Um conto de fadas Contemporâneo

Por Viviane de Sousa Furtado | 05/05/2011 | Contos

Ele a ouve chorar noite após noite de mãos atadas. Nada pode fazer. O que ele poderia fazer. Estranho pensar como ele a conheceu. Ela mora no segundo andar e ele no primeiro. Ela mora no apartamento imediatamente acima do apartamento dele. E ele já a ouvia chorar muito tempo antes de conhecê-la. Mas até então as lágrimas da moça não o incomodavam. Mulheres costumam chorar mesmo. E ele nada tinha a ver com a vida dela. Até que um belo dia, voltando do trabalho ele pegou o mesmo ônibus que ela. O ônibus não estava lotado. Mas todos os lugares estavam ocupados e ele era o único de pé quando viu essa moça frágil e bonita, com seu rosto macio muito molhado de lágrimas. A moça estava sentada no banco mais alto do ônibus, todos podiam vê-la chorando, chorava copiosamente, mergulhada numa tristeza tão profunda que ele sentiu vergonha. Vergonha porque não se deve chorar em público. Vergonha porque ninguém fazia nada, ninguém parecia mesmo se importar. Vergonha porque ele também não faria nada. Essa é a nossa geração, ninguém quer se comprometer com ninguém, ninguém quer perguntar nada, nem ele. Ele foi assim obrigado a assistir calado, a tristeza da moça durante todo o percurso e ela parecia tão sozinha. Como se houvesse um abismo muito grande entre ela e toda a humanidade. Um abismo tão grande que nem ele poderia atravessar, e ela parecia disposta a encher esse abismo com lágrimas. Chegou o ponto em que ele deveria descer. Ele percebeu que ambos desceriam no mesmo lugar e decidiu andar um pouco mais devagar do que a moça chorosa. Qual foi sua admiração quando percebeu que ela morava no mesmo prédio que ele. E então um laço invisível se criou entre eles assim que ele notou que ela era a moça que chorava no andar de cima. Agora ele não conseguia mais ser indiferente as lágrimas dela. Aquelas lágrimas agora tinham um corpo para sofrer e um rosto para entristecer. Todas as noites ele a ouvia chorar como um animalzinho indefeso e nada fazia. Nada. Ele começou a ter medo de que ela fizesse uma besteira qualquer. Teve medo de perdê-la antes de conhecê-la.
Tomou coragem nessa noite e subiu as escadas. Bateu na porta e esperou. Aquele pequeno corpo apareceu diante dele quando a porta se abriu. Quando ele a viu no ônibus ela estava usando roupas sociais, mas agora a menina que abriu a porta usava apenas uma camiseta comprida e meias. Olhou para ele com a maquiagem toda borrada e espalhada pelo rosto. Ele sentiu uma ternura tão profunda que foi difícil não abraçá-la.
Ela o olhou e ele sentiu toda a dor que ela queria transmitir e teve vontade de pega-la em seus braços:
_Em que posso ajudar?
_Eu é que pergunto, como eu posso te ajudar? Você chora tanto. Eu quero... Quero te salvar da sua maldita dor.
Diante dessa resposta tão honesta dita de um jeito tão direto ela deixou-se afundar um pouco mais em seu pranto e se atirou nos braços dele. Ele a recebeu com ternura. Ele a pegou no colo e conduziu para dentro. Deitou a menina na cama e fez o que podia para fazer a dor acabar. Ele a aqueceu com seu corpo. Aqueceu o frio da alma dela com seu corpo quente. Com sexo. Com amor. Com ardor. Ela não recusou o corpo que a penetrava.
Quando ele terminou, ela se aninhou nele. Ele sentiu que ela pertencia a ele e que ele cuidaria dela para todo o sempre e sempre.