Um encontro entre os princípios psicopedagógicos e a base da inovação: a psicopedagogia na Startup
Por Luana Fellix Eckert | 23/01/2019 | EducaçãoLuana Fellix Eckert[1]
Luana Cassali[2]
A psicopedagogia na área empresarial tem sido bastante promovida pelos meios acadêmicos, motivados pela emergente demanda institucional. Em nosso tempo, vem surgindo novos modelos empresariais que têm, em suas vertentes, o embasamento do trabalho cooperativo e enxuto (em breve trataremos desse termo, que tem um significado muito importante para o modelo empresarial emergente). Atender a demandas de empresas inseridas no modelo de Startups, pode ser um desafio de aprendizagem para o profissional da área psicopedagógica. O cenário destas empresas é bastante dinâmico e instável, por causa das sucessivas mudanças em prol do crescimento da empresa. Em razão disso, podem-se evidenciar certas dificuldades na comunicação, por exemplo, na solicitação e devolução de trabalhos, causando estresse e fragilidade nas relações entre o grupo. Essas empresas atualmente têm se destacado no mercado de tecnologia e inovação com ideias criativas para diferentes maneiras de ver as coisas no mundo.
Destacando a necessidade do atendimento psicopedagógico dentro de uma empresa de Startup em Porto Alegre, neste texto será relatada parte da experiência de estágio. Para isso, torna-se prioritário explicar o que é uma Startup e porque ela é modelo emergente no mercado empresarial, agregando em suas atividades a tecnologia como mudança no cenário econômico do país.
Existe um novo cenário empresarial emergente, no qual a gestão democrática atua como modelo de liderança dentro do setor de gestão. Empresas como google e facebook, que iniciaram como Startups, vêm desenvolvendo no campo do empreendedorismo um sistema baseado na gestão de feedbacks, entendendo que, no mercado, há constantes mudanças, e a Startup deve acompanhá-las. Para Ries (2012, p 19 ), estes negócios geralmente articulam-se em cenários de bastante instabilidade, sendo assim o autor destaca que: “[...] uma Startup é uma instituição humana desenhada para entregar um novo produto ou serviço sob condições de extrema incerteza.”
Segundo Hartman apud Ries (2012), uma Startup é uma companhia que valida o seu produto antes de entrar no mercado, logo diferencia-se do modelo tradicional, em que o mercado está em primeiro plano de análise e depois a ideia - o produto final. Portanto, segundo o autor, é um feedback tantoquantitativo como qualitativo nesse ciclo que promove o crescimento de uma Startup.
Caracterizada por uma instituição humana, uma Startup valoriza o esforço e o trabalho individual, buscando no ambiente de trabalho constantes feedbacks relacionais, ou seja, variadas trocas de ideias que democratizam a forma de empreender. Para que as frequentes mudanças ocorridas no mercado possam ser acompanhadas por todos dentro da instituição, e as incertezas do mercado possam ser amenizadas pela concepção máxima de que as ideias devem ser medidas, o produto deve ser construído e, com os resultados, todos aprendem e crescem juntos. Então, para favorecer o bom rendimento dentro da instituição, é necessário certa desenvoltura do gestor que, em muitos casos, são jovens na faixa etária de 26 a 30 anos[3]. Esses gestores buscam por profissionais que gostem de inovar e de aprender, os quais são, na maioria, bem remunerados e com formação adequada.
Para isso, conforme Ries (2012), essas empresas investem no tempo de trabalho na empresa, que muitas vezes pode ser homework, com demandas a serem realizadas na casa do colaborador e tempo regido por ele. Esse padrão de comportamento empresarial faz com que muitas vezes a comunicação entre os setores fique com desajustes. Surge então a necessidade de estabelecer uma boa comunicação para que as funções sejam exercidas com qualidade, promovendo o bem estar na dinâmica do trabalho. Ainda nesse sentido, a ação do psicopedagogo é de realizar sondagens e atividades extracurriculares de relevância social, com o intuito de proporcionar situações de autoconhecimento na dinâmica do trabalho que melhorem a produtividade individual, fortalecendo assim as relações na equipe de trabalho. Assim, justifica-se a necessidade de um(a) psicopedagogo(a) estar atuando nesse novo cenário empresarial, utilizando de seus conhecimentos sobre aprendizagem e desenvolvimento humano em prol do enriquecimento das relações dentro de empresas emergentes.
Ao falar sobre uma gestão democrática dentro do cenário de empresas emergentes, deve-se ter o cuidado de lembrar como acontece o papel da liderança em cada cenário empresarial. Em geral, a liderança no modelo empresarial de Startups desenvolve-se junto à sua equipe pela condição etária, como já citado anteriormente, e pelo próprio modelo de funções horizontais. Esse sistema faz com que, por vezes, as ações dos gestores sejam interpretadas como omissão, já que, nesse cenário, as diligências de trabalho estão menos impostas. Portanto, é possível considerarmos que, em alguns casos, ocorra alguma identificação entre equipe e gestores que, de certa forma, impulsiona o trabalho de ambos. Porém, fragiliza relações, uma vez que, neste modelo, não existem hierarquias institucionalizadas. Sendo assim, não fica tão claro para a equipe a quem se deve reportar ou direcionar seu trabalho diário. Nesse caso, o papel do psicopedagogo é de auxiliar o gestor a exercer sua liderança com mais clareza e ética, sem perder o foco original que é a democracia e a estética da empresa em seu design de horizontalidade. Em detrimento a isso, outra função do psicopedagogo é alinhar, junto aos gestores e equipe, as finalidades de cada setor.
Outro problema que a gestão de Startup tem enfrentado é a questão da disciplina em meio ao processo de construção e de desenvolvimento de relações. Em conseqüência do modelo de gestão já citado anteriormente, pode-se evidenciar nessas empresas situações de conflitos internos. De acordo com Ries (2012), pelas estatísticas, esse método conduz a empresa ao fracasso com muito mais frequência do que ao êxito. Segundo Dornelas, 2005 apud HARTMANN (2013, p. 6), é “no momento de gerenciar a empresa e colocar as ações em prática que surge a maior parte dos problemas”. Assim, ainda conforme o autor, é necessário que o gestor reconheça suas limitações, recrutando uma boa equipe de profissionais para gerenciar cada setor e para minimizar os problemas através da identificação das prioridades da empresa. Dessa forma, mais uma vez, faz-se importante a ação psicopedagógica na empresa para fundamentar o trabalho das relações interpessoais, buscando através de sondagens, de observações e de intervenções na equipe, as soluções necessárias. Para Berlim et al (2006), empreendedorismo é uma prática social e também um projeto de vida, uma vez que busca a transformação de vidas com novas ideias para desenvolver novas maneiras de fazer as coisas. As mesmas autoras citadas acima ainda evidenciam o fenômeno empreendedorismo como um movimento de:
[...] perceber uma oportunidade quando os outros enxergam o caos. Tão simples e, ao mesmo tempo, tão complexo! O diferencial está no simples fato de que, a partir das habilidades e competências geradas pela atitude empreendedora, podemos oportunizar formas alternativas para atender às necessidades emergentes, ou ainda, poder antecipar situações a partir da análise crítica do cotidiano e suas vicissitudes, operando na transformação do espaço social. (BERLIM et al, 2006, p 1)
Como Psicopedagogos institucionais é de suma importância desenvolver a capacidade de escuta e de se envolver com todos da equipe de forma sensível, buscando conhecer como aprendem e como utilizam seus talentos dentro do seu espaço de trabalho. Em meio ao estágio desenvolvido, pode-se perceber que, em meio ao “caos” do cotidiano de uma Startup, por vezes passam despercebidas as características individuais. Isso acontece porque não estamos acostumados a refletir sobre como nos constituímos, ainda mais em espaços empresariais, em que muitas vezes esse processo não tem muita significância. Porém, ao perceberem uma demanda de formalização na organização do referido grupo de trabalho, foram trabalhadas individualmente as habilidades e as competências pela via epistemológica, em que a subjetividade é exercida no do olhar do outro. Assim, a intencionalidade psicopedagógica foi de promover a autoanálise para garantir a caracterização do grupo consolidado na ciência de suas funções.
Há de salientar que, no cenário de empresas emergentes, a comunicação pode sofrer gaps, até mesmo interrupções, gerando desconforto na equipe de trabalho. Se a comunicação entre todos os setores da empresa não for efetiva, o resultado do trabalho pode se tornar insatisfatório. É neste momento que o psicopedagogo(a) trabalha para desenvolver, junto à equipe, ferramentas de comunicação entre pares, desenvolvendo a empatia entre as partes e fortalecendo os vínculos dos colaboradores para que o resultado seja de excelência. Nesse sentido, pode-se promover espaços de escuta na instituição, buscando, no exercício da fala, maneiras de resolver conflitos. Em situações como essas que os colaboradores da dinâmica expressaram que o trabalho psicopedagógico serviu-lhe como espelho: que antes estava embaçado, mas que agora tornou-se possível de enxergar quem realmente era. Essa é a essência da psicopedagogia como um todo, enxergar o potencial individual de cada ser que com ela esbarrar, auxiliando-o a exercer a capacidade de autorreflexão para que saiba o quão importante é no seu mundo, para as pessoas que convive e para o outro que lhe completa.
Cabe a cada profissional conhecer sobre seu espaço atuante, neste caso, sobre o funcionamento de uma Startup, buscar, junto à equipe de gestores, a compreensão das necessidades dessa liderança. Assim, com humildade e sabedoria, entender o funcionamento e as funções da equipe, que está todos os dias dando seu melhor para a empresa; construir caminhos que promovam a superação dos dilemas enfrentados e o desenvolvimento intra e interpessoal daqueles que empenham seus esforços para contribuir com a inovação econômica em nosso país.
Finaliza-se esse artigo com a seguinte preposição, onde inicia a ação psicopedagógica na empresa emergente, ou como é possível que o psicopedagogo atue nesses espaços? Questionamentos assim são importantes para a propagação do assunto. Portanto, conhecer modelos de negócios como o de Startups é essencial para que a relevância desse trabalho alcance outras áreas de atuação, uma vez que o atendimento psicopedagógico em instituições engajadas neste modelo tem grande potencial e há poucos psicopedagogos(as) envolvidos nesse nicho. Logo, para que o trabalho psicopedagógico institucional seja efetivo, faz-se necessária a investigação e a compreesão do fenômeno observado: a empresa emergente.
REFERÊNCIAS
BERLIM, Clara Geni et al. Princípios e práticas do empreendedorismo: um novo paradigma em educação e em psicopedagogia. Revista Psicopedagia. Vol. 23, nº 70. São Paulo, 2006. Disponível em: <http://www.i-deaconsultoria.net.br>. Acesso em: 15 de março de 2018.
RIES, Erick. A Startaup enxuta: como empreendedores atuais utilizam a Inovação contínua para criar empresas extremamente bem sucedidas. São Paulo, 2012.
HARTMAN, Victor Hugo Pereira. Startup: uma nova forma de empreender. Trabalho de graduação (Graduação em Administração). Centro Universitário de Brasília. Faculdade de Tecnologia e CiênciasSocias Aplicadas – FATECS. Brasília, 2013
[1] Graduada em Pedagogia pela PUCRS, professora alfabetizadora e estudante em Psicopedagogia pela IERGS.
[2]Graduada em Design de Produto pelo UniRitter, Teacher na Educação Infantil e Séries Iniciais Graduanda em Psicopedagogia Clínica e Institucional pela IERGS.
[3] Pesquisa feita pelo Blog i.DEA, retirada do site em 15/03/2018.