SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL NO PARADIGMA DO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO: UM ESTUDO SOBRE A LEGITIMAÇÃO EXTRAORDINÁRIA DO SINDICATO E O SISTEMA DE ACESSO COLETIVO À JUSTIÇA.
Por Gabriela de Campos Sena | 22/12/2013 | DireitoSUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL NO PARADIGMA DO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO: UM ESTUDO SOBRE A LEGITIMAÇÃO EXTRAORDINÁRIA DO SINDICATO E O SISTEMA DE ACESSO COLETIVO À JUSTIÇA.
Gabriela de Campos Sena[1]
I. Introdução.
Com a instituição de um Estado Democrático de Direito, fruto da vontade do Poder Constituinte para edificar a lex fundamentalis, o ordenamento jurídico brasileiro depara-se com a necessidade de efetivação da cidadania, da dignidade da pessoa humana e dos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa.
“Surge, então, o Estado Democrático de Direito, também chamado de Estado Constitucional, Estado Pós-Social ou Estado Pós-Moderno, cujos fundamentos se assentem não apenas na proteção e efetivação dos direitos humanos de primeira dimensão (direitos civis e políticos) e segunda dimensão (direitos sociais, econômicos e culturais), mas também dos direitos de terceira dimensão (direitos oi interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos).” (BEZERRA LEITE, Carlos Henrique. 2.010, p.39)
O objetivo de um Estado Democrático de Direito é contribuir para a formação de uma sociedade justa sem obstar o desenvolvimento nacional, é erradicar a pobreza e a marginalização para reduzir as desigualdades e promover o bem comum priorizando a prevalência dos Direitos Humanos através do incentivo na cooperação entre os atores da sociedade e entre estes e o Estado.
O principal objetivo do Estado Democrático de Direito não é apenas justificar os direitos sociais como direitos humanos, mas sim garanti-los. Daí a importância do poder judiciário (e do processo) na promoção da defesa dos direitos fundamentais e da inclusão social, especialmente por meio do controle judicial de políticas públicas.” (BEZERRA LEITE, Carlos Henrique. 2.010, p.39).
A atual sociedade é marcada pelas contradições e desigualdades geradas pelo capitalismo e pela globalização, o que consequentemente ocasiona lesões aos direitos humanos, notadamente os sociais.
Diante das lesões de massa, surge a necessidade de se efetivar os interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos. Assim, as concepções de jurisdição e processoem um EstadoDemocráticode Direito, devem ser compreendidas a partir dos princípios constitucionais de acesso à justiça presentes no título II, capítulo I da Constituição de 1988.
Devido a constante evolução por que passa a atual sociedade, é inconcebível manter um direito processual imutável no tempo, que não atenda ou que ignore os reclamos sociais. Citemos a professora Tereza Cristina Sorice Baracho Thibau:
Com o desenvolvimento social houve o surgimento de necessidades diferenciadas por parte dos grupos sociais, agora organizados, como os trabalhadores, por exemplo, que impuseram a proclamação de novos direitos, de índole social. A transformação do Estado Liberalem Estado Socialimpôs ao ente soberano a intervenção na economia e na sociedade com o fim de estabelecer garantias básicas: a proteção do trabalhador, a assistência social e o amparo quando o cidadão atingisse a velhice são exemplos dessas garantias. (THIBAU, T.C.S.B; SILVA NUNES, Leonardo. Panorama e Tendências sobre a Tutela Jurisdicional de Direitos Coletivos. PMMG jurídico, v. 23, p.26-29, 2011).
A Constitucionalização do processo tem por escopo, a efetividade do acesso à justiça, por intermédio das ações individuais e coletivas. A coletivização do processo idealiza colocar em prática as normas programáticas contidas na Constituição para que o acesso à justiça se traduza em instrumento para viabilizar justiça social através da possibilidade de controle das políticas públicas.
Através das tutelas alusivas à dignidade humana e aos direitos de personalidade, ou até mesmo da proteção do meio ambiente, do patrimônio público e social, além de outros interesses metaindividuais (difusos, coletivos e individuais homogêneos), almeja-se alcançar uma ordem jurídica justa interligada com a atual realidade social.
A Constituição da República deu aos sindicatos liberdade de organização e a possibilidade de fortalecimento da perspectiva coletiva de atuação, inclusive judicial, para a defesa dos interesses individuais e coletivos. O inciso III do artigo 8º da CRFB, confere aos sindicatos a legitimação para defender judicialmente os interesses individuais ou coletivos da categoria profissional ou econômica correspondente.
A substituição processual clássica é figura jurídica encontrada no Art. 6o, do Código de Processo Civil - CPC. A CLT - não contém normas processuais para consagrar a substituição processual. No entanto, os seus Artigos 8o, parágrafo único, e 769, dão base ao aplicador do direito para utilizar-se do direito comum como fonte subsidiária.
O Art. 8o, III da Constituição da República de 1988, deu elasticidade à representação sindical, entendendo o legislador que o sindicato abrange a toda a categoria e não apenas aos associados.
O principal objetivo do Estado Democrático de Direito não é apenas justificar os direitos sociais como direitos humanos, mas sim garanti-los. Daí a importância do poder judiciário (e do processo) na promoção da defesa dos direitos fundamentais e da inclusão social, especialmente por meio do controle judicial de políticas públicas.” (BEZERRA LEITE, Carlos Henrique. 2.010, p.
Conforme citação anterior do professor Carlos Henrique Bezerra Leite, precisamos pensar na governança pública e na utilização de políticas públicas para que possamos dar efetividade aos direitos fundamentais.
Com a crise do sindicalismo moderno, se torna difícil visualizar um sindicato forte e representativo. Ademais, para que a substituição processual se estabeleça nos termos do paradigma de um Estado Democrático de Direito, temos que fortalecer os sindicatos e dotá-los de representatividade, o que depende da capacidade de organização e luta de cada categoria profissional.
2. Ações Coletivas e Conflitos de massa.
Na ação coletiva para tutela de interesses ou direitos individuais homogêneos, o autor da demanda atua em nome próprio na defesa de interesses de outrem (legitimação extraordinária ou substituição processual), enquanto na ação individual o titular da demanda é também o titular do direito material nela deduzido (legitimação ordinária). Por aí já se vê que não há identidade de partes no pólo ativo das duas demandas.
O maior desafio dos juristas na pós-modernidade é atenuar os conflitos de massa. Assim, é imprescindível aprofundar no fenômeno da substituição processual, tão latente nas novas relações jurídicas. Quanto ao aspecto da legitimação ativa, trazemos à baila as pontuações destacadas por Tereza Cristina Sorice Baracho Thibau:
Partindo-se do exame de circunstâncias processuais que cercam a legitimação ativa e o interesse de agir dos entes intermediários, além do objeto e dos efeitos da coisa julgada nas ações coletivas, verifica-se que não existe uma perfeita adequação da figura da substituição processual como inerente à posição ocupada no processo por tais entes. Todavia, não se pode negar que também existam semelhanças entre a figura do substituto processual e a condição de ‘representante’ institucional da coletividade àqueles referentes. A própria lei processual, assim como está, não facilita interpretações muito seguras neste campo. Entretanto, o que se verifica de concreto é que houve uma modificação, por ficção jurídica, no conceito de ‘parte’, passando a ser concebido como aquele que foi legitimado a intentar a ação, e tal fato tornou-se indispensável para que o direito processual pudesse acobertar os conflitos coletivos. (THIBAU, Tereza Cristina Sorice Baracho. A legitimação ativa nas ações coletivas. Tese de doutorado. Belo Horizonte. Faculdade de Direito da UFMG, 2003, pág 7).
A substituição processual é uma situação-problema de suma importância investigativa devido à sua relevância social, humana e jurídica. Citemos novamente a professora Tereza Cristina Sorice Baracho Thibau:
A possibilidade de participação dos entes intermediários, que para alguns acontece, ocupando, estes, a posição de substitutos processuais, vem trazendo dúvidas quanto à própria formação e validade de processos que já se desenvolveram com o objetivo de atender aos grupos ou à coletividade, de uma forma mais equânime e justa. Portanto, delimitar o verdadeiro alcance e a legalidade do fenômeno da substituição processual, nestas novas relações jurídicas, parece ser tarefa relevante para doutrina e prática jurídica atual. (THIBAU, Tereza Cristina Sorice Baracho. A legitimação ativa nas ações coletivas. Tese de doutorado. Belo Horizonte. Faculdade de Direito da UFMG, 2003, pág 17).
As ações coletivas visam a proteção de três categorias de direitos ou interesses metaindividuais: a dos coletivos, dos difusos e a dos individuais homogêneos, todos definidos no artigo 81 do Código de Defesa do Consumidor.
Ada Pellegrini Grinover, ressalta que houve um erro de remissão no artigo 104 do CDC, assim, nos explica sucintamente o referido equívoco do artigo com a autoridade de ter sido co-autora do anteprojeto que originou a Lei nº 8.078/90 (CDC):
Observe-se e retifique-se, antes de mais nada, um erro de remissão contido no art. 104: a referência do dispositivo aos ‘efeitos da coisa julgada erga omnes ou ultra partes a que aludem os incisos II e III do artigo anterior’ deve ser corrigida como sendo à coisa julgada ‘a que aludem os incisos I, II e III do artigo anterior’; e isto porque a coerência interna do dispositivo exige a relação entre a primeira e a segunda remissão, pelo que não se pode excluir da segunda a menção ao inciso I do art. 103 que, ademais, se sujeita ao mesmo regime previsto no inciso II. Quando muito, poder-se-ia entender a segunda remissão como feita aos incisos I e II do art. 103, levando-se em conta a própria ordem de indicação dos efeitos da coisa julgada (erga omnes e ultra partes). (GRINOVER, Ada Pellegrini et alii. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor comentado pelos autores do anteprojeto. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1997, p. 733).
O pedido na ação coletiva é obrigatoriamente genérico, pois a condenação será sempre genérica (CDC, art. 95), ao passo que na ação individual é permitido o pedido líquido. Assim, a coisa julgada na ação coletiva produzirá efeitos erga omnes; na ação individual, inter partes. Logo, questiona-se:
No prisma de um Estado Democrático de Direito, há litispendência entre ação coletiva para tutela de interesse individual homogêneo (em que o autor atua como substituto processual) e ação individual?
- 3. Litispendência entre ação coletiva para tutela de interesse individual homogêneo e a ação individual: controvérsias doutrinárias.
A substituição processual é dotada de contornos próprios no processo do trabalho, não se constituindo em uma mera repetição do modelo do Processo Civil, diante do reconhecimento de que a substituição processual pelo sindicato, abrange não só os associados, mas todos os membros de uma categoria.
A matéria objeto de estudo ainda está em construção, pois há um compromisso com a efetividade dos direitos fundamentaisem um Estado Democráticode Direito:
A figura da substituição processual teve sua trajetória evolutiva ao longo história do direito processual, entretanto, não se pode dizer que este caminho tenha chegado ao seu destino final, posto que muitas dúvidas ainda pairam sobre sua verdadeira natureza jurídica, notadamente em se tratando de direito coletivo. Além disto, a própria evolução do Direito Processual, na sua inevitável e saudável dinâmica, em acompanhamento às necessidades de uma sociedade cada vez mais complexa em suas relações interpessoais, vem a clamar uma nova atitude interpretativa quanto aos seus institutos, por vezes, diferentes daquelas que, um dia, responderam às inquietações doutrinárias da época em que foram concebidas. (THIBAU, Tereza Cristina Sorice Baracho. A legitimação ativa nas ações coletivas. Tese de doutorado. Belo Horizonte. Faculdade de Direito da UFMG, 2003, pág 7).
Para reforçar a importância do estudo do Direito Coletivo, citamos novamente a professora Tereza Cristina Sorice Baracho Thibau:
No direito processual civil tradicional, de cunho individualista, o estudo desses institutos jurídicos encontra-se bastante desenvolvido, mas no direito processual coletivo, não se pode afirmar tal fato. Ademais a configuração da sociedade contemporânea, que guarda em seu seio a existência de conflitos de massa, indica a necessidade da renovação interpretativa os institutos do direito processual civil para permitir uma tutela jurisdicional coletiva que proporcione uma efetiva pacificação social. (THIBAU, Tereza Cristina Sorice; NUNES, Bruno José Silva. Cenexão, continência e Litispendência no processo coletivo. MPMG jurídico, 2009, v. 18, p.35-40).
O acesso real à justiça, se diferencia do mero acesso formal, refletindo diretamente nas relações entre o substituto com o direito de exercer, efetivamente, sua legitimação para a causa, e o direito material que é objeto da demanda. Assim, o desenvolvimento da economia deve estar necessariamente atrelado aos postulados da boa-fé e da justiça social (artigo 170 da Constituição da República), juntamente com a cidadania e a valorização da dignidade do substituído (trabalhador), que possui a garantia Constitucional de acesso real à justiça, acesso esse que ultrapassa as meras fronteiras do acesso formal.
Para Se trabalhar os fundamentos jurídicos do instituto da substituição processual, é importante traçar seu conceito nos moldes da doutrina tradicional, considerando a realidade jurídico-social na qual ele foi concebido, a fim de que se confirme a necessidade contemporânea de se repensar a extensão de tal conceito, para conferir sua compatibilidade, tanto com seu escopo na sistemática referente á Teoria Geral do Processo, como também no Direito Constitucional Posto. (THIBAU, Tereza Cristina Sorice Baracho. A legitimação ativa nas ações coletivas. Tese de doutorado. Belo Horizonte. Faculdade de Direito da UFMG, 2003, pág 126).
A importância do tema se dá pela necessidade de analisar e aprofundar no reconhecimento dos direitos individuais do substituído de intervir no processo, de desistir e de transigir quanto aos direitos postulados.
Quanto à necessidade de diálogo e participação, cite-se a sábia colocação do professor Antônio Gomes de Vasconcelos:
O novo paradigma constitucional estabelece como condição sine qua non a quebra do isolacionismo institucional e sua substituição por um espaço de cooperação e integração institucional, sob uma perspectiva mais realista e democrática e, portanto, pluralista e participativa. Além disso pressupõe a horizontalização desta integração participativa, seja no âmbito local ou no âmbito de cada setor de atividade econômica (setorial). A relativa interação decorrente do intercâmbio entre cúpulas representativas (sindicais e governamentais), todavia, não deixará de existir. Contudo, sua contribuição para racionalização e harmonia do sistema, é insuficiente e distante das realidades locais, regionais e setoriais. O elo fundamental na tensão do novo Direito versus realidade é a atuação integrada e participativa das instituições locais, estabelecendo-se uma relação de suplementariedade por parte das instâncias superiores em relação às locais (princípio da subsidiariedade). (VASCONCELOS, Antônio Gomes de. A função dos conselhos tripartites dos núcleos intersindicais de conciliação trabalhista: a organização intercategorial as relações de trabalho (regulamentação, administração, prevenção e resolução de conflitos) orientada pelo princípio da subsidiariedade ativa. 2.002. Dissertação de mestrado. Universidade Federal de Minas Gerais, p. 21).
O Direito, como uma das garantias precípuas da vida em sociedade, é considerado como um dos responsáveis pela harmonia da relação empregatícia, mas, para que haja tal harmonização deve existir um menor teor de desigualdade e consequentemente, a manutenção e progressão de direitos sociais. Um dos caminhos a ser perseguido em prol da efetivação dos direitos sociais, é assegurar o acesso real á justiça. [2]
Segundo Moraes (2003), “o tratamento desigual dos casos desiguais, na medida em que se desigualam, é exigência tradicional do próprio conceito de justiça.” [3] É essencial o tratamento desigual para promover o equilíbrio.
A participação dos jurisdicionados nas decisões administrativas, principalmente quando o foco se refere às políticas públicas que se dirigem à efetivação dos direitos sociais, é apta para ensejar a construção de uma democracia participativa voltada para a realização dos direitos fundamentais.
Tereza Cristina Sorice Baracho Thibau, ressalta mais uma vez a importância das ações coletivas, principalmente as que versam sobre a concretização de políticas públicas sociais:
Nessa trajetória de identificação dos limites ao controle judicial, verifica-se que o processo -sobretudo o processo coletivo - desempenha funções primordiais, pois a presença de representantes adequados para a defesa dos interesses coletivos, a atuação judicial proativa, a possibilidade de produção de uma instrução probatória qualificada, a abertura de canais à participação dos interessados e os efeitos coletivos da decisão são capazes de ensejar um debate amplo e aprofundado sobre grande parte dos aspectos e interesses envolvidos no caso concreto, com vistas a produzir uma decisão judicial que não represente mera substituição do crivo do administrador pelo crivo judicial, mas uma decisão que seja produto do diálogo instaurado no curso do processo, levando-se em consideração os pontos de vista dos interessados a fim de produzir uma decisão efetivamente democrática que possa suprir a omissão ou negligência do administrador. (THIBAU, Tereza Cristina Sorice. As ações coletivas e a judicialização de políticas públicas no Estado Democrático de Direito: possibilidades e limites. MPMG jurídico, 2009, v. 17, p.33-36).
O tema suscita controvérsia não apenas entre os doutrinadores, mas, também, na jurisprudência dos tribunais pátrios. O dissenso reside no inciso III, do artigo 8º da CRFB, pois o dispositivo não foi claro quanto à forma que se daria à defesa dos direitos e interesses coletivos e individuais da categoria pelos sindicatos, se por representação ou por substituição processual.
Diante disso, é importante situar o tema da substituição processual, abordando alguns aspectos básicos de institutos jurídicos afins a essa matéria, tais como legitimação ordinária e extraordinária para provocar a jurisdição, capacidade processual, litispendência e coisa julgada nas ações coletivas, permitindo assim, visão sistêmica da questão.
Na defesa dos interesses coletivos agirá o sindicato por meio do instituto da substituição processual. O texto constitucional, neste sentido, é cristalino, cabe indubitavelmente ao Sindicato a defesa dos direitos e interesses dos trabalhadores que representa, sejam direitos coletivos ou individuais, seja em questões administrativas ou judiciais.
O problema do "acesso à justiça" esbarra-se freqüentemente nas abordagens que se fazem acerca das condições da ação.
Acesso à justiça significa acesso ao poder judiciário em geral, a seus serviços e aos direitos decorrentes da condição humana, visando à concretização da dignidade, da formação e consolidação da cidadania, bem como da prevalência dos Direitos Humanos e da efetividade dos direitos fundamentais.
Segundo Tereza C. S. Baracho Thibau, as condições da ação servem de suporte para a determinação dos pressupostos processuais na substituição processual:
A existência de uma relação ou situação jurídica de direito material entre o substituto e o substituído é a primeira indagação que se faz quanto ao fato de ser esta uma condição da ação para atuação daquele. E há de se marcar que, em princípio, a tal relação não se poderia conferir qualidade de ‘condição da ação’, visto que nem em todos os casos de substituição processual, tal conexão aparecerá, a exemplo do Ministério Público na defesa de direito cujo o titular do direito material é exclusivamente o substituído. Se é que se pode falar em legitimação extraordinária ‘exclusiva’. (THIBAU, Tereza Cristina Sorice Baracho. A legitimação ativa nas ações coletivas. Tese de doutorado. Belo Horizonte. Faculdade de Direito da UFMG, 2003, pág 146).
Em diversos momentos as condições da ação, definidas pela doutrina clássica, servem de obstáculo à consecução da justiça, especialmente se empregadas em dissonância com as concepções jurídicas e sociais vigentes.
A substituição processual é um instituto amplo que exige a análise especializada de cada caso em concreto, citemos novamente a professora Tereza C. S. Baracho Thibau:
Considerando-se que existem casos acobertados pela lei, em que não se marca como condição da ação a referida relação, não se pode enquadrá-las desta maneira. Por outro lado, estar-se-ia na contramão da evolução do sentido atual de ação como direito subjetivo público, de índole constitucional. (THIBAU, Tereza Cristina Sorice Baracho. A legitimação ativa nas ações coletivas. Tese de doutorado. Belo Horizonte. Faculdade de Direito da UFMG, 2003, pág 147).
No tocante ao Interesse de Agir, este trata da necessidade da tutela jurisdicional para a efetiva reparação do dano causado ou para impedir que ocorra o evento danoso.
O Código de Processo Civil estabelece em seu Art.3º que "para propor ou contestar a ação é necessário ter interesse e legitimidade" e seu objetivo é evitar o acesso desnecessário ou indevido ao Judiciário, abarrotando ainda mais as mesas dos juízes, logo, devem ser levados às “barras dos tribunais” tão somente os casos que exijam de fato a prestação jurisdicional, cuja solução não possa ser encontrada diretamente pelos interessados.
Quanto ao interesse de agir, citamos novamente a professora Tereza:
Não se poderá, então, confundir-se interesse material ou substancial, com interesse instrumental ou formal; em torno desta dicotomia, formaram-se algumas correntes doutrinárias, uma dando relevo como condição da ação, o interesse do substituto, e outra desconsiderando sua exigência. (THIBAU, Tereza Cristina Sorice Baracho. A legitimação ativa nas ações coletivas. Tese de doutorado. Belo Horizonte. Faculdade de Direito da UFMG, 2003, pág 152).
A segunda condição da ação é a legitimatio ad causam, e a doutrina civilista clássica entende que só podem propor ou contestar quaisquer ações (CPC, art. 3º) aqueles que legitimamente figurarem nos pólos ativo e passivo da relação substancial levada ao Judiciário.
Desta forma, são legitimados para agir apenas os titulares dos interesses materiais em conflito, ficando patente a insuficiência de tal doutrina, de cunho individualista, limitada e estreita para resolver inúmeros casos cujo deslinde depende do acesso ao judiciário.
Surge, então, a legitimação extraordinária que confere legitimação para agir a quem não é titular do interesse material levado ao juízo, em oposição à legitimação ordinária. A legitimação extraordinária, também chamada substituição processual, ocorre quando se litiga em juízo, em nome próprio, em qualquer dos pólos, na defesa de direito alheio.
A legimatio ad causam, enquanto condição da ação, serve de obstáculo ao acesso judiciário quando usada e interpretada restritivamente, impedindo a apreciação de ações cujo pedido seja perfeitamente aceitável, se propostas por quem ordinariamente é legitimado para agir.
Trata-se de ardil manejado por operadores do direito despreocupados com a realidade subjacente a seus escritos, e que fazem letra morta os preceitos inseridos na Carta Maior, que relativizou a ênfase no privado para reforçar o coletivo.
A legislação pátria evoluiu sensivelmente a partir da Constituição de 1988, garantindo a legitimação extraordinária ao Ministério Público, sindicatos e associações, e ao cidadão, na defesa dos direitos tutelados pela ação popular, sobre o que não podem fazer “vista grossa” advogados, juízes e Ministério Público.
Para compreendermos a importância dos sindicatos, citamos o professor Antônio Gomes de Vasconcelos:
A opção pelo sindicato único e sua definição clara como órgão colaborador do poder público transformava-o em ente de natureza pública exercente de funções delegadas do poder público.
No novo regime os sindicatos posicionaram-se como anteparos frente ao levante das partes operárias diante da resistência, por parte das classes produtoras, à organização operária e à implementação de políticas sociais. Entendeu-se que a harmonização desta realidade antagônica deveria ser alcançada e ritmada por um regime legal intervencionista. Procedeu-se a aproximação entre os sindicatos e o Estado, reconhecendo-lhes a condição de órgãos necessários ao equilíbrio da ordem jurídica na economia nacional. (VASCONCELOS, Antônio Gomes de. A função dos conselhos tripartites dos núcleos intersindicais de conciliação trabalhista: a organização intercategorial das relações de trabalho (regulamentação, administração, prevenção e resolução de conflitos) orientada pelo princípio da subsidiariedade ativa. 2.002. Dissertação de mestrado. Universidade Federal de Minas Gerais. Faculdade de Direito, p. 89).
A terceira condição da ação, a Possibilidade Jurídica do Pedido, manda verificar se o pedido formulado na ação se enquadra abstratamente na lei; caso contrário haverá a rejeição sumária, sem apreciação do mérito pelo juiz, ocorrendo a chamada “carência de ação".
Não se pretende defender que o Judiciário aprecie ações com pedidos juridicamente impossíveis, contrapostos ao interesse social. Apenas se defende que a utilização, interpretação e aplicação do direito, se transformem em elementos que instrumentalizem justiça social.
A utilização cega e aparentemente apolítica da doutrina clássica das condições da ação conduz a um obstáculo à prestação jurisdicional, na medida em que se preconcebem na letra fria da lei e no inconsciente dos juizes, os pedidos que podem e os que não podem, sequer ter seus méritos conhecidos.
O Artigo 267 do Código de Processo Civil dispõe que extingue-se o processo, sem julgamento do mérito:
(...)
VI – Quando não concorrer qualquer das condições da ação, como a possibilidade jurídica, a legitimidade das partes ou o interesse processual.
Estas condições têm servido de justificativa constante daqueles que se baseiam na letra fria da lei, para julgar o que pode e o que não pode ter seu mérito conhecido. Esquecem-se os aplicadores do direito e seus julgadores, que a lei maior determina que “...a lei não pode impedir que o Judiciário aprecie lesão ou ameaça de direito” (Art. 5º, XXXV, da Constituição da República de 1988).
De acordo com o Artigo 90, do CDC, se aplicam às ações coletivas os dispositivos da Lei n.º 7.347/85, e as do CPC, naquilo que não contrariar suas disposições[4]. São, portanto, fontes subsidiárias instrumentais para aplicação no que tange às ações coletivas: a Ação Civil Pública, Lei 7347/85, e o CDC, Lei 8078/90.
As regras das ações trabalhistas coletivas, quando não disciplinadas, regem-se pelo CDC. Se compararmos fornecedor e empregador, e por outro lado, empregado e consumidor, temos que os primeiros causam um impacto coletivo quando atuam, sua atuação tem caráter de afetação social. Já os últimos recebem o impacto individualmente, não constituindo, conforme RESSEL “mais do que um elemento de um universo organicamente apreendido sob o ponto de vista do outro pólo da relação jurídica, o fornecedor/empregador”.[5]
A visão do Direito Trabalho aproxima-se da visão do CDC, ao colocar em campos próximos o empregado / consumidor, cuja inspiração é coletiva, enquanto o Direito Civil centra fogo na figura do devedor, de inspiração individualista.
Ainda seguindo o raciocínio de Sandra Ressel, temos a distinção entre os direitos abrangidos pelas ações coletivas previstas no Art. 81, CDC:
a) Ações concernentes aos Direitos difusos e transindividuais, cujos titulares são pessoas indeterminadas. Seus interesses geram laços circunstanciais, vinculados a um fato comum. São indivisíveis, insuscetíveis de apropriação individual, transmissão, renúncia ou transação.
b)Ações concernentes aos direitos coletivos ou transindividuais, cujos titulares são grupos, categorias, classes de pessoas ligadas por uma relação jurídica base. São indivisíveis, sendo insuscetíveis de apropriação individual, transmissão, renúncia ou transação.
c)Ações concernentes aos direitos individuais homogêneos, divisíveis e determináveis. Guardam perfeita identificação dos sujeitos relacionados com o objeto de seu direito. Sendo transmissíveis, suscetíveis de renúncia e transação, salvo direitos personalíssimos. (RESSEL, 1997, p. 613).
A maioria da doutrina concorda que os direitos difusos não cabem no âmbito trabalhista, vez que a representação sindical torna preciso o universo em questão, quais os trabalhadores, quantos são, quais são seus interesses feridos.
Na lição de Delgado:
Na verdade, a Lei n. 8.078/90, construída a partir de indução constitucional (arts. 5o, XXXII e 170, V, CF/88), incorpora, como inovações, institutos e figuras típicas e clássicas ao Direito Material e Processual do Trabalho. Parte da noção de ser coletivo (conceitua, por exemplo, como consumidor também a “coletividade de pessoas, ainda que indeterminadas” – art. 2o, e retira as lógicas conseqüências jurídicas dessa noção essencial. Assim, fixa (arts. 12, 13, 14 e 23/25) a responsabilidade objetiva do “fornecedor” (a responsabilidade objetiva é noção clássica ao Direito do Trabalho e timidamente aceita no Direito Civil); incorpora a teoria da desconsideração da personalidade jurídica (art. 28), tradicionalmente aplicada na jurisprudência trabalhista; dá notável relevância à substituição processual (arts. 81/82 e 91), de grande projeção no Direito do Trabalho (art. 8o, III, CF/88).... (DELGADO, 1999 p. 68)
a) Legitimação Ordinária – Representação – Os sindicatos estão legitimados a representar os associados, com a autorização expressa destes. É o que entende a maioria da doutrina, a partir da leitura do Artigo 5º, XXI, da Carta Magna: “entidades associativas, quando expressamente autorizadas, têm legitimidade para representar seus filiados”.
Também há normas na CLT que garantem a legitimidade da representação sindical, caso do artigo 791, § 1º, que trata da representação do sindicato em caso de dissídios individuais, combinado com o art. 513, alínea “a”, que lista dentre as prerrogativas do sindicato “[...] representar, perante as autoridades administrativas e judiciárias, os interesses gerais da respectiva categoria ou profissão liberal [...]”.
b) Legitimação ordinária – no tocante à defesa de interesses coletivos - Tem o sindicato legitimação ordinária para a defesa de interesses coletivos da categoria profissional.
A representação judicial do Sindicato perante o TRT quando esgotadas as tentativas de negociação coletiva direta, no chamado Dissídio Coletivo, é um exemplo desta legitimação.
Tem legitimação ordinária o Sindicato para promover os atos necessários à efetivação dos direitos da categoria, quando promove a Ação de cumprimento, em defesa dos direitos previstos em convenção ou acordo coletivo.
c) Legitimação ordinária – no tocante à defesa de interesses próprios - No tocante a interesses próprios, o Sindicato tem a legitimação prevista às pessoas jurídicas. Assim, tem-se que o sindicato é legítimo para propor ação de despejo contra inquilino inadimplente.
d) Legitimação extraordinária – Interesses individuais e transindividuais, a chamada Substituição processual - O CPC, em seu art. 6o, informa que ninguém poderá pleitear em juízo direito alheio em nome próprio. O entendimento da doutrina é que, se ocorrer tal situação, há de se ter previsão legal, e se dará pelo instituto da substituição processual, expressão cunhada por Chiovenda, também conhecida por legitimação extraordinária.
Se a legitimação extraordinária permite pleitear direito alheio em nome próprio, o fenômeno jurídico processual daí decorrente é a substituição processual.
Há quem questione a aplicabilidade do Artigo 6o do CPC. A este respeito, transcrevemos ementa de acórdão do qual foi relator o eminente magistrado do Tribunal Regional do Trabalho da 3a Região, Antônio Álvares da Silva:
Ementa: Substituição Sindical - Âmbito de abrangência - Interpretação do Art. 8º, III da Constituição Federal. A substituição processual da categoria, hoje elevada a nível constitucional, não se faz mais sob o signo limitativo do art. 6º do CPC, mas sob a inspiração da própria natureza da atuação dos sindicatos no âmbito do Direito Coletivo do Trabalho onde atuam, não como soma, mas como síntese de interesses individuais transpersonalizados em pretensões coletivas. Quando, no campo do direito individual do trabalho, as pretensões transcendem a esfera de seus titulares para se transformarem em interesse de toda a categoria, torna-se o sindicato automaticamente autorizado a reivindica-las na condição de substituto e não apenas de representante. A substituição, por ser conquista do sindicalismo moderno, deve sempre ser interpretada ampliativamente. (TRT 3ª R. – 3T - RO/2230/90 Rel. Juiz Antônio Álvares da Silva - DJMG - 24/05/1991 p. ).
No entendimento da doutrina tradicional, a substituição processual tem sido reconhecida como legitimação extraordinária, só sendo possível quando autorizada por lei e com base no CPC, em seu 6o Artigo. Isto assim se dá porque a elaboração doutrinária da substituição processual é civilista, por isso resistem os juristas em reconhecer a legitimação extraordinária da Constituição da República.
A substituição processual consiste na autorização por meio de lei para que alguém defenda em nome próprio, como autor ou réu, direito alheio. A substituição tem previsão legal no Artigo 6o CPC, e só se dá quando o substituído também tenha interesse que motive a defesa do substituído.
O direito de ação pertence ao titular do direito material, que se chama na doutrina de "juizo da oportunidade e da conveniência" de utilizá-lo ou não. Excepcionalmente este direito pode ser outorgado a quem não é titular do direito subjetivo material.
São efeitos da substituição processual: a) impossibilidade do substituto de confessar o pedido, renunciar, transigir ou praticar qualquer ato de disposição do direito; b) os efeitos da decisão produzem coisa julgada para o substituído, tornando imutável, não podendo ser discutido novamente em outra relação processual o mesmo pedido; c) em havendo reconvenção, o substituído deverá ocupar seu lugar no processo, na posição de reconvindo; d) o substituto responde pelas despesas da lide como se parte fosse.
No caso do Sindicato, ao se colocar na condição de substituto processual, não o faz mais no interesse particular dos associados, mas de toda a categoria, o que engloba, inclusive, os não associados. São interesses coletivos, todavia, adstritos à categoria.
Substituição processual no direito do trabalho é a possibilidade dos sindicatos de, em nome próprio, se fazerem presentes numa relação processual em defesa dos interesses da sua categoria. É possuir a legitimatio ad causam sem ser o possuidor direto do bem jurídico. É a exceção à regra de que somente aquele que é titular de direito pode reclamá-lo por meio da ação, ou seja, somente o titular do direito pleiteado possui a legitimatio ad causam.
A defesa dos interesses individuais é a defesa do interesse trabalhista relacionado à pessoa, geralmente o associado do Sindicato, e não à categoria em seu conjunto. É uma defesa voluntária, depende de manifestação expressa da pessoa, porquanto, a defesa efetiva-se por meio da representação. O sindicato agirá em nome do associado, e como já citado, se dá mais comumente quando da assistência jurídica prestada pelos Sindicatos aos empregados nas reclamações trabalhistas simples.
Faz-se muita confusão entre assistência e representação. Esta confusão está presente na redação da CLT. Vejamos o que é assistência nos dizeres de Saad:
Faculdade dada pela lei a qualquer pessoa, natural ou jurídica de participar de lide em ajuda a um dos litigantes, desde que prove ter legítimo interesse para assim agir, ou melhor, que é co-titular do direito em discussão”. (SAAD, 1995, p. 554/5).
A assistência encontra previsão legal no CPC, em seus artigos50 a55, aplicados subsidiariamente ao processo do trabalho. O assistente atuará como auxiliar da parte principal e exercerá os mesmos poderes, sujeitando-se aos mesmos ônus processuais que o assistido. Pode se dar de duas formas: a primeira quando o assistente tem interesse de que a sentença seja favorável a uma das partes, e neste caso não sofrerá diretamente as conseqüências da sentença; a segunda quando, na condição de litisconsorte, o assistente sofrerá conseqüências da sentença, que afetará sua relação jurídica com a parte contrária ao assistido.
O Art. 791, § 2º, CLT, faz confusão entre Assistência e Representação. O Artigo diz que, em caso de dissídios coletivos é facultada às partes a assistência por advogados, quando na verdade quer dizer representação.
Quanto ao menor de 18 e maior de 16 anos, a Assistência se dá por meio do pai, tutor ou responsável, e somente por meio deles é que se pode firmar contrato de trabalho. Entretanto, a lei não exige assistência alguma quando o mesmo menor outorga recibo de quitação de salários, exceto quando se trata de quitação final na rescisão contratual. Quando se tratar de absolutamente incapaz, haverá representação.
Tem-se que a substituição processual clássica encontra previsão legal restrita sob a ótica do Art. 6o do CPC. Entretanto, analisando sob o prisma da superioridade do texto constitucional do Art. 8o, III, encontraremos ali que se trata de legitimação extraordinária conferida aos sindicatos.
Transformar a legitimação extraordinária da Constituição, prevista no Art. 8o, III, em legitimação ordinária requer uma boa engenharia intelectual, mas não foge do óbvio, e assim fazendo seus defensores estão igualando o ente coletivo ao ente individual, confundindo as figuras de trabalhador e sindicato.
Tem-se que os “interesses individuais da categoria”, a quais se refere a norma constitucional não são aqueles concernentes à pessoa do sindicato, mesmo por que este na condição de pessoa jurídica, tem legitimidade ordinária para realizar a defesa de seus interesses individuais.
Seria redundante e inócuo constar em norma constitucional que o sindicato tem legitimidade para a defesa de seus próprios interesses.
Na lição de Eva Kocher:
Assim sendo, a substituição processual trabalhista dos sindicatos mostra diferenças significativas à substituição no processo civil. Esta legitima-se pelo interesse próprio do substituto processual na reclamação da pretensão. Por outro lado, o sindicato, enquanto pessoa jurídica, não tem interesse próprio no cumprimento dos direitos individuais dos empregados. Seu ‘interesse’ não é jurídico, institucional, mas apenas político. Cumpre as suas atribuições estatutárias e defende o cumprimento dos direitos legais e convencionais que, em representação dos empregados, ajudou a criar. (Kocher ,1998 p. 31-32)
Na esteira deste raciocínio, cabe ao sindicato a defesa dos interesses da categoria, sejam eles individuais ou coletivos, nas vias administrativa e judicial. Tem, pois, legitimação extraordinária, para, pela via da substituição processual, ingressar em juízo em defesa de seus representados, sejam associados ou não.
Enunciado 271 – TST – “Legítima é a substituição processual dos empregados associados, pelo sindicato que congrega a categoria profissional, na demanda trabalhista cujo objeto seja adicional de insalubridade ou periculosidade.”.
Tal entendimento consolidou o posicionamento do TST acerca da legitimação dos sindicatos para substituição processual dos empregados em se tratando de demandas cujos objetos sejam o adicional de periculosidade ou insalubridade.
Enunciado 180 TST – “Nas ações de cumprimento, o substituído processualmente pode, a qualquer tempo, desistir da ação, desde que, comprovadamente, tenha havido transação”.
O Enunciado 180 foi substituído pelo Enunciado 255.
“Dispõe o Enunciado 255: O substituído processualmente pode, antes da sentença de primeiro grau, desistir da ação.”
A crítica que se faz é recorrente no aspecto da fragilidade do empregado perante o poderio econômico empresarial. É a perpetuação da Justiça do Trabalho na qualidade de (In) justiça dos desempregados. Por razões óbvias, pouquíssimos empregados ousariam ingressar judicialmente contra o empregador, sob pena de perder o emprego.
Assim permite-se ao empregador pressionar o empregado a desistir da ação, tornando sem efeito a substituição promovida pelo sindicato. Torna-se letra morta o acesso à justiça, prevalecendo a desigualdade social por meio do predomínio do poderio econômico.
Dispõe a Lei 8073/90, interpretada pelo Enunciado 310 do TST:
Art. 3o – as entidades sindicais poderão atuar como substitutos processuais dos integrantes da categoria.
.....
Art. 5o – revogam-se as disposições em contrário.”
Pela presente norma, que teve seus demais artigos vetados pelo Presidente da República, o Congresso nacional visou implantar uma política salarial nova. Em razão do disposto no Art. 3o, formaram-se duas correntes: uma afirmava que os sindicatos, tanto de empregados quanto de empregadores, estavam legitimados a atuar como substitutos processuais dos membros da categoria em qualquer ação, individual ou coletiva; a segunda corrente afirmava que a lei limitava a substituição apenas em matérias salariais.
O Enunciado 310 que foi revogado, tentou por fim à discussão, impondo que o sindicato só substituía em casos de matéria salarial, interpretando restritivamente o preceito da lei.
Enunciado 286 - “O sindicato não é parte legítima para propor, como substituto processual, demanda que vise à observância de convenção coletiva”.
Esta redação negava ao Sindicato legitimação para substituição processual em ação de cumprimento de Convenções Coletivas. Foi superada pelo Art. 8o, VI, que exige a participação do sindicato nas negociações coletivas. Sendo o sindicato o responsável pela Convenção Coletiva, interesse legítimo tem o mesmo no cumprimento da norma.
A Resolução 98 de 18/09/2000, foi editada respeitando o entendimento derivado da aplicação do Art. 872, § 1o, que permite ao sindicato exigir o cumprimento da sentença normativa, e passou a ter a seguinte redação:
Sindicato. Substituição Processual. Convenção e acordos coletivos. A legitimidade dos sindicatos para propor ação de cumprimento estende-se também à observância de acordo ou de convenção coletivos.
O STF tem entendido que a Constituição permitiu tratamento diferenciado das demais entidades associativas, garantindo-lhe legitimação extraordinária para substituição processual, utilizando-se da combinação dos Artigos 5o, XXI e 8o, III.
Artigo 5o - ...
XXI – as entidades associativas, quando expressamente autorizadas, têm legitimidade para representar seus filiados judicialmente ou extrajudicialmente;
Artigo 8o - ...
III – ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas.
Veja que o Artigo 5o não tratou dos sindicatos, falou em “entidades associativas”. Quando o constituinte quis referir-se aos sindicatos, o fez expressamente, como no Art. 5o, LXX, dando-lhe legitimidade ativa para impetrar o mandado de segurança:
Artigo 5o - ....
LXX – o mandado de segurança pode ser impetrado por:
b) organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano, na defesa dos interesses de seus membros e associados.
Segundo o STF, a norma é de caráter especial, sobrepondo-se à norma geral, e em acórdão, o supremo julgou da seguinte maneira:
“...revela-se de caráter especial, afastando qualquer óbice de condição estabelecida na norma geral.
Daí resulta que o Sindicato, constituindo-se em entidade associativa de atuação específica no campo das relações trabalhistas, para a defesa dos ‘direitos e interesses coletivos ou individuais’ da categoria por ele representada, ‘inclusive em questões judiciais ou administrativas’, não depende de expressa autorização de seus filiados para representá-los em juízo. Noparticular, portanto, o sindicato recebeu tratamento distinto do conferido às ‘entidades associativas’ em geral, pelo art. 5o, XXI da Constituição, que a elas atribui ‘legitimidade para representar seus filiados judicial ou extrajudicialmente’, ‘quando expressamente autorizadas’. Reconhecemos, por isso, ser o sindicato impetrante parte legítima para pedir o mandado de injunção’.”. (trecho do voto do Min. Rel. Néri da Silveira, MI 3475/400, STF, Tribunal Pleno, DJ 08.08.94).
O entendimento do STF encontra-se consolidado a partir daí, em reiteradas decisões, pelo que transcrevemos o Precedente:
EMENTA: Sindicato. Substituição Processual. Legitimidade. Consolidou-se o entendimento, neste Supremo Tribunal, de que os sindicatos têm legitimidade para atuar na defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais dos integrantes da categoria, como substitutos processuais. Precedente: RE 202.063.
Recurso Extraordinário conhecido e provido.” (STF, Primeira Turma, RE n.º 213.782-1 RS, Relator Min. Octávio Gallotti, DJ 06.11.98)
Enunciado 310:
I) O art. 8º, III, da Constituição da República não assegura a substituição processual pelo sindicato.
II) A substituição processual autorizada ao sindicato pelas Leis 6.708, de 30.10.79, e 7.238, de 29.10.84, limitada aos associados, restringe-se às demandas que visem aos reajustes salariais previstos em lei, ajuizadas até 03.07.89, data em que entrou em vigor a Lei 7.788/89.
III) A Lei 7.788/89, em seu art. 8º, assegurou, durante sua vigência, a legitimidade do sindicato como substituto processual da categoria.
IV) A substituição processual autorizada pela Lei 8.073, de 30.07.90, ao sindicato alcança todos os integrantes da categoria e é restrita a demandas que visem à satisfação de reajustes salariais específicos resultantes de disposição prevista em lei de política salarial.
V) Em qualquer ação proposta pelo sindicato como substituto processual, todos os substituídos serão individualizados na petição inicial e, para o início da execução, devidamente identificados pelo número da CTPS ou de qualquer documento de identidade.
VI) É lícito ao substituído integrar a lide como assistente litisconsorcial, acordar, transigir e renunciar, independentemente de autorização ou anuência do substituto.
VII) Na liquidação da sentença exeqüenda, promovida pelo substituto, serão individualizados os valores devidos a cada substituído, cujos depósitos para quitação serão levantados através de guias expedidas em seu nome ou de procurador com poderes especiais para esse fim, inclusive nas ações de cumprimento.
VII) Quando o sindicato for o autor da ação na condição de substituto processual, não serão devidos honorários advocatícios.”
O Artigo 8o, III, da Constituição da República de 1988, deu elasticidade à representação sindical, entendendo o legislador que o sindicato abrange a toda a categoria e não apenas aos associados.
O Tribunal Superior do Trabalho, contrariando a Constituição da República e os entendimentos do Supremo Tribunal Federal, resolveu restringir a substituição processual, o que se depreende da leitura do Enunciado 310.
Preso às interpretações restritivas que permeiam o meio jurídico, em especial o trabalhista, considerou que a Constituição não legitimou o sindicato para substituir os empregados processualmente, em se tratando de interesses individuais homogêneos, de forma ampla.
Conforme demonstrado, o sindicato tem legitimidade prevista para agir na condição de representante processual dos membros da categoria. Representação possível tanto na fase de conhecimento, quanto na execução. Uma diferença entre a representação e a substituição é que na primeira, é possível abranger conhecimento e execução, na segunda é substituto apenas na fase de conhecimento, na execução, será necessária a autorização do trabalhador.
Há, no entanto, que se considerar a condição do sindicato enquanto ente coletivo, representativo dos interesses da categoria. Não há que se falar sequer em autorização assemblear, já que a legitimidade do sindicato advém da Carta Magna, também não há necessidade de procuração individual para que o sindicato prossiga na condição de titular do direito de ação, inclusive em fase de execução, justamente pelo maior desprendimento do interesse individual oriundo da relação entre substituído e substituto.
Além disso, o direito lesado e já discutido em fase de conhecimento tornou-se determinável e individualizado na fase de execução, pelo que, detendo o substituto processual poderes derivados da lei, poderá transigir quanto ao seu conteúdo e valor. A representação do trabalhador pelo sindicato se mantém enquanto uma necessidade individual do empregado, em questões afetas ao seu interesse próprio, aquelas que não dizem respeito aos interesses da categoria, sejam coletivos ou individuais homogêneos.
Verifica-se na CF/88 o estímulo à formação da chamada a terceira onda de acesso à Justiça, com a diversificação dos instrumentos de representação judicial e a multiplicação dos modos de solução dos litígios. Isso fica claro quando se coloca como função do MP "promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos" (Artigo 129, III).
Antônio Álvares da Silva, já alertava:
Portanto, aos sindicatos cabe hoje a defesa dos interesses coletivos em sentido lato, compreendendo não só os de natureza profissional e econômica mas também aqueles definidos pelo art. 81, item II, da Lei n. 7.347/85, desde que decorram das relações de trabalho. Estes últimos serão exercidos concorrentemente com o Ministério Público do Trabalho (127, III, da CF). (Antônio Álvares da Silva, 1993 p. 88).
É certo que a definição da legitimação extraordinária pode desafogar os tribunais às voltas com milhões de processos enquanto as partes ficam a aguardar vistas eternas.
As ações envolvem pedidos de cumprimento de convenção coletiva, data de recebimento de salário, reajuste, pagamento de hora extra. Em preliminares, os empregadores argumentaram que os sindicatos não podem substituir os trabalhadores no pleito.
Não se pode olvidar que a busca da Justiça para solucionar as demandas entre patrões e empregados sempre foi motivo de perseguição, de formação de “lista negra”, de se ver o empregado “com maus olhos”. A realização do ideal de justiçaem nosso Paíspassa, portanto, inclusive, pelo efetivo direito de ação. Convém lembrar que vivemos na era da informática, do transporte rápido de informações, o que fragiliza o indivíduo face às estruturas sociais coletivas, mais ainda face às corporações empresariais.
Segundo Dubugras:
A adequação do processo à nova realidade sócio-econômica que estamos vivendo, marcada profundamente pela economia de massa, invoca a necessidade de um programa de reforma do método do pensamento jurídico para aquisição de uma nova postura mental vulnerável à interpretação das normas jurídicas voltadas à realidade. (Dubugras, 1998, p. 137).
A substituição processual é, pois, a forma de acesso à justiça que mais convém à moderna relação de trabalho. A velha máxima da “união faz a força” mantém sua plenitude.
Sabemos que a efetivação deste direito, de forma ampla, só se dará após batalhas jurídicas, que já estão ocorrendo, e também sociais, aquelas promovidas pelos trabalhadores e seus respectivos sindicatos.
O sindicato é legítimo substituto na defesa processual coletiva dos direitos individuais dos membros da categoria, no entanto sua legitimidade está restrita à prática de atos ligados ao exercício do direito de ação do qual é titular. Na qualidade de substituto, o sindicato não pode renunciar a qualquer direito material, vez que não é titular. Pode, no entanto, desistir da ação, o que não impede ao titular do direito material de cobrá-lo em momento oportuno.
No tocante à transação, vez que esta requer a disposição do direito controvertido, esta não poderá ser praticada pelo substituto, também em razão de não ser ele o titular do direito.
Na hipótese de o Sindicato receber autorização assemblear, pelos membros da categoria profissional ou econômica, certamente que poderá transacionar parcial ou totalmente o direito discutido, vez que tal autorização expressa a vontade de cada indivíduo, no âmbito da coletividade.
Discute Dubugras, sobre a possibilidade da convivência entre a função conciliatória da Justiça do Trabalho e o instituto da substituição processual:
Entendemos que a conciliação continuará sendo prioritária na Justiça do Trabalho, o que ocorrerá nas ações coletivas de defesa de direitos individuais é a postergação do momento conciliatório para a fase de execução, quando o substituído, titular do direito material reconhecido, manifestará a sua vontade diretamente e poderá livremente transigir.( DUBUGRAS, 1998, p. 122)
Outra limitação imposta pelo Enunciado 310, IV, é a que permitia ao substituído acordar, transigir, renunciar, independentemente de autorização ou anuência do substituto. Concordamos com Dubugras, que afirma haver imprecisão técnica no Enunciado, pois faz confusão entre atos dos substituídos, e atos que implicam no direito de ação do sindicato.
Nesta linha de pensamento, quem tem poder para desistir da ação é o titular do direito de ação, o sindicato. O substituído não pode desistir da ação, nem mesmo quanto a si próprio, já que o sindicato representa os interesses individuais de parte ou de toda a categoria.
No tocante à renúncia, esta pode ocorrer, tacitamente, ou de forma expressa, na execução, quando o sindicato deixa de ser substituto processual e passa à condição de representante.
O acordo ou transação, em fase de execução, deverá ser feito expressamente, comprovando a vontade do substituído, por meio de seu representante ou pessoalmente.
A legitimação extraordinária, prevista constitucionalmente e ampliativa do instituto da substituição processual dos sindicatos, lega ao operador do direito e à sociedade em geral várias vantagens, dentre as quais podemos citar: o uso do direito de ação pelo empregado, minimizando o risco da dispensa pelo empregador; redução das demandas individuais em favor das coletivas, desobstruindo o acesso ao Judiciário; proporciona aos trabalhadores um forte instrumento de defesa de seus interesses; serve de estímulo à negociação direta, vez que, fortalecido o pólo hipossuficiente, certamente o empresariado buscará respeitá-lo e ouvi-lo.
Ademais, o modelo sindical é compatível com a ampliação da legitimidade do sindicato no tocante à defesa dos direitos de todos os membros da categoria. Estabelecido fosse, por hipótese, o regime da Pluralidade, haveria de se delimitar quais trabalhadores seriam atingidos pela substituição, já que a opção de filiação estaria delimitada.
Prevalecendo o regime da Unicidade sindical e, em consonância com o já exposto, de que a Constituição permitiu a substituição ampla, no processo de conhecimento, pelo sindicato, não se deve manter as dúvidas atualmente existentes.
O atual quadro de indefinição, especialmente as divergências entre TST e STF, atrasa a possibilidade de dar celeridade ao processo, atendendo aos interesses das partes que buscam o acesso à Justiça.
Certamente a decisão será política em razão dos inúmeros interesses postos em jogo, mas deve-se vislumbrar que a ampliação do caráter coletivo do processo, respeitando-se a legitimação extraordinária dos sindicatos, trará fôlego ao Judiciário para resolver demandas de maior monta. E estas demandas de maior importância podem satisfazer com mais vigor aos interesses da coletividade, o que, em suma, é o que se espera do julgador nos tempos modernos.
Como bem o disse Ada Pellegrini Grinover, a sociedade de massa, na qual cresce a demanda pelo provimento judicial, está a exigir uma reestruturação do esquema processual clássico, com forte ênfase civilista, para o processo que viabilize a rapidez no atendimento dos interesses em jogo.
Se seguir o espírito da Constituição da República e do Código de Defesa do Consumidor, certamente a Justiça do Trabalho já tem os instrumentos que facilitem tal solução, sem dúvida pela via da coletivização do processo e fortalecimento das entidades previstas constitucionalmente.
Assim, diante das exigências da pós-modernidade, precisamos ter em mente um direito que seja essencialmente preventivo de conflitos. Em uma visão pós-moderna, a prevenção de conflitos pode ser estabelecida pelo sistema do Núcleo Intersindical de Conciliação Trabalhista, idealizado e criado pelo professor Antônio Gomes de Vasconcelos, no município de Patrocínio.
Outrossim, a prevenção de conflitos também pode se dar através da co-gestão do empregado no estabelecimento empresarial e através do Direito Premial, propostas estas idealizada pelo professor Antônio Álvares da Silva.
3. Conclusão.
Não há litispendência entre ação coletiva para tutela de interesse individual homogêneo e a ação individual, pois se deve levar em consideração as peculiaridades dos direitos materiais coletivos para que o processo coletivo se revele apto a assegurar empiricamente, o respeito àqueles direitos.
Cite-se a professora Tereza Cristina Sorice Baracho Thibau, que descarta a possibilidade de litispendência, tendo em vista a aplicação subsidiária do Código de Defesa do Consumidor para dirimir a controvérsia:
Finalmente, no que tange à litispendência, o artigo 104 do Código de defesa do consumidor prescreve que ações coletivas não induzem litispendência para as ações individuais. O dispositivo se revela desnecessário, porque as ações (individual e coletiva) possuirão indubitavelmente, autores distintos; poderá haver identidade entre causa de pedir remota, mas não entre a causa de pedir próxima; e os pedidos serão distintos. Portanto, ausente a tríplice identidade , que poderia acarretar o reconhecimento da pendência da lide para julgamento, não há motivo para sustentar a existência de litispendência. (THIBAU, Tereza Cristina Sorice; NUNES, Bruno José Silva. Cenexão, continência e Litispendência no processo coletivo. MPMG jurídico, 2009, v. 18, p.35-40).
Quanto aos preceitos do artigo 104 do CDC, a professora Tereza Cristina Sorice Baracho Thibau, esclarece ainda sobre os efeitos da coisa julgada nas ações coletivas e individuais:
Saliente-se que o artigo 104 do Código de Defesa do Consumidor dispõe que os efeitos da coisa julgada erga omnes ou ultra partes não beneficiarão os autores das ações individuais que não requererem a suspensão das demandas singulares no prazo de trinta dias, contados da ciência, nos autos, do ajuizamento da ação coletiva. Assim, pela sistemática vigente, a suspensão dos processos individuais é fomentada, mas não decorre automaticamente da propositura das ações coletivas. (THIBAU, Tereza Cristina Sorice; NUNES, Bruno José Silva. Cenexão, continência e Litispendência no processo coletivo. MPMG jurídico, 2009, v. 18, p.35-40).
Quanto à abordagem legal sobre a temática, a professora Tereza Cristina Sorice Baracho Thibau, cita ainda o projeto de lei nº 5.139/09, que em seu artigo 37 disciplina a relação entre ações coletivas e individuais:
Como se vê, o dispositivo do projeto de lei prevê que não há litispendência entre ações coletivas e ações individuais, mas indica que estas ficarão suspensas até julgamento da demanda coletiva em primeiro grau. Uma vez que os lesados individualmente poderiam beneficiar-se da eventual procedência da ação coletiva, tal fato traria inegável avanço à legislação, ao permitir enorme economia de atividade jurisdicional. Ademais, o projeto de lei prevê a possibilidade de concessão de provimentos de urgência nas ações individuais durante o período de suspensão, o que possibilita ao órgão jurisdicional analisar a situação específica de cada demanda individual, resguardando, se for necessário, a situação jurídica dos indivíduos até que sobrevenha o provimento final na ação coletiva. (THIBAU, Tereza Cristina Sorice; NUNES, Bruno José Silva. Cenexão, continência e Litispendência no processo coletivo. MPMG jurídico, 2009, v. 18, p.35-40).
Em suma, as modificações contidas no projeto de lei visam aperfeiçoar o sistema de tutela de direitos ou interesses coletivos latu sensu, contribuindo assim, para a persecução da efetividade de direitos fundamentais.
A ação invididual é mais abrangente que a formulada pela entidade de classe. Ademais, a Constituição reconhece a mitigação do devido processo legal nos processos coletivos, pois, o membro da classe não tem o direito de ser citado, ouvido e defendido individualmente; tem sim o direito de ser citado, ouvido e defendido por um representante em ação individual. Ocorre que esta representação em juízo não pode ser feita por “um qualquer”, exige-se que seja feita somente pelo representante adequado. É preciso reconhecer que a inadequada representação viola frontalmente o direito ao contraditório.
Não há identidade entre os titulares ativos, nem entre os pedidos na demanda individual e na demanda coletiva. No máximo, poder-se-ia falar em identidade de causa de pedir remota (fatos), mas as causas de pedir próxima (fundamentos jurídicos do pedido) também seriam diferentes.
Para satisfazer à indagação, cumpre lembrar que na ação coletiva para tutela de interesses ou direitos individuais homogêneos, o autor da demanda atua em nome próprio na defesa de interesses de outrem (legitimação extraordinária ou substituição processual), enquanto na ação individual o titular da demanda é também o titular do direito material nela deduzido (legitimação ordinária). Por aí já se vê que não há identidade de partes no pólo ativo das duas demandas.
Além disso, o pedido na ação coletiva é obrigatoriamente genérico, pois a condenação será sempre genérica (CDC, art. 95), ao passo que na ação individual é permitido o pedido líquido. Finalmente, a coisa julgada na ação coletiva produzirá efeitos erga omnes; na ação individual, inter partes. Por interpretação lógica e sistemática, portanto, concluímos que não há litispendência entre ação coletiva para tutela de interesses individuais homogêneos e ação individual.
Mesmo diante de todos os fundamentos elencados acima, observa-se uma enorme divergência doutrinária a respeito da temática, pois parte majoritária da doutrina considera que há litispendência. Para essa parcela da doutrina há uma reprodução da ação anteriormente ajuizada, pois a definição de litispendência é extraída do artigo 301, §§1º, 2º e 3º do CPC, aplicável subsidiariamente ao processo do trabalho, tendo em vista a existência de lacuna normativa e ausência de incompatibilidade (artigo 769 da CLT).
Para a referida hipótese, a defesa coletiva de direitos está ligada á própria credibilidade da justiça, pois a sentença proferida em uma ação coletiva reduz os riscos de serem prolatadas decisões opostas sobre o mesmo tema, fenômeno natural quando as ações são ajuizadas individualmente e as questões são examinadas por magistrados diversos.
A jurisprudência trabalhista majoritária, na contramão do novo sistema de acesso coletivo à Justiça do Trabalho (jurisdição trabalhista metaindividual), advoga a tese da litispendência entre a ação individual e a ação coletiva em que o sindicato atua como substituto processual na defesa de interesses individuais homogêneos dos integrantes da categoria que representa.
Quanto aos limites objetivos, o artigo 6º do Código de Processo Civil disciplina que a legitimidade extraordinária reserva-se aos direitos autorizados por lei. Isto implica dizer que a norma constitucional tem eficácia limitada. Em uma análise sistemática do ordenamento jurídico, pode-se afirmar que a lei infraconstitucional já existe. Trata-se da Lei nº 8.073 de 1990, que garante a legitimidade dos sindicatos para atuarem como substitutos processuais dos integrantes da categoria.
Não há uma resposta sem promover a decomposição e re-configuração dos discursos anteriores. Não existem fatos, mas interpretações influenciadas pelas visões de cada intérprete. Assim, parte-se da necessidade de desconstrução do domínio do logos e da irrupção de uma nova noção de escritura que faça justiça ao excesso de discurso que se tem produzido acerca dessa temática. Há a negação da existência de uma verdade absoluta, pois na pós modernidade, o pensamento derridiano foi construído no diálogo com Nietzsche, Freud, Heidegger, Kierkegaard e Lévinas.
O Direito não pode ser compreendido como um sistema cuja finalidade é disciplinar de forma objetiva e coercitiva a conduta humana, ditando o que é e o que não é justo, o certo e o errado, bem como estabelecendo estruturas em que a sociedade se funda e opera.
O paradigma pós-moderno e o que quer que ele venha a se tornar ou concretizar no futuro, certamente não deverá se afastar dos objetivos que cada homem tem buscado através da história, ainda que pelos mais tortuosos e díspares meios: a harmonização de interesses e a prevalência da pessoa humana com a dignidade do seu modo de viver.
O presente artigo propõe uma análise inovadora da substituição processual e dos instrumentos de efetividade dos direitos sociais, bem como das discussões juríco-processuais impostas pelos conflitos de massa na pós-modernidade. Propõe-se o fomento de leituras e contraleituras que estabeleçam um diálogo crítico com as tradições de pensamento, bem como entre as mesmas.
Segundo a “teoria do diálogo das fontes” de Erik Jayme, o pluralismo pós –moderno gera a necessidade de coordenação entre as leis do mesmo ordenamento. Para o referido teórico do direito, o diálogo é que legitima o consenso, onde os valores e princípios têm sempre uma dupla função, muitas vezes antinômicos. Assim, a superação de paradigmas é substituída pela convivência dos mesmos na pós-modernidade.
Na linguagem do direito, o pluralismo significa ter à disposição alternativas, opções, possibilidades e é isso que se propõe com a participação popular na elaboração de normas: buscar na sociedade as possibilidades que não se alcançariam em um grupo menor. (JAYME, Erik. 2005, p.29).
A diversidade de informações, segundo Erik Jayme, deve acarretar o questionamento das máximas jurídico-filosóficas que instigue uma nova leitura da realidade provocando críticas e reflexões sobre afirmações, institutos ou métodos fixados pelo ordenamento Jurídico.
O professor Antônio Álvares da Silva possui uma visão pós-moderna muito bem fundamentada no Princípio da Concordância Prática, que se relaciona diretamente com a teoria do diálogo das fontes. Vejamos a opinião do douto professor em sua obra “Flexibilização das Relações de Trabalho”:
“Quando a Constituição acolhe dois valores, a interpretação correta é integrativa, que preveja um lugar para os dois, e não a excludente que acolha um em prejuízo do outro. Do mesmo modo que a lei não deve ter palavras desnecessárias, também e com muito mais razão as Constituições não devem ter valores inúteis. É o que se chama Princípio da Concordância Prática.” (SILVA, Antônio Álvares da. 2.002, p.81).
A pós-modernidade é um fenômeno cultural, um modelo que ainda está em construção, mas que supera a modernidade em seus paradigmas e conceitos, desconstruindo as fixadas “verdades” anteriormente impostas diante da gama de informações propiciadas pelo fenômeno da globalização. Logo, conclui-se que a teoria do diálogo das fontes está interligada a “teoria da desconstrução” de Jacques Derrida. Assim, pretende-se estabelecer um diálogo entre ambas teorias, de forma a harmonizar e analisar os possíveis caminhos a serem traçados na interpretação do Direito Processual para promover a proteção dos novos direitos ou interesses de terceira geração, denominados metaindividuais.
Para a ideia de “desconstrução”, não existem fatos, mas interpretações influenciadas pelas visões de cada intérprete. Há a negação da existência de uma verdade absoluta, pois o pensamento derridiano foi construído no diálogo com Nietzsche, Freud, Heidegger, Kierkegaard e Lévinas.
A Desconstrução é uma corrente teórica que pretende minar as correntes hierárquicas sustentadoras do pensamento ocidental, tais como, dentro/fora; corpo/mente; fala/escrita; presença/ausência; natureza/cultura, forma/sentido. A referida teoria procura decompor os discursos com os quais opera, revelando seus pressupostos, suas ambigüidades, suas contradições desfazendo as relações binárias utilizadas pelo mundo ocidental para estabelecer uma hierarquia ou supremacia de um termo sobre o outro.
Jacques Derrida é invariavelmente levado à necessidade de criar e reelaborar novo termo capaz de superar toda a relação dialética simples que nos permite reduzir o pensamento à ordem do calculável quando há o contraste entre termos bipolares. A desconstrução do conceito de liguagem, passa necessariamente pela desconstrução do signo, ou seja, após se desfazer a ilusão da presença prévia e soberana do significado, ressurge as significantes, que também são chamadas de “escrituras”.
Para Derrida, a idéia de um sentido preexistente não é mais uma idéia entre outras, é a condição da idéia de verdade. Assim, parte-se da necessidade de desconstrução do domínio do logos e da irrupção de uma nova noção de escritura que faça justiça ao excesso de discurso que se tem produzido acerca dessa temática.
Na pós modernidade surgem enigmas ocultos sob valores e teorias aceitas e respeitadas anteriormente, pois do ponto de vista derridiano, a certeza deve ser substituída pela crítica, pela reflexão e pela desconfiança. A consciência de algo ou a certeza de alguma teoria pode enriquecer-se, ganhar sentido e figura quando é explorada com profundidade e é abandonada pela crítica e pela desconfiança.
“O pensamento da coisa como o que ela é confunde-se já com a experiência da pura palavra; e esta com a experiência em si.” (Derrida, Jacques. 2.002, p.21).
“O sentido deve esperar ser dito ou escrito para se habilitar a si próprio e tornar-se naquilo que a diferir de si é: o sentido.” (Derrida, Jacques. 2.002, p.24).
É importante saber dialogar com a crítica, pois ela é capaz de desvendar o verdadeiro sentido que ultrapassa a própria significação de toda e qualquer escritura. Logo, criticar a “letra da lei” ou criticar o sentido da lei é afetar a mesma em prol da busca de um sentido que ultrapasse sua própria significação.
“Ser afetado é ser finito: escrever seria ainda usar de manha em relação à finitude, e querer atingir o ser fora do sendo, o ser que não poderia ser nem afetar-me ele próprio. Seria querer esquecer a diferença: esquecer a escritura na palavra presente, tida como viva e pura. Na medida em que o ato literário procede em primeiro lugar deste querer escrever, é na verdade o reconhecimento da pura linguagem, a responsabilidade perante a vocação da palavra “pura” que, uma vez ouvida, constitui o escritor como tal.” (Derrida, 2.002, p.27).
A palavra “pura” traz consigo o “perigo objetivista” que prioriza a forma e aniquila o sentido ou a intenção. Uma escritura pode trazer uma significação contrária a própria forma ou ao sentido, pois a significação pode se tornar uma variante da intenção que há por detrás da escritura. Logo, a crítica a “letra da lei” em uma perspectiva derridiana, é capaz de reconstituir e despertar sua historicidade em sua temporalidade própria.
A referida teoria parte do pressuposto de que o direito positivado e formal é insuficiente para regular a vida jurídica da sociedade. Ademais, a significação de uma escritura pode sofrer transformações para se adequar a pós-modernidade. Em outros termos, haverá sempre antinomias no ordenamento que deverão ser solucionadas tendo por base os princípios Constitucionais, mesmo que implícitos, e tratados internacionais que versem sobre Direitos Humanos.
Quanto a questão do perigo objetivista juntamente com os excessos de legislações esparsas com a conseqüente excessiva regulamentação jurídica, sem uma contrapartida social, cabe-nos citar a excelente crítica feita pelo professor Antônio Gomes de Vasconcelos:
O “vício legiferante” volta-se contra si mesmo e o resultado dessa “inflação legislativa” é, além do esvaziamento e descrédito da legislação trabalhista, o desenvolvimento de uma jurisprudência cada vez mais complexa e contraditória.
Por outro lado, a proliferação das “leis de circunstância” e regulamentos de necessidade é causa da desvalorização do direito estatal, do acirramento dos conflitos trabalhistas e da ineficiência da atuação das instituições responsáveis pela operacionalização desse instrumental normativo em todos os níveis institucionais (regulamentação, administração e jurisdição trabalhista). (VASCONCELOS, Antônio Gomes de. A função dos conselhos tripartites dos núcleos intersindicais de conciliação trabalhista: a organização intercategorial das relações de trabalho (regulamentação, administração, prevenção e resolução de conflitos) orientada pelo princípio da subsidiariedade ativa. 2.002. Dissertação de mestrado. Universidade Federal de Minas Gerais. Faculdade de Direito, p. 141).
Como núcleo do sistema jurídico, a Constituição é extremamente densa e aberta. Por ser aberto, tal sistema dialoga permanentemente com o ambiente sociocultural circundante, o que lhe permite adaptar-se às mudanças da realidade e as novas concepções de verdade e justiça. Ressalta-se que para Jacques Derrida, toda nova concepção deve ser questionada e colocada sob suspeita até que se explore incansavelmente sua significação.
Hodiernamente, os intérpretes do Direito devem atender aos fins sociais e ao bem comum, utilizando-se dos princípios constitucionais que, segundo a hermenêutica contemporânea, devem possuir primazia no sistema. Logo, um princípio Constitucional, mesmo que implícito, pode ser considerado hierarquicamente superior a norma expressa na constituição.
Nesse mesmo sentido, a “teoria da interpretação pluralista e procedimental da Constituição” de Peter Haberle, afirma que a jurisdição constitucional fornece a ultima palavra sobre uma interpretação democratizada, ou seja, repensada frente às responsabilidades do Estado Democrático de Direito. Ademais, ainda segundo a mesma teoria, a democracia está muito próxima da idéia que concebe a democracia a partir dos direitos fundamentais. Logo, a interpretação do Direito do Trabalho deve girar em prol da dignidade do trabalhador. Mas para Derrida, toda e qualquer interpretação sofrerá influências da história de vida, das concepções ou da bagagem intelectual de cada intérprete.
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[1] Mestranda em Direito pela UFMG. Advogada especialista em Direito do Trabalho. No período da graduação foi bolsista de Iniciação Científica do Conselho Nacional de Pesquisa- CNPq.
[2] O acesso real envolve o direito de efetiva participação e diálogo.
[3] MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. São Paulo: Atlas, 2003. p. 64.
[4] “E imprescindível observar que do CDC e da Lei da Ação Civil Pública emerge a base da sistemática das ações coletivas no direito brasileiro (tendo-se no Código de Processo Civil fonte subsidiária), e não só aquela relativa às ações que dizem respeito ao consumidor" (Alvim, 1.994 / 273).
[5] RESSEL (1997, p. 612)