Um perfil da escola ideal - CIEP
Por andreia cristina de souza pedro bezerra | 15/07/2012 | EducaçãoUm perfil da Escola Ideal - CIEP
“Sou um homem de sorte, tive muitas alegrias na vida. Nenhuma maior, porém como a de conduzir o Programa Especial do Rio de Janeiro, que foi e é o mais amplo e ambicioso empreendimento realizado no Brasil.“
DARCY RIBEIRO..
Resumo:
Para formar sujeitos críticos e capazes de atuar como cidadãos conscientes na sociedade, é necessário que haja, antes de qualquer coisa, o estabelecimento de uma relação pedagógica de qualidade, por isso, o presente estudo tem por objetivo refletir sobre o tema “A escola ideal”, levando em consideração o sentido amplo que tem o ato de educar e o modelo pensado por Darcy Ribeiro e Leonel Brizola: CIEP (Centro INETGRADO DE EDUCAÇÃO PÚBLICA). O CIEP foi a mais transformadora das políticas sociais brasileiras. Todas as crianças teriam aulas do começo da manhã ao final da tarde. Desenvolveriam seus talentos, independentemente da renda da família.
Palavras-chaves: ESCOLA IDEAL- EDUCAÇÃO INTEGRAL- PROPOSTA PEDAGÓGICA
Abstract:
To form critical subjects and capable of acting as concerned citizens in society, there must be, first of all, the establishment of a pedagogical relationship quality, therefore, this study aims to reflect on the theme "The ideal school "taking into account the broad sense that the act is to educate and model designed by Darcy Ribeiro and Brizola: CIEP (Centre INETGRADO oF PUBLIC EDUCATION). The CIEP was the most transformative social policies in Brazil. All children have classes in the early morning to late afternoon. Develop their talents, regardless of family income.
Introdução:
É muito comum ouvir que o ensino no Brasil é de má qualidade. Mas o que é qualidade? Será que uma escola considerada de qualidade há cem anos, ainda hoje seria vista como ‘escola de qualidade’ ou escola ideal, aquela que dá certo? Será que uma escola boa para uma população que vive no interior do Brasil, é boa para quem mora num centro urbano?
Como todos nós vivemos num mesmo país, num mesmo momento histórico, é provável que compartilhemos muitas noções gerais sobre o que é uma escola de qualidade, uma escola ideal. A maioria das pessoas certamente concorda que escola boa é aquela em que os alunos aprendem coisas essenciais para sua vida, como ler e escrever, resolver problemas matemáticos, conviver com os colegas, respeitar regras, trabalhar em grupo; esquecendo-se de que para definir uma escola como boa ou que dá certo é preciso defini-la bem, de acordo com os contextos socioculturais locais (comunidade escolar – interna e externa). Bem como a sua gerência (gestão) e a política interna.
Assim,surgem na década de 80 uma proposta “nova” de escola: os CIEPs , centro integrado de educação publica visando o atendimento integral de cada aluno. A proposta pedagógica dos CIEPs rompe com o antigo isolamento da Escola Pública, para fazer dela uma promotora efetiva da maior participação social (principalmente das classes mais pobres),O CIEP inaugura uma nova etapa na história da educação de base em nosso país: traz a oferta de um programa educacional integrado, capaz de mobilizar para aprendizagem o potencial dos alunos envolvendo toda a comunidade escolar: alunos, professores, diretores, funcionários e a própria comunidade bairro.
DESENVOLVIMENTO
Educação em sentido amplo é formar o homem completamente: família, sociedade, escola, é conseguir com que ele saiba se “pôr” em várias situações, pensar, reagir, agir, elaborar, lutar por seus direitos, exercer seus deveres, ajudar a melhorar o mundo. Educação é ser cidadão, pai, mãe, mulher, homem, com consciência plena, com dignidade, sabedoria.
A escola tem a função de preparar cidadãos, mas não pode ser pensada apenas como tempo de preparação para a vida. Ela é a própria vida, um local de vivência da cidadania. (Alarcão,2001)
Com educação o homem passa a “ver” as coisas com clareza, ele passa a possuir uma visão ampla e sabe decifrar tudo à sua volta, pois ele pensa, lê, “incomoda”, e esse homem pode e deve considerar-se livre.
Educação deve ser sempre sinônimo de liberdade, pois com uma educação ampla e clara, o homem conseguirá lembrar-se das coisas simples de seu cotidiano, que acabam sendo esquecidas por todos.Há necessidade de dar educação ao povo, para que através dela ele torne-se livre para lutar e decidir o rumo de seus pés!
Por isso, é necessário que a escola dê certo; atenda de forma integral essa construção do homem critico e capaz de atuar como cidadão consciente na sociedade. Necessita-se de uma escola que tenha objetivos claros e accessíveis, participação dos pais/responsáveis, gestão democrática, projeto (planejamento). Enquanto sistema social que é, a escola constitui-se em uma organização sistêmica aberta, isto é, em um conjunto de elementos que interagem se influenciam mutuamente, conjunto esse relacionado, na forma de troca de influências, e ao meio em que se insere.
A escola é um espaço constituído por diversas dimensões, todas entrelaçadas. Pode-se destacar algumas principais, como as dimensões pedagógica, política, social, cultural, administrativa e humana.
Por dimensão pedagógica compreende-se o processo ensino- aprendizagem, com todas as variáveis que o constitui, como por exemplo, a organização dos conhecimentos, do espaço e do tempo escolar, a relação professor- aluno, a metodologia de ensino.
Por dimensão administrativa entende-se as questões de infra-estrutura e de pessoal.
No campo político, situam-se as relações de poder e o processo decisório.
No social, a relação com a comunidade escolar em um sentido bem amplo: a relação interna entre professores, alunos e funcionários e a relação estabelecida com pais, moradores próximos à escola, secretaria de Educação e sociedade em geral. Também estão incluídas as experiências sociais de todos os segmentos, ou seja, sua origens de classe , suas condições de moradia, trabalho, lazer.
No campo cultural, estão as raízes e vivências que promovem a elevação do homem, conferindo-lhe uma identidade social e cultural.(...)
E na dimensão humana, os sentimentos, desejos, dificuldades pessoais, os conceitos e preconceitos que povoam o íntimo de cada um de nós.
Cada dimensão destas é constituída por elementos ou traços das demais, encontrando-se em permanente movimento de associação e influências mútuas. (Caderno da TV escola,1996)
A escola ideal é aquela que cumpre a sua função. Essa função já esta historicamente determinada, não cabendo a escola reinventar a roda. Em qualquer tempo e lugar, a escola tem uma base comum, universal: garantir o direito de aprendizagem dos conhecimentos científicos, culturais e éticos a todos que a ela recorrem.
Sito o programa dos CIEPs como exemplo, que começou a ser idealizado no início dos anos 80, quando a proximidade do período autoritário aliada a ainda forte influência das ideologias político-revolucionárias resultava num profundo desinteresse pelas questões da educação escolar por parte do que se poderia chamar de forças progressistas intelectuais e políticas. Nesse período surgem um conjunto de medidas marcantes e polêmicas para romper com a inércia da área educacional e transformar (naquele período) o caos em que se encontrava a educação. Na proposta administrativa e pedagógica, surgem os CIEPs ,com uma nova concepção de organização escolar e a uma tentativa de redefinição do papel da escola em nossa sociedade.
O programa tentava colocar em prática uma proposta de reformulação mais profunda da escola, propiciando uma reflexão sobre sua organização, objetivos, métodos e inserção social. A concepção básica, apresentada nos documentos oficiais, especialmente no “Livro dos CIEPs” (Ribeiro/1986) articulava, pelo regime de turno único, linhas de ação nas áreas de instrução, saúde e cultura, que pretendiam resultar numa escola democrática, com funções sociais e pedagógicas ampliadas.
Em 1983, com a posse de Leonel Brizola como primeiro governador eleito depois da ditadura militar, foi desenvolvido o Programa Especial de Educação, materializado nos Centros Integrados de Educação Pública, os Cieps, com a coordenação do Prof. Darcy Ribeiro.
Sob inspiração do mestre Anísio Teixeira, a equipe organizada por Darcy Ribeiro formatou os Cieps. Eram escolas com horário integral, aulas de reposição, biblioteca, esportes, atividades de cultura a cargo dos animadores culturais. As crianças faziam quatro refeições diárias e tomavam banho antes da volta para casa. Os Cieps tinham ainda residência para vinte crianças carentes, com pais substitutos.
Nos prédios havia cozinha industrial, gabinete médico-odontológico, quadra de esportes e, alguns, piscina. Os professores tinham programas de atualização, formação continuada e os materiais pedagógicos e didáticos eram da melhor qualidade. As merendeiras eram concursadas e passavam por treinamento antes de assumir. As turmas tinham 20 crianças nas séries iniciais e até, no máximo, 30 nas turmas de 5ª a 8ª séries.
Muitos Cieps tornaram-se ponto de convergência das comunidades em que estavam localizados e nos finais de semana havia atividades de entretenimento para os alunos e seus familiares. Em muitas unidades, festas de casamento, quinze anos, batizados, posse de associações de moradores e outros eventos aconteciam em suas dependências. Era o início do conceito difundido hoje em todo o país como “escolas de paz”.
O projeto era tão avançado que imediatamente gerou um ódio irracional em setores da grande imprensa e em segmentos da sociedade que, inconformados com todo aquele investimento em educação pública, começaram uma campanha mesquinha, contínua, incansável para desacreditar os Cieps junto à população.
(Transcrição do post da Professora Marilda Campos, em seu blog, uma mensagem à Professor Amanda Gurgel)
O necessário era fazer com que a escola garantisse a aprendizagem de todos que nela ingressavam; no nível macropolitico, ou seja, as grandes decisões a serem tomadas nos níveis da União, Estados e Municípios. É preciso hoje, repensar a estrutura e o funcionamento do sistema de ensino, buscando adequá-lo às grandes transições de paradigma decorrentes das mudanças econômicas, tecnológicas, sociais, políticas e culturais, que vêem marcando o Brasil e o mundo; no nível micropolitico, ou seja, as relações da escola com a família, a comunidade e o poder público local, visam inserir as escola na vida da comunidade e a comunidade na vida da escola, de modo a potencializar recursos e energias em função da melhoria do ensino.
O grande desafio da escola pública está em garantir um padrão de qualidade (para todos) e, ao mesmo tempo, respeitar a diversidade local, étnica, social e cultural. Portanto, o nosso desafio educacional continua sendo educar e ser educado. (Gadotti e Romão, 2002).
As escolas de horário integral, os Centros Integrados de Educação Pública (Cieps) representam uma experiência original de inovação e democratização da educação no Brasil nessse sentido que Gadotti e Romão colcam, além da ampliação de tempo e espaço para permanência dos alunos na escola, expandem seus objetivos ao assumir a formação contínua em serviço de seus professores como tarefa inerente e necessária ao seu fazer cotidiano. O horário integral exige e permite que professores tenham tempo para reuniões diárias destinadas ao planejamento, estudo e desenvolvimento de práticas reflexivas que possibilitem a constante avaliação e qualificação do trabalho realizado.
A relação professor-aluno e seu entorno institucional (técnicos, funcionários, diretores) é o nível molecular. Sempre é bom lembrar que a escola só é boa, só dar certo, quando o aluno aprende e que qualquer criança e/ou adulto capaz de brincar/ trabalhar e brigar é também capaz de aprender. Analisando a afirmativa com mais atenção, verificamos a crença explícita numa escola como instituição capaz de promover mudanças sociais, com extensão do tempo escolar (escolas de dia completo) e, também, a característica de ser uma escola para alunos e professores.
Criar escolas de dia completo para alunos e professores, sobretudo nas áreas metropolitanas onde se concentra a maior massa de crianças condenadas à marginalidade porque sua escola efetiva é o lixo e o crime. O que chamamos de menor abandonado e delinqüente é tão-somente uma criança desescolarizada, ou que só conta com uma escola de turnos ( Ribeiro, 1995a, p. 13).
Porém como afirma Paulo Freire, “não se muda a cara da escola por um ato de vontade do secretário” (1991). Retomando a discussão da qualidade de ensino como elemento central para que a escola dê certo, é preciso ressaltar o distanciamento entre os discursos dos educadores e da academia e as questões pedagógico-didáticas da escola e o campo de sala de aula, o que implica uma perda na prática educativa. Os processos educacionais possuem um caráter endógeno, de dentro para fora e, por conta disso, é preciso pensar e construir políticas educacionais que tenham suas bases na escola e na aprendizagem dos alunos. Nesse sentido, poder-se-iam promover modificações "por dentro" das escolas, garantindo assim a melhor qualidade de ensino. A desconexão entre o sistema escolar e as escolas parece torná-las campos impenetráveis: não se pensa nas necessidades dos contextos concretos de ensino e aprendizagem. É comum pensar a escola de cima para baixo, primeiro os currículos, depois as metodologias e, finalmente, os resultados de aprendizagem dos alunos. Tal desconexão, apesar das numerosas políticas educativas, requer pensar a diversidade social e cultural dos alunos, com a avalanche de novas tecnologias da comunicação e informação, como as deficiências de gestão da escola e do currículo. Muito além de administrar a burocracia, o que se espera da gestão escolar hoje é criar condições para que os alunos avancem.
Hoje a maioria dos administradores de escola no Brasil tem consciência de que seu trabalho é muito mais que só cuidar dos aspectos legais e atenter as demandas burocráticas. É necessário gerenciar a equipe de professores e funcionários (saber ouvir, articular, respeitar, formar e gerenciar equipes, etc), administrar os recursos financeiros, motivar e mobilizar a equipe e atuar como um verdadeiro líder, com planejamento, estratégia, ética e transparência. Pode ser utópico, mas para que uma escola dê certo é necessário que ela seja direcionada desta forma, mesmo sabendo que estamos longe desta realidade, é o relacionamento interpessoal que irá gerar uma escola de sucesso, pois a desmotivação do corpo docente, as deficiências na formação dos professores , a falta de envolvimento das famílias, a relação professor –aluno e relação interna das escolas ainda aparecem como um problema a ser enfrentado no dia a dia escolar. Como diria Paulo Freire (1982), é necessário formar o homem novo, a mulher nova e a educação, eles não aparecem por acaso vão nascendo na prática da reconstrução revolucionária da sociedade.
Uma das qualidades mais importantes do homem novo e da mulher nova é a certeza que tem de que não podem parar de caminhar e a certeza de que cedo o novo fica velho se não se renovar. A educação das crianças, dos jovens e dos adultos tem uma importância muito grande na formação do homem novo e da mulher nova. Ela tem que ser uma educação nova também, que estamos procurando pôr em prática de acordo com nossas possibilidades. Uma educação completamente diferente da educação colonial. Uma educação pelo trabalho, que estimule a colaboração e não a competição. Uma educação que dê valor à ajuda mútua e não ao individualismo, que desenvolva o espírito crítico e a criatividade, e não a passividade. Uma educação que se fundamente na unidade entre a prática e a teoria, entre o trabalho manual e o trabalho intelectual e que por isso incentive os educandos a pensar certo.
Uma educação que não favoreça a mentira, as ideias falsas, a indisciplina. Uma educação política, tão política quanto qualquer outra educação, mas que não tenta passar por neutra. Ao proclamar que não é neutra, que a neutralidade é impossível , afirma que a sua política é a dos interesses do nosso povo. (Paulo Freire, 1982).
Conclusão
Escola ideal é a resultante do apoio dos governantes às reivindicações dos educadores e do povo deste país. Várias foram as tentativas de uma escola ideal, e pude experimentar, durante um processo de pesquisa dos Cieps que a criança entrava pela manhã e ficava até o final da tarde. Era estimulada à criatividade, à leitura, ao esporte, cuidava da saúde e expressava os seus sonhos. O projeto não foi adiante. Essas questões já foram pensadas no passado, cabendo hoje aos educadores e ao governo refletirem e tentar rever suas histórias e buscar uma nova maneira de se pensar o ensino para que verdadeiramente possamos ter uma escola ideal que dê certo.
Um projeto de escola que dê certo, só será competente e funcional se for pensado e realizado no coletivo. É no coletivo, na integração que um conhecimento mais global e verdadeiro da escola é construído.
É através da participação que cada pessoa é respeitada enquanto individuo e enquanto integrante de um corpo maior e coletivo, que é a escola.
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