Trajetórias Imutáveis: Determinismo e Positivismo em 'Luzia-homem'
Por FLÁVIO ALVES DA SILVA | 16/12/2008 | LiteraturaA obra Luzia-Homem de Domingos Olímpio traz em si a influência das correntes de pensamento Positivista e Determinista. Dentre as partes da obra em que ocorrem as manifestações dessas teorias, foi escolhida para o desenvolvimento desse trabalho a trajetória das personagens. Também entre elas ocorre uma delimitação da análise e com isso foram escolhidas três delas: Luzia, Alexandre e Teresinha, sendo a última o principal enfoque desse trabalho.
Começamos por Alexandre. Um jovem de origem rica, pele branca, escolarizado e, por conseguinte, situado na classe alta da sociedade em que vivia. Sua origem, sua cor e sua instrução lhe proporcionavam regalias como trabalhar no armazém e receber maior quantidade de ração. Sua atenção desmedida para com Luzia era um fator considerado errado pela maioria das outras pessoas devido a diferença entre suas origens raciais. Um homem de cor branca não poderia ter uma relação afetiva com uma mulher de cor diferente. Sendo dessa forma impossível de se tornar realidade o amor que aflora em seu coração. O determinismo mostra-se tão inviolável que não permite que o amor dele por Luzia seja concretizado na obra. Outra manifestação ocorre no caso do roubo do armazém. A posição que Alexandre ocupa naquela sociedade o deixa quase imune da acusação e gera uma insuspeita e consideração generalizada de inocência por parte das demais personagens. Um moço daquela estirpe jamais poderia cometer tal falha. E isto é comprovado, reforçado e perpetuado ao ser provada a sua idoneidade. Por último, a oportunidade de sair daquela terra inóspita lhe é oferecida de forma exclusiva, reafirmando, implicitamente, que sua categoria não poderia ser rebaixada, o que era representado por sua união à Luzia.
Esta, por sua vez, é uma mulher bela, valente no trabalho, gentil e cuidadosa, oriunda da raça negra e retirante do sertão. Representa a determinação da eterna luta pela sobrevivência. A cotidiana batalha pelo pão de cada dia exercida pelo retirante e que perpetua sua dependência e sua manutenção na plebe. A Ela não se dá o direito de sonhar e menos ainda de amar, principalmente um homem branco. O amor que surge em seu coração é sempre sufocado por ela ao pensar nas diferenças existentes entre ela e Alexandre. É uma personagem fadada a sucumbir na condição em vivia, sem qualquer possibilidade de ascensão. Seu lugar era aquele, o sertão, e seu destino o sofrimento. Não lhe era permitido sequer chegar até a praia ou ter felicidade com a saúde da mãe ou o amor de Alexandre. Sua submissão retrata a ação determinista e positivista sobre ela, pois não se devia nem mesmo questionar a razão da impossibilidade de seu amor, de sua felicidade e de uma mudança de vida. A única possibilidade era aceitar.
Por fim abordamos Teresinha. Esta tem em sua trajetória de vida a manifestação explícita do determinismo positivista. Sua infância, em companhia do pai, é totalmente determinada pelo contexto do meio em que vive. Na fazenda ela sai montada a cavalo e indo vaqueirar o gado em companhia do pai e dos outros vaqueiros. Uma convivência que influencia até mesmo seu modo de montar, escanchada feito homem. Depois, ao ir viver com seu primeiro marido sua vida passa a ser de uma retirante acompanhando-o na eterna busca de melhora. Nesta fase, Teresinha se acostuma ao modo de vida em que está e mesmo com algumas saudades da vida abastarda que tinha com sua família ela aceita o seu fado. Após a morte do esposo ela passa a ter uma vida de mendigagem até encontrar o segundo homem de sua vida. Esse período de vida com seu segundo companheiro ela é vítima de violência sexual, física e simbólica, mas mesmo vivendo sob essas condições não há vontade em abandona-lo e ela asujeita-se de tal forma que chega a ter saudades dessa vida no futuro.
Seqüencialmente Teresinha é carrega por outro homem que viria a ser seu terceiro companheiro. Este a coloca em um local afastado do mundo social reservando-a ao seu desfrute quando bem entendesse. Contudo, mais uma vez não há resistência, não é permitido rejeição para com seu carma. Quando o desejo por ela acaba seu companheiro a abandona ao acaso e o destino dela é de continuar sua vida como uma retirante, como um "farrapo de gente" em busca do pão da sobrevivência. Sua aceitação é mais uma vez presente e ela se acostuma a morar de qualquer maneira e viver sem expectativas de melhorias e de mudança de vida.
Portanto, ao visualizamos a vida dos personagens analisados em seus acontecimentos e em suas reações a estes vem à luz a atuação do determinismo e do positivismo. Os reflexos dessas teorias nas trajetórias das personagens de age de tal forma a conceberem suas rotas de forma imutável, sem qualquer possibilidade de alteração e/ou de rejeição de seu destino. É sempre mantida a sujeição dessas personagens às forças sociais e biológicas conduzindo-as a aceitarem e a agirem de acordo com as regras desses organismos.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
OLÍMPIO, Domingos. Luzia-Homem.
COMTE, Augusto. Discurso sobre o espírito positivo. São Paulo: Ed. Escala, 2005. (Coleção Grandes Obras do Pensamento Universal – 30).