNDAMENTAIS ELENCADOS NA CONSTITUIÇÃO DE 1988; Considerações finais; Referências. 

RESUMO 

O usucapião é o modo de aquisição da propriedade e de outros direitos reais suscetíveis de exercício continuado no qual o Código Civil traz em seus dispositivos, suas modalidades especiais, também intituladas como constitucionais, sendo enfoque deste artigo o usucapião especial familiar.  , não é tão constitucional assim, já que com base no supracitado os próprios preceitos constitucionais venceram características que esta modalidade de usucapião trouxe consigo.

INTRODUÇÃO 

No Brasil, o usucapião familiar é uma modalidade de usucapião dentro do Direito das Coisas instituída pela Lei 12.424/2011 de 16 de junho de 2011 que vem para amparar aquele que ficou em posse do imóvel, após ser abandonado pelo seu cônjuge.

Ocorre que, a referida lei trouxe alterações incontroversas quanto à matéria de dissolução matrimonial evoluída pela Constituição Federal de 1988, como por exemplo, a Emenda Constitucional n. 66 de 2010. Porém, também trouxe mais respaldo para as famílias de baixa renda, em que o cônjuge abandonado não possui nenhum outro imóvel no qual possa viver.

Dessa maneira, para entender para a nova modalidade de usucapião especial é necessário ponderar as suas características gerais e peculiares, fazendo uma leve contraposição das vantagens e desvantagens trazidas pelo novo artigo 1.240-A, e assim, ponderar as incontroversas que o dispositivo trouxe ao ordenamento jurídico, frente aos preceitos constitucionais que será objeto de estudo neste artigo.

1 OS CONCEITOS E CARACTERÍSTICAS DO USUCAPIÃO FAMILIAR 

Primeiramente, é importante ponderar que o usucapião familiar é um instituo jurídico dentro do Direito das Coisas, no qual, como explana Maria Helena Diniz em "Curso de Direito Civil Brasileiro", tratam-se de normas que regulam as relações jurídicas fundadas em bens materiais ou imateriais, suscetíveis de apropriação, ressalvando que tais coisas devem ser esgotáveis, pois se não fosse, não haveria nenhuma necessidade econômica de controlar. (DINIZ, 2007) Ou seja, o Direito das Coisas visa regulamentar o vínculo direto do ser humano com a coisa na qual recai o seu direito, sendo ele, o titular deste.

Dentro do Direito das Coisas, existe um exercício de um direito, no qual segundo Caio Mário da Silva em “Instituições de Direito Civil”, se dá a partir da prescrição aquisitiva, ou seja, no decurso de tempo, sua força cria um novo titular a este direito, que se contrapõe a prescrição extintiva em face do antigo titular, então ele nasce: o usucapião.  Instituto no qual, para o autor, é a aquisição da propriedade pelo tempo, ou pela posse prolongada, observados os requisitos legais. (SILVA, 2014)

Maria Helena Diniz, em Código Civil Anotado (2012) denomina como o meio de aquisição da propriedade e de outros direitos reais, sejam eles, o usufruto, a habitação e o uso por exemplo. (DINIZ, 2012) Carlos Roberto Gonçalves em "Direito Civil Brasileiro" relata que é vedado usucapião entre cônjuges da constância do casamento, ascendentes e descendentes durante o poder familiar e contra absolutamente incapazes, no qual, suspende também os prazos de herdeiros necessários menores de dezesseis anos. (GONÇALVES, 2012)

Monteiro e Maluf em “Curso de Direito Civil” (2012) ressalva um interessante ponto, quando diz:

 “Discute-se se o usucapião é modo originário ou derivado de adquirir a propriedade. Trata-se de questão obscura e até agora não solucionada pela doutrina, que se inclina, porém, no sentido de conceituá-lo como modo originário, porquanto, para o usucapiente, a relação jurídica de que é titular surge como direito novo, independente da existência de qualquer vinculação com seu predecessor, que, se por acaso existir, não será o transmitente da coisa.” (MALUF, MONTEIRO, 2012) 

Fabio Ulhoa em “Curso de Direito Civil” (2012) explana, que este instituto, trata-se do simples conceito de que o bem da propriedade de outrem se encontra na posse de outro, sem que o proprietário saiba ou concorde:

“é racional, econômico e justo que a posse reiterada de uma pessoa sobre certo bem, quando ninguém se opõe a essa situação, implique a atribuição ao possuidor do direito de propriedade. Como afirmado no estudo da prescrição, o decurso do tempo consolida situações jurídicas (Cap. 12). A aquisição da propriedade por meio da usucapião importa essa consolidação. Por ter a posse da coisa, sem contestação, por muito tempo, o possuidor torna-se seu proprietário. Esvai-se, então, o desconforto da ordem jurídica.” (COELHO, 2012) 

Após o explanado, é possível visualizar duas características essenciais do usucapião: a posse e o tempo. Nos quais, devem ser tratados com certa particularidade, pois mesmo que o instituto da posse seja tratado de maneira geral, o elemento do tempo é particular a cada modalidade de usucapião. Por isso, é necessários considerar o usucapião especial familiar, vez que é objeto de nossa pesquisa.

A posse, por Carlos Roberto Gonçalves em "Direito Civil Brasileiro" trata-se da situação de fato, no qual, uma pessoa exerce poderes ostensivos sobre uma coisa, no caso um bem imóvel, no qual dela tem proveito ou vantagem, e que a boa-fé persista durante toda a prescrição aquisitiva, não podendo também, haver nenhum vício impeditivo (por exemplo, a posse injusta), denominado por ele como animus domini, a posse mansa e pacifico. (GONÇALVES, 2012)

Para Fabio Ulhoa Coelho, dentro de usucapão, há três elementos na posse: a continuidade, inexistência de oposição e a intenção do dono (animus domini), nos quais darão ensejo a chamada posse ad usucapionem. (COELHO, 2012) Verifica-se, portanto, que a aquisição da propriedade, que faz nascer o instituto do usucapião, deve ser ininterrupta (abordada quando se falar de tempo), mesmo que com a oposição de outrem, seja por outro sujeito no qual quer fazer uso do imóvel, ou até pelo proprietário, e a seu animus de ter sobre a coisa, o exercício de um aparente propriedade.

Cumpre ressalvar, que o autor Silvio de Salvo Venosa em "Direito Civil" cita como requisitos para o usucapião a res habilis, iusta causa, bonas fides, possessio e tempus, sendo a coisa hábil, justa causa, boa-fé, posse e tempo, respectivamente. (VENOSA, 2013)

Em relação ao tempo, é necessário, anteriormente, tratar a respeito das modalidades de usucapião, sendo elas quatro em nosso ordenamento jurídico: a extraordinária, ordinária e a especial (divida em rural e urbana) e o especial familiar. E, como o objeto deste trabalho é a especial familiar, será trabalhada por ultimo, na sequência a seguir.

O usucapião extraordinário encontra-se no dispositivo 1.238 do Código Civil, no qual exige a posse pacifica e ininterrupta e exercida com o animus domini no prescrição aquisitiva de 15 (quinze) anos, no qual, segundo o parágrafo único, o prazo poderá ser reduzido a 10 (dez) anos se o possuidor houver estabelecido no imóvel a sua moradia habitual, ou ter realizado obras ou serviços de caráter produtivo.

Já o usucapião ordinário, conforme artigo 1.242 do Código Civil, requer a posse por dez anos com animus de como dono fosse, de forme contínua, mansa e pacifica, com justo título de boa-fé, sendo diminuído para cinco anos, disposto no parágrafo único, se o imóvel houver sido adquirido onerosamente, com base no registro do cartório, cancelado posteriormente, desde que os possuidores tivessem nele estabelecido a sua moradia, ou realizando investimentos de interesse social ou econômico.

O usucapião especial rural, regulado no artigo 1.239 do Código Civil, determina que o sujeito, exerça a posse com o animus domini sobre um área de 50 (cinquenta) hectares em zona rural, pelo decurso ininterrupto de 5 (cinco) anos, e que, tornou-a produtiva por seu trabalho ou de sua família, tendo nela moradia, não havendo a propriedade sobre outro imóvel rural ou urbano, adquirir-lhe-á a propriedade.

O usucapião especial urbano, vide artigo 1.240 do Código Civil, autoriza a aquisição do imóvel urbano de até 250 (duzentos e cinquenta) m², exercer a posse, como se dono fosse, e sem oposição, durante o prazo de 5 (cinco) anos ininterruptos, não sendo proprietário de outro imóvel urbano ou rural.

E por fim, e mais importante, o usucapião familiar, instituído pela Lei n. 12.424, de 16 de junho de 2011, que introduziu o artigo 1.240-A no Código Civil brasileiro, determinando que a pessoa que exerce o direito de posse, com animus domini, pelo lapso temporal de dois anos ininterruptamente e sem oposição, a posse direta e exclusiva sobre imóvel urbano de até 250m² (duzentos e cinquenta metros quadrados), utilizando-o para a sua moradia ou de sua família, cuja propriedade divida com ex-conjuge ou ex-companheiro que abandonou o lar, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural, adquirir-lhe-á o domínio integral.

Carlos Roberto Gonçalves em Direito Civil Brasileiro explana que, o novo instituto é disciplinado nos moldes previstos do artigo 183 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988:

Art. 183. Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinqüenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.

  • 1º - O título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil.
  • 2º - Esse direito não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez.
  • 3º - Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião. 

Isto é, ele é instituído em favor de pessoas de baixa renda, que não tem imóvel próprio e que recebem o bônus de adquirir a propriedade do imóvel pelo ônus dado aquele que deixou o ex-conjuge ou ex-companheiro para realizar o sustento do imóvel e da família que ali ficou. (GONÇALVES, 2012)

O autor Carlos Roberto Gonçalves fala também, exige-se que o usucapiente seja coproprietário do imóvel, em comunhão ou condomínio com seu ex-conjuge ou ex-companheiro, que este ultimo tenha abandonado o lar de forma voluntária e injustificada e o lapso temporal de dois anos. (GONÇALVES, 2012)

Portanto, segundo Ulhoa Coelho (2012) a posse não poderá ter sofrido a menos descontinuidade, ainda que breve, isto é, se o possuidor deixar o imóvel e retornar, perderá o direito de adquirir o imóvel contanto o prazo anteriormente transcorrido. E mais, se o possuidor ainda for forçado a abandonar o imóvel, mesmo contra a sua vontade, a interrupção será considerada, visto que exige a inexistência de oposição também, como o mesmo argumenta:

Esses dois elementos se justificam em vista das finalidades da usucapião. O objetivo do instituto, como se viu, é consolidar uma situação de fato que existe há considerável tempo. Se a posse não é contínua, por ter experimentado lapsos em que deixou de ser exercida, ou se há quem a ela se oponha, então carecem os fatos da persistência e tranquilidade que tornem justa sua consolidação.” (COELHO, 2012) 

Na qual será concedida ao coproprietário, segundo o parágrafo único do artigo 1.240-A, o direito apenas uma única vez.

Percebe-se então, que o decurso de tempo para aquisição do imóvel no qual o ex-conjuge é coproprietário é menor que as demais modalidades de usucapião, e que o mesmo, não só envolve o direito de propriedade, mas como o matrimônio entre o casal, fazendo com quem, ocorra uma série de controvérsias com o ordenamento jurídico vigente, e principalmente, diretamente com a nossa carta máxima, a Constituição da República Federativa do Brasil. 

2 DAS VANTAGENS E DESVANTAGENS DO USUCAPIÃO FAMILIAR TRAZ PRETENSOS USUCAPIENTES 

Diante do trabalhado, infere-se que a modalidade de usucapião especial familiar, instituída pela Lei 12.424/2011 de 16 de junho de 2011, trouxe consigo uma solução para aquele que fora abandona pelo seu cônjuge, e não possui outro imóvel em seu nome, e, nesta mesma linha de raciocínio, conforme as lições de Maria Helena Diniz, isso se baseia no afastamento do lar conjugal representa descumprimento simultâneo de outros deveres conjugais, como a manutenção das despesas da família e do próprio imóvel o que justifica a perda da propriedade e a possibilidade de ser objeto de usucapião (DINIZ apud CJF, 2012). 

Mas, cumpre ressalvar, que toda esta problemática, mas parece como uma consequência pela culpa do “abandono de lar”, ideia esta que fora vencida pela Emenda Constitucional n. 66 de 2010, de acordo com Pena em “Aspectos Inconstitucionais da Usucapião Familiar” (2013) o referido dispositivo 1.240-A imputa culpa, responsabiliza a separação: "mostra-se absolutamente desnecessário em sede de separação/divórcio reacender os problemas que advém do término do afeto, ainda mais, quando desse término resultam litígios que repercutem na esfera patrimonial.". (PENA, 2013)

Carlos Roberto Gonçalves diz que o usucapião familiar ressuscita a discussão sobre a causa do término do relacionamento afetivo, sendo este a principal crítica dada a essa nova modalidade, visto que nesta época se prega a extinção da culpa para a dissolução do matrimônio ou união estável. (GONÇALVES, 2012)

Enquanto, discorre Carlos Roberto Gonçalves (2012) que o aludido artigo 1.240-A do Código Civil deixa dúvida sobre o dies a quo da prescrição aquisitiva, se seria a partir da decretação do divorcio ou dissolução da união estável, haja vista que antes disso não há o que se falar em "ex-companheiro" ou "ex-conjuge" para Maria Helena Diniz, parece certo a separação fática do casal (2010)

Cumpre destacar, conforme Pretel em "Comentários acerca da Emenda Constitucional nº 66" (2010) que a Emenda Constitucional 66 trouxe consigo a extinção da separação judicial e instituiu o divórcio como uma forma de dissolução do casamento na qual é menos burocrática, visto que pode ser feita em cartório, ou com processo judicial rápido e sem o período de dois anos de separação de fato, para poder ser convertido, e permite também, aos ex-conjuge, se casarem novamente.

A autora Pretel, denomina como Emenda do Amor, citando Pablo Stolze ao argumentar que a emenda foi um ganho constitucional:

"O que estamos a defender é que o ordenamento jurídico, numa perspectiva de promoção da dignidade da pessoa humana, garanta meios diretos, eficazes e não-burocráticos para que, diante da derrocada emocional do matrimônio, os seus partícipes possam se libertar do vínculo falido, partindo para outros projetos pessoais de felicidade e de vida" (PRETEL apud GAGLIANO, 2010) 

Em contrapartida a crítica sobre o “abandono do lar”, existe autores, que segundo Stphanie Pena, não discutem a expressão de forma tão pejorativa, ela exemplifica Maria Vilardo e Douglas Freitas, e cita parte do pensamento dos dois ao defender que deve-se pensar em um novo conceito do “abandono de lar” na questão o usucapião familiar, em conformidade com o pensamento de Maria Helena Diniz abordado no começo deste capítulo, os autores falam que o este conceito envolve apenas a saída do lar comum por um dos cônjuges e em consequência, a despreocupação por este no dever de dar assistência ao seu antigo companheiro e seus filhos, isto é, conferindo mais segurança ao ex-conjuge que ficou desamparado. (PENA apud FREITAS, VILARDO; 2013)

A outra grande crítica acerca do usucapião familiar seria o prazo da prescrição aquisitiva que é de 2 (dois) anos e bem reduzida em relação as demais modalidades de usucapião, como argumenta Pena ao citar Neto:

“É pouco razoável e extremada a cominação legal de usucapião de imóvel urbano destinado ao uso da família, pelo decurso do prazo de apenas dois anos, eis que interferirá diretamente no regime de bens vigente, desprezando-o e causando sérios prejuízos ao retirante, além de possivelmenet instigar, ainda mais, o litígio entre os cônjuges.” (PENA apud NETO, 2013) 

Isto é, o usucapião entre cônjuges não poderia ter uma prescrição aquisitiva menor que as outras modalidades de usucapião, já que trata-se de separação de um casal, na qual envolve questões de ordem emocional, impedindo muitas vezes, a tomada de decisões mais racionais. 

3 DAS LESÕES AOS DIREITOS FUNDAMENTAIS ELENCADOS NA CONSTITUIÇÃO DE 1988 

3.1 Da Lesão ao Princípio da Igualdade 

Primeiramente, ao concluir toda a abordagem sobre o dispositivo 1.240-A, percebe-se que há um paradoxo ao verificar este artigo em um sistema normativo que tem como preceito fundamental o princípio da isonomia, elencado no artigo 2º, IV, artigo 3º, IV, artigo 5º, I CRFB/88, determinando como dever da República Federativa do Brasil (em seus três poderes: legislativo, executivo e judiciário), a garantia da igualdade e em contrapartida o próprio Legislativo adicionar e o Judiciário aplicar a questão do usucapião familiar.

Ressalva-se que este preceito fundamental, como descreve Luís Roberto Barroso em Constituição da República Federativa do Brasil Anotada, é autoaplicável, sob um duplo aspecto: a) igualdade da lei (limitação a atividade do legislativo) e b) igualdade perante a lei (limitação a operação do judiciário). (BARROSO, 2003)

Pena, aborda um interessante ponto ao relatar que o legislador, ao regular o usucapião especial familiar de imóveis urbanos, deixou de abarcar os imóveis rurais, sendo omisso sobre essa questão, por isso, ferindo claramente o princípio da igualdade da lei. (PENA, 2013) 

3.2 Da Lesão ao Princípio da Liberdade 

Cumpre ponderar que a questão da liberdade no âmbito das relações familiares, liberdade esta que é principio fundamental de nosso sistema normativo, disposto no artigo 5º, caput, CRFB/88, em que o cônjuge tem seu direito de liberdade limitado, ao sofrer uma sanção patrimonial caso se desprender do lar conjugal.

Percebe-se que ao regular um dispositivo da natureza do usucapião familiar acaba por violar a autonomia de vontade no âmbito familiar, ou seja, tornar-se um obstáculo que o constrange, um conceito de liberdade trazido por José Afonso da Silva em Comentário Contextual a Constituição. (SILVA, 2008)

A autora Stephanie Pena, o direito de liberdade constitucionalmente garantido é uma maneira de limitar a atuação do Estado em face das relações que predominam o interesse particular, como o matrimônio, e que é gritante a lesão ao princípio da liberdade, a legislação que impede ao ex-conjuge de escolher estar ou não em companhia do outro, sob pena de imputação de sanção matrimonial. (PENA, 2013)

Considerações finais 

Frente à Lei nº 12.424/2011 de 16 de junho de 2011 que acrescenta dispositivo 1.240-A ao Código Civil verifica-se que fica claro por meio de uma simples interpretação literal que tal dispositivo visou a possibilidade de usucapir a quota parte do imóvel do cônjuge ou companheiro. Entretanto, tal mudança não trouxe somente vantagens, visto que torna-se incontroversa em relação aos direitos fundamentais de igualdade e liberdade, inclusive a Emenda Constitucional nº 66 de 2010.

Percebe-se que esta modalidade de usucapião, batizado como constitucional, não é tão constitucional assim, já que com base no supracitado os próprios preceitos constitucionais venceram a separação e a causa da separação, sem falar da violação dos direitos basilares do sistema normativo brasileiro, que é o direito de liberdade e igualdade.

REFERENCIAS 

BARROSO, Luís Roberto. Constituição da Republica Federativa do Brasil Anotada. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003. 

COELHO, Fabio Ulhoa. Curso de Direito Civil: Direito das Coisas. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012. vol 4. 

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Coisas. v. 4. São Paulo, 2007. 

DINIZ, Maria Helena. Código Civil Anotado. 16ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012. 

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: Direito das Coisas. vol. 5 7ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012. vol III. 

MALUF; MONTEIRO. Carlos Alberto Dabus; Washintong de Barros. Curso de Direito Civil: Direito das Coisas. 42ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012. 

PENA, Stephanie Lais Santos. Aspectos Inconstitucionais da Usucapião Familiar. Disponível em < http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=10202> Acesso em 14.08.2014 

PEREIRA, Caio Mario da Silva. Instituições de Direito Civil: Direitos Reais. v. 4. São Paulo: Forense, 2014. 

PRETEL, Mariana Pretel e. Comentários acerca da Emenda Constitucional nº 66. Disponível em Acesso em 14.08.2014.  

SILVA, José Afonso da. Comentário Contextual a Constituição. 5ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2008. 

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: Direitos Reais. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2013. Coleção direito civil, v. 5.  

[1] Check de paper desenvolvido como requisito parcial para aprovação da disciplina de Direitos Reais ministrada pela Prof. Viviane de Brito, durante o 5º período do curso de Direito (noturno) da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco (UNDB), entregue em abril de 2014.

[2] Acadêmicos do 5º período do curso de Direito da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco.

[3] Professora especialista, orientadora.