Tudo sobre Almodóvar
Por Alba Regina da Silva Azevedo | 19/09/2012 | ArteAPRESENTAÇÃO
O presente trabalho visa fazer uma análise do cinema de Pedro Almodóvar, considerado atualmente o maior cineasta da Espanha e um dos maiores da história do cinema.
A análise partirá de um breve histórico de sua trajetória, incluindo uma biografia e falando sobre as características que lhe são mais comuns. Por se tratar de Almodóvar, não podemos deixar de falar sobre as estéticas, as teorias e os conceitos aplicados em seus filmes.
Será feita também uma breve análise de algumas de suas mais importantes realizações, contemplando a sinopse de cada um e as características mais relevantes.
PEDRO ALMODÓVAR CABALLERO
Almodóvar é, hoje, o cineasta europeu de maior renome mundial. Seu estilo marcante e inconfundível, repleto de filmes onde a presença feminina é sempre ponto principal; suas cores típicas; seus dramalhões; suas comédias e a política espanhola sempre presente em seus roteiros fazem dele também um dos maiores diretores do planeta e da história do cinema.
Pedro Almodóvar Caballero nasceu em 1951 na pequena cidade espanhola de Calzada de Calatrava, em La Mancha. Em 1968, aos 17 anos, mudou-se sozinho para Madri, em pleno governo do General Franco. Queria estudar e fazer filmes, porém, foi impossível entrar na Escola Oficial de Cinema, já que o governo tinha decretado seu fechamento recentemente. Assim, resolveu aprender na prática. Nessa época, mesmo com a ditadura, Madri era para os jovens a capital da cultura e da liberdade. Antes de alcançar seu objetivo, Almodóvar acumulou vários ofícios: foi funcionário de uma companhia telefônica, por doze anos; cartunista; ator de teatro de vanguarda e cantor de uma banda de rock, da qual participava travestido.
Fez vários curtas metragens em Super-8 e algumas filmagens em 16mm. Escreveu para várias revistas alternativas, até conseguir realizar, em 1980, seu primeiro longa: Pepi, Luci e Bom y otras chicas del montón. Em sua estréia Almodóvar já mostrava a densidade de seus roteiros. Pepi, Luci e Bom, que não foi lançado no Brasil, conta a história de três mulheres que têm suas vidas entrelaçadas, quando o marido policial de Luci estupra Pepi, vivida por Carmem Maura, que se tornaria presente em várias obras do diretor. Pepi tem uma plantação de maconha em sua casa e Luci, sado-masoquista, se envolve sexualmente em uma relação lésbica com Bom. Tudo isso se passa na era punk de Madri.
Muitos de seus filmes são autobiográficos. Toda a sua experiência de vida tornou-se fonte de inspiração para suas obras. Almodóvar é frequentemente comparado ao cineasta também espanhol Luis Buñuel, devido a semelhança de seus trabalhos.
O PÓS-MODERNISMO
Assim como as demais estéticas, o Pós-Modernismo surgiu como uma negação ao estilo anterior. Apresenta diferenças fundamentais em relação a todas as estéticas que vieram antes dela, até mesmo à modernista, que defendia o novo, a vanguarda, a ruptura total. Para os pós-modernos não era preciso inovar nem ser original.
O Pós-Modernismo prega o fim da proibição e a tolerância de toda e qualquer forma de arte. Qualquer produto cabe ao mercado, e toda produção é considerada comercial. A estética pode ser observada na música na dança no teatro e no cinema. Na música, assume formas diversas: a experiência do silêncio, palmas descompassadas, repetições de frase tocadas em uníssono, tecnopop, vozes humanas ou sons eruditos misturados ao eletrônico. A dança passa a mostrar o grotesco, os bailarinos assumem formas não convencionais e podem passar horas jogando bolas uns para os outros ou andando de um lado para o outro do palco fazendo gestos banais. No teatro, as peças contam com a participação do público e podem não ter texto ou enredo, mas, simplesmente, corpos imitando fenômenos biológicos.
Já no cinema, o Pós-modernismo caracteriza-se, principalmente, pela mistura de estilos e pelo pastiche. A nostalgia dos anos 20 ou 30 pode ser acoplada à ficção científica ou podemos junta-la ao policial e ainda ao histórico, como em Blade Runner, um dos pós-modernistas mais citados. O individualismo também é enaltecido, como em Quem Puder, de Godard, e Paris Texas, de Wim Wenders, que passeia pelo “deserto” atual.
O PÓS-MODERNISMO EM ALMODÓVAR
Muitas características pós-modernistas podem ser observadas no cinema almodovariano. O diretor faz uso de funções normativas e teorizadas, como a metalinguagem, com o propósito de chegar a uma função especifica do seu estilo: a emotiva. As emoções e os sentimentos passados pelo emissor no momento da transmissão de sua mensagem são enfatizados sempre. Os filmes de Almodóvar se fazem por um percurso estético moderno, através de uma função poética, ao mesmo tempo que utiliza funções pós-modernas como a metalinguagem.
Para os personagens de Almodóvar, assim como na estética pós-moderna, tudo é permitido, nada é considerado um absurdo. Não há culpados, nem há espaço para a pena. A tolerância é apresentada na forma do perdão. Não é de se estranhar que em Tudo Sobre Minha Mãe, por exemplo, Lola, a travesti responsável por quase todas as desgraças do enredo, ao final coloque um bebê no colo, ou que Benigno, autor de um ato cruel e criminoso em Fale com Ela veja num aborto a sua forma de reviver.
TEMÁTICAS E LINGUAGEM
Um dos traços mais característicos do estilo de Almodóvar está na composição de suas obras valendo-se de vários gêneros e modelos, que vão do próprio cinema, da música, do desenho, da pintura, da literatura, da telenovela à propaganda. As metáforas, metonímia e, principalmente, a metalinguagem, são identificáveis em sua obra. Esse trânsito ocorre de, pelo menos, duas formas. Na primeira, filmes da tradição cinematográfica internacional surgem nas películas do cineasta espanhol. Esse é o caso de Matador (1986), quando os protagonistas se encontram pela primeira vez num cinema onde se projetava Duel in the sun (1945), de King Vidor. Em Todo sobre mi madre (1999), esse procedimento do filme dentro do filme é acentuado e estendido ao limite, pois toda a película faz diretas referências a All about Eve (1949), de Joseph L. Mankiewicz. Na segunda forma de trânsito, Almodóvar desvenda o próprio processo de realização de um filme, como podemos acompanhar em ¿Qué He Hecho Yo Para Merecer Esto? , que, além de se aproximar estilisticamente de Hitchcock, apresenta, nas primeiras cenas, uma praça com câmeras, onde se está rodando um filme. Mujeres al borde de um ataque de nervios , retrata o trabalho de dublagem – Ivan dubla a voz masculina do autor Sterling Hayden, em Johnny Guitar, de Nicholas Ray – e aulas de filmagem. Essa prática narrativa se estende, ainda, para Hable con Ella, seja no delicado evocar do cinema mudo, seja na reprodução da própria sessão de cinema, ou no personagem masculino que chora copiosamente, já que, como ressaltou Almodóvar, ele sempre desejou ver John Wayne chorar; e, também, para La Mala Educación, que apresenta uma intricada trama de filme dentro de outro filme. Assim como o cinema, a literatura e, principalmente, o ofício do escritor, compõe as películas de Almodóvar. Se em La flor de mi secreto (1995), Almodóvar coloca o tema da literatura com suas penúrias e sofrimentos no personagem Leo, em Todo sobre mi madre o ofício do escritor surge na figura e nos dilemas de Esteban.
A televisão, a publicidade, os noticiários, os reality-shows estão também presentes no cinema de Almodóvar. Em Pepi, Luci, Bom y otras chicas del montón, Almodóvar nos apresenta um anúncio de calcinhas capazes de permitir às mulheres todos os tipos atividades como, por exemplo, soltar gases em plena noite romântica, já que as calcinhas os transformarão num aromático perfume. Em Mujeres al borde de un ataque de nervios, a propaganda é da mãe de um assassino em série capaz de deixar a roupa ensaguentada de seu filho tão branca e limpa que a polícia não teria vestígios do crime. Tacones Lejanos brinca com os jornais televisivos e a apresentadora, de forma inusitada, confessa o assassinato do seu esposo ao vivo. Já no filme Kika (1993), Almodóvar acentua a crítica à mídia, apresentando-nos o lado terrível dos reality-shows, em sua busca de fazer recreação com a miséria humana.
Almodóvar possui eixos temáticos que perpassam os seus filmes. Um deles, certamente, é a representação da figura da mãe. Tacones Lejanos descreve uma relação tensa e cheia de conflitos entre mãe e filha, com a marcante ausência do pai. Matador mostrará a figura da mãe em suas vertentes mais extremas: a castradora e a amiga. Em Carne trémula, a mãe está só. A relação entre Benigno e sua mãe, em Hable con ella, é também densa, e conduz a narrativa, pois é com a mãe que ele aprende a cuidar. Nesse caso, mesmo que a mãe não apareça diretamente aos olhos dos espectadores, ela se torna personagem central da narrativa. Tratam-se, em todos os casos, de maternidades complexas e paternidades ausentes. Tema também extensamente desenvolvido em Todo sobre mi madre. Além desse, temos em seus filmes a recorrência de temas como a morte e o cuidar. De Pepi, Luci, Bom à Hable con ella, de diferentes maneiras e ângulos, esses temas são retomados. Todo sobre mi madre coloca-os em debate, trazendo a morte, a doação de órgãos e, principalmente, a Aids como peças fundamentais da história, como elementos que compõem o mosaico e que conduzem a narrativa. Identificamos esses como sendo os eixos da estética de Almodóvar: composição por colagem, utilização de fragmentos de outras obras, inclusive da música.
Também comum nos filmes de Almodóvar é a referência à Teoria Queer, na qual é feita uma defesa àqueles e àquelas que transgridem convenções de sexualidade e de gênero. Essa temática pode ser visualizada no mais do que polêmico "Má Educação", um filme sensível e muito simpático à causa gay. Apesar de se calcar no dramalhão, traz cenas de sexo, ainda que veladas, e trata a relação amorosa entre homens sem preconceito ou estereótipo. Porém, o título do filme parece inadequado ao próprio movimento: seria mesmo a "má educação" despertada na infância a grande responsável pelas tragédias da vida adulta?
A ESTÉTICA KITSCH
Aos procedimentos narrativos do diretor, soma-se a estética do excesso. A riqueza cromática da variedade de cores ressalta uma preocupação estética que indica a necessidade de não reproduzir uma realidade, mas criar, inventar a realidade do real. As cores vivas na decoração, azuis, roxos saturados, cozinhas de azulejos floreados e móveis pintados de cores, criam paisagens em que o excesso sinaliza o trabalho inventivo, que se torna evidente para os que as observam. Sendo assim, não é possível falar sobre Almodóvar ser citar a estética Kitsch, uma das maiores características de seu cinema.
Mais do que uma estética, o Kitsch é, na verdade, um fenômeno sociocultural, que caracteriza a inadequação de certos elementos que parecem estar fora do lugar e do tempo adequado. É popularmente conhecido como “a estética do mau gosto” e geralmente é confundido com o cafona e o brega. Isso ocorre porque o Kitsch faz referência a coisas, ou pessoas, que pretendem ser algo fora de seu contexto, ou seja, é algo que tem significado artificial.
Também podemos conceituar o Kitsch como sendo uma volta de elementos de décadas anteriores, causando, na atualidade, um aspecto “brega”. Teóricos dizem que essa estética exprime o esgotamento da arte e da criatividade ou seja, o Kitsch aparece porque as pessoas não têm mais o que aprender ou o que inovar. Por isso, podemos, dizer, que o Kitsch é uma releitura de artes anteriores, vindas de um tempo ao qual elas não soavam estranhas.
O primeiro teórico a dar espaço e estudar a Estética Kitsch foi o semioticista Abraham Moles. Ele observou alguns elementos em comum, como coleções de objetos sem valor, plantas de plástico, pingüins sobre a geladeira... enfim, coisas sem utilidade prática que as pessoas guardam julgando imprescindíveis, e tornando-as objetos de desejo. Moles denominou esse fenômeno de “Arte da Felicidade” e notou que se espalhava rapidamente e por todos os cantos do mundo após a era industrial.
Com a constante aparição do Kitsch no cotidiano de quase todo o mundo, várias teoria surgiram sobre o assunto, porém para os próprios teóricos primeiramente é preciso definir o que é Kitsch e o que Brega. Para que o Kitsch seja considerado uma forma de arte é necessário reunir alguns critérios objetivos. Foi pensando nessa diferenciação que os estudiosos da USP Thiago Bortolozzo da Silva e Adams Carvalho distinguiram cinco princípios básicos da Estética Kitsch: o Princípio da Inadequação, que se refere aos objetos que têm formas ou funções descontextualizadas e esdrúxulas; o Princípio da Acumulação, aquele ao qual estamos mais ligados, pois trata-se de objetos sem nenhum valor e, geralmente, de baixa qualidade, mas que insistimos a fornecê-lo algum valor afetivo; o Princípio da Percepção Sinestésica, que apela aos sentidos, olfato, paladar e tato; o Princípio da Mediocridade, que estabelece que o Kitsch não pretende ser o mais vulgar, mas sim estar sempre num meio termo entre o vagabundo e o elegante; e o Princípio do Conforto, que surge para suprir alguma necessidade, geralmente cultural, do consumidor.
O Kitsch é um fenômeno que se estende por todos os campos, inclusive o comportamental. Os dramalhões escritos por Almodóvar, assim com o exagero de certos personagens são facilmente encaixados na estética. Porém, o principal reflexo disso no cinema almodovariano está na cenografia e nos figurinos, com combinações de cores quentes e espalhafatosas, utilizados pelo diretor. Foi o contato com a cultura underground de Madri, nos anos oitenta, a chamada Movida, que fez com que o cineasta se aproximasse da estética e pudesse utiliza-la em seus filmes.
O CINEMA NOIR
Almodóvar enquanto expectador, tem uma preferência explícita que recai sobre a Hollywood dos anos 1940 e 1950. Entre dez filmes escolhidos por ele como os melhores de todos os tempos, três são variações do noir (Fuga do Passado, de Jacques Tourneur; A Marca da Maldade, de Orson Welles; e O Mensageiro do Diabo, de Charles Laughton), um melodrama essencial (Amar Foi Minha Ruína, de John Stahl), três filmes de diálogos sofisticadíssimos (A Malvada, de Joseph Mankiewicz; Quanto Mais Quente Melhor, de Billy Wilder; e Meia-Noite, de Mitchell Leisen, com roteiro de Wilder), além, é claro, de um Hitchcock básico (Intriga Internacional).
O cinema de Almodóvar, até hoje, é fiel às suas preferências. Mesmo que tenha sofrido transformações, sempre se inseriu na tradição de um universo autoral ultra-elaborado e controlado. Claro que, como um cineasta espanhol e contemporâneo, Almodóvar tem seu próprio cinema como base, mas suas referências sempre se farão presentes.
No filme A Má Educação, Almodóvar faz uma homenagem ao seu gênero preferido. Como todo exemplar pertencente ao cinema "Noir", o filme fala de crimes vistos sob a perspectiva dos criminosos, não de autoridades policiais. Tem alianças e lealdades instáveis. A diferença do tradicional filme "Noir" é que a "femme fatale", responsável pela discórdia e pela ruína dos personagens, aparece na pele de Gael García Bernal, como o transexual Zahara.
O próprio Almodóvar faz questão de classificar seu filme como "Noir", pois nele há perversão, transgressão moral, traição e ilusão.
O filme é repleto de referências. Em dado momento, dois personagens decidem matar o tempo depois de um assassinato e entram num cinema, que está exibindo uma mostra de filmes Noir. Dois clássicos franceses aparecem: A Besta Humana, de Renoir, e Thérèse Raquin, de Marcel Camé. Ambos mostram situações similares às dos personagens que os estão assistindo. Ao saírem da sessão, um deles comenta: “É como se todos esses filmes falassem de nós”.
Sobre A Má Educação, o próprio diretor comenta: “O filme não é uma comédia, ainda que haja humor (no personagem travesti de Javier Câmara) nem um musical infantil, ainda que crianças cantem. É um film noir, ou, pelo menos, gostaria de considerá-lo assim. O gênero noir admite bem a mistura com outros gêneros, sempre que a narração respire esse ar fatal, sem o qual o negro (noir) seria cinza. No noir pode não haver polícia nem armas, nem sequer violência física, mas tem de haver mentiras e fatalidade, qualidades que normalmente uma mulher encarna: a femme fatale. Ela é consciente de seu poder de sedução e é fria, razão pela qual não se altera facilmente. É alguém que perdeu os escrúpulos e não se interessa em recuperá-los. Para ela, o sexo não é fonte de prazer e sim de dor para os demais. Em ‘Má Educação’, a femme fatale é um enfant terrible, o personagem interpretado por Gael Garcia Bernal.”
PRINCIPAIS FILMES
La Ley Del Deseo – Pedro Almodóvar – 1987
Pablo (Eusebio Poncela) e Tina (Carmen Maura) são irmãos. Ambos têm uma vida sexual bastante complicada. Ele escreve e dirigi peças e filmes de temática gay e vive num mundo de sexo, drogas e álcool. Tem um relacionamento com o jovem Juan (Miguel Molina), que não corresponde ao romantismo de Pablo, expressado por cartas de amor. Já Tina é uma transexual que odeia os homens. Na verdade, ela nasceu homem e resolveu mudar de sexo, e hoje tem uma filha adotiva. Pablo quer fazer dela uma grande atriz.
O relacionamento de Pablo e Juan chega ao fim quando Juan decide deixar a cidade. Pablo, então, conhece Antonio (Antonio Banderas) que, enlouquecido de ciúmes e obcecado pelo diretor, passa a ir atrás de Juan e briga com Pablo, fazendo com que ele perca a memória, Quando a memória volta, ele descobre que Antonio seqüestrou Tina.
A Lei do Desejo só foi lançado oficialmente no Brasil em 1996, nove anos após sua estréia na Espanha. Sua sinopse segue uma linha complexa, característica de seu cinema. É tão polêmico quanto outros filmes como Kika e Matador, ou, considerado por muitos, até pior, por conta das, quase explícitas, cenas de sexo entre Antonio Banderas e Eusebio Poncela
A trilha sonora tem alguns temas compostos pelo próprio Almodóvar e o clássico francês “Ne me quitte pas", de Jacques Brel na voz da diva Edith Piaf.
Mujeres al Borde de un Ataque de Nervios – Pedro Almodóvar – 1988
Indicado ao Oscar de melhor filme estrangeiro em 1989, esse é o filme mais conhecido e estilizado de Almodóvar, uma comédia rasgada onde a realidade beira o absurdo e as cores reinam. Foi o primeiro grande sucesso mundial do cineasta.
A sexy dubladora de TV Pepa (Carmem Maura) é abandonada pelo seu amante, Ivan (Fernando Guillén), que terminou o relacionamento deixando um recado em sua secretária eletrônica. Obcecada, desesperada e à espera de explicações, ela sai a procura de Ivan por todos os cantos de Madri. Ao mesmo tempo, sua melhor amiga, a neurótica Candela (Maria Barranco) procura refúgio na sua casa, porque descobriu recentemente que seu amante é um terrorista shiita. Entra em cena também o filho de Ivan, Carlos (Antonio Banderas), sua noiva virgem, Marisa (Rossy de Palma) e Lucia (Julieta Serrano), mãe de Carlos e ex-esposa de Ivan que tem sérios distúrbios de comportamento.
Para Peter William Evans, autor do ensaio: "Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos", o filme estuda os, quase sempre hilariantes, relacionamentos entre homens e mulheres neste fim de século, o filme tem na sua personagem central, Pepa, um brilhante exemplar da moderna heroína da tela. Revigorada e autoconfiante após passar por sérios embates matrimoniais, Pepa ocupa o centro de um colorido grupo de personagens que representam um vívido perfil da sociedade espanhola de nosso tempo.
Átame! – Pedro Almodóvar – 1990
Ata-me! É a síntese do amor bandido, do amor louco. Ricky, Antônio Banderas, após ter alta do sanatório onde via há anos, vai ao encontro de seu grande amor, a jovem atriz de filmes “B”, Fulana de Tal (Victoria Abril). Porém, para convence-la de seu amor, e mostrar que ela também pode amá-lo da mesma forma, Ricky a seqüestra, para que os dois estando à sós, possam descobrir a felicidade que os reserva.
O próprio personagem de Antonio Banderas expressa sua biografia em poucoas linhas numa conversa com Fulana: Imagine que minha vida é uma linha de metrô. Primeira parada: órfão aos três anos. Orfanato. Fugi aos oito anos. Reformatório, mais fugas. Hospício aos dezesseis. Portei-me bem no hospital e aprendi várias profissões. Serralharia é minha favorita, abrir e fechar portas. Assim, eu fugia às vezes, mas sempre voltava. Não tinha para onde ir. E a diretora gostava de mim. Ano passado fugi e conheci você. Essa parada mudou minha vida. Desde então, só penso em você. E já que fiquei ocupado pensando, não fiz mais loucuras e fiquei normal. Vem um juiz, me examina, e diz que estou bom. Eles me dão alta. Fim da linha.
Kika – Pedro Almodóvar – 1993
Em 1993 Almodóvar já discutia sobre os polêmicos programas de televisão que invadem a privacidade das pessoas. Os figurinos, inclusive a "roupa-câmera" utilizada por Victoria Abril e o vestido ensangüentado com os seios postiços pulados para fora, são assinados pelo estilista francês Jean Paul Gaultier, autor da roupa polêmica de Madonna que também usava os seios da cantora para provocar.
No filme, a maquiadora Kika (Verónica Forqué) é casada com o fotógrafo Ramón (Alex Casanovas), mas mantém um tórrido caso com o escritor norte-americano Nicholas (Peter Coyote), que é padrasto de Ramón. Kika passa a ser ameaçada por Juana (Rossy de Palma), sua empregada lésbica, e Andrea Caracortada (Victoria Abril), ex-namorada de Ramón e apresentadora de um reality show.
Kika é o segundo longa de Almodóvar financiado por uma produtora da França, o primeiro foi De Salto Alto (1991). Isso mostra a poularidade de seus filmes em várias culturas. Seus temas são universais.
A habilidade do cineasta Pedro Almodóvar em contar histórias é impressionante. Quase sempre usando uma narrativa não convencional, fugindo do linear, incorporando elementos bizarros e surreais, e personagens esquisitos e originais, transformando enredos relativamente simples (como esse) em filmes muito interessantes. No fundo, todas as películas do diretor tem uma crítica social fortíssima. Mas sua forma de reclamar é original, foge do lugar comum e busca na originalidade elementos de reflexão.
Carne Trémula – Pedro Almodóvar – 1997
No fim do regime do ditador espanhol Franco, a prostituta Isabel (Penélope Cruz) começa a sentir as contrações do parto. Ajudada pela cafetina Centro (Pilar Bardem – mãe de Javier Bardem), Isabel dá a luz a um filho no ônibus que iria leva-la ao hospital. A criança é batizada com o nome de Victor. Passam-se alguns anos.
David e Sancho são dois policiais de Madrid, Sancho é alcoólatra e desconfia que sua esposa, Clara (Ángela Molina) tem um caso. Embriagado, ele resolve atender um chamado de distúrbio num apartamento, apesar da relutância do parceiro em esperar reforço policial. No local, Helena (Francesca Neri), bastante drogada discute com Víctor (Liberto Rabal), um entregador de pizza com quem Helena teve relações sexuais dias antes numa boate.
Depois desse dia, as vidas de Helena, David, Víctor, Sancho e Clara irão se cruzar para sempre.
O filme, baseado no livro Live Flesh (Carne Viva) da famosa escritora inglesa Ruth Rendell, especialista em romances policiais, ganhou adaptação nas mãos de Almodóvar que levou a história para Madri, que está para ele assim como Nova Iorque para Woody Allen. A presença da bela atriz italiana Francesca Neri ajuda a criar a alma feminina tão comum nas películas do diretor. A sua cena de sexo que é usada no cartaz é das mais belas do cinema mundial.
A fotografia do filme é do carioca Affonso Beatto, em sua segunda colaboração com o cineasta madrileno A primeira foi em A Flor do Meu Segredo (1995).
Todo Sobre mi Madre – Pedro Almodóvar – 1999
Esteban está completando 17 anos. Para comemorar seu aniversário, Manuela, sua mãe, o leva ao teatro para assistir à peça "Um Bonde Chamado Desejo". Enquanto esperam pela saída da atriz principal, Huma Rojo, Manuela confessa ao filho que interpretou o mesmo papel de Huma 20 anos antes, junto com seu pai, de quem ele nunca soube notícias. Como presente de aniversário, Manuela promete contar a Esteban tudo sobre o seu pai ao chegarem em casa. Porém, antes que seu desejo se realize, Esteban morre acidentalmente no caminho, e Manuela parte em busca do homem que um dia foi seu marido. Porém, o pai de Esteban, que tinha o mesmo nome, hoje se chama Lola, e se apresenta como mulher. Manuela guarda um caderno de seu filho, com anotações sobre uma futura história que se chamaria Tudo Sobre Minha Mãe. Na busca por Lola, se depara com situações e personagens únicos.
Aqui, Almodóvar economiza no tom tragicômico e no visual exagerado para trabalhar a sobriedade e as cores mais amenas. Os personagens não são mais caricaturas, mas pessoas verdadeiras. Passam a ser observados por dentro e não através das roupas espalhafatosas que utilizariam. A história flui mais com emoção e espontaneidade e menos com exotismo. Cada vez mais Almodóvar nos apresenta sua maturidade.
Hable com Ella – Pedro Almodóvar – 2002
O filme trata do amor e da amizade a partir da historia de dois homens cujas vidas se cruzam no hospital onde estão internadas as mulheres que eles amam. O primeiro é Benigno, o enfermeiro de Alícia, em coma há quatro anos. O outro é Marco, um jornalista que vela por sua amada, a toureira Lydia. Com uma trilha sonora e fotografia impecáveis, este filme vencedor do Oscar de melhor roteiro entrou para a galeria de grandes obras de Almodóvar.
Embora trágico, o filme consegue ser bonito. Neste roteiro, mais uma faceta de Almodóvar, que condiz com suas características pós-modernas, aparece: a mistura de elementos em um só continente. Benigno, personagem que parece encantador desde o início do enredo, assim como a maioria dos personagens do diretor, não é totalmente bom. Também não é totalmente mau. Essa característica, apesar de presente em quase todos os filmes de Almodóvar, merece especial destaque nesta obra. Benigno pode ser considerado o ápice da convergência de sentimentos e emoções, que já tinha sido apresentado ao público anteriormente no personagem Ricky, vivido por Antonio Banderas em Ata-me!, o bandido de quem não conseguimos ter raiva.
Merecem atenção especial o curta-metragem mudo inserido na trama, inspirado no cinema do início do século XX, e as belas seqüências com músicas interpretadas por Caetano Veloso e Elis Regina, o primeiro cantando ao vivo no próprio filme.
Volver – Pedro Almodóvar – 2006
Neste filme, Almodóvar trata com humor e sensibilidade a cumplicidade entre mulheres. Três gerações de mulheres de uma mesma famílias, de alguma forma, tiveram problemas com homens. O tema do abuso sexual, anteriormente visto em A Má Educação, agora apresentado pelo viés feminino. O assunto é tratado de modo delicado envolvendo culpa, medo e vergonha. Sã esse mesmo sentimentos que separam e virão a unir essas mulheres.
O roteiro segue uma linha tênue entre o melodrama e a comédia os dois estilos mais característicos do diretor. Trata-se de um assassinato. A filha mata o pai ao ser abusada sexualmente por ele. A mãe, Penélope Cruz, acoberta e filha e, juntas guardam o segredo. Raimunda, a mãe, representa a força da mulher, que evoca sentimentos e afetos que envolvem cuidado e proteção.
Em Volver, o diretor homenageia e rememora a história do cinema ao recorrer a uma cena da atriz Anna Magnani, do filme Belíssima, de Luchino Visconti. Belíssima trata também da relação entre mãe e filha, o que constitui um ele temático repleto de beleza entre os dois filmes.
Volver é também o nome do tango composto e interpretado por Carlos Gardel, presente na trilha sonora.
FILMOGRAFIA
Produções Comerciais:
- Volver (Volver) – 2006
- A Má Educação (La Mala Educació) – 2004
- Fale com Ela (Hable com Ella) – 2002
- Tudo Sobre Minha Mãe (Todo Sobre Mi Madre) – 1999
- Carne Trêmula (Carne Trémula) – 1997
- A Flor do meu Segredo (La Flor de mi Secreto) – 1995
- Kika (Kika) – 1993
- De Salto Alto (Tacones Lejanos) – 1991
- Ata-me! (Átame!) – 1990
- Mulheres à beira de um Ataque de Nervos (Mujeres al Bordede um Ataque de Nervios) – 1988
- A Lei do Desejo (La Ley del deseo) – 1987
- Matador (Matador) – 1986
- Trailer para Amantes de lo Prohibido (média metragem para TV) – 1985
- O que Fiz para Merecer Isso? (Que Hecho yo para Merecer Esto?) – 1984
- Maus Hábitos (Entre Tinieblas) – 1983
- Labirinto de Paixões (Laberinto de Pasiones) – 1982
- Pepi, Luci y Bom y Otras Chicas del Montón – 1980
Produções Não Comerciais:
- Folle... Folle... Fólleme Tim (longa metragem) 1978
- Salomé curta metragem) 1978
- Complementos (série de curtas metragens) – 1977
- Sexo Va, Sexo Viene (curta metragem) – 1977
- Lãs Três Ventanas de Ponte (curta metragem) – 1977
- Muerte em la Carretera (curta metragem) – 1976
- Sea Caritativo (curta metragem) – 1976
- Blancor (curta metragem) – 1975
- El Sueño o La Estrella (curta metragem) – 1975
- Homenaje (curta metragem) – 1975
- La Caída de Sodoma (curte metragem) – 1975
- Film Político (curta metragem) – 1974
- Dos Putas o Uma Historia de Amor que termina em Boda (curta metragem) – 1974
Como ator
- Na Cama Com Madonna (Madonna: Truth or Dare, EUA,1991)
- A Lei do Desejo (La Ley del deseo, Espanha,1987)
- ¿Qué he hecho yo para merecer esto?!! (1984)
- Negros Hábitos (Entre tinieblas, Espanha,1983)
- Labirinto de Paixões (Laberinto de pasiones,1982)
- Pepi, Luci, Bom y otras chicas del montón (1980)
- Tiempos de constitución (1978)
PREMIAÇÕES
- Oscar de Melhor Roteiro Original por Fale com Ela, em 2002
- BAFTA de Melhor Diretor por Tudo Sobre Minha Mãe, em 1999
- BAFTA de Melhor Filma Estrangeiro por Tudo Sobre Minha Mãe, em 1999
- Melhor Diretor no Festival de Cannes por Tudo Sobre Minha Mãe, em 1999
- Prêmio do Júri Ecumênico no Festival de Cannes por Tudo Sobre Minha Mãe, em 1999
- Teddy de Melhor Filme de Lançamento no festival de Berlim por A Lei do Desejo, em 1987
- Osella de Ouro de Melhor Roteiro no Festival de Veneza por Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos, em 1988
- César de Melhor Filme Estrangeiro por De Salto Alto, em 1991
- César de Melhor Filme Estrangeiro por Tudo Sobre Minha Mãe, em 1999
- César Honorário, em 1999
- Prêmio da Audiência no European Film Festival por Tudo Sobre Minha Mãe, em 1999
- Prêmio European Film por Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos, em 1988
- Melhor Filme Estrangeiro no Prêmio Cinema Brasil por Tudo Sobre Minha Mãe, em 1999
- Kikito de Ouro de Melhor Diretor no festival de Gramado por De Salto Alto, em 1991
- Prêmio Internacional Filmmaker no Festival Internacional de Palm Springs, em 2000
- Prêmio FIPRESCI de Melhor Filme do Ano no Festival Internacional de San Sebastián por Tudo Sobre Minha Mãe, em 1999
- Prêmio Escola do Público no Festival Internacional de Toronto por Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos, em 1988
- Prêmio Bodil de Melhor Filme Não Americano por Tudo Sobre Minha Mãe, em 1999
- Prêmio Círculo Precolombiano de Ouro de Melhor Diretor no Festival de Bogotá por A Lei do Desejo, de 1987
- Prêmio Círculo Precolombiano de Ouro de Melhor Roteiro no Festival de Bogotá por A Lei do Desejo, de 1987
- Melhor Filme Estrangeiro no German Film Awards por Tudo Sobre Minha Mãe, em 1999
- Prêmio Internacional Fantasi Film de Melhor Diretor no Fantasporto por Matador, em 1986
- Goya de Melhor Diretor por Tudo Sobre Minha Mãe, em 1999
- Goya de Melhor Roteiro Original por Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos, em 1988
CONCLUSÃO
Após fazer um estudo sobre o cineasta Pedro Almodóvar, aplicando os conhecimentos teóricos do cinema e visualizando a estética empregada por ele em seus filmes, podemos concluir que o diretor é um dos nomes de maior relevância no cinema atual.
Pertencente à corrente Pós-moderna, a qual não podemos ainda chamar de movimento, por não ter ainda a devida organização dos conceitos e características agregadas à estética, Almodóvar reconhece e recupera vários conceitos e estéticas do cinema. Ele se encaixaria com primor no gênero Noir. Também poderia estar dentro da classificação comédia. Os dramas também são abordados com maestria por ele, assim como temas com grande densidade emocional e artística. Ele é o próprio gênero. Almodóvar é o astro de seus filmes, e mesmo sem ter o hábito de trabalhar como ator, é ele quem atrai os espectadores aos cinemas quando um título seu é anunciado
Almodóvar, além de um talentosíssimo diretor, é também um teórico do cinema, por isso compreende tão bem, e se faz compreender, em seus filmes conceitos que, utilizados simultaneamente, cabem ao roteiro com perfeição. Podemos observar que muitos elementos são utilizados de uma só vez, a exemplo de cenas dramáticas onde ele consegue inserir certo teor de comédia, mas mesmo assim, o filme não perde seu rumo muito menos seu esplendor.
Sites Consultados:
http://www.contracampo.com.br/66/tudosobreminhamae.htm
http://zurdo-zurdo.blogspot.com/2007/08/ps-modernismo-arteecletismo.html
http://pt.wikipedia.org/wiki/P%C3%B3s-modernismo#Est.C3.A9tica_P.C3.B3s-Moderna
http://pt.wikipedia.org/wiki/Pedro_Almod%C3%B3var
http://adorocinema.cidadeinternet.com.br/personalidades/diretores/pedro-almodovar/corpo.asp
http://www.allmodovar.com.br/filmes/film.htm
http://museudocinema.blogspot.com/2006/09/fogo-nas-entranhas.html
http://www.bravoonline.com.br/noticias.php?id=1074
http://mixbrasil.uol.com.br/cultura/cinemix/filme1/filme1.asp
http://www.cineplayers.com/critica.php?id=2
http://cineminha.uol.com.br/materia.cfm?id=2384
http://www.fazendogenero7.ufsc.br/st_16.html
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-83332007000100002&lng=endirectory&nrm=iso