União homossexual possibilidade jurídica da união sexual entre pessoas do mesmo sexo

Por Saulo Ferreira Silva Oliveira Nascimento | 01/12/2011 | Direito

Wanderson Carlos Campos de Andrade

Saulo Ferreira Silva Oliveira Nascimento

 

Sumário: Introdução;1 Aunião homossexual no Direito de Família: um caso de inexistência;2 Aformação de união estável; 3 Esforço interpretativo jurisdicional para a concretização da união estável entre homossexuais; Considerações Finais; Referências.

 

 

 

Introdução

Para uma verdadeira compreensão e validade das normas estabelecidas em todo o ordenamento jurídico brasileiro, a Constituição deve ser respeitada, isso se aplica ao Código Civil em vigor desde 2002.

A Constituição no Brasil é a principal e maior fonte de Direito. Apesar de ser essencialmente política a Carta Magna tem peso fundamental no momento em que se criam novas leis, pois todas as demais normas devem obedecer aos requisitos constitucionais para tornarem-se legítimas.

O objetivo nesse texto é demonstrar que o Código Civil é essencialmente Constitucional, por mais que suas regras sejam de cunho privado, ou seja, estabelecem preceitos que regem contratos jurídicos entre particulares.

Nessa perspectiva é que se coloca como objeto de pesquisa o tema da união homoafetiva, o qual gera um segundo objetivo, a saber, investigar a postura dos juízes perante os pedidos de união estável entre pessoas do mesmo sexo, tendo como parâmetro a Constituição de 1988, bem como uma análise crítica acerca da legislação e de decisões judiciais.

            Na defesa da união homoafetiva é importante analisar os princípios constitucionais que tratam do direito de família, ou seja, trata-se do Direito Civil Constitucional, uma vez que o direito de família encontra respaldo na Lex Major. Localiza-se na geração de direitos e garantias fundamentais o respaldado aos direitos inerentes ao casal homoafetivo, sendo que os direitos e garantias fundamentais de primeira dimensão surgiram após a Revolução Francesa, tendo como característica a passividade do Estado perante a população. É o chamado laissez-faire. Logo, ocorre a aplicação da liberdade entre os indivíduos. Já os direitos e garantias fundamentais de segunda dimensão preconizam o contrário. Tendo em vista tratar-se de direitos sociais, clamam por uma posição ativa do Estado. Ocorre a promoção da igualdade. Já os de terceira dimensão, surgidos após a Segunda Guerra Mundial, são corolário do principal princípio constitucional, aquele que decorre a maioria dos princípios que conhecemos, qual seja, a dignidade humana. E principalmente - não só - nesta dimensão que está a tutela dos interesses dos casais homoeróticos. Reputa-se que o princípio da dignidade não é um conceito constitucional, mas um dado inicial e preexistente a toda experiência, verdadeiro fundamento na República brasileira, atraindo o conteúdo de todos os direitos fundamentais.

 

 

1 A União Homossexual no Direito de Família: um caso de inexistência

Antes de adentrarmos diretamente no ponto que tange à união estável homossexual, necessário se faz colocá-lo como determina a legislação civil brasileira. Nesse aspecto, é extremamente relevante apontar que existem três eventos que tornam o casamento inexistente. Tais casos, se ocorrerem, não precisam acontecer cumuladamente, basta que um aconteça para se ter inexistente o casamento.

Abrem-se aqui parênteses para reforçar o que seja inexistência de um ato jurídico como o casamento. Neste plano de inexistência, o termo jurídico determina que o casamento inexistente não produz efeitos (mesmo que putativos) e que esta inexistência de um determinado casamento pode ser evocada a qualquer momento, por interessado, independente de estabelecimento judicial. (SOUZA, 2000)

O primeiro desses eventos é a celebração do casamento frente à autoridade não investida de poderes. Tem-se que o casamento deve ser solenizado perante pessoa para a qual a lei de organização judiciária estadual atribua tal competência, geralmente chamado juiz de paz. Um outro episódio que torna inexistente o casamento celebrado é quando não ocorre o consentimento manifestado na forma da lei pelos nubentes. Nesse diapasão, será inexistente o consórcio nubente quando faltar a pretensão de um dos contraentes para tal celebração, uma vez que se trata de um contrato, deve haver duplicidade do interesse das vontades. (DIAS, 2007)

O objeto aqui estudado, no entanto, trata da diferença de sexo entre os nubentes. No que tange a este aspecto, para que o casamento tenha efeitos, é necessário que seja celebrado o contrato entre um homem e uma mulher, sem tal requisito, o casamento é inexistente (VENOSA, 2008). Mesmo o Código Civil de 2002, ao pensar o arcabouço jurídico do casamento, partiu de um modelo dual. É disposto assim o casamento no CC/02:

 

Art. 1.514. O casamento se realiza no momento em que o homem e a mulher manifestam, perante o juiz, a sua vontade de estabelecer vínculo conjugal, e o juiz os declara casados.

 

É daí, da leitura do texto que se tira que a união entre pessoas do mesmo sexo não pode ser considerada casamento dentro dos padrões legais, posto que a realização de um casamento válido e com efeito pressupôs que exista diferença de sexo. A igualdade de sexo poderia ser enquadrada como algum outro instituto jurídico, não configurando oem apreço. Maria BereniceDias (2000) denomina como união homoafetiva o relacionamento duradouro e efetivo dentre pessoas de mesmo sexo.

Defende-se na doutrina e jurisprudência o uso da analogia, prevista no art. 126 CC/02 e também no artigo 4° da LICC, passando pelo estudo hermenêutico e, também, deve-se demonstrar que tais uniões entre pessoas do mesmo sexo possuem os mesmo fins e princípios das uniões heterossexuais, ao que se entende então aplicar a mesma legislação existente para as uniões estáveis heterossexuais, e ao ser observado o art. 226 da Constituição Federal. Para um melhor entendimento da legislação a ser aplicada, explicaremos o instituto da união estável, seu conceito, seus requisitos, e os direitos e deveres que decorrem de tal situação fática frente a legislação vigente no Brasil atualmente.

 

PROCESSO CIVIL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE UNIÃO HOMOAFETIVA. PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ. OFENSA NÃO CARACTERIZADA AO ARTIGO 132, DO CPC. POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. ARTIGOS 1º DA LEI 9.278/96  E 1.723 E 1.724 DO CÓDIGO CIVIL. ALEGAÇÃO DE LACUNA LEGISLATIVA. POSSIBILIDADE DE EMPREGO DA ANALOGIA COMO MÉTODO INTEGRATIVO. 1. Não há ofensa ao princípio da identidade física do juiz, se a magistrada que presidiu a colheita antecipada das provas estava em gozo de férias, quando da prolação da sentença, máxime porque diferentes os pedidos contidos nas ações principal e cautelar. 2. O entendimento assente nesta Corte, quanto a possibilidade jurídica do pedido, corresponde a inexistência de vedação explícita no ordenamento jurídico para o ajuizamento da demanda proposta. 3. A despeito da controvérsia em relação à matéria de fundo, o fato é que, para a hipótese em apreço, onde se pretende a declaração de união homoafetiva, não existe vedação legal para o prosseguimento do feito. 4. Os dispositivos legais limitam-se a estabelecer a possibilidade de união estável entre homem e mulher, dês que preencham as condições impostas pela lei, quais sejam, convivência pública, duradoura e contínua, sem, contudo, proibir a união entre dois homens ou duas mulheres. Poderia o legislador, caso desejasse, utilizar expressão restritiva, de modo a impedir que a união entre pessoas de idêntico sexo ficasse definitivamente excluída da abrangência legal. Contudo, assim não procedeu. 5. É possível, portanto, que o magistrado de primeiro grau entenda existir lacuna legislativa, uma vez que a matéria, conquanto derive de situação fática conhecida de todos, ainda não foi expressamente regulada. 6. Ao julgador é vedado eximir-se de prestar jurisdição sob o argumento de ausência de previsão legal. Admite-se, se for o caso, a integração mediante o uso da analogia, a fim de alcançar casos não expressamente contemplados, mas cuja essência coincida com outros tratados pelo legislador. 5. Recurso especial conhecido e provido. [grifos nossos] (STJ, REsp 820475, Relator Ministro ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO, DJe 06/10/2008, RDTJRJ vol. 77 p. 97, Decisão: 02/09/2008)

 

Este, como se observa, parece ser o rumo a ser tomado na jurisprudência brasileira, no intuito de garantir e concretizar os direitos de pessoas que não tomam para si os mesmo valores que a sociedade impõe.

 

Considerações Finais

A linha jurídica entre Constituição e normas infraconstitucionais é de hierarquia vertical, como se observa em todos os casos do sistema de normas positivadas no Brasil, isto é, todas demais normas, mesmo que tratem de caráter privado, devem obedecer a Lex Fundamentallis. Para que não haja uma volumosa desordem no aparelho legal a Constituição necessita ser sempre respeitada. É isso que manifesta o encanto de um ordenamento sucinto e preciso em suas cláusulas, pois para que não exista uma anarquia à Lei Maior é operoso o procedimento de concepção de um regulamento e este mesmo procedimento não deve ser depreciado de forma que, continuamente, a Constituição esteja no nível que lhe é de direito no ordenamento jurídico, o cume.

Dentro desta perspectiva é interessante observar como os magistrados tem atuado de acordo com sua vocação política, no sentido de não ser imparcial. Buscando, assim, observar os direitos de um grupo que tem historicamente um misto de preconceito e repulsa dentro da sociedade patriarcal o qual vivemos. Esta sociedade que cria mecanismos de excluir a cada dia mais e mais pessoas, de forma a não haver um apreço a direitos dos chamados “intoleráveis”.

 

BIBLIOGRAFIA

 

COSTA, Elcias Ferreira da. Analogia jurídica e decisão judicial. Porto Alegre: Fabris, 1987.

 

CZAJKOWSKI, R. União livre. 2. ed. Curitiba: Juruá, 2000.

 

DAL COL, H. M. A família à luz do concubinato e da união estável. Rio de Janeiro: Forense, 2002.

 

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. v. 5. Direito de Família. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2004.

 

DIAS, Maria Berenice. Homoafetividade:o que diz a justiça! : as pioneiras decisões do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul que reconhecem direitos às uniões homossexuais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003.

 

______. Manual de Direito das Famílias. São Paulo: RT. 2007.

 

______.  União homossexual: o preconceito e a justiça. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2000.

 

SOUZA, Aida Maria Loredo Moreira de. Aspectos polêmicos da união estável.  2. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2000.

 

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil v. VI. São Paulo: Atlas. 2008.



*** Aluno 6º período Direito UNDB