Uma perspectiva jurídica sobre os direitos das crianças e dos adolescentes Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado
Por Fabiana Tertuliano de Lima | 06/11/2022 | EducaçãoEstatuto da Criança e do Adolescente Comentado
Por muito tempo, as crianças e os adolescentes eram vistos como seres inferiores aos demais, estando submetidas às normas sociais impostas pelos pais ou responsáveis.
O reconhecimento da criança e do adolescente como sujeito de direitos foi uma construção social, perpassando de geração em geração.
Atualmente, a identificação e ressignificação da criança e do adolescente como sujeito social e histórico tem influenciado para que o ordenamento jurídico assuma, posteriormente, a condição de ente responsável por oferecer a tutela e assistência necessárias para o desenvolvimento e bem-estar destes.
Título I
Das disposições preliminares
- A Doutrina da Proteção Integral adotada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente
Segundo os estudiosos, o Estatuto da Criança e do Adolescente perfilha a “doutrina da proteção integral”, fundada no reconhecimento de direitos especiais e específicos de todas as crianças e adolescentes. Foi anteriormente prevista na Constituição Federal, no art. 227, instituindo a chamada prioridade absoluta. O texto constitucional, nesse prisma, assegurou direitos fundamentais à criança e ao adolescente, constituindo, assim, uma nova forma de enxergar, com o escopo de efetivação dos direitos fundamentais da criança e do adolescente.
- Princípio da prevalência do interesse do menor.
A doutrina da proteção integral e o princípio do melhor interesse são duas regras basilares do direito da infância e da juventude, e que estão intrinsecamente ligadas uma, a outra, devendo permear todo o tipo de interpretação dos casos envolvendo crianças e adolescentes.
Uma vez reconhecido a criança e o adolescente como sujeito de direitos, sobre o princípio do melhor interesse, considera-se o “melhor interesse da criança” aquilo que a Justiça acredita ser o melhor para o menor, e não o que a família acredita que seja. O entendimento dos pais às vezes não é o melhor para aplicação à criança e ao adolescente.
Ou seja, todas as medidas concernentes às crianças terão consideração primordial os interesses superiores da criança. Na redação original em inglês, o termo utilizado é best interest of the child. Muitos entendem como o princípio da dignidade da pessoa humana aplicada à criança e ao adolescente. De qualquer forma, a lei deve prever a melhor consequência para criança ou adolescente, concordando com as reais necessidades destas.
- Convenção sobre os direitos da criança
Aprovada pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 20 de novembro de 1989, assinada pelo Brasil em 26 de novembro de 1990 e aprovada pelo Decreto Legislativo nº 28, de 14 de setembro de 1990, surge a Convenção sobre os Direitos da Criança.
A Doutrina da Proteção Integral, originada através da referida Convenção orienta o atendimento à criança e ao adolescente por meio da proteção e assistências especiais ao seu amplo desenvolvimento. Dessa forma, há necessidade de um conjunto articulado de ações por parte do Estado, da família e da sociedade, que vão desde a concepção de política públicas até a realização de programas locais de atendimento implementados por entidades governamentais ou não governamentais, objetivando oferecer cuidados e amparos necessários às crianças e aos adolescentes.
- A introdução do artigo 227 na Constituição Federal
Antes do advento do ECA, houve uma luta incessante de vários grupos de defesa do bem-estar do menor para a inserção de direitos da criança e do adolescente no texto constitucional.
- A história sobre o ECA
Em primeiro momento, a Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1900, dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente. O termo estatuto foi preferido em razão deste expressar direitos. O termo código foi preterido em razão de vincular ao caráter punitivo, tal qual o Código Penal. Na verdade, a escolha estaria mais correta porque o código representaria um conjunto de leis, o que implicaria em um ordenamento jurídico muito maior que o ECA. Já o estatuto exprime a ideia de lei, de decreto, regulamento, sendo o termo mais apropriado.
O ECA é uma criação coletiva, fruto de um grande movimento, é a luta pela efetivação dos direitos sociais no Brasil. A lei nº 8.069/90 foi um marco histórico em termos de legislação em geral, abrangendo uma gama variada de disciplinas voltadas à proteção dos direitos da criança e do adolescente. Esse direito pode ser compreendido como o conjunto de princípios e de leis que se regem os direitos e obrigações das crianças e adolescentes à luz da proteção integral e do melhor interesse. A exemplo, o Estatuto do Idoso tomou o ECA como referencial para sua própria elaboração.
Nesse sentido, o desenvolvimento da criança e do adolescente põe em evidência a luta por uma infância onde esses sujeitos sejam respeitados em suas todas as suas dimensões, como sujeitos históricos e de direitos.
- O ECA e a denominação técnica de criança e adolescente
Todavia, por muito tempo, não havia a distinção entre criança e adolescente. Para tanto, houve a necessidade de distinguir a criança do adolescente. Nesse sentido, para o ECA, criança é todo menor de 12 anos, e adolescente entre 12 e 18 anos (art. 2º).
Embora definidos, ainda há uma pequena discussão a respeito da inclusão do Nascituro – termo utilizado para se referir àquele que vai nascer, de existência no ventre materno e que há de nascer – como criança. Em tese, pode-se elencar três posições acerca do direito do nascituro: (I) a teoria natalista, segundo a qual o nascituro teria mera expectativa de direitos; (II) teoria da personalidade condicional, nesse, o nascituro teria os seus direitos garantidos, mas que dependeriam de uma condição suspensiva: o nascimento com vida; (III) teoria concepcionista, aqui, o nascituro seria sujeito de direitos e obrigações desde a concepção. A doutrina da proteção integral e do melhor interesse acaba ter de incluir o nascituro dentro da proteção, incluindo a tutela ou a obrigação da gestante a certos cuidados.
Além disso, o termo jovem, embora muito utilizado para se referir a criança ou ao adolescente, significa a pessoa entre 15 e 29 anos. No entanto, apesar de a maioridade civil cessar aos 18 anos, é notório que a maturidade da pessoa não ocorre, na maioria das vezes, nessa idade, havendo a necessidade de um ordenamento jurídico protetivo do jovem, da mesma forma como ocorreu com a criança e com o adolescente.
- Crianças e adolescentes como pessoas em desenvolvimento
A Lei nº 8.069/90 levar-se-ão em conta os fins sociais a que a norma se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e, especialmente, a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvido.
A infância e a juventude são etapas que devem ser superadas para que se possa atingir com plena conformação física, psíquica, moral e social o estágio da vida adulta. Dessa forma, as instituições de ensino, em conformismo com o Estado, família e sociedade, devem promover a estes sujeitos o estímulo ideal para a permanência efetiva no âmbito escolar, bem como desenvolver suas habilidades e, consequentemente, prepará-los para o exercício da cidadania e, a posteriori, a qualificação para o trabalho profissional.
Esse desenvolvimento deve ser feito de modo prospectivo, ou seja, com um viés futurista, voltado ao bem-estar da criança e do adolescente. As crianças, por um lado, necessitam de maiores cuidados, ao passo que os adolescentes ganham paulatinamente maior autonomia.
1- Jane Gomes de Castro: Graduada em Biologia; Especialista em Ecoturismo, Turismo e Educação Ambiental.
2- Adriana Peres de Barros: Graduada em Pedagogia; Especialização em Educação Infantil e Alfabetização; Psicopedagogia Institucional.