SOBRE O DIREITO A TER DIREITOS: UMA REFLEXÃO SOBRE A RELAÇÃO ENTRE A CIDADANIA E AS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS

Por LARA WANESSA CASTRO FERREIRA DE ALMEIDA | 07/02/2025 | Direito

SOBRE O DIREITO A TER DIREITOS: UMA REFLEXÃO SOBRE A RELAÇÃO ENTRE A CIDADANIA E AS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS

 

ON THE RIGHT TO HAVE RIGHTS: A REFLECTION ON THE RELATIONSHIP BETWEEN CITIZENSHIP AND BRAZILIAN CONSTITUTIONS

 

Lara Wanessa Castro Ferreira de Almeida

Gabriele Sapio

 

RESUMO

O presente artigo pretende estabelecer uma reflexão sobre o processo histórico evolutivo da cidadania e sua relação com a evolução constitucional brasileira. O estudo, através de pesquisa bibliográfica com fins explicativos propõe a condução de uma nova linha de investigação jurídica de temáticas que apresentam uma interdisciplinaridade com a história constitucional brasileira, por isso se compromete a remontar o surgimento histórico da cidadania, sua manifestação no processo histórico constitucional brasileiro, que conta com 7 constituições outorgadas e promulgadas, e sua inevitável relação com a democracia. O objetivo é esclarecer como esse processo evolutivo constitucional e da cidadania brasileira, por possuir viés autoritário, acarretou embaraços na manifestação e compreensão do que significa “possuir cidadania”, especialmente após promulgação da Constituição de 1988, portanto, na vigência do Estado Democrático de Direito.

Palavras – chave: cidadania; constituição; democracia; direito; estado; evolução; fragilidade; subcidadania;


 

ABSTRACT

This article aims to establish a reflection on the historical evolutionary process of citizenship and its relationship with Brazilian constitutional evolution. The study, through bibliographical research with explanatory purposes, proposes the conduct of a new line of legal investigation of themes that present na interdisciplinarity with Brazilian constitutional history, which is why it is committed to retracing the historical emergence of citizenship, its manifestation in the constitutional historical process Brazilian, which has 7 constitutions granted and promulgated, and its inevitable relationship with democracy. The objective is to clarify how this constitutional evolutionary process and Brazilian citizenship, due to its authoritarian bias, caused embarrassment in the manifestation and understanding of what it means to “have citizenship”, especially after the promulgation of the 1988 Constitution, therefore, during the democratic rule of law.

Keywords: citizenship; constitution; democracy; law; state; evolution; fragility; sub-citizenship;

 

1 INTRODUÇÃO

 

Etimologicamente advinda do latim “civitas”, que significa cidade, as raízes mais remotas da conceituação do termo, “cidadania”, estão associadas à nacionalidade, noção influenciada pela natureza do surgimento das primeiras civilizações, um contexto histórico de guerra, que moldou o debate filosófico e político de um período que precipitou e induziu as primeiras experiências de Estado, Política, Democracia, Direito Constitucional e, consequentemente, as ideias sobre cidadania.

Comparada com o surgimento do homem, o surgimento das civilizações é particularmente recente na história, assim como o constitucionalismo, por isso existe a necessidade de debater o fenômeno, que está em pleno desenvolvimento, como a cidadania, isso porque, ela estabelece uma relação cada vez mais sólida com os ordenamentos constitucionais e outros direitos, tornando-se indissociável das sociedades contemporâneas.

Ao passo em que o conceito de cidadania se tornou mais sofisticado, exigindo um status de direito fundamental, mais necessária é a discussão sobre os impactos, dilemas, renovações e nivelação deste processo de evolução, a fim de repercuti-la como uma garantia em todas as sociedades, por isso existe a fomentação da produção de estudos e debates que, de forma geral, percebam a evolução histórica da cidadania nas constituições e na sociedade brasileira.

Fomentação que impacta a cidadania brasileira, forjada na esteira do autoritarismo, que reflete sua arbitrariedade na evolução desta garantia na ordem constitucional, e que tenta, a duras penas, adequar este direito às pretensões atuais, mas estagna na profunda cicatriz de desigualdade e violência que atravessa o tecido social, que define quem pode, ou não, exercer e usufruir da cidadania, criando um ambiente de difícil efetivação do direito, compreensão que norteia a investigação do presente trabalho.

Os impasses que permeiam a cidadania brasileira não se restringem apenas à sua falta de efetividade. A desigualdade brasileira nasce e se aprofunda, tangenciando a crise institucional, democrática e constitucional que aflige o país a anos. Por isso, dialogar sobre cidadania no mundo atual, e especificamente no Brasil, é falar sobre uma organização estrutural, econômica, política, jurídica e social do Estado que tenta superar suas crises e consolidar o direito de cidadania.

Nesse sentido, para compreender a dificuldade no desenvolvimento e efetivação da cidadania na sociedade brasileira, é necessária uma revisão bibliográfica específica acerca das raízes mais remotas e o surgimento da cidadania moderna, seguida pela observação da evolução e manifestação desse princípio na ordem constitucional brasileira, o impacto na presente conjuntura democrática e as perspectivas para o direito nesse século, questões que serão abordadas no presente trabalho.

 

2 RAÍZES REMOTAS E SURGIMENTO HISTÓRICO DA CIDADANIA MODERNA

 

Ao longo da história existem diversas discussões sobre o indivíduo e o seu papel como cidadão, principalmente no que concerne ao direito de exercer cidadania, dada a sua natureza “mais social do que as abelhas e os outros animais que vivem juntos” (Aristóteles, 1991, p. 4). Tratada como um processo histórico em constante evolução, comum à diversas sociedades, as manifestações e conceitos de cidadania distinguem-se em determinados tempos e espaços da história do mundo e, também, do Brasil.

O homem surge há aproximadamente 2,5 milhões de anos, e ao longo da sua história existem avanços técnicos- científicos que acarretaram mudanças no paradigma da produção, da economia, da organização, e das relações, sociais e trabalhistas, no entanto, no processo de formação das civilizações, que começou acerca de 12 mil anos atrás, a humanidade se viu compelida a discutir sobre si mesma, surgindo assim o chamado antropocentrismo, do grego “anthropos” (homem), e latim “centrum” (centro).

Na Idade Antiga, os filósofos gregos se dispuseram a exercer sua atividade de reflexão focados na emancipação do pensamento, ou seja, propondo um debate antropocêntrico, a “Alegoria da Caverna”, de Platão, exemplifica estas aspirações da filosofia, que incluíam o questionamento da organização social, jurídica, política e religiosa vigentes, por isso é importante salientar como o antropocentrismo foi fundamental na evolução do debate sobre cidadania, assim como as tragédias gregas.

No contexto da Antiguidade a “tragédia” era uma “instituição político-social de cunho democrático e cidadã, uma reflexão coletiva da cidade sobre o nascimento da cidadania e democracia” (Chaui, 2020). A tragédia grega cria o espaço público, em que a encenação sobre o nascimento da Pólis (cidade) e os primórdios da Política, provocam questionamentos e discussões sobre assuntos e conflitos que permeavam a vida na cidade, como, por exemplo, a justiça; a política; o direito; a democracia; a participação, o cidadão; e a cidadania;

A tragédia, neste contexto, possuía a finalidade de formar e educar a Pólis, o homem e a democracia. As novas leis, ditadas pelo Estado, eram retratadas nas peças em exibições que simbolizavam a transformação política, social, econômica e jurídica pela qual o povo grego passava. Sobre o vínculo entre Estado, cidadania e tragédia, Jean-Pierre Vernant e Pierre Vidal-Naquet afirmam:

 

A tragédia não é apenas uma forma de arte, é uma instituição social que, pela fundação de concursos trágicos, a cidade coloca ao lado de seus órgãos políticos e judiciários. Instaurado sob a autoridade do arconte epônimo, no mesmo espaço urbano e segundo as normas institucionais que regem as assembleias ou tribunais populares, um espetáculo aberto a todos os cidadãos, dirigido, desempenhado, julgado por representantes qualificados das diversas tribos, a cidade se faz teatro, ela se toma, de certo modo, com objeto de representação e se desempenha a si própria diante do público; (1999, p.10).

 

Nesse sentido, a tragédia não só envolve a capacidade de exercer cidadania, como define que pode exercê-la. O cidadão grego é aquele que possui aptidão na organização, formação, elaboração e execução das normas, ou seja, quem dispõe de capacidade deliberativa na Pólis. Segundo Aristóteles, “o que constitui propriamente o cidadão, sua qualidade verdadeiramente característica, é o direito de votar nas assembleias e de participação no exercício do poder público em sua pátria.” (Aristóteles, 1998, p.42).

A cidadania grega, apesar de contrapor as oligarquias, não era universal e surge no escopo da exclusão sistemática de uma grande maioria de estrangeiros, mulheres, crianças e escravos, isso porque, os direitos e a participação direta nas decisões da cidade, a cidadania, era reservada aos cidadãos gregos, portanto, homens, maiores de 21 anos, nascidos em Atenas e dotados de posses. Revelando que a cidadania nos seus primórdios foi restrita à critérios territoriais, políticos, sociais e econômicos da aristocracia patriarcal.

Ao longo da Idade Média, influenciada pela estrutura do sistema socioeconômico feudal, nota-se a divergência da guinada democrática proposta pelos gregos. O aprofundamento da estratificação social, que contrapunha senhores e vassalos, e a consolidação do Catolicismo, institucionalizou uma lógica de servidão e fidelidade, que reprimiu as liberdades sociais, causando o declínio da esfera pública em favor da privada, modificando, com isso, a realização da cidadania. Para Hannah Arendt, “foi a Igreja Católica que ofereceu ao homem um substituto para a cidadania antes outorgada exclusivamente pelo governo municipal” (1995, p.43).

A Igreja assume o poder da esfera privada, respondendo pela regulação do matrimônio, direito, governo, poder bélico e escravidão, suprimindo o espaço público e afastando os cidadãos da cidadania, que aprofundou a desigualdade em favor de uma minoria. A inquisição representou o mais significativo instrumento de coerção do poder teológico, “exercido de forma hierárquica e inquestionável” (Luz, 2007, p.93), e estagnou os avanços tecnológicos, filosóficos e culturais, e combaliu a liberdade, igualdade, democracia e cidadania.

O Catolicismo da idade média utilizou-se das cruzadas e do imperialismo, para exercer e expandir seus domínios, fortalecendo o mercantilismo, que levou a burguesia a ascender economicamente. Guiada pelos ideais iluministas, a burguesia deseja transformações na sua realidade sociopolítica, no que se referia à igualdade, liberdade de pensamento, disseminação e desenvolvimento do conhecimento, e, principalmente, influência política.

Na Idade Moderna a efervescência das Revoluções Burguesas, que defendiam as ideias de uma democracia liberal, que pretendia a regulação do poder, a partir da salvaguarda de direitos civis, econômicos e políticos dos cidadãos, os direitos de liberdade, conhecidos popularmente como a “primeira geração de direitos”, facilitaram a ruptura com as monarquias medievais e absolutas, e estabeleceram o Estado Liberal.

Com o nascimento do Estado, nasce também, segundo Moraes (2018, p. 35), o constitucionalismo escrito, principalmente com o advento da Revolução Francesa, e sua Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, nesse contexto torna-se mais forte “a necessidade da proclamação de declarações de direitos” (Moraes, 2018, p. 37), e, por consequência, ressurge a cidadania.

Mas a cidadania pretendida pela burguesia, estava associada ao individualismo econômico e o domínio da estrutura política absolutista e medieval, na prática gerou um desejo de conservar e emancipar o poder econômico e político, frente à Aristocracia. Nesse contexto, não existe a ampliação da cidadania a todos, mas sim a defesa do direito de gozar de privilégios, principalmente políticos, antes restritos à nobreza e ao clero. E a institucionalização do Estado Liberal gerou desigualdade e injustiça social para maioria dos cidadãos.

Nesse sentido os doutores em direito, Nuria Belloso Martín e Clovis Gorczevski, fazem comentários sobre a estrutura social no surgimento e desenvolvimento do Estado Liberal:

 

O fim do feudalismo e o surgimento dos Estados nacionais não altera a sociedade, que continua rigidamente dividida em estamentos. Nesse período, em toda Europa, mas especialmente na França, a situação é catastrófica: fome, miséria, direitos diferenciados, insensibilidade, desigualdade e ganância. Tudo isso gera uma grande insatisfação popular. Sérios questionamentos são levantados sobre as diferenças sociais e os privilégios. Revoltas e Declarações de Direitos são as consequências naturais; (2011, p.46)

 

Ou seja, percebe-se que o Constitucionalismo Liberal, dos séculos XVIII e XIX, sofreu críticas em relação à abstenção do Estado Liberal frente à subcidadania da maioria, que aprofundou ainda mais a desigualdade, e a sua subserviência às classes econômicas e políticas dominantes. A eclosão e consequências da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), foram essenciais para a decadência do Estado Liberal, isso porque, a partir do século XX, a dignidade humana é indissociável da conquista e concretização de direitos sociais.

A classe trabalhadora representava a maior unidade negligenciada por este Estado, sendo submetida às condições extenuantes de trabalho e à miséria, essas circunstâncias inflamaram a massa trabalhadora. Nesse contexto a Revolução Industrial e Russa, simbolizaram e influenciaram as lutas contra a exploração, desigualdade e subcidadania resultantes das políticas do Estado Liberal e do cenário econômico, político e social pós-guerra.

O Estado Social de Direito é resultado da luta histórica por direitos trabalhistas, sociais e assistencialistas, influenciado pelo Marxismo, o bem-estar social é primordial na discussão sobre a concretização da cidadania, para ser cidadão e exercer cidadania é necessário, como induz Hannah Arendt (2004, p. 332), “direito a ter direitos”. O Estado passa a observar a desigualdade como uma questão de desordem social que necessita de uma conduta proativa, voltada a promoção dos direitos de igualdade e cidadania.

Historicamente associado à promoção da igualdade, ou “direitos de segunda geração”, o Estado de Bem-estar social possui o compromisso de “converter em direito positivo várias aspirações sociais, elevadas à categoria de princípios constitucionais protegidos pelas garantias do Estado de Direito” (Moraes, 2018, p. 38).  A Constituição Alemã de Weimar (1919), engloba a tentativa de consagração destes direitos: sociais, econômicos; culturais; e assistenciais; e modificou, fundamentalmente, a cidadania, que passou englobar a capacidade do indivíduo garantir, não apenas a liberdade, mas ter condições para acessar o bem-estar social.

A inovação proposta pelo modelo constitucional alemão, influenciou o mundo, mas mesmo se afastando do individualismo e abstencionismo liberal, o Estado Social foi criticado, pela predominância do Poder Executivo sobre os outros poderes, contrariando a ideia de tripartição e equilíbrio entre poderes, proposta por Aristóteles, em “A Política” (século IV a.C), desenvolvido por John Locke no “Dois Tratados sobre Governo” (1689) e amplamente compreendida por Montesquieu, em “Espírito das Leis” (1748).

A pressão das instituições de poder econômico e sociopolítico, em decorrência das consequências da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), prejudicou a efetivação do Estado Social, que foi tolhido em suas pretensões pela incapacidade de garantir os direitos que previa no texto constitucional. E esta falta de garantia de direitos, principalmente à classe trabalhadora, facilitou a ascensão do Nazismo, segundo o doutor em direito, Gilberto Bercovici, a questão econômica é fundamental para a ascensão do Nazismo e fim do Estado Social:

 

E a crise econômica coloca em causa a própria ordem constitucional alemã, agravando os conflitos sociais. A partir do final da década de 1920, há uma campanha deliberada dos setores economicamente fortes de combate aos direitos e garantias sociais previstos na Constituição, bem como de enfraquecimento dos sindicatos de trabalhadores. A destruição da Constituição republicana e do Estado Social passou a ser vista como necessária para a solução da crise econômica. (Bercovici, 2019)

 

Com a ascensão e consolidação do Nazismo e todos os eventos que se sucederam, como a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), o holocausto e as bombas de Hiroshima e Nagasaki, o mundo se compeliu a evoluir o conceito de cidadania, à uma concepção mais moderna e ampla do termo. A fundação da Organização das Nações Unidas (ONU), em 1945, e firmação do acordo internacional de Declaração Universal de Direitos Humanos (1948), teve o propósito de globalizar a cidadania pautada na: dignidade humana; paz entre os povos: equilíbrio com meio ambiente: e multiculturalismo; portanto, voltados a promoção da “terceira geração de direitos”, os direitos de fraternidade e solidariedade.

Ainda no preâmbulo da declaração é considerado que:

 

[...] o desprezo e o desrespeito pelos direitos humanos resultaram em atos bárbaros que ultrajaram a consciência da humanidade e que o advento de um mundo em que mulheres e homens gozem de liberdade de palavra, de crença e da liberdade de viverem a salvo do temor e da necessidade foi proclamado como a mais alta aspiração do ser humano comum [...] (ONU, 1948)

 

Existe o esforço, ao longo da segunda metade do século XX, com suporte no neoconstitucionalismo, dedicado a ampliação do “guarda-chuva” da cidadania, voltando-se à promoção da igualdade de gênero, atentando-se a luta histórica feminina por emancipação e direitos civis e políticos, a proteção de crianças, adolescentes e idosos, e das pessoas historicamente perseguidas em razão de sua cor, religião e cultura. A declaração é pertinente no que diz respeito à essa dedicação, em seu artigo 1º e 2º fica esclarecido que:

 

Artigo 1.º Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade.

Artigo 2.º Todos os seres humanos podem invocar os direitos e as liberdades proclamados na presente Declaração, sem distinção alguma, nomeadamente de raça, de cor, de sexo, de língua, de religião, de opinião política ou outra, de origem nacional ou social, de fortuna, de nascimento ou de qualquer outra situação. Além disso, não será feita nenhuma distinção fundada no estatuto político, jurídico ou internacional do país ou do território da naturalidade da pessoa, seja esse país ou território independente, sob tutela, autónomo ou sujeito a alguma limitação de soberania. (ONU, 1948)

 

É a partir da criação da ONU e da Declaração Universal de Direitos Humanos, que a cidadania moderna avança pelos territórios da liberdade, igualdade, fraternidade, diversidade, integridade humana, cidadania universal e autonomia humana, lidando com alguns percalços, políticos, econômicos e sociais, específicos às determinadas culturas, criando, com isso, a necessidade de questionar e analisar a manifestação e plenitude dessa “cidadania global”, em locais que o processo de evolução da cidadania é tardio e conturbado, por exemplo, o Brasil.

 

3 O CASO BRASILEIRO, UMA CIDADANIA FORJADA NO AUTORITARISMO

 

A relevância de estabelecer diretrizes e observações sobre a relação entre cidadania e as Constituições do Brasil, ajudam a compreender a evolução do conceito e efetividade da cidadania no processo evolutivo constitucional. É pertinente compreender que mesmo gozando de status de direito fundamental e princípio constitucional, no Brasil existe a persistente limitação do conceito de “cidadania” ao direito de exercer o sufrágio, e, ao mesmo tempo, a naturalização da “subcidadania” no processo de modernização do país que, segundo o sociólogo brasileiro Jessé de Souza (2018 p. 190), significou a institucionalização de um “padrão de classificação e desclassificação social”, que naturalizou, de forma virulenta, as desigualdades sociais históricas, e prejudicam a concretização do Estado Democrático de Direito.

A guinada constitucional brasileira começa no século XIX e se intensifica no XX, invadido em 1500, e colonizado a partir da década de 1530, o império português regeu o Brasil durante 322 anos, até a Independência do Brasil, em 1822, instituindo uma sociedade escravocrata, negligente e violenta que assimilou e naturalizou o autoritarismo. Essa dinâmica enviesada de poder político, social, econômico e jurídico estruturou o país, distorção que aprofundou a relação controversa entre o cidadão brasileiro, a cidadania, e a democracia.

Fruto do imperialismo, de 1500 até o processo de independência não houve sinais de cidadania, tampouco de democracia no Brasil, numa sociedade escravocrata, há a ausência de cidadãos, por que imperava uma lógica social na qual as elites oligárquicas dominavam e a maioria era subjugada. Estas elites conservavam privilégios, enquanto o resto da população passava por processos de desumanização, logo, existia uma sociedade ausente de direitos como igualdade, liberdade e dignidade. A lógica de privilégios, dominação e restrição de direitos, vigente no período colonial, tornou a sociedade brasileira vazia de cidadania.

Para Jean-Paul Sartre, no prefácio de Os Condenados da Terra (1961), de Frantz Fanon, não fazia muito tempo que “a Terra tinha dois bilhões de habitantes, isto é, quinhentos milhões de homens e um bilhão e quinhentos milhões de indígenas. Os primeiros dispunham do Verbo, os outros pediam-no emprestado” (1961, p.3), consideração que comunica com a lógica de direitos e estrutura socioeconômica que permeia a história do Brasil, que constrói uma cidadania brasileira marcada pelo autoritarismo e segmentada por critérios econômicos e sociais. A desigualdade brasileira é uma construção histórica e constitucional, por problemas na efetividade jurídica e social do texto constitucional, principalmente no que concerne à concretização dos direitos sociais.

Àqueles mais abastados era restringida a cidadania, o que gerou uma exclusão institucional dos brasileiros, não brancos, pretos e pobres, impedidos institucionalmente de ascender social, jurídica, política e economicamente. Até 1822 o Brasil era uma colônia, nesse contexto há ausência completa do Estado, e o poder de decisão era concentrado na mão de uma elite minoritária econômica, bélica, individualista e escravocrata, as funções públicas eram exercidas, de forma divergente e em causa própria.

O processo de independência não possuiu vínculos com lutas populares, não aboliu a escravização, e, por ter ocorrido na esteira de um golpe de Estado, inaugurou o mau legado de naturalização do autoritarismo e arbitrariedade nos processos constitucionais do país, fatos que impactaram a experiência da cidadania no Brasil.

Segundo os juristas Paulo Bonavides e Paes de Andrade (1991, p.5), a história constitucional do Brasil, possui “um fundamento elitista porque o povo não a escreveu”. O constitucionalismo brasileiro é impactado por momentos de cisão e reconstrução, principalmente através de golpes de Estado e processos de redemocratização, nesse tempo foram outorgadas e promulgadas 7 constituições brasileiras, e estas refletiam contextos sociais, políticos, jurídicos e econômicos diferentes entre si, e a sua maioria foi instituída Pós-Proclamação da República, em 1889.

A redação da primeira constituição brasileira foi atribuída à 100 parlamentares, numa Assembleia Constituinte, em 1823, e por contrariar os interesses do Imperador, esse usou das forças armadas para dissolvê-la e prender os parlamentares, golpe de estado que deu origem à primeira constituição brasileira, a “Constituição Imperial” que, redigida e outorgada pelo Imperador D. Pedro I em 1824, perdurou até o fim do império.

A Constituição Imperial, pela sua formação e característica, é uma constituição absolutista, liberal, elitista e autoritária, e defendia os interesses da classe dominante, formada pelo clero, aristocracia, forças armadas, juristas, fazendeiros. O ordenamento definiu o governo como: monárquico e hereditário, e a aptidão ao voto, no concerniu a Constituição, era obrigatório, censitário e indireto.

 

As eleições eram indiretas e aconteciam em dois graus. Os eleitores de primeiro grau (Votantes de Paróquia) tinham de ser homens com mais de 25 anos de idade, católicos e com renda mínima de 100 mil réis. Eles escolheriam os eleitores de segundo grau (Eleitores de Província), que, por sua vez, deveriam ter renda anual mínima de 200 mil réis. Esses eleitores de segundo grau (de Província) escolhiam os deputados e senadores provinciais e gerais, lembrando que os senadores eram vitalícios. (Sobral, 2024)

 

A instituição do simbólico Poder Moderador, disciplinado pela Constituição, no Título 5º, Capítulo I, dava ao imperador o poder de nomeação dos senadores, dissolução da Câmara e convocação de eleições para renová-la, direito de vetar as decisões da Câmara e do Senado, nomear ou demitir Ministros do Estado e suspender magistrados. É perceptível que este poder criou mecanismos para exercer sua governança de forma autoritária, por isso, a Constituição de 24 foi amplamente conhecida por “seu baixo grau teórico de legitimidade e suas discrepâncias com a inteireza democrática e representativa do século revolucionário que proclamara os direitos do homem e sagrara a inviolabilidade constitucional da separação de poderes” (Benevides, 2001, p.191).

Uma sociedade autoritária, violenta e escravocrata possui cidadania restrita, e apesar da constituição possuir artigos como o 179, parágrafo XIX, que previa a abolição de “açoites, a tortura, a marca de ferro quente, e todas as penas cruéis” (C.F. 24), houve a popularização do termo “lei para inglês ver”, visto que, na prática, a demagogia da lei estabeleceu um Estado arbitrário, negligente, antidemocrático, escravagista e vazio de cidadania. Apenas o limitado Título 2ª da Constituição mencionava o cidadão brasileiro, de forma restrita à nacionalidade.

A desigualdade presente no primeiro e segundo reinado se revelam quando há o entendimento sobre a divergência entre os status de “brasileiro” e “cidadão brasileiro”, isso porque, na prática o Brasil Império reservou aos “cidadãos brasileiros” a restrita possibilidade de acessar direitos e explorar àqueles impossibilitados de ascender socialmente, os desumanizados, os párias, os “brasileiros”.

A abolição da escravidão, com a Lei Áurea (1888), não modificou o paradigma de restrição da cidadania, o Brasil a essa altura já lidava com as consequências do racismo institucionalizado em quase 400 anos de escravização, e sem reparação, e um Código Penal (1890), incorporado pelo ordenamento seguinte, que negligenciou o crime de racismo e discriminação, e instituiu a criminalização da mendigagem, houve na pratica a marginalização e aprofundamento das desigualdades, especialmente entre os descendentes de escravizados.  

A “derrocada do trono e na reorganização republicana, no interregno em que se apagam as carreiras longamente consolidadas e se ateiam as ambições sufocadas, a palavra de ordem será a do Exército, sob a liderança de Deodoro da Fonseca” (Faoro, 2012, p. 417), a insatisfação com o poder absoluto gera outro golpe, e assim foi proclamada a República em 1889.

A primeira Constituição da República do Brasil, a “Constituição Republicana”, promulgada em 1891, marca o fim da Monarquia e do poder moderador, e inicia o federalismo, marcado pelo liberalismo e avanço da autonomia dos Estados, “as alterações da segunda Constituição brasileira com respeito à Carta outorgada de 1824 foram, portanto, a introdução da república, da federação e da forma presidencial de governo” (Benevides, 2001, p.198).

Há a tripartição entre poderes: Executivo, Legislativo e Judiciário, o poder executivo é de responsabilidade do Presidente da República com mandato de 4 anos, o legislativo foi dividido em Câmara dos Deputados e Senado, e os senadores deixaram de ser vitalícios. Em relação aos eleitores, apesar do fim do voto censitário, o Título IV do ordenamento definia que somente homens alfabetizados e maiores de 21 anos poderiam votar abertamente, colhendo o legado do ordenamento anterior, excluiu uma parte significativa da população entre mulheres, analfabetos e pobres, esses majoritariamente negros, impedindo-os de exercer o voto.

 

Ao excluir os analfabetos, a ampla maioria dos cidadãos acima de 21 anos era mera espectadora nas eleições. Entre os negros a situação era muito pior. Pelos dados de 1872, quando ainda havia escravidão, dos 1.509.403 cativos, apenas 1.403 eram alfabetizados. (Villa, 2011, p. 21-22)

 

Ainda no Título IV, pela primeira vez, foi disciplinada simbolicamente a “Declaração de Direitos”, na Seção II, que tratava dos direitos referentes à liberdade, segurança individual e propriedade, não houve aprofundamento da matéria da cidadania já que os direitos dos cidadãos eram restritos aos direitos políticos e civis, e à recente república era mais conveniente efetivar estruturalmente a transição da monarquia para o federalismo, do que efetivar direitos sociais.

 

O progresso era tudo, os direitos do cidadão não existiam, inclinando, tais empresas, as classes altas para o evolucionismo de Spencer, apto a abrigar as teorias racistas que, ao justificarem-nas, davam-lhe uma base biológica. Para citar exemplos: houve a modernização médica, com a vacina obrigatória, uma obra que bem poderia ser feita por um personagem de Ibsen, a modernização urbanística, no Rio de Janeiro, que expulsou moradores e proprietários pobres de suas casas sem que se lhes permitisse o acesso ao juiz. (Faoro, 2012, p.112)

 

Enquanto esteve em vigência, a restrição do exercício da cidadania, facilitou a manipulação da democracia, já que instituiu a política do café com leite e no Brasil profundo facilitou o avanço do coronelismo e do voto de cabresto, que perduraram durante a vigência dessa constituição. A corrupção brasileira nasceu com a chegada da primeira caravela na orla do país, e a instituição da democracia e da república, somada às consequências da escravidão, criou uma trágica naturalização da desigualdade no âmago da sociedade brasileira e do desvirtuamento do aparelho público, destruindo o exercício da cidadania.

A década de 20 ficou conhecida pelas “rebeliões tenentistas”, em face das políticas antidemocráticas da República Velha, e a “Revolução de 30” instituiu o golpe de estado que tornou Getúlio Vargas presidente, e em 1932 esse promulgou o Código Eleitoral que instituía o voto feminino, a Justiça Eleitoral e o voto secreto, no entanto, a década também se destacou pelos avanços do integralismo, fundamentado no fascismo europeu, no Brasil.

Nesse contexto nasce a Constituição de 1934, a mais curta da história, que possui alguma influência do constitucionalismo social, isso porque, incorporou a reforma do Código Eleitoral de 1932, que permitia o voto feminino e secreto. Getúlio percebe a necessidade de unificar as massas mais marginalizadas da República Velha, buscando evitar novas revoluções, por isso decide pelo avanço de direitos sociais, principalmente no direito do trabalho, com a criação do ministério do Trabalho, edição de leis trabalhistas, criação da CTPS, instituição do salário-mínimo, firmação das jornadas de trabalho e a criação dos sindicatos, no entanto, houve a restrição da atuação dos sindicalistas, especialmente à esquerda do espectro político.

Esta constituição, apesar dos avanços, a “Declaração de Direitos” no seu título III, restringiu a cidadania aos direitos políticos, portanto à noção de nacionalidade, e o ordenamento teve uma vida curta, por que, para Paulo Bonavides a:

 

Constituinte que a promulgou não auferiu a necessária densidade legitimante que é de exigir de um colégio de soberania. As lideranças do ancién régime republicano permaneciam no exílio político, afastadas de toda participação. As forças políticas situacionistas, por sua vez, elegeram Presidente da República, por via indireta, o ex-ditador e chefe revolucionário do movimento de outubro de 30, um homem cujo apetite pelo poder o levou três anos depois a desferir o golpe de Estado de 10 de novembro de 1937. (Bonavides, 2001, p.203)

 

Devido a estrutura geopolítica que antecedeu a Segunda Guerra Mundial, e na sombra da “ameaça comunista”, Vargas fecha o congresso e logo a Constituição de 1937 seria outorgada, a chamada “Constituição Polaca” que, inspirada no fascismo e totalitarismo europeu, regeria a ditadura do Estado Novo, em seu preâmbulo (CF, 1937) existe o “aviso” da necessidade de soluções de “caráter radical e permanente” para combater a “infiltração comunista”. A cidadania é novamente associada aos direitos políticos, e à nacionalidade.

Com a declaração do estado de guerra, a ditadura Vargas, mesmo combatendo o nazifascismo, utilizou-se dessa ideologia autoritária, para endurecer a perseguição contra partidos e opositores, cassando direitos políticos, e suspendendo, vide Decreto nº 10.358, de 1942, os direitos e garantias individuais de ir e vir, de associação e reunião, do habeas corpus, de propriedade e manifestação de pensamento. Por isso, apesar dos avanços sociais na matéria do trabalho, a Constituição Polaca ficou conhecida por ser uma carta autoritária que “inspirava-se realmente nas instituições e na legislação nazifascista” (Bonavides, 1991, p. 343).

A iminente derrota do nazifascismo, fez do renascimento da democracia uma necessidade, nesse contexto, o afastamento do autoritarismo constitucional, também parecia um objetivo almejado. Noberto Bobbio, faz a reflexão sobre o contexto de pós segunda guerra, e a experiência de combate ao fascismo de Mussolini, que, em parte, se confunde com a retomada da democracia no Brasil:

 

Dividiram, ou melhor dizendo, racharam o curso da vida de cada um de nós em um “antes” e um “depois”: um “antes” em que procuramos sobreviver mantendo algum inevitável compromisso com nossa consciência e aproveitando até os menores espaços de liberdade que o regime fascista, ditadura mais branda que a nazista, nos concedia; um “depois” no qual, através de uma guerra civil às vezes impiedosa, nasceu nossa democracia. (Bobbio, 1997, p.157)

 

Em diferentes circunstâncias a Carta de 1946 foi promulgada, a “chama democrática” também queimava no Brasil, e outro golpe militar seria a sua combustão, Getúlio é derrubado, e em Assembleia Constituinte é promulgada a 5ª Constituição do Brasil que era, até então, a mais democrática da história brasileira. A Carta Magna dispunha o símbolo do seu comprometimento com processo de redemocratização, no art. 141, incisos 5 e 13, neles: 

 

§ 5º - É livre a manifestação do pensamento, sem que dependa de censura, salvo quanto a espetáculos e diversões públicas, respondendo cada um, nos casos e na forma que a lei preceituar pelos abusos que cometer. Não é permitido o anonimato. É assegurado o direito de resposta. A publicação de livros e periódicos não dependerá de licença do Poder Público. Não será, porém, tolerada propaganda de guerra, de processos violentos para subverter a ordem política e social, ou de preconceitos de raça ou de classe; (...) § 13 - É vedada a organização, o registro ou o funcionamento de qualquer Partido Político ou associação, cujo programa ou ação contrarie o regime democrático, baseado na pluralidade dos Partidos e na garantia dos direitos fundamentais do homem;” (CF, 1946)

 

As memórias da ditadura deixaram um legado na ordem constitucional, que a época submeteu o Estado brasileiro a uma diretriz baseada na efetivação da cidadania, nota-se que existe um compromisso teórico, com a liberdade e o cidadão, se afastando assim do autoritarismo praticado pela ditadura de Vargas, o voto no Brasil passa a ser universal, direto e secreto, mas é notável que os direitos de Cidadania continuam sendo associados aos direitos políticos.

O respeito a liberdade na manifestação de pensamento e no direito de associação, motiva o estabelecimento de uma sociedade apta a exercer sua cidadania, baseada numa constituição cujo artigo supracitado representa essa postura proativa ligada a efetivação de direitos fundamentais e, em consequência disso, reforça a visão de que a remontada da democracia, para além de um direito, torna-se uma necessidade, por isso e pela Constituição de 1946 surgir antes da Declaração Universal do Direitos Humanos, seu texto é considerado original e inovador.

No entanto, o constitucionalismo brasileiro é atravessado pelo esvaziamento da cidadania, assim a efetivação de mudanças concretas no tecido social é impactada pela profunda desigualdade presente no país. A construção da subcidadania e naturalização do autoritarismo, somada à crença popular de que a mudança no tecido social era possível apenas através do Populismo, introduzido por Vargas, esvaziou a fé popular no texto constitucional.

 

O fato então e que a consciência autoritária não se viu atacada em sua raiz, e o populismo se fez uma alternativa trilhada de maneira irresponsável. Ninguém percebeu que a Constituição por si só não poderia garantir os princípios expressos em seu texto. Não se percebeu sobretudo que essa ambiguidade se tornaria insustentável por muito tempo. (Bonavides, 1991, p. 410)

 

As aspirações constitucionais entram em conflito com a realidade social, isso porque, o Estado Social proposto pelo texto constitucional é instável e abstrato, e a Guerra Fria, disputa geopolítica entre União Soviética, comunista, e Estados Unidos, capitalista, foi o divisor de águas que dificultou ainda mais a efetivação do Estado Social. A mácula imposta ao comunismo nas Américas tornou ainda mais complexa a promessa e efetivação dos direitos sociais.

O último presidente desse período conturbado de redemocratização, João Goulart, não tinha o apoio necessário do Congresso Nacional para efetivar reformas consideradas “impopulares”, como por exemplo a reforma agrária, e concretizar as premissas e promessas da Carta até então vigente. A estrutura na qual o Estado brasileiro fundou sua política era corrompida pelos interesses econômicos e políticos de uma oligarquia que se fez ainda no período de colonização, e o “inimigo invisível”, o comunismo, tornou-se inimigo, primeiro da elite política, pelo projeto revolucionário e depois da sociedade brasileira pelo estigma.

 

As demandas sociais e económicas só poderiam ser concretizadas com apoio substancial do Congresso Nacional e da sociedade em geral. João Goulart não consegue apoio político suficiente para efetuar suas reformas de base, entrando em conflito com vários grupos e com o próprio Congresso. Seu discurso desloca-se para a esquerda. Uma polarização cada vez mais acentuada surge no cenário político nacional. O contexto da Guerra Fria e anticomunismo, vindos desde 1945 na esfera mundial, também compõe o berço de onde surgiu o Estado de Segurança Nacional. A Revolução Cubana (1959) e a Crise dos Mísseis (1962) preocuparam os EUA, que alteraram sua política externa em relação aos países da América ao reforçar a ideia de que os governos nacionais deveriam se proteger contra a subversão (inimigo interno). (...) Nesse clima de instabilidade ocorre o golpe de 1964. (Lopes, 2009, p. 597-598)

 

Com o golpe militar, o país retrocedeu na sua escalada democrática, após uma curta e agitada tentativa de restabelecer sua democracia, as ameaças e investidas contra os direitos políticos e fundamentais, tornam-se realidade, e existe todo um Estado Militar pautado na conservação do poder, através do cerceamento da cidadania, e no esvaziamento da democracia.

 

As comoções políticas de raiz social fizeram-na desembocar por obra da corrupção do regime presidencial na segunda ditadura do século, a mais longa e perniciosa por haver mantido aberto um Congresso fantoche, debaixo de uma Constituição de fachada, outorgada pelo sistema autoritário, que ao mesmo tempo censurava a imprensa e reprimia a formação, pelo debate livre, de novas lideranças, sacrificando assim toda uma geração. Tal aconteceu em 1964 quando o País atravessou durante duas décadas a mais sombria ditadura militar de sua história. (Bonavides, 2001, p.204)

 

O regime ditatorial foi guiado por um ordenamento vazio que tentou “camuflar” o completo retrocesso na escalada democrática e cidadã, sujeitando o país a arbitrariedade, corrupção e violência das forças armadas. A Constituição de 1967 foi outorgada depois de 3 anos do início da ditadura, na tentativa de “legitimar” o golpe militar, mas na prática os atos institucionais, foram, de fato, o ordenamento seguido pelo regime, o Ato Institucional nº 1 e nº 2, respectivamente, davam o direito de suspender e cassar direitos políticos, e pôs fim nos partidos políticos existentes; nos Atos nº 3 e nº 4, houve a supressão das eleições diretas dos governos estaduais e das prefeituras das capitais, e convocação do Congresso para elaborar a nova Constituição, a partir desse momento a ditadura foi progressivamente endurecendo.

O ataque expresso contra as liberdades e outros direitos fundamentais, o estabelecimento de uma “caça às bruxas” aos “subversivos”, que simbolizou a criminalização da oposição política ao regime ditatorial vigente, sujeitou os opositores à supressão total de seus direitos políticos e fundamentais, e tal privação culminava com uma perseguição deliberada, censura e ameaças a integridade e humanidade dos “desobedientes”.

O ápice veio com a baixa do Ato Institucional nº 5, em 13 de dezembro de 1968, “um dos atos mais arbitrários da história republicana" (Villa, 2012, p. 70), engloba os 4 primeiros atos institucionais, dando amplos poderes ao presidente, estabelece o fechamento do Congresso, a intervenção do governo federal nos Estados, constituição da censura prévia e suspensão do habeas corpus nos casos considerados pela ditadura como “crimes políticos”. A repressão instrumentalizou a prática da tortura, um dos recursos mais cruéis presentes na história do Brasil, com isso o regime contrariou as determinações da Declaração Universal dos Direitos Humanos, artigo V de que “Ninguém será submetido à tortura nem a tratamento ou castigo cruel, desumano e degradante” (ONU, 1948).

A década de 70, por ter sido o momento mais crítico da ditadura, marca a perda de apoio moral e social do regime ditatorial, e a falta de incentivo externo, recorrente da crise mundial, e pressão interna enfraqueceram o regime. Para José Reinaldo de Lima Lopes, “ao longo da década de 1970, o regime ditatorial já apresentava sinais de desgaste” (2009, p. 601), isso porque, segundo o autor a mudança geopolítica e econômica internacional, apresentou um cenário de estagnação e inflação que cessou o financiamento internacional ao regime ditatorial, que já se via envolvido em polêmicas internas por questões de cunho político, econômico, social e moral, o que gerava um clamor pela transformação daquela realidade.

José Murilo de Carvalho corrobora com o pensamento de Lopes e mostra que existem algumas razões para a abertura da ditadura, e o passo dado a transição para a democracia que incluem: o fim do milagre econômico e a crise do petróleo; problemas de hierarquia do exército; e o desgaste na imagem do exército. No entanto a questão da desigualdade e falta de cidadania corroboram com a imagem negativa atribuída à ditadura, isso porque:

 

O sentido do “milagre” econômico foi posteriormente desmistificado por análises de especialistas que mostraram seus pontos negativos. Houve, sem dúvida, um crescimento rápido, mas ele beneficiou de maneira muito desigual os vários setores da população. A consequência foi que, ao final, as desigualdades tinham crescido ao invés de diminuir. (Carvalho, 2021, p. 133)

 

Por isso o real desafio à transição democrática era promulgar um dispositivo constitucional que fosse um “longo e minucioso documento em que a garantia dos direitos do cidadão era preocupação central” (Carvalho, 2021, p. 156). A redemocratização teve início em 1979, a Emenda Constitucional nº 11, que revogou o AI-5, deu início a reforma política, que durou 6 longos anos, até 1985, ano em que a ditadura, após 21 anos, cessou.

 

4 A CONSTITUIÇÃO CIDADÃ, A DEMOCRACIA E A CIDADANIA

 

A Assembleia Nacional Constituinte que promulgou a Constituição Federal de 1988 durou 18 meses, a “Constituição Cidadã”, como acunhou Ulysses Guimarães, presidente da constituinte, versou que a constituição “foi escrita para o homem, que o homem é seu fim e sua esperança” (Guimarães, 1988). Sobre a matéria da cidadania e participação popular, Fernando Henrique Cardoso, líder do PSDB, fez o relato significativo sobre a Constituição:

 

Pela primeira vez na História do Brasil e talvez do mundo, se faz uma Constituição com a colaboração direta da cidadania. Recebemos milhões de assinaturas em emendas populares e o povo sentiu de perto o que é consciência dos nossos direitos; entendeu, rapidamente, que, sem liberdade, não há avanço social. (Jornal do Brasil, 23 set. 1988: 4)

 

A Constituição de 1988 tenta, em termos teóricos e práticos, afastar-se do período ditatorial, a fim de dirigir a sociedade a uma nova forma de organização e participação, que visa reduzir a discrepância entre o ordenamento e a realidade, institucionalizando o regime político democrático no Estado brasileiro. A Carta de 88 é pautada no respeito às garantias e direitos fundamentais, e voltada a reparar a vulnerabilidade social majoritária da sociedade brasileira, propondo a promoção da cidadania, através da redução da desigualdade e estimulando liberdade e fraternidade, o comprometimento mais significativo é nortear a sociedade e outros ordenamentos, por isso é considerada uma constituição dirigente.

No preâmbulo constitucional, “certidão de origem e legitimidade do novo texto e uma proclamação de princípios, demonstrando a ruptura com o ordenamento constitucional anterior” (Moraes, 2018, p. 52), há a consagração dos fundamentos e finalidades do Estado Democrático de Direito, expressando que o dispositivo constitucional estaria:

 

[...] destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias [...] (CF, 1988)

 

A cidadania possui um conceito amplo, que envolve direitos sociais e de seguridade social, não apenas direitos políticos, por isso a Carta de 1988 é bem clara quando regulamenta o Brasil como um Estado Democrático de Direito, que defende e se compromete com os direitos sociais relativos à integridade, dignidade e cidadania dos brasileiros e a ampliação dos direitos individuais e coletivos.

 

A Constituinte trabalhou mais de um ano na redação da Constituição, fazendo amplas consultas a especialistas e setores organizados e representativos da sociedade. Finalmente, foi promulgada a Constituição em 1988, um longo e minucioso documento em que a garantia dos direitos do cidadão era preocupação central. (Carvalho, 2021, p. 155- 156)

 

O ordenamento inaugura estabelecendo a cidadania como fundamento do Estado Democrático de Direito no seu primeiro artigo, ou seja, transformando-a num pilar da democracia. A plenitude do Estado Democrático passa pelo reconhecimento dos cidadãos como pessoas de direitos e deveres, isso porque, “a cidadania: representa um status e apresenta-se simultaneamente como objeto e um direito fundamental das pessoas;” (Moraes, 2018, p.53), assim, falar sobre cidadania consiste em perceber que a usufruir como um direito só é possível através da capacidade de exercê-la como um dever.

Como se pode observar, a cidadania não se restringe aos direitos políticos, como em constituições anteriores, mas a ampliação da matéria que abrange estes direitos é importante à evolução teórica da cidadania política constitucional brasileira, porque, ela deixa de ser associada exclusivamente a nacionalidade, e transforma-se na aptidão para participar da vida política, o artigo 14 simboliza essa mudança, além de estabelecer a questão do voto universal, direto e secreto, indica, as formas de exercer a soberania popular: “plebiscito, referendo e iniciativa popular” (CF, 1988), criando um ambiente no qual a liberdade de participação favorece a persecução e repúdio em relação às funções e decisões do poder legislativo, detalhe que diferencia fundamentalmente a Constituição de 88 de suas anteriores.

Convém ressaltar a conquista de ampliação da dimensão do voto e alistamento eleitoral aos analfabetos que obtiveram a possibilitar de exercer, de forma facultativa, estes direitos, o que “pôs fim a uma discriminação injustificável” (Carvalho, 2021, p. 156), mais uma medida que mostra a predisposição do ordenamento em relação à efetivação da participação. O artigo 5º da Constituição, o mais importante do ordenamento, expressa que, em respeito a pluralidade, todas pessoas são iguais perante a lei, e firma um rol de direitos, deveres e garantias, individuais e coletivos, que se comprometem com a defesa dos princípios democráticos e da humanidade da nação, concedendo “mandado de injunção sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania;” (art. 5º, § LXXI, CF, 1988).

O Mandato de Injunção é um remédio constitucional inovador, importante à materialização de direitos fundamentais que antagoniza a improdutividade das normas constitucionais, e, com isso, incentiva a cidadania, representando “uma ação constitucional de caráter civil e de procedimento especial, que visa suprir uma omissão do Poder Público, no intuito de viabilizar o exercício de um direito, uma liberdade ou uma prerrogativa prevista na Constituição Federal” (Moraes, 2018, p. 252), e que “transitada em julgado a decisão, será possível estender seus efeitos a casos análogos.” (Moraes, 2018, p. 264).

No entanto, como afirma José Murilo de Carvalho (2021, p. 161), o empecilho a cidadania brasileira é a “persistência das grandes desigualdades sociais que caracterizam o país desde a independência, para não mencionar o período colonial”, essa concentração da riqueza durante séculos, aprofundou a pobreza e a miséria no país, problemas que, segundo o autor, são essencialmente de “ordem regional e racial”.

A naturalização da violência como remédio contra grupos marginalizados, a desconfiança em relação as instituições políticas e públicas, a limitação do acesso à justiça, tanto pelo  desconhecimento, quanto pela incapacidade de arcar com custos processuais, a dificuldade de acessar justiça gratuita devido à alta demanda processual, a morosidade processual decorrente da enorme quantidade de litígios, e a construção de uma sociedade hierarquizada que na definição de Carvalho (2021, p.167-168), divide a sociedade brasileira em classes de “doutores, cidadãos simples e elementos”, que possuem entre si profundas disparidades no acesso ao direito de justiça e cidadania, e denotam a grave cicatriz da subcidadania no tecido social brasileiro.

A subcidadania brasileira é naturalizada na formação histórica do país e se desenvolve com a negligência histórica constitucional, no que se refere a matéria de possuir e concretizar direitos fundamentais e sociais, por isso, tratar sobre subcidadania brasileira é também falar sobre a dificuldade de implementar o Estado Democrático de Direito, que se vê numa encruzilhada em que a efetividade da democracia depende da concretização de direitos sociais. O cidadão brasileiro excluído não se enxerga como um sujeito de direitos, e esse autodesprezo decorre da naturalização da negligência, marginalização e preconceito.

 

Uma dessas formas de feridas profundas parece-me a aceitação da situação de precariedade como legítima e até merecida e justa, fechando o círculo do que gostaria de chamar de naturalização da desigualdade, mesmo de uma desigualdade abissal como a da sociedade brasileira. (Souza, 2018, p. 221)

 

Os avanços promovidos pela Constituição de 88 são importantes e condizem com um Estado compromissado, a nível teórico, com a efetivação de um Estado de Direito, mas a desigualdade, que define quem é cidadão, e quem pode exercer cidadania, revelam a trágica construção de uma democracia frágil que possui uma sociedade afável ao autoritarismo, hierárquica, cheia de preconceitos de cor e gênero, que escolheu ignorar e perseguir escravos libertos e seus descendentes, através de políticas eugenistas, normas constitucionais e dispositivos penais discriminatórios. Transformando o país num Estado marcado pela dominação oligárquica política que exerce poder através dos séculos, e que não só inventou a desigualdade no Brasil, mas a agravou.

 

5 PERSPECTIVAS PARA EVOLUÇÃO DA CIDADANIA BRASILEIRA NO SÉCULO XXI

 

É quase impossível desvincular a crise da cidadania da democrática, suas imperfeições conversam entre si, e o desafio das democracias atuais é se manterem saudáveis, para criarem espaços de liberdade, fraternidade e igualdade em que seja possível exercer a cidadania, e consequentemente possibilite a criação de direitos, especialmente os sociais. Essa associação entre cidadania e direitos humanos é resultado da efervescência dos movimentos sociais por redemocratização e por direitos civis da segunda metade do século XX, impactados pela criação das Nações Unidas e Declaração Universal dos Direitos Humanos.

 

As crescentes pressões sociais por justiça material levaram à percepção de novos direitos individuais e, consequentemente, à ampliação dos significados e sentidos da cidadania, por meio das lutas por direito à moradia, à saúde e à educação básica, por exemplo. A grande inovação ficou por conta da emergência das lutas por novos direitos, que não mais se referem exclusivamente a indivíduos, abrangendo grupos, etnias, nações e a própria humanidade, por exemplo, em seu direito a um meio ambiente equilibrado, à paz ou à transmissão do patrimônio ecológico e/ou cultural às gerações futuras. (Botelho; Schwarcz, 2012, p. 16-17)

 

A Constituição de 1988 nasce nesse contexto de absorção dos direitos de quarta geração, em que o compromisso essencial é a reinvindicação de um constitucionalismo fundamentado na garantia de princípios e valores que valorizam a liberdade, pluralidade, justiça, equidade, solidariedade e cidadania, mas sofre com a incapacidade de adequar a realidade da histórica desigualdade e autoritarismo brasileiro com as promessas constitucionais, deixando o país numa posição delicada em que efetivar direitos sociais depende do Poder Judiciário.

 

Conservando as marcas da sociedade colonial escravista, ou aquilo que alguns estudiosos designam como “cultura senhorial”, a sociedade brasileira é marcada pela estrutura hierárquica do espaço social que determina a forma de uma sociedade fortemente verticalizada em todos os seus aspectos: nela, as relações sociais e intersubjetivas são sempre realizadas como relação entre um superior, que manda, e um inferior, que obedece. (Chauí, 2001, p. 56)

 

Marilena Chauí defende que o autoritarismo histórico político se reflete nas relações sociais, e a sociedade brasileira naturaliza a dinâmica da hierarquia e arbitrariedade, transformando-se num povo que deseja mais o domínio uns sobre os outros do que a própria alforria, que relacionado à desinformação e ao pânico moral, que no entendimento de Stanley Cohen (2002, p. 46), é associado à algum medo coletivo de um suposto inimigo que “emerge para se tornar definido como uma ameaça aos valores e interesses da sociedade; sua natureza é apresentada de forma estilizada e estereotipada pelos meios de comunicação de massa”, criam empecilhos à implementação de novos direitos sociais que aprofundam a crise de identidade e cidadania no país, que delimita a discussão atual à maniqueísmos.

O “empecilho” diz respeito à omissão dos outros poderes frente às garantias constitucionais de efetivar direitos sociais fundamentais, ocasionado por projetos políticos moralistas e fundamentalistas que “travam” o processo legislativo na matéria da criação de direitos, fazendo o Poder Judiciário assumir a responsabilidade, através do controle repressivo de constitucionalidade, de acossar as premissas constitucionais relativas à promoção de direitos fundamentais, o que acaba instaurando uma crise de identidade e cidadania na sociedade brasileira. Fomentadas pelo excesso de demanda judicial, que estagna o avanço real de direitos sociais, e que, no contexto de polarização social, cria uma expectativa negativa sobre a conquista de direitos de cidadania e confiança na democracia.

Segundo Canotilho, a omissão:

 

em sentido jurídico-constitucional, significa não fazer aquilo a que se estava constitucionalmente obrigado. A omissão legislativa, para ganhar significado autónomo e relevante, deve conexionar-se com uma exigência constitucional de acção, não bastando o simples dever geral de legislar para dar fundamento a uma omissão inconstitucional. (Canotilho, 2003, p. 1033)

 

Ao STF, “Guardião da Constituição”, cabe o controle de constitucionalidade, e poder de ajuizar “Ação Indireta de Inconstitucionalidade por Omissão” (ADO), “quando o poder público se abstém de um dever que a Constituição lhe atribuiu” (Moraes, 2028, p. 1040), seja essa omissão legislativa ou administrativa em relação à matéria dos direitos fundamentais, predisposição que está disciplinada no artigo 103, § 2º, da Constituição Federal de 1988, e regulamentada na Lei nº 9.868 que dispõe “sobre o processo e julgamento da ação direta de inconstitucionalidade e da ação declaratória de constitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal.” (1999), que incorpora a Lei nº 12.063, Capítulo II-A, que “estabelece a disciplina processual da ação direta de inconstitucionalidade por omissão” (2009).

Dada a configuração geopolítica atual de avanços dos projetos autoritários que defendem restrição e retrocesso de direitos, acentuados especialmente pela “era da desinformação”, que embrutece uma sociedade que, em grande parte, já havia naturalizado parte desses discursos, pautados no medo e aversão ao outro como sujeito de direitos, existem, para além disso, muitas invertidas contra atos que simbolizam a atuação do STF como “guarda constitucional”, utilizando-se sempre do “pano de fundo” do pânico moral que revela a dicotomia entre o bem e o mal que se estabelece na discussão sobre política, democracia e cidadania na sociedade brasileira. Lógica que torna a expectativa para o desenvolvimento da cidadania no século XXI, voltada a necessidade de regulação do espaço digital, reafirmação de direitos já conquistados e busca por novos direitos.

 

Toda intolerância estética é reveladora de um autoritarismo do olhar, princípio de outras formas de intolerância. O autoritarismo não somente se manifesta de diversas formas, como se revela pela exigência de submissão do gosto do outro. A definição do gosto do outro como um não gosto, ou seja, a construção da opacidade de uma outra estética, é reveladora do espírito autoritário, o gérmen de um processo de castração libidinal da expressão do outro como forma de negação da própria diversidade. (Bittar, 2009, 806)

 

Para Clarissa Tassinari, a ascensão do Poder Judiciário remonta as memórias de cisão com o regime ditatorial, e se desenvolve num “ambiente de tensão com os demais Poderes do Estado e, por consequência, em uma crise da democracia” (2013, p. 30), em que a atuação dos outros poderes estatais entram em desacordo que:

 

como afirma Bolzan de Morais, tenta conjugar “uma política de inclusão (democracia social) e uma economia de exclusão (capitalismo)”. O resultado disso é a existência de uma sensação de desconforto, que, elevada à condição de insatisfação popular, causada pela ausência do cumprimento (especialmente pelo Executivo) das promessas insculpidas no texto constitucional, produz um apelo à jurisdição, que acaba por assumir ares de “sacralização”. (Tassanari, 2013, p. 30)

 

Apesar da previsão constitucional e ética na atuação do Judiciário, essa cultura legislativa por sua parte, possui um terrível indício a respeito da ordem democrática e do acesso a cidadania, verificando-se um caminho não natural no acesso à direitos. Isso porque, o Poder Legislativo, por exemplo, passa pela manifestação da vontade popular que configura a sua vontade o Congresso Nacional, responsável pela criação de leis a serem promulgadas, ou não, o que significa dizer que àqueles que “travam” a criação de direitos sociais, ou de alguma forma tentam retrocedê-los, tendem a manifestar a “vontade” de parte majoritária do povo.

No entanto, é possível perceber que, apesar da perspectiva de dificuldades para se estabelecer o acesso à cidadania, os avanços são perceptíveis, a existência de instituições democráticas, nacionais e internacionais, composta por membros, procedimentos e normas, comprometidos a evitar retrocessos relacionados aos direitos fundamentais, representam uma ruptura com a tradição histórica de omissão institucional e sufocamento de movimentos sociais que permitiam a flexibilização e supressão dos direitos fundamentais e, consequentemente,  o fim definitivo da cidadania e democracia. Apesar da árdua realidade, existe uma estrutura rumo a uma alvorada de exercício da justiça e solidariedade que consolida a cidadania mundial.

 

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

  Os impactos da formação histórica brasileira no acesso à cidadania, como se pôde perceber ao longo do artigo, denotam que a desigualdade brasileira não nasce por acaso, essa subcidadania é fruto de estruturas políticas e ordenamentos que tornam a vida de uma parte majoritária da sociedade, insustentável. O aprofundamento do individualismo e da inclinação autoritária da sociedade brasileira são as consequências da persistência dessa desigualdade, tornando imprescindível uma conduta ativa que combata o problema.

O ser humano é movido pela necessidade de exercer suas liberdades, algo que é primordial no que diz respeito ao exercício de direitos, por isso é pertinente falar sobre a relação entre liberdade, bem comum, democracia e cidadania. A cidadania é tratada como instrumento que possibilita a busca pela criação de novos direitos sem prejudicar os direitos já garantidos, para exercê-la é necessário um espaço de liberdade, e, em decorrência da sua criação, acessar o bem comum.

O bem comum se constrói quando existe respeito às liberdades individuais e coletivas, por isso está envolto nos conceitos de humanidade, cidadania, constitucionalidade, democracia e integridade, não existe democracia sem liberdade, da mesma forma que não existe democracia sem cidadania. Exercer cidadania ativa, é exercer a liberdade, ambos pilares da democracia, por isso perseguir segurança social, informacional, ambiental, econômica, jurídica, assistencial, estrutural e constitucional, revela o comprometimento com Estado Democrático de Direito.

A necessidade de conservar as garantias constitucionais e possibilitar a criação de novos direitos, contraria a sujeição do indivíduo ao risco de se encontrar desprotegido pelas normas constitucionais, portanto, lesado de seus direitos e garantias fundamentais. Ou seja, o exercício da cidadania combate a fragilidade democrática brasileira herança do autoritarismo presente no processo de evolução da ordem constitucional do país, que possui uma dificuldade sistêmica em efetivar suas promessas constitucionais.

Por fim, mesmo frente a este contexto de dificuldade, é possível aferir que, apesar de todos os avanços e conquistas significativas da cidadania no contexto da evolução constitucional brasileira até os dias atuais, constata-se que ainda faz-se necessário percorrer um longo caminho para se chegar a uma situação de efetivação plena da cidadania e, mesmo que não seja possível em sua plenitude, o primordial é não retroceder ao passado recente e manter-se fiel às promessas do presente a fim de construir uma ordem constitucional futura ainda mais cidadã.

 

REFERÊNCIAS

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[1] Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao curso de Bacharelado em Direito da Universidade Estadual do Piauí – UESPI, como requisito básico para obtenção do título de Bacharel.

[2] Graduanda do curso de Bacharelado em Direito da Universidade Estadual do Piauí – UESPI.

[3] Professor orientador do curso de Bacharelado em Direito da Universidade Estadual do Piauí – UESPI – Mestre em Direito Constitucional pela Universidade Federal do Ceará – UFC.

 

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