Transformações Sociais e Políticas
Por Emanuel Isaque Cordeiro da Silva | 25/07/2019 | SociedadeSOCIOLOGIA: TRANSFORMAÇÕES SOCIAIS E POLÍTICAS
SOCIOLOGY: SOCIAL AND POLITICAL TRANSFORMATIONS
Emanuel Isaque Cordeiro da Silva – IFPE-BJ, CAP-UFPE e UFRPE - eisaque335@gmail.com e eics@discente.ifpe.edu.br e WhatsApp:(82)98143-8399
1. PREMISSA
Muitas foram as transformações sociais e políticas vividas em nossa sociedade. Algumas foram violentas e transformaram radicalmente as sociedades. Outras levaram à independência do jugo colonial ou neocolonial. Há também aquelas que brotaram de acordos entre classes dominantes ou que se constituíram movimentos liderados pela burguesia ascendente.
Merecem destaque aquelas que eclodiram no século XX, consideradas populares por terem registrado significativa participação do povo nos países onde ocorreram.
2. TRANSFORMAÇÕES LENTAS E GRADUAIS
As transformações em algumas sociedades foram lentas e graduais, permeadas por acordos, conciliações, reformas. Em alguns momentos houve até atos violentos, coordenados por quem estava no poder e sempre em acordo com as novas classes dominantes e os grupos mais poderosos dos momentos históricos precedentes.
São exemplos desse tipo de mudança social o que aconteceu na Inglaterra, no Japão e na Alemanha.
A Revolução Inglesa foi um movimento em que uma parcela dos senhores de terras e comerciantes se insurgiu contra o poder absoluto do rei e de seus associados (principalmente a nobreza e o clero, que nada produziam). Iniciada em 1642, tinha como objetivo limitar e condicionar esse poder a determinadas funções, impedindo o controle do comércio e da indústria e a criação de impostos pelo rei sem autorização do Parlamento. Após prolongado conflito civil, as forças políticas que lutavam contra o absolutismo derrubaram a monarquia, em 1649, e proclamaram a república. Esse movimento tornou possível a eliminação dos últimos laços que prendiam os ingleses a uma sociedade feudal.
A monarquia foi restaurada em 1660, mas o rei e os nobres perderam os poderes anteriores. O Parlamento havia adquirido força política e dividia o poder com a monarquia. Era o grande passo para que o mercantilismo se expandisse e, como consequência, o processo de industrialização se desenvolvesse a partir do século seguinte. O fundamental nesse processo foi a implantação de uma série de direitos que hoje são considerados universais. Mas foi um movimento em um único país e alterou substancialmente a situação apenas em uma sociedade. Só posteriormente teve repercussão maior.
A Inglaterra pode ser considerada o paradigma das transformações lentas e graduais mesmo tendo passado por algumas revoltas e irrupções políticas, uma vez que conseguiu manter a monarquia e também um sistema político e jurídico estável por muito tempo.
Pode-se dizer que a Revolução Inglesa é resultado de um acordo entre as várias classes dominantes existentes. Constituiu-se, assim, uma integração cultural em torno da ideia de nacionalidade.
Na Alemanha e no Japão também aconteceram mudanças políticas decorrentes de um pacto social entre as classes dominantes: os grandes proprietários de terras e a burguesia industrial e comercial emergente. Mesmo com as características próprias de cada país, o que houve foram alterações políticas e econômicas necessárias para o desenvolvimento de sociedades industriais modernas. Apesar de mudanças significativas nos processos e nas relações de produção, houve poucas alterações na estrutura do Estado e os detentores do poder político continuaram os mesmos. Assim, os proprietários da terra não perderam sua fonte de poder e continuaram conduzindo de forma compartilhada com a nova burguesia os destinos do Estado nacional.
No Japão, o período entre o início do século XVII até a segunda metade do século XIX (1600-1868) foi marcado por um governo autoritário assentado sobre a grande propriedade rural feudal. Esse período ficou conhecido como Era Xogunato Tokugawa, família que tinha apoio dos famosos guerreiros samurais. A chamada Revolução ou Restauração Meiji refere-se ao período de renovações políticas, religiosas e sociais profundas que ocorreram no Japão entre 1868 e 1900. É também chamado de “Renovação”, já que transformou o Império japonês num estado-nação moderno, o que levou o país a entrar na corrida imperialista do século XIX, principalmente na Ásia, tendo como fundamento o domínio econômico e o expansionismo militar. Essa reforma propriamente dita, apesar de ter assistido a revoltas e batalhas, não resultou na abolição das relações de produção no campo nem na derrubada da monarquia absoluta. Nesse contexto é que os antigos samurais e a pequena nobreza, composta de classes instruídas e já comandantes da burocracia estatal e de parte do exército, passam a ser uma força significativa no Estado japonês. Pode-se dizer, portanto, que houve uma “revolução conservadora” ou apenas uma conciliação de interesses e objetivos que visava manter os mesmos grupos e classes no comando das ações do Estado. Somente depois do fim da Segunda Guerra Mundial (1939-1945) é que se iniciou no Japão a reforma agrária, o que alterou profundamente a estrutura de propriedade da terra.
Na Alemanha, as mudanças passaram pelo processo de unificação de muitas unidades políticas, territoriais e culturais. A Alemanha de hoje é fruto de vários movimentos militares, políticos e culturais. Entre 1860 e 1871, foram incorporados novos territórios, demonstrando a força dos exércitos da Prússia – antigo Estado que fazia parte da então Alemanha pré-unificação –, concomitante à ideia de um inimigo externo e comum a todos que desejavam a unificação. Como consequência dessas necessidades, perpetrou-se guerra contra a Dinamarca, depois contra a Áustria e, finalmente, contra a França, em 1870, o que concorreu para o aumento do território.
Com a vitória na Guerra Franco-Prussiana, em 1870, a Prússia conseguiu unificar a Alemanha. O rei Guilherme I foi coroado kaiser (imperador) da Alemanha e considerado o líder máximo do país. Mas, mesmo quando o Império alemão se constituiu como tal, ainda existiam 22 estruturas políticas e territoriais diferenciadas, como principados, ducados, grão -ducados, grandes reinos (como os da Baviera e da Prússia) e até cidades livres (como Bremen e Hamburgo).
Apenas depois de 1870 foram possíveis a unificação nacional e a transformação da Alemanha em um país industrializado e desenvolvido, uma vez que, além das questões militares, houve outras ações urgentes para que a união se efetivasse. Otto von Bismarck – chefe de governo que estava à frente do processo de unificação alemã e uma das figuras mais proeminentes da política europeia do século XIX – desenvolveu um intenso projeto educacional que incluía um programa curricular unificado, no qual a língua alemã era obrigatória. Além disso, passaram a ser produzidas histórias da nação germânica atreladas a uma formação religiosa protestante única, cujo objetivo era unir a língua, a história e a religião e identificá-las com o povo alemão, rejeitando a diversidade e postulando a falsa ideia de uma unidade alemã indissolúvel e harmônica.
Assim, o pacto político orquestrado no interior dos Estados nacionais alemão e japonês aprofundou os laços políticos entre os grandes proprietários de terras e a burguesia, excluindo os operários e os camponeses do direito pleno à democracia e à cidadania, bem como ao acesso à terra. A burguesia não tinha poder para fazer a transformação, e os grandes proprietários não tinham como manter as coisas como estavam. Esse processo de modernização conservadora conduziu esses países à formação de uma sociedade industrial modernizada, mas cuja estrutura política se manteve conservadora.
3. REVOLUÇÕES E MOVIMENTOS ANTICOLONIAIS
O rompimento com os laços coloniais também configura um conjunto de movimentos em prol de mudanças sociais. Mais do que isso: como resultado de profundas conscientizações políticas por parte de populações historicamente exploradas e segregadas, esses movimentos anticoloniais estabelecem de modo bastante peculiar um novo patamar para o conceito de revolução.
3.1 Revoluções no continente americano pela independência
A Revolução Americana, ocorrida em 1776, caracterizou-se como uma luta contra o colonialismo inglês. O movimento teve grande repercussão, principalmente nos países da América Latina, pois provocou o rompimento dos laços coloniais. Teve influência significativa também por pregar a liberdade individual como um dos pilares da sociedade que se formara na América do Norte.
O Boston Tea Party foi um protesto de colonos ingleses considerado fundamental para a deflagração da Revolução Americana, o movimento de independência dos Estados Unidos.
Na América do Sul, Simón Bolívar foi sumamente decisivo para a conquista da independência da Venezuela, proclamada em 1811, mas só consumada com a tomada de Caracas e outras regiões de importância estratégica que permaneciam até 1821 sob domínio da coroa espanhola.
A maioria dos países da América Latina e do Caribe, seguindo o exemplo do que havia acontecido nos Estados Unidos e sob influência da Revolução Francesa, iniciou as lutas pela independência no início do século XIX, cujos desdobramentos se estenderam até 1820, aproximadamente. Foram necessárias muitas batalhas para que a Espanha aceitasse os termos de independência desses países. Após a emancipação, os países se organizaram politicamente na forma de repúblicas, abolindo a escravidão e o trabalho servil.
O Brasil, antiga colônia portuguesa, foi o único país que manteve a monarquia e a escravidão. Com o fim dos laços coloniais, os países que obtiveram a liberdade política assumiram uma nova forma de dependência econômica, agora em relação à Inglaterra, posto que o interesse do capitalismo britânico era conseguir manter o fornecimento de matérias-primas e ampliar o consumo de seus produtos manufaturados em território latino-americano.
3.2 Independência das colônias no século XX
A segunda fase do processo de descolonização desenvolveu-se no contexto do neocolonialismo, após a Segunda Guerra Mundial e até a última parte do século XX. Os palcos principais foram a África e a Ásia.
O continente africano, no final do século XIX, tinha sido loteado pelos países europeus (com exceção de Portugal, que possuía colônias desde o século XVI), que buscavam matérias-primas para o desenvolvimento de suas indústrias e ampliação do mercado consumidor para os seus produtos manufaturados. Assim, a maior parte das estruturas políticas tribais foi sendo gradativamente destruída, bem como as formas de vida e de produção existentes.
Após o fim da Segunda Guerra Mundial, em 1945, muitos povos africanos se organizaram e passaram a lutar por sua independência, criando, assim, uma série de novos países.
A independência, no entanto, não significou autonomia, uma vez que os novos países surgidos após a descolonização enfrentaram problemas para promover o desenvolvimento econômico e social. As heranças deixadas pelos colonizadores, representadas tanto por uma economia sempre dependente do exterior, exportadora de matéria-prima e importadora de gêneros de primeira necessidade quanto pelo baixo nível educacional e técnico da população, impediram os projetos de desenvolvimento e provocaram a continuidade da dependência através do endividamento, mantendo esses países subordinados aos interesses das antigas metrópoles.
Na Ásia, alguns países obtiveram sua independência mediante lutas ou acordos com as potências colonizadoras. Aqueles que foram invadidos durante a Segunda Guerra Mundial pelo Japão aproveitaram, depois da derrota nipônica em 1945, para iniciar ou retomar os vários movimentos pela independência. Do mesmo modo, o Vietnã, o Laos e o Camboja se tornaram independentes da França, e a Indonésia, da Holanda. Em alguns casos, houve acordo, como a Malásia e Cingapura, que conseguiram a independência da Inglaterra nos anos de 1957 e 1965, respectivamente.
O caso da Índia – emblemático – reúne movimentos por independência e acordos com o país colonizador. A presença dos ingleses na Índia data do século XVII e foi se ampliando com o tempo. A dominação foi facilitada pela inexistência de um governo centralizado e também pela diversidade religiosa e de castas, o que não contribuía para uma visão de unidade nacional.
Em 1920, logo após o término da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), surgiram movimentos pela independência, os quais, ao final da Segunda Guerra, quando o declínio do poder econômico e militar da Inglaterra ficou evidente, foram muito bem -sucedidos em suas lutas. Assim, a dominação na Índia não pôde ser mantida e em 1947 os ingleses reconheceram a independência indiana, que, em função das rivalidades religiosas, deu origem à União Indiana, com maioria hinduísta, e à Liga Muçulmana, com maioria islâmica, que veio a constituir o Paquistão (Ocidental e Oriental). O Ceilão, de maioria budista, tornava-se também independente, passando a ilha a se denominar Sri-Lanka. Posteriormente, o Paquistão Oriental se tornou o atual Bangladesh.
4. REVOLUÇÕES RADICAIS E POPULARES
Muitas foram as revoluções radicais e populares. Aqui será abordada apenas a Revolução Francesa.
4.1 Revolução Francesa
A Revolução Francesa eclodiu em 1789 como um movimento contrário ao poder monárquico e aos resquícios do feudalismo na França. Foi exemplo para a luta em várias nações do mundo ocidental contra os regimes absolutistas e pela eliminação da monarquia, uma vez que essas formas e sistemas de governo significavam opressão à maioria da população.
Além disso, com a revolução foi alterada profundamente a estrutura da propriedade rural, eliminando entraves para o desenvolvimento de uma nova sociedade. Entretanto, o fato mais importante foi que os revolucionários lutaram em nome das pessoas (apesar de não incluir as mulheres), e não só dos franceses, o que transformou o movimento em paradigma das revoluções posteriores.
5. REVOLUÇÕES POLÍTICAS NO SÉCULO XX
No século XX ocorreram várias experiências revolucionárias. Entretanto, foram poucas as que envolveram os mais explorados e, portanto, a maioria da sociedade. Duas delas serão aqui tratadas.
5.1 Revolução Mexicana
A Revolução Mexicana começou em 1910 e foi uma resposta dos explorados no campo e nas cidades a uma situação insustentável de desigualdade e de exploração. Havia no México uma grande desigualdade social: 1% da população possuía 97% das terras, o que gerava uma situação de exploração e miséria muito grande.
Três grandes grupos, representando classes sociais diferentes, participaram do movimento: o dos camponeses, que eram a maioria (seus líderes mais conhecidos foram Pancho Villa no norte e Emiliano Zapata no sul); o dos trabalhadores urbanos organizados em torno da Casa del Obrero Mundial (COM), de orientação inicialmente anarquista; e o da burguesia urbana e rural, liderada por Francisco Madero. Os camponeses exigiam o fim da concentração e a redistribuição das terras. A burguesia dissidente exigia que fossem definidas regras claras sobre as eleições para que se implantasse uma democracia de tipo liberal. Os trabalhadores urbanos, por sua vez, que não tinham nenhum direito nem liberdade de expressão e reunião, exigiam direitos garantidos pela Constituição.
O movimento estendeu-se até 1917, quando foi promulgada uma nova Constituição para o México. Várias reivindicações dos camponeses foram atendidas, mas todas sob o controle do Estado. Grandes propriedades, principalmente as da Igreja, foram expropriadas e repartidas. Possibilitou-se a manutenção das terras comunais na forma de cooperativas, mas a reforma agrária (divisão dos latifúndios) propriamente dita não foi realizada e a restituição das terras usurpadas não se efetivou. Assim, os camponeses pouco tiveram a comemorar.
Aos trabalhadores urbanos garantiu-se uma série de novos direitos, como jornada máxima de oito horas e a regulamentação do trabalho das mulheres e de menores, do trabalho noturno, do repouso semanal, das férias e das horas extras. Além disso, foram regulamentados a liberdade de organização sindical e o direito à greve, entre outros direitos.
A burguesia industrial, os banqueiros, os grandes comerciantes e proprietários de terras, em nome da “revolução mexicana”, constituíram o Partido Revolucionário Institucional (PRI), que se manteve no poder de 1929 até 2000.
5.2 Revolução Russa
Enquanto os mexicanos conquistavam sua Constituição, na Rússia a sociedade fervilhava. A maior parte dos russos, tanto no campo como na cidade, vivia em condições precárias e, desde 1905, lutava pela construção de uma nova ordem social.
A Revolução Russa de 1917 começou com a derrubada do czar, em fevereiro, e culminou com a tomada do poder pelos bolcheviques, liderados por Vladimir Ilitch Ulianov, o Lênin, e por Leon Trotsky, em outubro. O movimento teve como base os trabalhadores urbanos e os soldados.
Os revolucionários organizavam-se em conselhos populares que expressavam a proposta de uma sociedade que se orientasse pela vontade da maioria. Esses conselhos populares eram chamados de sovietes e constituíram o fato mais inovador da revolução.
Após a tomada do poder, com a constituição de uma nova estrutura estatal, os sovietes perderam pouco a pouco sua força. O termo, no entanto, ficou gravado no nome da unidade política e nacional formada em consequência da revolução: República Soviética.
A situação na Rússia, que era terrível por causa da Primeira Guerra Mundial, tornou-se ainda pior no período de afirmação da revolução. Mesmo assim, a propriedade privada foi extinta e procurou-se alterar a estrutura estatal e de serviços, como a educação, a saúde, o transporte ferroviário e o sistema bancário. A grande dificuldade foi mudar a estrutura da propriedade rural, que ainda era medieval, e a condição dos camponeses, precária em todos os sentidos. Assim, foi necessário primeiro privatizar a terra para depois torná-la coletiva. Isso foi possível com a concentração do poder pelo Partido Comunista e pelo Estado.
Em 1922 foi criada a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), formada por 12 repúblicas, todas sob o comando político e militar da República Soviética Russa. Depois da Segunda Guerra Mundial, mais três repúblicas foram incorporadas à URSS.
Em 1924, com a morte de Lênin, Josef Stálin assumiu o comando da URSS e aprofundou a concentração do poder no Partido Comunista e no Estado, eliminando a oposição. A partir de então, uma revolução que nascera com o propósito de transformar o sistema anterior e garantir a liberdade para todos gerou uma sociedade que teve parte dos problemas econômicos resolvidos, mas à custa da submissão a um Estado autoritário que oprimiu a maioria da população.
A União Soviética desmoronou na década de 1980, tendo seu fim assinalado pela queda do Muro de Berlim, em 1989. Deixou oficialmente de existir em dezembro de 1991.
Além da experiência russa, outras revoluções populares de orientação socialista ocorreram no século XX. Podemos citar alguns exemplos: na China, em 1949, a revolução liderada por Mao Tsé-Tung; em Cuba, em 1959, o movimento revolucionário encabeçado por Fidel Castro e Che Guevara; no Vietnã, de 1945 a 1954, o movimento liderado por Ho Chi Minh.
5.3 Um breve balanço
Como se pode perceber, uma coisa é o início de uma revolução, com seus propósitos transformadores; outra é a situação pós-revolucionária ou a institucionalização da revolução, em que o momento inicial de tomada do poder e alteração das estruturas políticas, econômicas e sociais precisa ser deixado para trás. É necessário, então, criar novas instituições ou reformular as antigas para que a revolução possa se desenvolver.
Com o passar dos anos, a liderança muda, e as situações interna e externa se modificam; aparecem interesses novos e são necessárias novas ações, que podem gerar maior emancipação ou não.
Algumas revoluções, como a do México, são populares, mas depois do momento inicial as demandas da maioria do povo são deixadas de lado e, em nome delas, há uma reorganização das classes dominantes para continuar no poder.
Os exemplos analisados aqui são de sociedades que alteraram sua estrutura e seu modo de vida, mas avançaram pouco no processo de liberdade e emancipação. Pode-se afirmar, então, que não são parâmetros para futuras mudanças, embora devam ser vistos como repletos de lições da história, da vida e dos rumos sempre otimistas e de esperança num mundo melhor.
6. E O QUE VEM PELA FRENTE?
A transformação radical de uma sociedade – revolução – está sempre ligada à superação de um sistema por outro, havendo um movimento popular ou uma classe social oprimida organizada para ir à frente e derrubar o antigo regime.
Na sociedade capitalista, segundo Marx, a classe social oprimida é o proletariado. Depois das muitas revoluções que ocorreram no mundo, há a possibilidade de a classe proletária, ou trabalhadora, organizar-se para derrubar o sistema capitalista? Há condições objetivas (crise do sistema, organização, poder, armas) e subjetivas (consciência social, aliança entre os diversos segmentos dos explorados) para que isso ocorra? Não se pode negar a existência de algumas dessas condições, principalmente nos países periféricos do sistema capitalista, mas, com as sociedades submetidas a forte esquema de massificação, torna-se cada dia mais difícil acontecer um movimento revolucionário nos moldes da Revolução Russa.
Hoje, em todos os meios de comunicação, ouvimos declarações de que estamos vivendo em uma “nova” sociedade, em uma “era pós-moderna”, em uma “sociedade pós-burguesa”, em uma “sociedade pós-industrial” etc. Com isso, afirma-se que está se estruturando uma nova organização social, completamente diferente da anterior.
Ora, na sociedade atual estão sendo levadas ao limite as potencialidades da modernidade estabelecida pela Revolução Industrial dos séculos XVIII e XIX, sem mudanças nas estruturas de poder e na economia; mas há indícios de que uma transformação esteja ocorrendo. Em que direção? As respostas a essa questão são divergentes.
É possível perceber que a ideia de uma revolução violenta, com a tomada do poder do Estado para desenvolver uma nova sociedade, está cada dia mais distante da realidade. Parece remota, também, a ideia de uma mudança significativa mediante ações lentas e graduais por parte das instituições políticas, pois estas estão muito amarradas às estruturas de poder existentes. Diante de uma possibilidade de mudança, a força da reação normalmente é muito grande e pode aniquilar qualquer tentativa de resistência. Além disso, devido à crise na democracia representativa, as pessoas já não acreditam que seus representantes possam tomar medidas que alterem profundamente a sociedade.
Então não há alternativa? Parece difícil, porque a capacidade de cooptação por parte dos poderes vigentes é muito grande. Mas a consciência da desigualdade e do sofrimento que isso acarreta não é apagada ou silenciada e se expressa em manifestações populares e revoltas pontuais em várias partes do mundo.
6.1 Mobilizações e mudanças no século XXI
Para pensar um pouco mais sobre as possibilidades de mudança social, é urgente atentar para o que está acontecendo no mundo. Se é verdade que a simples ideia de mudanças lentas e constantes, em termos políticos, não avança para uma grande transformação da vida em sociedade, é também verdadeiro que os sintomas da inquietude que se alastram pelo mundo contemporâneo permitem observar a gestação de novas realidades no curso do processo histórico.
O filósofo italiano Antônio Negri (1933-) e o filósofo estadunidense Michael Hardt (1960-) destacaram ao menos três características que podem multiplicar os sintomas da inquietude social:
• o nascimento de um grupo composto de novos e jovens sujeitos políticos, conectados com o mundo e inconformados com os limites e a mediocridade de sua vida cotidiana nas periferias das metrópoles, que já não aceitam a condição de subordinação e, para abandoná-la, estão dispostos a sacudir o status quo;
• o cultivo de um projeto emancipador por esses jovens sujeitos políticos: eles querem organizar a produção e a distribuição de riquezas horizontalmente e em rede – sem os limites das hierarquias e da mercantilização atuais;
• a prática de uma nova democracia, ainda em construção, numa época em que a representação tradicional está se tornando cada vez mais obsoleta e desprestigiada.
Exemplos de inquietude social foram as Jornadas de Junho de 2013, quando as ruas do Brasil foram tomadas por insubmissas e plurais personagens. O mesmo aconteceu durante a ocupação, pelos estudantes, das escolas públicas paulistas, em 2015 e 2016, contrários às políticas do governo estadual.
Conforme o sociólogo espanhol Manuel Castells (1942-), em termos tecnológicos, econômicos e culturais já há um longo caminho percorrido e muitas transformações efetivadas. De acordo com ele, o período atual é um tempo de eclosão de uma nova era em termos políticos e institucionais.
É crucial que se estabeleça um alerta para as possíveis reações contrárias às mudanças sociais e políticas, posto que as forças conservadoras são robustas e poderosas e não desejam mudanças que possam ameaçar seus privilégios. É do confronto entre as correntes progressistas e conservadoras, no entanto, que poderá emergir uma nova era que seja constituída de saltos qualitativos na vida coletiva ou, então, que faça prevalecer o ritmo obscuro e perigoso do retrocesso histórico, rumo a um tempo que não garanta a existência de direitos, em que gritos não são ouvidos e em que as utopias não se alimentam.
REFERENCIAL TEÓRICO
ALMOND, M.; BATISTA, G. O livro de ouro das revoluções. 2ª ed. Nova Iorque: Harper Collins, 2018.
ARRUDA, J. J. de A. A Revolução Inglesa. Vol. 82. 1ª ed. São Paulo: brasiliense, 1984. Col. Tudo é História.
COTRIM, G. História global. Vol. Único. 11ª ed. São Paulo: Saraiva, 2016.
FUKASAWA, M.; ISI, M.; IRIMAJIRI, Y. Cultura japonesa 7: a era Meiji. Vol. 7. 1ª ed. São Paulo: Nikkey Shimbun, 2018.
SILVA, A. et al. Sociologia em movimento. Vol. Único. 2ª ed. São Paulo: Moderna, 2016.
VÁRIOS AUTORES. O livro da Sociologia. Trad. Rafael Longo. 1ª ed. São Paulo: Globo, 2015.
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