Um Contra-senso De Saias

Por Conselheiro Acácio | 10/03/2008 | Crônicas

Post antigo escrito pro Povo dos vinte alguns meses atrás em uma rodada de discussão sobre a flexibilidade das mulheres.

Estava meio na dúvida de como começar sobre o tema proposto, e acabei lembrando de um texto que li hoje cedo em uma coletânea de crônicas do Veríssimo que peguei emprestado esses dias, e assim resolvi seguir o ritmo e também pegar emprestado o início genial do texto.

Dizia o Veríssimo: “Quando estivermos com dificuldade para começar uma crônica, devemos apelar para um velho provérbio Chinês. Quando não tivermos um velho provérbio Chinês para começar uma crônica, devemos inventar um”.

Pois lá vai um que não fui eu que inventei mas achei bem interessante e acredito ser exatamente o que eu procurava para começar: “Não se deve ser forte. Há de se ser flexível”. Assim penso no que de fato representa o novo perfil das mulheres modernas, quantas novas e velhas contradições ainda as acompanham, mas no final a única coisa que me vem a cabeça é por que algumas mulheres insistem em achar válido ser como os homens em alguns aspectos. Não me entendam mal, não afirmo isso por achar que uma mulher não tenha o direito de se comportar de forma similar a um homem, mas sinceramente por que elas iam querer isso? Não entendo bem. No meu ambiente de trabalho vejo algumas coisas bem peculiares, por exemplo quase toda semana vejo alguns caras mais velhos e mal casados reclamando que a mulher não entende o que é trabalhar igual um corno todo dia, receber ligação toda madrugada, não ter tempo de ficar com os filhos ou com ela e etc. Lembro uma vez de uma conversa que ouvi no café de uma empresa que eu visitava, um cara falava pro outro “Queria ver ela segurar uma semana aqui no meu lugar”. Estava acabando de pegar o café e enquanto ia fumar um cigarro na sequência fiquei pensando nas mentiras e histórias que a gente conta pra si só pra justificar algum comportamento que sabemos ser censurável. Verdade que qualquer pessoa não condicionada a uma vida estressante provavelmente iria surtar com uma semana de vida em ritmo grotescamente mais acelerado que o normal. Mas isso por um acaso o torna válido ou recomendável?

Acho salutar e natural ter mulheres em cargos de chefia ou de maior influência. Mas acho censurável que muitas sigam a receita que para tal deva se ter um comportamento mais parecido com o masculino, ainda mais quando no pacote são incluídas algumas falhas de caráter muito peculiares aos homens.

Nada pior do que um chefe muito agressivo, ditatorial ou intransigente, e na minha humilde opinião isso fica ainda mais feio na figura feminina, pois destoa do esperado e acaba causando mais reações negativas do que com os homens. Não que deveria ser assim, mas simplesmente é assim.

Lembro de uma executiva que conheci alguns meses atrás. Fui visitar um cliente para uma reunião de fornecedores, onde são reunidos alguns representantes de todos os provedores de serviço para uma reunião periódica na sede do cliente. Estava eu sentado lá em uma mesa de reunião gigantesca e lotada, olhando o projetor e preocupado com os meus slides e me acostumando ao desconforto de ter que estar usando terno para completar a fantasia de sério, ao lado de mais uma turba de gente dentro das suas respectivas fantasias.

Cada um com seus crachás e broches com a logomarcas das suas respectivas empresas pendurados em alguma parte da roupa, brigando para passar uma imagem de mais ocupado e estressado do que o outro, mais da metade falando no celular enquanto batucava alguma coisa no notebook esperando a reunião que não começava. Confesso que me divirto em observar essas peculiaridades ridículas do mundo corporativo.

Pois bem, ao contrário das reuniões anteriores o executivo do cliente que iria presidir a reunião era uma mulher. Apesar de não ser comum, também não era tão incomum e no final das contas não fazia nenhuma diferença, pensei.

Grande erro, fez uma grande diferença, e muito positiva. Após as apresentações de cada empresa, estávamos começando o tradicional debate das idéias propostas naquele tranquilo clima de tribunal do santo ofício.

Ao início das rotineiras trocas de acusações entre os participantes a nova executiva com poucas e delicadas intervenções desfez o clima competitivo de forma suave e natural, como uma mãe que chamava a atenção dos filhos. Dura, mas ainda assim carinhosa. Da forma que somente uma mulher poderia fazer. Pra ser ainda mais piegas, reconheço que no final da reunião saímos todos nos cumprimentando e sorrindo mais do que de costume, mesmo que minutos depois tudo voltasse ao normal.

Após esse episódio fiquei pensando em todas as vantagens naturais ao próprio gênero que algumas mulheres ignoram para serem mais parecidas com os homens, quando poderiam simplesmente trazer suas diferenças para uma abordagem diferente e mais interessante do tradicional.

O contra-senso disso tudo é que mesmo vivendo em tempos em que os direitos iguais entre homens e mulheres já foi garantido a pelo menos uma geração, ainda é mais difícil para uma mulher ocupar um cargo nos altos escalões e ter salários e benefícios compatíveis com os homens. De fato a vida é dura, não se pode negar. Mas deve-se pensar também a que preço alguns homens conseguem ter essas vantagens? Sacrificando partes consideráveis de suas vidas particulares que muitas mulheres dificilmente abririam mão, e que de fato não devem abrir mão, pelo menos não somente em troca de dinheiro e um plano de carreira.

À parte do papo pseudo-zen-executivo e seus derivados, acredito que o meio termo seja muito mais saudável do que os extremos tanto aos homens quanto para as mulheres, e isso as já mulheres encaram com muito mais naturalidade do que nós homens, e a muito mais tempo. Essa flexibilidade soa mais normal com elas.

Hoje mais do que nunca, não somente as mulheres avaliam opções por uma vida menos estressante, os homens também buscam essas mesmas alternativas, até por que em uma realidade onde os dois sexos ocupam quase os mesmos postos de trabalho não é surpreendente que tenham dificuldades e desejos em comum.

Nós só estamos buscando o que a maioria das mulheres já vem praticando muito antes de nós. Como se equilibrar entre a vida profissional e a particular sem desfavorecer demais um lado, reconhecendo que fatalmente o lado que pesar mais tende a prejudicar o outro.