SINOPSE DE CASE: análise dos procedimentos cautelares

Por Amanda Cavalcanti Dantas | 22/06/2018 | Direito

SINOPSE DE CASE[1]

 

Amanda Cavalcanti Dantas[2]

Anne Andrews Rocha de Lima[3]

Vail Altarugio Filho[4]

 

1 DESCRIÇÃO DO CASO

 

O Sr. Bisão foi acionado judicialmente pela defensoria pública, no ano de 2012, por meio de uma ação de “obrigação de não fazer com pedido de antecipação de tutela”, pelo fato de começar a construir um sobrado ao lado do terreno da Dona Florinda (autora da ação), que estaria desrespeitando os direitos de vizinhança. 

Ignorando as questões de mérito, que são irrelevantes para o caso, o NPJ alegou como preliminar, na contestação, falta de interesse processual uma vez que o então CPC previa uma ação específica para atender aquela situação peculiar, ação essa (de procedimento especial) que não foi observada pela defensoria pública. 

Quase cinco anos depois, já com o código de processo novo, a ação de procedimento especial que deveria ser proposta pela parte não mais existe e o processo continua em andamento.

 

  1. Questão principal

 

Como o juiz deve apreciar a preliminar apontada?

 

2 ARGUMENTOS CAPAZES DE FUNDAMENTAR CADA DECISÃO

 

2.1 Preliminar indeferindo o pedido (devendo ser seguido o procedimento comum)

 

     O novo Código de Processo Civil (2015) trás no seu artigo 1.046 a seguinte redação: “Ao entrar em vigor este Código, suas disposições se aplicarão desde logo aos processos pendentes, ficando revogada a Lei nº 5.689/73”. E continua em seu §1º: “As disposições da Lei nº 5.689/73, relativas ao procedimento sumário e aos procedimentos especiais que forem revogadas aplicar-se-ão às ações propostas e não sentenciadas até o início da vigência deste Código”.

Com isso, temos que o Código determina que a partir da data de sua entrada em vigor, devem-se aplicar, de imediato, suas disposições, exceto nos casos de ações de procedimento sumário e procedimentos especiais que foram revogados. Presente uma dessas situações, a ação proposta deverá continuar no procedimento em que fora a ajuizada, até sua sentença.

De acordo com o doutrinador Elpídio Donizetti (2016), o supracitado trata-se de uma hipótese de “ultratividade da lei processual civil revogada”. O renomado autor ainda informa que o Direito intertemporal é o responsável por cuidar “dessa transição, estabelecendo uma ponte entre o velho e o novo e evitando que o completo rompimento das regras – entrada em vigor de um Código e revogação do anterior – deixe determinadas situações no limbo” (DONIZETTI, 2016, p. 82).

     Assim, fazendo a leitura dos supracitados dispositivos do Novo Código de Processo Civil, num primeiro momento poder-se-ia concluir pela obrigatoriedade da aplicação do procedimento especial, haja vista que o Novo Código determina que, nos casos dos procedimentos especiais revogados, devem-se aplicar as disposições destes, ainda que após a entrada em vigor daquele. Entretanto, o que temos é que o procedimento que está sendo seguido é o procedimento comum ordinário, ainda que por erro.

Dessa maneira, considerando que a ação fora ajuizada no procedimento comum ordinário, e não por meio do procedimento especial, e que, portanto, a partir da entrada do Novo Código de Processo Civil, deve ser regida por este, o juiz deve apreciar a liminar indeferindo o pedido da parte, até mesmo porque, como preconiza o renomado autor Humberto Theodoro Júnior (2016), o debate amplo permitido pelo procedimento comum não irá causar prejuízo às partes.

Sobre isso, o artigo 283 do atual CPC prevê que “o erro de forma do processo acarreta unicamente a anulação dos atos que não possam ser aproveitados, devendo ser praticados os que forem necessários a fim de se observarem as prescrições legais”. Continua, ainda, no parágrafo único, dizendo que “dar-se-á o aproveitamento dos atos praticados desde que não resulte prejuízo à defesa de qualquer parte”. Destarte, o erro na adoção do procedimento não leva à invalidade do processo, sendo, entretanto, possível que haja anulação das partes que não puderem ser aproveitadas, ou seja, é possível a adoção de ajustes no procedimento comum para que haja adequação à necessidade concreta.

Além do já exposto, há de se considerar a possibilidade da obra já ter sido concluída, haja vista que já se passaram 5 (cinco) anos desde o ajuizamento do processo; não se pode descartar tal possibilidade. E, sendo assim, ou seja, caso a obra já tenha sido finalizada, haverá perda de interesse processual no caso da Ação de Nunciação de Obra Nova;  ação perde sua finalidade, seu objeto, de modo que o processo deverá ser extinto sem julgamento do mérito.

Dessa forma, o juiz deve indeferir o pedido da preliminar. Devendo apreciar o pedindo no sentido do procedimento continuar pelo comum, e não pelo procedimento especial de Nunciação de Obra Nova, porém respeitando e compatibilizando tal procedimento com as peculiaridades do caso, e também respeitando os atos já consumados pelo procedimento comum ordinário, pois, como bem pontuou o autor Luiz Guilherme Marinoni (2015), o novo CPC deve respeitar a eficácia dos atos já consumados, acatando, assim, a Teoria do Isolamento dos Atos Processuais.

 

2.2 Preliminar deferindo o pedido (seguir o procedimento especial em questão)

 

Como dito anteriormente, o artigo 1.046 contém a seguinte redação: “Ao entrar em vigor este Código, suas disposições se aplicarão desde logo aos processos pendentes, ficando revogada a Lei nº 5.689/73”. E continua em seu §1º: “As disposições da Lei nº 5.689/73, relativas ao procedimento sumário e aos procedimentos especiais que forem revogadas aplicar-se-ão às ações propostas e não sentenciadas até o início da vigência deste Código”.

Com isso, temos que, apesar da ação em questão ter sido ajuizada pelo procedimento comum ordinário e que, neste caso, deveria haver a “conversão” direta para o procedimento comum, sem nenhum percalço ou impedimento, temos que o pedido da liminar aponta um erro anterior à entrada em vigor do Novo Código de Processo Civil, ou seja, um erro que deveria ter sido sanado àquela época. 

Se a ação tivesse sido ajuizada no procedimento especial ou se o erro tivesse sido sanado à época do antigo CPC, certo é que a ação seguiria por tal procedimento desde antes à entrada do novo CPC, que extinguiu tal procedimento. Dessa forma, se tivesse tido havido respeito ao procedimento a ser seguido, a ação estaria sendo regida por esse procedimento até a presente data, ainda que posterior à entrada de vigor do novo CPC, visto que o art. 1.054 do NCPC prevê a continuidade, até a prolação de sentença, dos procedimentos especiais extintos pelo atual CPC.

Assim, considerando que o ajuizamento da ação deveria ter sido por meio do procedimento da Ação de Nunciação de Obra Nova e que, caso assim o tivesse sido, este seria o procedimento do presente processo até os dias de hoje, o juiz deve julgar a preliminar considerando tal fato, ou seja, deve deferir o pedido do NPJ, de modo que permita a conversão do procedimento comum no procedimento especial supracitado.

 

3 QUESTÕES SECUNDÁRIAS

3.1 Qual seria a ação que a defensoria deveria ter entrado na época?

 

Com base na Lei nº 5.689/73, o antigo Código de Processo Civil, a ação que a defensoria pública deveria ter ajuizado na época é a “Ação de Nunciação de Obra Nova”. “Nunciação de obra nova consiste na providência tomada em juízo para o fim de embargar ou impedir o prosseguimento de construção que prejudica imóvel de outrem” (THEODORO JÚNIOR, 2014, p. 150). Destarte, essa ação tratava da solução das lides envolvendo o direito de construir com o direito de vizinhança, sendo, portanto, à época, o procedimento correto a ser ajuizada a ação.

3.2 Com o Código novo, qual seria ação que deveria ser utilizada hoje e as consequências da não utilização no caso concreto?

Para o ajuizamento da ação nos dias de hoje, após a entrada em vigor do novo CPC, o procedimento a ser seguido é o comum, haja vista que o procedimento de Nunciação de Obra Nova foi revogado e que o novo CPC, em seu artigo, 318 determina que, sem especificidade no procedimento, deve-se seguir o comum.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei nº 5.869, de 11 de Janeiro de 1973 (antigo Código de Processo Civil). Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5869.htm>. Acesso em: 28 mar. 2017.

BRASIL. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil). Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso em: 28 mar. 2017.

DONIZETTI, Elpídio. Curso didático de direito processual civil / Elpídio Donizetti. – 19. ed. Revisada e completamente reformulada conforme o Novo CPC – Lei 13.105, de 16 de março de 2015 e atualizada de acordo com a Lei 13.256, de 04 de fevereiro de 2016. – São Paulo: Atlas, 2016.

MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel; AREHHART, Sérgio Cruz. Novo código de processo civil comentado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015.

THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil – Procedimentos Especiais – vol. II – 50a ed. rev., atual. e ampl. – Humberto Theodoro Júnior – Rio de Janeiro: Forense, 2016.

THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil – Procedimentos Especiais – vol. III – Humberto Theodoro Júnior – Rio de Janeiro: Forense, 2014.

 

[1]          Case apresentado à disciplina Proc. Cautelar e Proc. Especiais da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB.

[2]             Acadêmica do 8º período do curso de Direito da UNDB.

[3]             Acadêmica do 8º período do curso de Direito da UNDB.

[4]          Professor Mestre, orientador.

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