Universalização Do Plano De Emergência

Por Gustavo Estevão | 22/08/2008 | Tecnologia

Resumo

As diversas situações de emergência demandam preparação e um estado de prontidão de "todas as pessoas" que fazem parte de um ambiente de trabalho, a fim de que minutos preciosos não se percam e, conseqüentemente, vidas humanas sejam preservadas. Assim, "todas as pessoas", aqui consideradas, são tanto aquelas que trabalham em um posto de trabalho específico, como são os visitantes a esse posto de trabalho, advindos de outros locais de trabalho, bem como todas as pessoas visitantes, externas ao quadro de empregados de uma empresa. Logo, "todas as pessoas" são também aquelas com mobilidade reduzida (e.g., os obesos e as mulheres gestantes), as pessoas de grupos etários diversos (e.g., crianças e idosos), as pessoas com deficiência física (e.g., os cadeirantes), as pessoas com deficiência sensorial (e.g., os cegos e os surdos), as pessoas com deficiência cognitiva (e.g., as pessoas com síndrome de Down ou de Williams) etc. Enfim, todo o conjunto de pessoas que faz parte do universo cotidiano do local de trabalho. No que tange aos aspectos técnico-prevencionistas, os estabelecimentos de trabalho estão obrigados a elaborar um Plano de Emergência. Será este que, enquanto documento escrito, fornecerá, aos ocupantes do estabelecimento de trabalho, as orientações sobre os procedimentos a serem adotados nos casos de evacuação do prédio, visando, nas situações de emergência, ao abandono do local, com rapidez e segurança para "todas as pessoas". Em face dessas reflexões, cabe identificar algumas das informações que devem constar no plano de emergência (independentemente de quais sejam os tipos de ocorrência), objetivando com elas "universalizar" as orientações para abandono de áreas sinistradas, em atendimento às demandas de "todas as pessoas".

1. Aspectos metodológicos

Denominaremos de "Universalização do Plano de Emergência" a tarefa de dar a conhecer quais são os pontos básicos desse documento que necessitam atender às exigências da Constituição Federal (05/10/88), da Lei Federal nº 7.853 (24/10/98), regulamentada pelo Decreto nº 3.928 (20/12/89), das Leis Federais de nº 10.048 (08/11/2000) e nº 10.098 (19/12/2000), regulamentadas pelo Decreto nº 5.296 (02/12/2004), bem como da Norma Técnica da ABNT / Associação Brasileira de Normas Técnicas de nº 9050 (2004) e das dispostas na legislação trabalhista, especialmente aquelas relativas à promoção da Saúde e Segurança no Trabalho (CLT/ Consolidação das Leis do Trabalho, Capítulo V do Título II), com destaque às normas de prevenção e combate ao incêndio (Portaria MTE nº 3.214 / 79, Norma Regulamentadora nº 23), entre outros documentos pertinentes que venham a ser publicados e que tragam a questão da segurança, envolvendo apessoa com deficiência.

2. Marco conceitual

Tendo em vista o plano de emergência e sua universalização, devemos considerar que cada empregado na empresa é diferente entre si e que cada um terá necessidades específicas a serem respondidas em uma situação de emergência.

Assim, uma pessoa aparentemente "frágil" poderá se mostrar "forte" perante uma situação, enquanto outra, com força física expressa se mostrará "débil".

Aspectos físicos e psicológicos poderão fazer diferença numa situação de emergência, quando, por exemplo, se necessite a tomada de decisões rápidas e corretas. No entanto, não serão as habilidades ou força físicas de um trabalhador a melhor arma que terá a empresa, numa situação de emergência. Pelo contrário, a melhor arma da empresa para essa situação seráo melhor treinamento oferecido aos seus empregados; a melhor e mais freqüente atualização dos procedimentos de segurança; a existência de uma brigada de incêndio melhor instruída, entre outros fatores primordiais para a segurança de todos no estabelecimento de trabalho.

Logo, deverá fazer parte desse conjunto de pré-requisitos, orientações formadoras específicas, quando se tratar de situações específicas, dentre as quais, aquelas em quepessoas com deficiência estejam presentes. Por conseguinte,o plano de emergência deverá trazer a orientação de que os postos de trabalho sejam adequados ao empregado, não só quanto a sua necessidade diária de trabalhador, mas também, e não menos importante, nas suas necessidades de segurança, por exemplo, em caso de evacuação rápida e segura do prédio, em situação de emergência.

Destarte, o plano de emergência de uma empresa deve apresentar a previsão de treinamento dos membros da brigada no que concerne às deficiências, suas limitações e seu efeito nas pessoas.

Com efeito, acorde com as orientações supracitadas, o "Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social", em seu manual "O que as Empresas podem fazer pela Inclusão das Pessoas com Deficiência" (2002), registra:

Uma empresa socialmente responsável deve estar atenta para detectar e prevenir situações de risco. Os acidentes de trabalho, assim como a existência de condições inadequadas para a saúde, podem levar muitos trabalhadores a adquirirem deficiências. Ter uma política de prevenção de acidentes é indispensável.

Por outro lado, a segurança de pessoas com deficiência requer alguns cuidados. A brigada de incêndio deve receber treinamento adequado para assegurar socorro às pessoas com deficiência. Divulgar informações em publicações internas sobre síndromes e patologias, ter canais abertos para esclarecimentos de dúvidas, colocar à disposição informações médicas e exames preventivos são

medidas que devem estar ao alcance de todos os funcionários. (Instituto Ethos, 2002, p.24)

Tendo, então, em mente que o plano de emergência visa à segurança de todos, objetivando a prevenção, mais que a situação de ocorrência, ele deverá fazer constar à previsão de treinamento (simulação), em que participem pessoas com deficiência. Para as situações em que, na empresa, não existam empregados com deficiência, por ocasião do treinamento, o plano de emergência deverá orientar que se deva recorrer a instituições de pessoas com deficiência que possam contatar seus membros em busca de voluntários, os quaisparticipariam (auxiliariam) dessetreinamento. Em última instância, nos treinamentos poder-se-ia valer de pessoas sem deficiência, as quais simulariam ter mobilidade reduzida ou alguma deficiência. Isso, contudo, não deve ser uma constante nos treinamentos, pois poderá levar a procedimentos estereotipados, e mesmo equivocados, da realidade de uma pessoa com deficiência, em situação de abandono rápido e seguro de um ambiente em risco iminente.

Considerando que cada indivíduo melhor aprende de acordocom habilidades diversas de que dispõe e por meio de estratégias variadas (visto que cada um tem inteligências e não uma só inteligência), a capacitação dos empregados, em particular dos membros da brigada deverão valer-se não só das estratégias verbal-lingüísticas (escritos e palestras), mas também de estratégias que permitam a aquisição do conhecimento pela cinestesia, pelas habilidades viso-espacias, pelas inteligências interpessoal, intrapessoal, e outras.

Dentre os itens de relevância para a segurança em estabelecimento de trabalho,devemos considerar que o maior deles está na comunicação. É em torno destaque tudo mais vai girar, isto é, será pela melhor comunicação que as melhores ações serão tomadas no local certo,pela pessoa ou pessoas certas, no momento certo.Assim, deverá o plano de emergência trazer orientaçõesprecisas, numa linguagem adequada a todos os seus leitores.

De fato, a esse respeito, a NBR 9050 (ABNT 2004) orienta que os textos sejam escritos de maneira coesa e coerente, em frases curtas e diretas, mormente tendo em vista a pessoa com deficiência intelectual (deficiência mental), e, acrescentamos, as pessoas com baixa escolaridade.

No entanto, não reside nas formas escritas à única via de comunicação quanto aos fatores de risco numa empresa, quanto às possibilidades de prevenção desses riscos ou quanto às possibilidades de fuga dos estabelecimentos de trabalho em situação de emergência.

É sabido que a utilização de formas gráficas (desenhos, mapas, diagramas, entre outros) constitui mídia de comunicação rápida e eficaz em muitas situações de prevenção a acidentes ou em situações de emergência.Todavia, tais formas gráficas, se não conseguirem comunicar a todos, perderá sua real eficácia.Logo, sob essa consideração, o plano de emergência deverá prever a comunicação acessível a todos, empregados ou não, no estabelecimento de trabalho.

Subsidiados pelos documentos legais supramencionados, pelas normas técnicas e eventualmente por consultorias externas, os responsáveis pela confecção do plano de emergência deverão fazer constar, nesse instrumento de segurança,a exigência de se ter, por exemplo,mapas e diagramas de rotas de fuga acessíveis não só às pessoas que vêem, mas também às pessoas cegas ou com baixa visão, o que poderá ser alcançado por técnicas específicas para a transposição do formato pictórico visual paraconfiguração háptica (tátil).Nesta mesma linha, os textos (panfletos, manuais e outros escritos) deverão ser acessíveis a essas pessoas, o que se alcançará seja transcrevendo-os para o Braille ou então lhes ampliando as letras.

3. RESULTADOS ESPERADOS

- Devem ser assegurados o pleno exercício dos direitos individuais e sociais das pessoas com deficiência, nos quais são considerados os valores básicos da igualdade de tratamento e oportunidades, da justiça social, do respeito à dignidade da pessoa humana, do bem-estar, e outros, indicados na Constituição Federal ou justificados pelos princípios gerais do direito, afastando-se todas e quaisquer discriminações e preconceitos;

- Devem ser adotadas medidas que garantam a funcionalidade das edificações de forma a evitar ou remover todos os óbices (barreiras arquitetônicas, de sinalização, etc.) às pessoas com deficiência, permitindo a elas o pleno acesso;

- As pessoas com deficiência terão tratamento prioritário e adequado as suas condições individuais, sem privilégios ou cunho assistencialista, visando assegurar-lhe o pleno exercício de seus direitos básicos e a efetiva inclusão social;

- Consideram-se apoios especiais às pessoas com deficiência a orientação, a supervisão e as ajudas técnicas, entre outros elementos, que auxiliem ou permitam compensar uma ou mais limitações funcionais motoras, sensoriais ou mentais da pessoa com deficiência, de modo a superar as barreiras da mobilidade e da comunicação, possibilitando a plena utilização de suas capacidades em condições de normalidade;

- Somente será considerada acessível aquela condição (do espaço, do mobiliário, do equipamento, das instalações, dos sistemas e meios de comunicação) de alcance para utilização das pessoas com deficiência, desde que o façam com segurança e autonomia;

- Considera-se desenho universal a concepção de espaços, artefatos e produtos que visam atender simultaneamente todas as pessoas, com diferentes características antropométricas e sensoriais, de forma autônoma, segura e confortável, constituindo-se nos elementos ou soluções que compõem a acessibilidade;

- Pelo menos um dos acessos ao interior de uma edificação deverá estar livre de barreiras arquitetônicas e de obstáculos que impeçam ou dificultem a acessibilidade da pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida;

- Pelo menos um dos itinerários que comuniquem horizontal e verticalmente todas as dependências e serviços de um edifício, entre si e com o exterior, deve cumprir os requisitos de acessibilidade;

- As pessoas com deficiência, os idosos com idade igual ou superior a sessenta e cinco anos, as gestantes, as lactantes e as pessoas acompanhadas por crianças de colo terão atendimento prioritário em quaisquer situações;

- Dentre as medidas adaptativas, que visam à acessibilidade nas situações de emergência, destacam-se as seguintes:

·piso tátil direcional para área de circulação (rota de fuga);

·calçadas rebaixadas e/ou rampas acessíveis nas saídas de emergência;

·escadas com piso tátil direcional e corrimão em ambas laterais;

·áreas de circulação (rota de fuga) sem barreiras de solo ou áreas;

·as características do desenho e a instalação do mobiliário devem garantir a saída segura e rápida e o seu uso por pessoa com deficiência ou mobilidade reduzida;

·a aproximação e o alcance visual e manual de sistemas de alarme de incêndio devem atender às pessoas com deficiência, em especial aquelas em cadeira de rodas e com deficiência visual;

·os elementos de alerta e sinalização de emergência devem atender às pessoas com deficiência, em especial devem ser concomitantemente sonora e visual / luminosa;

·atenção deve ser dada aos auditórios, estádios, salas de conferências e similares, que reservarão, pelo menos, dois por cento da lotação do estabelecimento para pessoas em cadeira de rodas, distribuídos pelo recinto em locais diversos, de boa visibilidade, próximos aos corredores (devidamente sinalizados), evitando-se áreas segregadas de público e a obstrução das saídas;

·junto às botoeiras externas do elevador deve existir sinalização em braile, em altura acessível, indicadora de qual andar da edificação a pessoa se encontra.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao trazer as orientações aqui apontadas, a universalização dos planos de emergência não só responderá às exigências legais de acessibilidade, mas também propiciará com que empregados com deficiência visual e também aqueles sem deficiência possam participar, efetivamente, das situações planejadas de fuga em caso de emergência, tanto facilitando a ajuda de terceiros à sua pessoa, quanto assistindo os seus colegas em situações que, por exemplo, haja baixa visibilidade ou privação de luz.

Portanto, todos os materiais de orientação à prevenção de acidentes, produzidos pela ou para a empresa deverão ser distribuídos no estabelecimento de trabalho a todos os empregados, e mesmo aos visitantes, pois a melhor comunicação e a mais amplamente acessívelconstituirá ferramenta indispensável à segurança de todas as pessoas,com deficiência ou não.

5. BIBLIOGRAFIA

GLAT, R. A lnteqração social dos portadores de deficiências: uma reflexão. Rio de Janeiro: Sette Letras, 1995.

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RIBAS, J. B. C. O que são pessoas deficientes. Coleção primeiros passos. São Paulo. Brasiliense: 1985.