Um Grão de Areia ?

Por Elcio Thenorio | 25/05/2014 | Contos

Contando, ninguém acredita!

Foram bilhões de anos singrando o nada. Para ser exato 8,34 bilhões de anos desde quando o asteroide chocou-se contra o planeta e arrancou-lhe uma lasca que seria como a soma de uns dez Everests. Um naco imenso, massa descomunal, saiu então sem rumo pelo espaço, algo como vários milhões de toneladas pelos padrões daqui. Mas naqueles extremos sem gravidade pesava nada… Só voava.

E foi atravessando os quilômetros, os anos-luz, ganhando mais e mais energia cinética à medida em que tangenciava outros planetas, outros sóis. Até que ultrapassou o último astro: tinha já tanta inércia que logrou atingir a velocidade de escape da galáxia, arrojando-se por fim na gélida escura vastidão do vácuo intergaláctico. Silêncio, nem um som. Além dele nada, nada absolutamente naquele ermo existia que não fosse a velocidade. E o tempo foi passando…

Sendo o espaço vazio, por mais povoado que seja, não encontrou obstáculo em seu caminho e os séculos se foram em milênios, os milênios se acumularam, fizeram-se eras e para o colossal rochedo o único a mudar era a velocidade que, devido à aceleração, cresceu quando ele resvalou numa galáxia elíptica.

Só foi chocar-se muito, muitíssimo tempo depois, quando estava a 1/3 de concluir a travessia de Andrômeda. Abalroou um satélite milhares de vezes maior do que ele e aí espatifou-se. Com a explosão, uma miríade de partes menores, cada uma em um rumo, dispersou. E pelo tamanho empuxo que a velocidade lhes conferia, muitas foram as que – uma vez mais – venceram a atração de uma galáxia.

Uma veio em direção à Terra, em rota de colisão! Não era grande, mas fendia o tecido espacial a uma taxa de 900 mil quilômetros por hora, rapidez que lhe possibilitou cobrir a distância de 2 milhões de anos-luz desde Andrômeda àqui em pouco mais de 3 bilhões de anos.

Cruzou a órbita da lua de forma tão efêmera que foi como se jamais ali tivesse estado. Invadiu a atmosfera terrestre e num átimo incinerou-se. Fosse pouco maior e teria causado um cataclismo! Mas seu tamanho restrito produziu nada mais que um clarão na noite e um estrondo que ninguém ouviu. Caiu no oceano.

Afundou até o chão do mar e aí seu movimento mudou. Agora já não avançava em linha reta, mas em qualquer sentido que o sabor das correntezas lhe impusesse. Outros sete milhões de anos transcorreram entre choques e entrechoques, até que do rochedo original não restou mais do que um único grão, que naquela tarde numa onda mais forte veio dar à praia.

Eu o reconheci assim que o vi, perdido entre a indistinta massa formada pelos grãos de areia. De imediato vislumbrei sua história, vastíssima, revi-a como num filme. E fiquei pasmo! Mas isso se deu devido à mediunidade, que é algo que tenho e que é a minha sina. Foi alguém do além a me revelar a imensa saga dessa ínfima soma de átomos. Quedei longo tempo a fitá-lo, ciente de que longo tempo era ali uma expressão que não fazia qualquer sentido.

Embora seja verdade, é algo tão inacreditável que, na verdade, nem eu mesmo acredito!