Um Olhar para dentro - Artigo publicado em setembro de 2012 no jornal Zero Hora

Por Themis Groisman Lopes | 05/01/2013 | Literatura

Um olhar para dentro

Themis Groisman Lopes*

“Nenhum homem é uma ilha” escreveu o poeta inglês John Donne. Na verdade, homem algum nasceu para viver só. O ser humano é gregário por natureza. Desde sua concepção exige a participação de duas pessoas. Durante o desenvolvimento uterino há uma estreita relação mãe-bebê. Na primeira infância, a criança necessita dos cuidados e afeto de outra(as) pessoas para desenvolver-se. No início da fase escolar é feita a socialização com a aquisição de amiguinhos, brincadeiras comunitárias e uma professora atenta e protetora. Em cada etapa de nossas vidas é necessária a presença de outrem.

No entanto, o que notamos nos dias atuais é um acentuado sentimento de solidão nas pessoas. Nos consultórios médicos a queixa principal, na gênese de vários quadros mórbidos é a solitude. As mídias noticiam um aumento significativo na adoção de gatos, além do amor manifesto em relação aos cães.

Existem pessoas que dizem preferir animais aos humanos, como ouvi numa fila de banco, um idoso que falava com convicção: prefiro meu cachorro às pessoas, pois sei que ele jamais me trairá. Outro aspecto notório é a adesão cada vez maior às redes sociais. Seria uma forma de esconder a solidão, fazendo de conta estar acompanhado. Afinal tem tantos amigos, troca tantas mensagens carinhosas, ocupa tanto de seu tempo livre. Às vezes é a única maneira encontrada para elevar sua auto-estima. Outros usam o chavão: Antes só que mal acompanhado. Isso é uma negação.

O que existe hoje é uma sociedade globalizada pelo uso cada vez maior de novas tecnologias, distanciando as pessoas do relacionamento pessoal. Ao lado disso, há uma insegurança grande em relação à violência, ao abandono das escolas, ao caos na saúde. Temos então a solidão gerada pela ausência de pai/mãe protetores. Seria o desejo de um regime patriarcal, no qual todas as necessidades são supridas. Também uma compulsão desenfreada ao consumo, onde o que vale é ter e não ser.

Até quando nos sentiremos sós? A resposta é a necessidade de uma reflexão interna e uma radical mudança de valores. Não será o homem com sua inteligência e sua capacidade de raciocinar capaz de participar efetivamente como um elemento agregador e solidário. Só um olhar para seu interior, com consciência e percepção, será capaz de promover uma mudança pessoal e coletiva.

A melhor definição de solidão que já li foi atribuída a Chico Buarque, mas segundo outras fontes, a autoria é de Fátima Irene Pinto. “Solidão é quando nos perdemos de nós mesmos e procuramos em vão, pela nossa alma”.

       *Psiquiatra