TRIBUNAL DO JÚRI: ORIGEM E EVOLUÇÃO HISTÓRICA

Por Denys Regis Vieira de Lima | 15/02/2017 | Direito

TRIBUNAL DO JÚRI: ORIGEM E EVOLUÇÃO HISTÓRICA

De acordo com a doutrina dominante, o início do Tribunal do Júri ocorreu na Carta Magna da Inglaterra, em 1215. Este entendimento doutrinário se mostra impreciso, principalmente pela falta de fontes seguras que identifiquem a sua existência em tempos antigos.

Na época do seu surgimento, existia a figura da vingança privada, que  consubstanciava-se pela entrega do criminoso à família da vítima, para que assim fosse feita a justiça, conforme a vontade dos familiares. Esse tipo de pena, com o passar dos tempos, foi se tornando arcaica e a sociedade, mais evoluída, passou a gozar de ideais humanistas. O surgimento do júri se enquadra neste contexto histórico, onde a humanidade se viu impossibilitada de continuar exercendo seu poder de punição pelas próprias mãos. Com o Júri Popular, o Estado passa a representar a sociedade nos julgamentos das infrações cometidas, incluindo o homem comum na prestação jurisdicional, respeitando o Estado Democrático de Direito.

A identificação de institutos semelhantes muito anteriores à citada Carta Magna, demonstram que suas origens remontam a uma época bem mais antiga. De acordo com o doutrinador Guilherme de Souza Nucci (2008, p. 41), o Tribunal do Júri teve origem na Palestina. com a criação do Tribunal dos Vinte e Três, composto por padres, levitas e chefes de famílias de Israel, sendo de sua competência o julgamento de crimes punidos com pena de morte em vilas com população superior a 120 famílias.

Na França, o júri foi inserido no ordenamento jurídico após a Revolução Francesa de 1789. Os magistrados da época pertenciam a famílias nobres, ligadas à monarquia. Tal fato gerava a insegurança do povo que gozasse de ideais republicanos, daí a necessidade de se criar um Tribunal popular, com o fim de atender às necessidades provenientes da nova ordem social.

No Brasil, o Tribunal do Júri teve sua origem em 18 de junho de 1822, através de um decreto proclamado pelo Príncipe Dom Pedro, com a criação da primeira Lei de Imprensa, e teve participação efetiva do então ministro do reino, José Bonifácio de Andrada e Silva. O papel do referido Decreto no surgimento da nossa atual estrutura de Tribunal do Júri está na forma de julgamento preceituado para os crimes de abuso contra a liberdade de imprensa. O Corregedor de Crimes da Corte e Casa nomeava vinte e quatro cidadãos que seriam escolhidos dentre “os homens bons, honrados, inteligentes e patriotas, com o direito de recusação de dezesseis, por parte dos réus”. Os restantes participariam da averiguação do fato e, chegando à conclusão sobre a culpa do réu, era imposta a pena que só poderia ser revista em face de apelação pelo então Príncipe Dom Pedro I.

Com a Constituição do Império em 1824, o Tribunal do Júri deixou de ser uma estrutura restrita aos julgamentos envolvendo crimes de imprensa, passando a ser órgão do Poder Judiciário com competência para julgar tanto matérias cíveis como criminais. A partir da promulgação da referida constituição, o Júri passa a se firmar como essencial na estrutura da sociedade brasileira e, por consequência disso, se deu a manutenção desse instituto nas constituições que estavam por vir na história de nosso país.

A sua recepção definitiva veio com a promulgação da atual constituição em 1988, que em seu artigo 5°, XXXVIII, reconhece a instituição do júri e assegura: “a plenitude de defesa; o sigilo de votações; a soberania dos veredictos e a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida”.

Tribunal do Júri na CF/88 e na legislação

Em nossa atual Constituição, o Júri está disciplinado no artigo 5º, XXXVIII. Trata-se de órgão judicial de 1º grau, da justiça comum, estadual e federal. Compete ao júri o julgamento de crimes dolosos contra a vida: homicídio doloso, instigação ou auxílio a suicídio, aborto e infanticídio.

A análise dos crimes de competência do júri traz certos debates à sociedade. Tal discussão se dá quanto à existência de crimes de repercussão nacional e que, no entanto, o julgamento não compete a este instituto. É o exemplo do crime de latrocínio, que, apesar de causar grande repulsa à sociedade, não se considera crime doloso contra a vida, tratando-se unicamente de crime contra o patrimônio. Assim, por mais que o resultado do crime tenha sido a morte da vítima, leva-se inicialmente em consideração a intenção do agente de atacar o patrimônio da vítima. Este é o entendimento do Superior Tribunal Federal, na Súmula nº 603, “A competência para o processo e julgamento de latrocínio é do juiz singular e não do Tribunal do Júri”.

Analisando brevemente o histórico do instituto em estudo, extrai-se que o sentido principal da sua criação foi trazer, para o ato do julgamento, as pessoas comuns da sociedade, criando, assim, uma falsa noção de democracia, que na verdade não é característica absoluta deste instituto.

A nossa Constituição prevê, no caput, do seu artigo 5º, o direito à vida, à liberdade e à segurança pública. Sem tais previsões se torna inviável a manutenção de um Estado democrático

Para ser democrática, a competência do Tribunal do Júri teria que ir além dos crimes elencados no artigo 5º, XXXVIII, englobando também todos os crimes dolosos cujo resultado fosse a morte.

Em vários países, a figura do júri não existe e, mesmo assim, é viável a manutenção de uma democracia. Isto acontece, pois se trata de um direito e garantia humana fundamentais, formais e não materiais, limitada apenas a participação popular na prestação jurisdicional.

 

Referências

LIMA, Denys Régis Vieira de. O Sensacionalismo midiático e suas influências no Tribunal do Júri. Fortaleza, CE, p. 10-12. Não publicado.