Tem manias que é melhor a gente largar
Por Fernando | 28/07/2015 | SaúdeSempre tive um hábito peculiar a todos lá em casa: eu gostava de ler bulas de remédios. Eu adoecia muito raramente, então quase nunca tinha uma bula pra chamar de “minha”, mas compensava isso revisando as dos remédios dos meus irmãos – esses sim viviam doentes. Fosse uma gripe, uma tosse, uma crisezinha alérgica, lá vinha remédio em caixa – e junto, minhas adoráveis bulinhas. Não era nada incomum quando eles reclamavam de algum desconforto e eu chegava dizendo: “isso é colateral do remédio que cê tá tomando, é normal”. E saía de lá sob os olhares atônitos dos meus irmãos e dos meus pais. Eles aliás, achavam muita graça no início, mas depois viram que eu realmente estava compreendendo as bulas; passaram a ficar atônitos também.
E numa dessas chateações da vida, virei rainha por alguns dias. Sim, fiquei no trono. É o que chamamos no interior de Minas de “piriri-gangorra”, ou seja, você pensa que já dá pra sair do vaso, mas tem que voltar; pensa que agora dá, mas tem que voltar. Sabe? Como nas gangorras dos parquinhos. É muito desagradável. No primeiro dia achamos que fosse algo estragado que eu havia comido mas quando terminou o segundo dia e nada de eu melhorar, meus pais me levaram ao médico. Saí de lá com uma receita de Annita. Aliás, achei muita graça porque lembrei que meu remédio pra diarreia tinha nome de cantora de funk!! Bom... vou parar esse comentário por aqui. Fato é que minha diversão daqueles dias de reino estava garantida: uma bula do Anitta novinha pra ler! Enquanto eu reinava, dava uma lida cuidadosa naquelas letrinhas miúdas.
É muito sofrimento!
Uma parte que sempre me agradou nas bulas é a quantidade de formas que aquele remédio pode te prejudicar antes de finalmente te fazer algum bem. Já reparou? A lista é enorme! O Anitta, por exemplo, pode me fazer transpirar feito maratonista da São Silvestre em dia de sol! Afe, e eu que detesto ficar suada...
Outro colateral que li na bula do Annita é que ele pode me dar desconfortos abdominais inespecíficos e cólicas, além de perda ou diminuição do apetite. Aí pensei comigo: “beleza. Se eu não emagrecer pela diarreia, por onde até minha alma tá saindo, vai ser por não conseguir comer nada. Minha nutricionista vai adorar meu novo peso na próxima consulta! SE eu conseguir chegar lá andando”. Aí fiquei meio apertada. Já sofri desidratação uma vez e é tão violenta que a gente não consegue nem se virar na cama direito, quanto menos sair dela!
Era raro, mas o Anitta podia me dar flatulências. Nessa eu comecei a rir dentro do banheiro! “Perfeito!! Isso aqui vai ficar mais animado que o 4 de julho nos Estados Unidos! Fogos de artifício pra todo lado!!”. Nossa, ainda bem que eu tenho um quarto só pra mim... assim fico mais, sabe como é, à vontade pra deixar o vento balançar as cortinas... Que tortura...
Mania boa ou mania ruim?
Eu leio essas coisas porque realmente em divirto muito com elas, mas confesso que fico preocupada sobre algumas pessoas que têm esse hábito também. São aquelas hipocondríacas, que têm “mania de doença”. Elas podem estar com a saúde perfeita e só tomarem uma aspirina pra dor de cabeça – mas se lerem a bula, já vão começar a sentir os sintomas dos efeitos colaterais. Por exemplo, um inchaço chamado edema de Quincke; é tipo esses que aparecem quando um alérgico é picado por uma abelha. Mas o hipocondríaco, mesmo sem saber o que é, já começa a falar “ai, meu Deus, acho que eu tô com Quincke! Acho que eu tô com Quincke!”; logo em seguida, lê que a aspirina pode dar hemorragia gastrintestinal e já começa a achar que tá sentindo gosto de sangue na boca e que “bem que reparou que a cor das fezes tava meio avermelhada outro dia (aquele em que ela se matou de comer beterraba, sabe?).
Pessoas assim não podem ter muito contato com bula de remédio ou documentários sobre doenças raras porque elas tendem a começar a “sentir” todos os sintomas mencionados e acreditam que estejam com aquela doença. E não tem nada nem ninguém que as convença de que não existe doença alguma! Elas VÃO marcar um médico e VÃO pagar mico, mas só assim elas entendem que não têm nada de errado – fora a hipocondria.
Quanto a mim, teve um dia em que eu achei que estava sentindo um colateral descrito numa bula nem lembro mais de qual remédio. Foi nesse dia que eu resolvi dar um tempo nas minhas leituras e voltar às revistinhas.