TUTELA COLETIVA NO CDC
Por Thaís Abdalla Bastos | 27/10/2015 | DireitoTUTELA COLETIVA NO CDC: Panorama Acerca da Ação Civil Pública na proteção dos direitos ou interesses difusos em relação à propaganda enganosa. ¹
Luane Índia do Brasil
Thaís Abdalla Bastos²
Roberto Almeida³
Sumário: Introdução; 1. Natureza Jurídica da Tutela Coletiva no CDC e os Direitos Transindividuais; 2. A Ação Civil Pública na proteção dos direitos difusos e coletivos; 3. Direito Difuso do consumidor em relação à propaganda enganosa e possibilidade de Ação Civil Pública; Conclusão; Referências.
RESUMO
O presente artigo versa sobre a tutela coletiva no CDC e seu panorama na Ação Civil Pública como meio de proteger o direito e interesses dos direitos difusos e coletivos. Assim, num primeiro momento abordar-se-á natureza jurídica da Tutela Coletiva no CDC, apontando sua operacionalidade e instrumentação e como este é aplicado no ordenamento jurídico brasileiro. Logo após, far-se-á uma análise da Ação Civil Pública na proteção dos direitos difusos e coletivos elucidando a presença do litisconsórcio presente nesta ação. Por fim, pretende analisar o TAC- Termo de Ajustamento de Conduta
PALAVRAS-CHAVE
Ação Civil Pública; Tutela Coletiva; Termo de Ajustamento de Conduta
INTRODUÇÃO
Neste estudo sobre a tutela coletiva no CDC, demonstrar-se-á a natureza Jurídica da Tutela Coletiva no CDC, depois serão abordado todos os pressupostos da ação civil pública que visa proteger os interesses difusos e coletivos, demonstrando os pressupostos processuais coletivos. No primeiro capítulo será feita uma análise da Natureza Jurídica da Tutela Coletiva no CDC, identificando sua operacionalidade e instrumentalidade. Parte-se elucidando a existência de interesses metaindividuais alçados na Constituição Federal de natureza indivisível sendo o titular um grupo categoria ou classe de pessoas ligadas entre si por uma relação jurídica de base. No segundo capítulo será demonstrado que a Ação Civil Coletiva, possui legislação especifica, sendo a via processual utilizada para impedir ou reprimir danos ao consumidor e a outros bens tutelados, a fim de solucionar conflitos coletivos, possuindo o legitimidade ativa a vários órgãos, pessoas, entidades ou associações.
Já no terceiro capítulo serão analisados os princípios norteadores do direito processual coletivo, examinando naquilo que se diferenciam dos princípios que sinalizam o direito processual individual.
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1. Natureza Jurídica da Tutela Coletiva no CDC e os Direitos Transindividuais:
Com o advento de novas relações de consumo e surgimento de novas formas de produção geradas a partir dos sistemas mecanizados e em série, desenvolveu-se um grande desequilíbrio nas relações de consumo, passando o consumidor a ocupar a posição de vulnerabilidade e hipossuficiência. Para a autora Alessandra Hendler, nesse contexto, houve uma preocupação por parte do Direito em criar novas leis que preservassem a esfera jurídica do consumidor, sendo assim reformulado, passou a responsabilizar civilmente os fornecedores e a liberdade de fixação contratual, entre outros instrumentos como as ações processuais para tutelar de forma eficaz os direitos do consumidor.
Em grande medida, as dificuldades encontradas do legislador concernente às ações de defesa do consumidor decorrem do fato que o Código de Processo Civil não há tratamento sistemático da tutela coletiva; preferiu o legislador processual centrar-se então, nos conflitos intersubjetivos. Alguns operadores do Direito têm dificuldades em compreender qual meio processual será aplicado ao caso concreto, bem como se tratar ou de espécie coletiva ou individual dentro dos interesses das relações de consumo e a adequada aplicação do CDC. A dúvida consiste em saber se tratar de uma ação coletiva, “judicialização dos interesses metaindividuais portado em juízo por um adequado representante” ou uma ação individual, onde os sujeitos concernentes, singurlamente ou litisconsorciados, sustentam em nome próprio os seus interesses. Tal relevância se dá nesse aspecto para a correta apresentação em juízo da ação cabível, a serem preenchidos os requisitos básicos para tal. Bem como também conceitua o autor Rodolfo Mancuso:
“a indeterminação de sujeitos, a indivisibilidade do objeto, e ainda a formulação de uma pretensão propícia a uma tutela judicial de eficácia expandida, a qual irá se projetar em alguma faixa ou em algum grau do universo coletivo, assim podendo alcançar um contingente realmente expressivo de sujeitos, ou uma dada coletividade, senão já a inteira sociedade, conforme as peculiaridades do caso concreto”. (MANCUSO, 2007, pag. 02).
De tal modo, as ações coletivas são “recentes” na legislação brasileira, sendo inaugurada pela Lei de Ação Civil Pública em 1985, nº 7347/85 em que começa a se afastar da visão individualista do processo e passa a tutelar também interesse coletivo, bem como seu artigo 81 do CDC:
“A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá ser exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo”.
Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar de:
I- interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste Código, os trans-individuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato;
II- interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste Código, os trans-individuais, de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base;
III- interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum.”
Tal Lei ampliou as hipóteses de cabimento da demanda visando a tutela de direitos difusos e coletivos, podendo tal ação ser utilizada não somente para a proteção do patrimônio público, mas também a proteção do meio ambiente, dos consumidores, bens e direito de valores artísticos, entre outros, como qualquer interesse difuso ou coletivo, bem como menciona o artigo 1º da referida Lei. Logo após isso, com o advento do Código de Defesa do Consumidor, houve uma ampliação na Legislação da Ação Civil Pública, bem como aponta o autor Humberto Dalla.
Os direitos ou interesses difusos estão conceituados no artigo 81, I do Código de Defesa do Consumidor, como sendo “os transidividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato”. Com isso, em relação à indeterminação dos sujeitos, os interesses difusos dizem respeito a um indeterminado grupo ainda que seus titulares não possam ser identificados precisamente, bem como ensina Mancuso. Nesse diapasão, no que cerne a indivisibilidade do objeto, a satisfação dos interesses difusos a um indivíduo implica necessariamente na satisfação de outros, enquanto que a lesão também atingirá toda a coletividade. “O caráter da indivisibilidade desse interesses também decorre do fato de que também não existe a possibilidade de se afirma com precisão quanto do direito pertence a cada um dos integrantes do grupo indeterminado, que é o seu titular”, como continua o autor.
Outra característica dos direitos difusos é a “intensa litigiosidade interna”, como menciona Rodolfo Mancuso, “os interesses difusos são soltos, fluidos, desagregados, disseminados entre seguimentos sociais mais ou menos extensos, não têm um vínculo jurídico básico, mas exsurgem de aglutinações contingenciais, normalmente contrapostas entre si”. Tal característica diferenciadora desses interesses difusos encontra-se na transição ou mutação no tempo e no espaço, visto que os mesmos surgem e também desaparece muita das vezes de situações repentinas e imprevisíveis.
Os direitos coletivos em sentido estrito são elucidados no artigo 81, p.u., II no CDC, como: “os transindividuais de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base”. Assim os interesses coletivos em sentido estrito é aquele cujo sujeito está ligado por uma relação jurídica base, e não por circunstâncias fáticas, como ocorre no interesse difuso.
No que tange os direitos individuais homogêneos, incluído no CDD no artigo 81, p. u., III, a possibilidade de tutela coletiva desses direitos, definidos como direitos que possuem origem comum, nos ensinamentos de Fernandes e Guimarães:
“O tratamento legislativo consagrador dos direitos individuais e homogêneos tem em si uma função estritamente teleológica, qual seja, a de propiciar uma maior efetividade no acesso à justiça, tendo em vista a ineficácia dos meios até pouco tempo atrás existentes no processo civil brasileiro”.
Assim, temos os direitos individuais homogêneos classificados por terem por base a mesma circunstância fática, sendo os seus titulares determinados ou determináveis, distinguindo-se dos interesses difusos por terem por base a mesma circunstância fática, todavia os seus titulares indetermináveis. Em relação à sua natureza jurídica, Mancuso afirma que os direitos individuais homogêneos não são coletivos em sua essência, nem no modo como são exercidos, mas apresentam certa uniformidade, pela circunstância que seus titulares encontram-se em certas situações, que lhes confere coesão suficiente para destacá-los da massa de indivíduos isoladamente considerados. Nessa mesma vertente, Pedro Dinamarco:
“eles são verdadeiros interesses individuais, mas circusntacialmente tratados de forma coletiva. (...). São conseqüências da moderna sociedade de massa, em que a concentração de pessoas em grandes centros e a produção em série abrem espaço para que muitas pessoas sejam prejudicadas por um mesmo fato”. (DINAMARCO, 2001, pag. 60).
Por fim, entende-se o direito individual homogêneo como um direito subjetivo individual e complexo, individual por dizer respeito às necessidades, anseios de uma única pessoa; e ao mesmo tempo complexo porque suas necessidades são as mesmas de todo um grupo de pessoas, fazendo nascer, destarte a relevância social da questão, bem como entende Humberto Dalla.
2. A Ação Civil Pública na proteção dos direitos difusos e coletivos;
A Ação Civil Pública é utilizada como um instrumento necessário para a mobilização social, sendo a via processual mais adequada para exercer a cidadania. Surgiu como ferramenta de proteção ao direito do consumidor e meio ambiente, tutelando e impedindo que o pólo vulnerável da lide, os consumidores, sofra com os danos causados pela parte mais forte, os fornecedores. Esse meio processual que tem como base a Tutela Coletiva serve para impedir ou reprimir um dano que venha a ser causado, protegendo “tanto os interesses difusos como coletivos e os individuais homogêneos de interesse social.” (255)
O Código da Defesa do Consumidor em seu artigo 81, cujo conteúdo dos parágrafo único, I e II, refere-se que: “os interesses ou direitos difusos (...), os transindividuais de natureza indivisível de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstancias de fato”. Já os “interesses ou direitos coletivos (...), os transindividuais de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com parte contraria por uma relação jurídica de base”
Quanto à classificação dos direitos difusos e coletivos e os individuais e homogêneos de interesse social, tem-se que João Batista de Almeida, mestre em Direito Público, defende a seguinte posição:
“A diferença entre interesses difusos e coletivos reside, pois, basicamente, na titularidade, conforme sejam pessoas indeterminadas ou pessoas integrantes do grupo, categoria ou classe. Não se presta como se vê a amparar direitos individuais puros, cujos titulares deverão valer-se do procedimento comum, ordinário ou sumário. Da mesma forma, não pode ser usada para obter a reparação de prejuízos causados por particulares, isoladamente, já que o âmbito de ação civil pública só pode ser tutela dos bens enumerados na lei, sejam eles difusos, coletivos ou individuais homogêneos de caráter social. (ALMEIDA, 2008, p.255-256)
A Lei nº 7.347 de 1985, considerada a Lei da Ação Civil Pública, surgiu para tutelar interesse de relação com o meio ambiente e ao consumidor, sendo uma lei que tutela matéria restrita a esses dois. É importante ressaltar que com a Constituição Federal de 1988, os direitos transindividuais passaram a ter proteção coletiva. Somado a isso, o Código de Defesa do Consumidor criado em 1990, veio potencializar as tutelas coletivas, trazendo em seus artigos “microssistemas de processos coletivos” e “criou a categoria de interesses ou direitos individuais homogêneos” (302)
Os legitimados para a propositura da Ação de proteção coletiva estão elencados no art. 5 da lei 7.347/85, são: O Ministério Público, a União, os Estados e o Distrito Federal e os Municípios, suas autarquias, empresas públicas, fundações, sociedades de economia mista, a Defensoria Pública, associações civis constituídas há mais de um ano. O ministério público tem como função advinda da própria Constituição Federal, art. 129, III: “promover o inquérito civil e ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos.” A Medida provisória número 550, de 8 de julho de 1994 que fora convertida na lei 9.870 de 23/11/1999, trouxe para o rol dos legitimados para a proposituras ligadas a ações previstas no CDC, as associações de alunos, de pais de alunos. Somado a isso, vale ressaltar que a OAB e os sindicatos na medida em que tiverem interesses das categorias poderão ingressas com esta ação estudada.
O foro competente segundo os arts. 2 e 4, é o local onde ocorreu o dano. Quando a matéria for de interesse da União, das autarquias e empresas públicas, a ação será na Justiça Federal no foro do Estado ou do Distrito Federal. Nota-se que, conforme é posto no o art. 109, I da CF, o Ministério Público Federal não esta incluso no rol de entidades onde a competência para a propositura da ação na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes é na Justiça Federal. Contudo, João Batista nos mostra que em decorrência da simetria existente entre o poder judiciário da União com o Ministério Público Federal é reconhecido que a competência de proposituras das ações do Ministério Público Federal é da Justiça Federal:
É certo que a Constituição não estabelece expressamente o foro para as ações promovidas pelo Ministério Público Federal. Fê-los apenas para a União, as entidades autárquicas e as empresas públicas federais( CF,art. 109, I, 1e2). Todavia, em decorrência da simetria do Poder Judiciário da União com o Ministério Publico da União(CF, 101 a 110,c/c 128), da atuação do Ministério Público Federal perante o Poder Judiciário (art.127) e das funções institucionais que lhe foram atribuídas( art.129), é inegável que o Parquet federal, na condição de órgão da União, utilize-se do mesmo foro. (p.258)
Vimos que é viável o litisconsórcio nas ações civis públicas, entretanto, sabe-se que não é essencial. Todos os litisconsortes estão em posição de igualdade não existindo exclusividade na matéria que será litigada. Vale ressaltar, que pessoas físicas não podem ser litisconsortes, “pela singular razão de ao estar incluída entre os legitimados do art.5 da lei n 7347/85” (ALMEIDA, 208, p.263). Na tutela coletiva o litisconsórcio é ativo e facultativo. Os órgãos públicos atuam para defender o interesse publico. Já as entidades privadas são responsáveis pela sociedade civil, faz-se necessário a existência de pertinência temática e que a entidade exista a mais de um ano para o ingresso da legitimação concorrente na ação civil pública (ALMEIDA, 2008). O Ministério Público pode litisconsorciar com os demais legitimados sem restrição, isso se dá pelo fato de suas atribuições que são expressas em nossa Constituição e definem que ele é o órgão responsável pela defesa do interesse público.
3. Direito Difuso do consumidor em relação à propaganda enganosa e possibilidade de Ação Civil Pública:
Com conceito determinado pelo inciso I do artigo 81 do CDC, os interesses ou direitos difusos, para todos os efeitos, são dotados de transindividualidade, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato. De tal modo, ainda tem como característica básica, a indeterminação de sujeitos, a indivisibilidade do objeto, intensa conflituosidade e a sua duração efêmera, como já elucidado anteriormente.
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[1]Paper apresentado á disciplina de Direito do Consumidor ministrada pelo professor Roberto Almeida.
2Acadêmicas do Curso de Direito da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco - UNDB
³Professor, orientador.