SINOPSE DE CASE DE PROCESSO PENAL

Por Lucas Henrique de Almeida Carvalho | 26/07/2016 | Direito

Lucas Henrique de Almeida Carvalho2

DESCRIÇÃO DO CASO:

C, empresário, foi acionado judicialmente pelo suposto cometimento do crime contra os consumidores descrito no art. 64 do CDC, ou seja, aquele que dita o dever que tem o fornecedor a comunicar aos consumidores a nocividade de produtos, nocividade esta que passou a ser de conhecimento do referido fornecedor apenas após a postura do bem no Mercado.

Não tendo efetuado composição civil de danos com os consumidores A e B e se negado a aceitar a proposta de transação penal oferecida pelo Ministério Público, o consumidor foi denunciado pelo Ministério Público pelo referido crime.

Após o curso do processo, verificou-se que o Ministério Público não havia produzido provas suficientes para ensejar a condenação do fornecedor pelo supracitado crime; porém, não obstante esta falta de provas, o juiz condenou o réu pela prática do ato criminoso, tomando como base no art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor, ou seja, aquele que define que o consumidor terá direito, por conta até mesmo da vulnerabilidade prevista no mesmo supracitado código, à inversão do ônus da prova no âmbito dos processos judiciais.

  1. Decisões Possíveis:

1.1- Agiu Corretamente o Juiz

1.2- Não agiu corretamente o Juiz

  1. Argumentos:

2.1- Agiu corretamente o Juiz

Em um primeiro momento, deve-se lembrar que em determinados casos, como aquele que debrua este estudo, fica o poder público em uma posição onde a produção de provas é ou de dificuldade exacerbada ou até mesmo impossível, sendo admitido que haja uma espécie de inversão do ônus da prova para suprir a referida impossibilidade e fazer valer o poder punitivo estatal.

Tal hipótese se verifica, a título de exemplificação, nos casos de investigação do crime de lavagem de dinheiro, onde tem o investigado todos os seus bens recolhidos, cabendo a tal investigado provar que tais bens não decorrem da atividade ilícita investigada; tal ação se justifica pelo fato que é deveras difícil para o Ministério Público provar quais bens do investigado são advindos de suas atividades ilícitas.[1]

Tal supracitada hipótese faz-se presente no caso em tela, vez que é praticamente impossível que o poder público comprove a existência do fato delituoso, já que quem possui total acesso às informações referentes ao estabelecimento e aos atos nestes praticados é o empresário, ou seja, o réu no presente caso.

De similar maneira decidiu o STF no julgamento do REsp 961.863-RS no ano de 2010, onde decidiu o supremo que, nos casos de roubo agravado pela utilização de arma de fogo, a apreensão da arma não é necessária para a caracterização da agravante do tipo, devendo o acusado efetivamente provar que não estava na posse da referida arma de fogo no momento da prática do ato.[2]

Destarte, é plenamente possível, conforme confirmado por jurisprudência do STF, que exista, em determinados casos específicos, a inversão do ônus da prova no Processo Penal sem que haja a incidência de inconstitucionalidade na decisão.

Conclui-se, portanto, que agiu de maneira correta o magistrado ao efetuar uma analogia do art. 6º, VIII, do CDC a fim de fazê-lo aplicável no processo penal, haja vista que a comprovação do fato por parte do poder público seria deveras dificultosa.

2.2- Não agiu corretamente o juiz

Uma das características que marcam a existência do Estado Democrático de Direito é a primazia que se tem como um todo pelo texto constitucional, devendo, portanto, tal texto ser seguido por todos os âmbitos da sociedade; tal primazia se verifica precipuamente pelo fenômeno chamado de filtragem constitucional, fenômeno este onde todos os textos legais e infralegais devem ser interpretados à luz daquilo disposto na Lei Maior e dela colher validade, direta ou indiretamente, sendo absolutamente inaceitável, portanto, no referido Estado em que vivemos, que qualquer norma tenha manifestações contrárias à constituição ou que medidas que violem as disposições supracitadas sejam tomadas em qualquer âmbito da sociedade hodierna.[3]

Pois bem, dispõe a Carta Magna brasileira em seu art. 5º, LVII, que determinado sujeito só será considerado culpado de crime após o trânsito em julgado de sentença condenatória, não podendo, pelos motivos expostos acima, tal direito ser restringido de maneira arbitrária por qualquer setor da sociedade.[4]

Assim, tem-se que o juiz do caso concreto sobre o qual se debruça este trabalho agiu de maneira inconstitucional ao atribuir ao réu, com base no Código de Defesa do Consumidor, o dever de provar a sua inocência sob pena de ser condenado pela prática do ato delituoso; ora, tal ação, conforme dito anteriormente, é inconstitucional, pois trata o réu efetivamente como culpado pela prática do crime sem que a acusação deva oferecer nenhuma prova que consubstancie a sua tese.[5]

Também relevante pare o tema é o princípio processual penal denominado in dubio pro reo, princípio este que, disposto no art. 386, VII, do Código de Processo Penal determina que o réu será absolvido nos casos onde não houverem provas suficientes para provar que este de fato cometeu o ato criminoso.[6] Assim, por força do disposto no Código de Processo Penal, nos casos onde fazer-se presente a dúvida por conta da ausência de provas capazes de ensejar a condenação, deve o réu ser absolvido.

Portanto, no caso em tela, visualizando a ausência de provas aptas a ensejar a condenação do reclamado na ação penal, deveria o juiz ter absolvido o réu, tendo como base tanto a Constituição Federal quanto o Código de Processo Penal e não invocar a inversão do ônus da prova, em um ato que além de inconstitucional, conforme visto anteriormente, é flagrantemente ilegal.

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