TRIBUTOS

Por LETICIA DE LIMA FARIAS | 25/11/2017 | Direito

SINOPSE DO CASE[1]

Letícia de Lima Farias[2]

1 DESCRIÇÃO DO CASO

No dia 30.04.2016, a Presidente da República, Dilma Rousseff, assinou o Decreto Presidencial nº 8.731/2016, majorando IOF nas operações de compra de moeda estrangeira de 0,38% para 1,1%. Logo após a modificação, o Ministério da Fazenda divulgou a esperança de arrecadação de 2,377 bilhões de reais, ainda no ano de 2016. Diante dessa modificação realizada pela presidente Dilma Rousseff surgiu uma inquietação entre os tributaristas e analistas financeiros nacionais. Diante do case surgem diversos questionamentos, a saber: A presidência da República tem competência para realizar a modificação em questão através de Decreto Presidencial? E tal Decreto é compatível com o discurso do governo federal ou com o discurso crítico dos tributaristas e analistas financeiros?

2 QUESTÕES PARA ANÁLISE

2.1 Questão principal:

  • Dentre as funções dos tributos, em qual delas se encaixa o IOF?

O conceito de Tributo encontra-se disposto na Lei nº 5.172 (Sistema Tributário Nacional), segundo o artigo 3º da referida Lei: “Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada” (BRASIL, 1966).  Ou seja, os tributos são prestações pecuniárias exigidas pelo Estado aos indivíduos, essa prestação em regra deverá ser em moeda (dinheiro) e excepcionalmente algo a ela equivalente, deve ainda ser instituído por lei, e ai se encontra o conceito de Legalidade, o ente tributador só poderá cobrar o tributo previsto e descrito completamente em Lei (HARADA, 2016).  

No que tange as espécies tributárias o autor Kiyoshi Harada (2016) afirma que o direito brasileiro reconhece cinco espécies de tributos, a saber: “impostos, taxas, contribuição de melhoria, empréstimo compulsório, contribuições sociais do art. 149 da CF e contribuições sociais do art. 195 da CF” (HARADA, 2016, p.391).

Quanto à classificação de acordo com a função, os tributos podem ser fiscais, extrafiscais ou parafiscais. O caráter fiscal consiste na arrecadação dos recursos financeiros aos cofres públicos (União, Estados, Municípios e Distrito Federal), e a partir de tal arrecadação “a administração pública deverá realizar a prestação de serviços ínsitos ao Estado, como educação, saúde, segurança, transporte e outros” (FREITAS [?]). A função parafiscal consiste na tributação que “visa custear atividades de interesse público, desenvolvidas por entidades paraestatais, como as que cuidam da previdência social (INSS) e da fiscalização de profissões regulamentadas, como a OAB” (MAGANHINI, 2006).

Com relação à função extrafiscal, o tributo funciona como mecanismo de interferência no domínio econômico, no intuito de alcançar um efeito que “visa favorecer ou desestimular os contribuintes a realizar determinadas ações, por considerá-las convenientes ou nocivas ao interesse público” (SILVA, 2014).

O IOF (Imposto Sobre Operações Financeiras) constitui uma espécie de tributo, com incidência “sobre operações de crédito, câmbio e seguro, e sobre operações relativas a títulos e valores mobiliários” (HARADA, 2016, p.508). Sua instituição é de competência da União, e tal prerrogativa conferida pela Constituição Federal (1988) está diretamente ligada à finalidade extrafiscal do IOF, uma vez que “o governo federal, manipulando o valor do tributo, pode incentivar operações de crédito em período de crise, ou ainda reprimir tais operações, quando excessivas, ou seja, quando gerar consequências maléficas a economia” (FERNANDES, 2015), assim dispõe o artigo 65º do CTN (Lei nº 5.172): “Poder Executivo pode, nas condições e nos limites estabelecidos em lei, alterar as alíquotas ou as bases de cálculo do imposto, a fim de ajustá-lo aos objetivos da política monetária” (BRASIL, 1966).

 

2.2 Questões secundárias:

  • Em matéria de majoração de Impostos, é competente a Presidente da República, através de Decreto Presidencial, fazer tais modificações?

 

Partindo do princípio da legalidade tributária, nas palavras do autor Luciano Amaro (2009):

A legalidade tributária não se conforma com a mera autorização de lei para cobrança de tributos; requer-se que a própria lei defina todos os aspectos pertinentes ao fato gerador, necessários à quantificação do tributo devido em cada situação concreta que venha a espelhar a situação hipotética descrita na lei. A legalidade tributária implica, por conseguinte, não a simples preeminência de lei, mas a reserva absoluta de lei (AMARO, 2009, p.112).

 

É correto afirmar que tal princípio, presa pela cobrança ou majoração através de Lei, assim como já foi mencionado anteriormente, o ente tributador só poderá cobrar o tributo previsto e descrito completamente em Lei (HARADA, 2016).  Visualizando exclusivamente por essa vertente, não se pode ter uma modificação em relação à majoração de tributos via decreto.

Porém, o direito tributário, assim como os demais ramos do Direito devem conter uma visão Constitucional, a Constituição Federal (1988), autoriza de forma expressa modificações desse teor realizadas pelo Poder Executivo sem necessidade de Lei, como esta elencada no artigo 153, parágrafo § 1º: “É facultado ao Poder Executivo, atendidas as condições e os limites estabelecidos em lei, alterar as alíquotas dos impostos enumerados nos incisos: I, II, IV e V” (BRASIL, 1988), o inciso V vem a tratar do IOF, impostos sobre operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos ou valores mobiliários (OLIVEIRA, 2010).

Desta forma, o presidente da República, como chefe máximo do poder executivo, está autorizado a realizar majoração de IOF desde que suas razões sejam fundamentadas, quanto ao questionamento a respeito da forma legislativa, poderá ser realizado via medida provisória e ainda via decreto.

 Em casos de urgência e emergência a Emenda Constitucional nº 32, de 11 de setembro de 2001 trouxe a forma legislativa de medida provisória para tais alterações (GUERRA, 2012). Porém nos demais casos, fora utilizada formas distintas, como exceção ao principio da legalidade, dando ênfase ainda ao caráter extrafiscal do IOF, no que tange ao artigo 153, parágrafo § 1º da Constituição Federal (1988), o poder executivo poderá “alterar as alíquotas, no intuito de proteger a indústria Nacional via decreto presidencial, porém só é possível a alteração, se o decreto obedecer às condições e limites estabelecidos em lei” (GUERRA, 2012).

 

  •  A fundamentação disposta no texto do Decreto Presidencial é compatível com qual discurso: da crítica ou do governo federal? Por quê?

 

A fundamentação do governo federal para a majoração do IOF descansa na finalidade principal de tal imposto, a regulação da economia nacional e o caráter extrafiscal dos impostos sobre operações financeiras. Já no outro vértice, a crítica ao governo realizada pelos tributaristas e analistas financeiros nacionais, afirma que na prática, a real finalidade do governo federal é a simples arrecadação.

É valido afirmar que a majoração realizada pelo governo federal não teve uma fundamentação plena, em contrapartida, a crítica ao governo se mostra bem fundamentada, segundo Diogo Ferraz (2016) o principal ponto que justifica a desvirtuação da finalidade do IOF pelo poder público, ou seja, a utilização da finalidade arrecadatória em imposto extrafiscal, descansa na seguinte ideia:

Quando há incidência do IOF para regular setores da economia, de forma sintonizada deve haver uma regulação pública aplicada sobre os mesmos setores, porém o que ocorreu fora somente o decreto, sem qualquer regulamentação interna dos setores da economia, “assim, um aumento de alíquota que contradiz a política regulatória aplicada pelo órgão competente não pode ser considerado legítimo” (FERRAZ, 2016).

Desta forma, fica clara a desvirtuação da finalidade do Imposto sobre Operações financeiras, realizando medidas puramente arrecadatórias, no intuito de cobrir os “buracos" realizados pelo gestor público, devido à má administração e desvios dos recursos financeiros.

 

REFERENCIAS

 

AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 15.ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

 

BRASIL, Código Tributário Nacional - Lei nº 5.172. 1966. São Paulo: Saraiva, 2014.

 

BRASIL, Constituição Federal do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. São Paulo: Saraiva, 2014.

 

FERNANDES, Alexandre. Direito tributário: IOF. 2015. Disponível em: . Acesso em 02 out 2016.

 

FERRAZ, Diogo. Uso deturpado e inconstitucional do IOF. 2016. Disponível em: . Acesso em 03 out 2016.

FREITAS, Rômulo de Jesus Dieguez de. A função extrafiscal dos tributos. Disponível em: <http://maja.net.br/Artigos_PDF/Art_14.pdf>. Acesso em 03 out 2016.

 

GUERRA, Guilherme Aires. O princípio da legalidade no direito tributário e suas exceções. Rio Grande, XV, n. 99, abr 2012. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=11478>. Acesso em 03 out 2016.

 

HARADA, Kiyoshi. Direito financeiro e tributário. São Paulo: Atlas, 2016.

 

MAGANHINI, Thais Bernardes. A FUNÇÃO SOCIAL DO TRIBUTO. Londrina: 2006. Disponível em: <http://www.idtl.com.br/artigos/173.pdf>. Acesso em 02 set 2016.  

 

OLIVEIRA, Alexandre Machado de. Princípios da legalidade e anterioridade no Direito Tributário. Rio Grande, XIII, n. 77, jun 2010. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=7864>. Acesso em 03 out 2016.

 

SILVA, Samara dos Santos. Sistema tributário nacional: fiscalidade, parafiscalidade e extrafiscalidade. 2014. Disponível em: < http://saamssilva.jusbrasil.com.br/artigos/119871459/sistema-tributario-nacional-fiscalidade-parafiscalidade-e-extrafiscalidade>. Acesso em 02 out 2016.

 

[1] Sinopse do case apresentado à disciplina Direito Tributário I, do curso de Direito da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB.

[2]Aluna do 7º - vespertino, do curso de Direito da UNDB.

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