SENTIMENTOS EXPRESSADOS POR HOMENS APÓS O EXAME DE TOQUE RETAL

Por DINO CEZAR RODRIGUES PASSOS | 26/01/2018 | Saúde

SENTIMENTOS EXPRESSADOS POR HOMENS APÓS O EXAME DE TOQUE RETAL

 

Dino Cezar Rodrigues Passos

Rita Narriman Silva de Oliveira Boery

Eduardo Nagib Boery

Cezar Augusto Casotti

 

RESUMO

Dentre as neoplasias malignas de maior letalidade entre os homens estão o câncer de pulmão e o de próstata, sendo que este último tem apresentado uma tendência de aumento, pois sabe-se que a incidência das doenças aumenta com a idade. Estudos acerca dos sentimentos expressados por homens do SUS, após a submissão ao toque retal, fornecem subsídios que ajudam os profissionais e gestores da saúde, a humanizar o atendimento a essa clientela. Esta pesquisa tem como objetivo conhecer os sentimentos expressados pelos usuários do Sistema Único de Saúde, após realização do exame clínico da próstata  por meio do toque retal. Trata-se de um estudo descritivo e exploratório, de natureza qualitativa, realizada com usuários da Policlínica, no Município de Itabuna-Ba, foram intrevistados 15 pacientes submetidos ao toque retal. A coleta de dados foi feita por meio de entrevista semi-estruturada, tendo início somente após a aprovação do projeto pelo CEP/UESB, Protocolo nº: 082/2010, em atendimento à Resolução nº: 196/96, do Conselho Nacional de Saúde. Utilizando a análise de conteúdo (BARDIN, 2008), tendo emergido as categorias: Sentimento manifestado; motivos do exame; dificuldades Reladas. Discussões precisam ser ampliadas para que a compreensão das questões sobre a prevenção/diagnóstico do câncer prostático seja melhor elaborada e aceita por essa população.

 

Palavra chave: Câncer de próstata, prevenção, toque retal, sentimentos.

 

ABSTRACT

Study about the feelings expressed by men, after submission of the digital rectal examination, clinical examination for the prostate, sought grants that could help professionals and health authorities to improve care for these patients. Among the most lethal malignancy among men are lung cancer and prostate, the latter has shown an upward trend, since it is known that the incidence of disease increases with age. It aims to understand the sentiments expressed by users of the Unified Health System (SUS) after performing digital rectal examination for clinical prostate. It is a descriptive study, qualitative in nature, conducted in a clinic in the city of Itabuna-BA, with 15 informants as subjects. Data collection was done through semi-structured interview, and start only after the project was approved by the IRB / UESB, in compliance with resolution nº. 196/96 of the National Health Data analysis was done by content analysis (BARDIN, 2008). **** This study will contribute as a stimulus to debate and seek proposals to change the reception of patients with prostate cancer, proposing improvements and a focus on health promotion and improved quality of life of this clientele.

Keywords: Prostate cancer, prevention, rectal, feelings.
 

INTRODUÇÃO

 

A próstata é um órgão pélvico, ímpar, situado inferiormente à bexiga e atravessando em toda sua extensão pela uretra, consiste principalmente de musculatura lisa e tecido fibroso. Permanece pequena durante toda infância, começa a crescer na puberdade sob o estimulo da testosterona. Ela atinge um tamanho praticamente estável por volta dos 20 anos, permanecendo assim aproximadamente ate a idade de 50 anos. Em alguns homens, ela começa, a degenerar, junto com a diminuição da produção de testosterona pelos testículos (DAGELO, 2007).

O carcinoma de próstata é a principal causa de morte por câncer em homens nos Estados Unidos da América, sendo o mais comum e o segundo em causas de morte por câncer. Sua incidência está relacionada à idade, à raça, à ocupação, à geografia, à origem étnica e a dieta. Tanto tumores benignos, como malignos são comuns em homens idosos. A incidência de câncer de próstata aumenta com a idade. O diagnóstico clínico de câncer de próstata é incomum antes da segunda metade da quinta década de vida, mas aumenta progressivamente após esse período (TORTORA, 2009).

Trata-se de uma patologia que pode ser detectada precocemente através de métodos diagnósticos de triagens: toque retal e o antígeno prostático específico (SPA), que são exames de baixo custo e possuem boa sensibilidade, especificidade e credibilidade. (INCA, 2002)

O exame toque retal deve ser realizado a partir dos 40 anos pelo menos uma vez ao ano. Neste exame, o medico pesquisa o tamanho, consistência, pontos endurecidos, dolorosos e mobilidade da próstata. O reto é a única via natural de acesso à próstata. Embora não seja um exame preventivo, a exemplo do que ocorre no exame realizado em mulheres para prevenção do câncer de colo uterino, este toque serve para o diagnóstico precoce do tumor. (INCA, 2002)

O Antígeno Prostático Específico – PSA é um exame realizado no sangue do paciente. Trata-se de um a antígeno específico da próstata podendo estar normal ou anormal. O PSA não substitui o toque retal, pois podem acontecer variações e existem fatores interferentes que podem mascarar o resultado. A realização do toque retal em conjunto com o PSA é a melhor estratégia para detecção precoce de anormalidades prostáticas (INCA, 2002).

Apesar de ser uma medida de detecção precoce, de baixo custo, o toque retal mexe com o imaginário masculino, a ponto de afastar inúmeros homens da sua realização. Essa recusa não ocorre, necessariamente por conta da falta de informação acerca da efetividade dessa medida diagnóstica. Fazer o toque retal é uma prática que pode suscitar no homem o medo de ser tocado em sua “zona proibida”. Esse medo pode se desdobrar em muitos outros.

Este estudo tem como objetivo conhecer os sentimentos expressados por usuários do SUS após realização do exame de toque retal.

 

3. METODOLOGIA:

 

Estudo qualitativo, descritivo e exploratório, realizado na Policlínica Dois de Julho, na cidade de Itabuna – Bahia., no período de...

Foram sujeitos desta pesquisa 15 usuários do SUS, para exames clínicos da próstata no serviço de referência do município. A seleção dos sujeitos da pesquisa deu-se com  usuários do SUS que foram referenciados por profissionais que atuam na Estratégia de Saúde da Família (ESF) e Unidade Básica de Saúde (UBS) que se submetem para avaliação da próstata, por meio do exame clínico, deu-se a partir dos seguintes critérios: que o paciente estivesse em condições de verbalização, com idade igual ou superior a 40 anos, residente em Itabuna e que concordou em participar, voluntariamente, da pesquisa assinando o Termo de Consentimento Livre e Esclarecimento (TCLE).

Foram observadas durante todas as etapas da pesquisa as recomendações da Resolução nº:196/1996, do Conselho Nacional de Saúde, que regulamenta as pesquisas envolvendo seres humanos (BRASIL, 1996). O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisas da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, sob Protocolo nº: 082/2010.

Utilizou-se a entrevista semi-estruturada seguindo um roteiro de perguntas previamente elaboradas; as entrevistas foram realizadas no próprio local onde os usuários se submeteram ao exame, em um local adequado, tendo uma duração de cerca de cinco minutos, as falas foram gravadas, após o consentimento dos participantes, ao término da entrevista as informações foram transcritas. Em último momento foi realizado a repetição da gravação da entrevista em sua originalidade e integralidade para que os participantes pudessem validar suas respostas.

Os dados coletados foram discutidos a partir da análise de conteúdo temática, segundo Bardin (2008).

4.RESULTADOS E DISCUSSÃO

 

A seguir, as falas dos usuários foram transcritas, garantindo desta forma uma maior fidelidade das informações. Inicialmente as entrevistas  foram transcrita na integra, sem interrupção. A seguir novas leituras foram realizadas, de uma forma mais pausada, relendo as partes consideradas significativas, quando necessário.

Posteriormente foram identificadas as palavras chaves por meio da técnica da análise temática, que consiste em descobrir os elementos mais significativos do discurso, para em seguida agrupá-la em unidades de significado. (MINAYO, 1996).

A técnica da analise de conteúdo temática consiste em descobrir os núcleos de sentido que compõem a comunicação e cuja presença, ou frequência de aparição pode significar alguma coisa para o objeto escolhido. Com essa técnica pode-se caminhar, também na direção da descoberta do que está por trás dos conteúdos manifestados, indo alem das aparências do que esta sendo analisado (BARDIN. 2004).

Foram identificadas as seguintes categorias: “ sentimento manifestado”, e as subcategorias, positivos; negativos e neutros. A categoria “Sentimento manifestado” e as subcategorias, Positivos; Negativos; Neutros foram justificadas pelas Unidades de Analise seguintes.

 

Da subcategoria Positivos,

 

Não tive sentimentos negativos./ ao saber o porquê das minhas dores e ao ser tratado, hoje, me sinto muito bem./  ...ao fazer, tendo o resultado positivo para minha saúde, senti-me tranqüilo/ ao fazer o exame da próstata  e ao receber o resultado que tudo está bem, fiquei tranqüilo./ Tudo normal, graças a Deus./ Normal./ Aliviado por não ter doença nenhuma./ Fiquei alegre porque estava cuidando da minha saúde. Deus abençoou...  / Bem, me senti bem./ Saí me sentindo bem, por que não deu nada.

 

Da subcategoria Negativos,

 

Medo./ Senti dores na hora que o medico fez o exame./ Senti dores no pé da barriga./ Por causa do preconceito tive vergonha./ fiquei cismado./ Muitas pessoas comentam que quem faz esse exame fica viciado. É mentira./ Não quero fazer mais nunca! Constrangedor. Não aceito não!/ Não volta mais, mas tem quem voltar senão a próstata fica grande.

 

Da subcategoria, Neutros,

 

“Nenhuma/ Não houve/ Não tive dificuldades”

 

Embora haja uma ampla discussão sobre masculinidade na área da saúde em geral, ainda há uma insuficiência de estudos sobre o empenho masculino voltado para o estilo de vida saudável e a promoção da saúde. Para se avançar nessa discussão, dentre outros aspectos, é importante dar voz aos próprios homens para melhor compreender as questões envolvidas no seu acesso aos serviços de saúde, promoção e prevenção de doenças (GOMES, 2003).

Os sujeitos da pesquisas foram assim caracterizados: sobre a escolaridade, 53% são analfabetos; 33% têm o fundamental incompleto; 7% possuem nível superior; 7% o ensino médio. Segundo a Sociedade Brasileira de Urologia (2003) quanto mais escolaridade e de classe econômica mais alta, maior é o cuidado com a saúde: 79% dos homens com nível universitário já foram ao urologista, enquanto 46% que tem ensino fundamental foram ao especialista. Homens das capitais do Sudeste são os que mais vão ao urologista (62%), enquanto os da cidade Norte, os que menos vão (36%).

Em relação à idade dos informantes foram assim distribuídos 33% na faixa etária de 50 a 59 anos; 27% na faixa de 40 a 49 anos; 27% na faixa de 60 a 69 anos; 13% acima de 70 anos. No que se refere à situação marital, 74% casados; 20% solteiros; e 6% desquitados.  Assim, como em  outros cânceres a idade é um fator de risco importante, ganhando um significado especial no câncer de próstata, uma vez que tanto a incidência como a mortalidade aumenta exponencialmente após 50  anos. História familiar do pai ou irmão com câncer de próstata antes dos 60 anos de idade, pode aumentar o risco de câncer em 3 a 10 vez em relação a população geral. Afirma também que a família e os amigos desempenham 80% o papel de influenciadores da procura por um médico e 76%, a esposa          ou companheira ( INCA, 2002).

Segundo o INCA (2002) a detecção precoce do câncer de próstata é fundamental importância para que se aumentem as possibilidades de cura. Entre as medidas de diagnóstico precoce, ressalta-se o toque retal realizado por profissionais de medicina. O toque é, relativamente, uma medida diagnóstica de baixo custo. No entanto, é um procedimento que mexe com o imaginário masculino, a ponto de afastar inúmeros homens da prevenção do câncer de próstata. Essa recusa não ocorre, necessariamente, por conta da falta de informações acerca da efetividade dessa medida preventiva. Quando arrebatamos pelo senso comum, homens bem informados, no mínimo resistem a se prevenirem dessa forma.

Fazer o toque retal é uma prática que pode suscitar no homem o medo de ser tocado na sua parte “inferior”. Esse medo pode se desdobrar em inúmeros outros. O medo da dor, tanto física com simbólica, pode estar presente no imaginário masculino. O toque, que envolve penetração, pode ser lido como violação e isso quase sempre se associam à dor. Mesmo que o homem não sinta a dor, no mínimo, experimenta o desconforto físico e psicológico de estar sedo tocado, numa parte interditada.

Sabemos que esses medos, dentre outros, podem aflorar no imaginário dos homens imersos no senso comum. Mesmo para aqueles homens que conseguem imprimir uma racionalidade frente ao toque retal, não podemos descartar a possibilidade de a situação trazer constrangimentos que não são conscientes para esses homens.

Nas sociedades em que se atribui poder, sucesso e força ao ser masculino, os homens podem se distanciar das características consideradas do ser feminino, tais como sensibilidade, o cuidado, a dependência e a fragilidade. Essas diferenças culturalmente atribuídas podem fazer com que homens se predisponham as doenças, lesões e mortes (SMELTZER, S. C.; BARE, B. G, 2008).

Assim sendo, os sujeitos apresentam os seguintes sentimentos após realizar o toque retal para exame clínico da próstata (sentimentos negativos) e carregaram esses sentimentos de significados/subcategorias (por exemplo: medo, dor, preconceitos, vergonhas, cisma, constrangimento, dentre outros), caracterizando assim o objetivo do estudo. Estes significados são transformados em pensamentos constituídos e socialmente aceitos do que representa para eles a realização do exame. Estes sentimentos podem ser sentidos e/ou expressos diferentemente por cada entrevistado.

Neste sentido, as falas que compõem as discussões deste estudo, não são meras narrações vazias ou simples respostas e perguntas intencionalmente realizadas. São manifestações verbais cheias de significado do que é, a realização do exame, para esses homens.

Nessa categoria, trazemos à discussão alguns aspectos comuns apresentados pelos usuários decorrentes do exame: 1) medo do desconhecido, por não saber como é o exame; 2) dor; 3)preconceito por causa dos comentários negativos que giram em torno do exame.

É necessário compreender que estamos abordando sentimentos que surgem a partir da representação do câncer como um mal, visto no senso comum como fatal. Independente de ser homem ou mulher, as pessoas quando são acometidas por esses sentimentos podem ser impedidas de buscar diagnóstico que precocemente detectam tal doença e contribuem para um efetivo tratamento. Segundo Gomes (2008), um dos fatores que dificultam a realização do toque, é o medo dos homens em buscar um diagnóstico precoce para câncer prostático, gerado pela associação de câncer à morte. Isso foi constatado no discurso dos depoentes: “medo...; não voltar mais, mas tem que voltar se não a próstata fica grande...”

A expressão ‘’sexualidade masculina’’, também, pode indicar, em algumas áreas da saúde, muito mais questões relacionadas à doença do que à saúde propriamente dita. Falar delas pode significar falar de impotência, disfunção erétil, infertilidade, problemas da próstata, Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST) e outros assuntos que se relacionem aos agravos do funcionamento do ser do homem. A redução dessa expressão à doença pode, em parte, ser explicada pela formação de algumas especialidades da saúde que se ancoram – quase que exclusivamente – na anatomofisiopatologia.

Assim como Schpun (2004), consideramos que convive na masculinidade uma pluralidade se sentidos, a ponto de ser mais adequado falarmos de masculinidades do que de masculinidade. A pluralidade da masculinidade obriga a considerar a existência de múltiplos seres homens. Como observa Pinho (2005) “não apenas um homem, mas um homem negro ou branco ou um homem gay ou assumido pela heterossexualidade compulsória”.

Esse olhar plural sobre o masculino deve se traduzir em uma crítica permanente à tentativa de reduzir a masculinidade de uma categoria que torne os homens homogêneos. Por isso, nos propomos a olhar para os processos dinâmicos de construção e reconstrução do masculino, fazendo dialogar diferentes campos disciplinares em busca de uma compreensão casa vez maior dos universos de gênero e instigando a pensar em uma vida mais saudável de homens e mulheres, construída a partir da superação e redutores que regam o masculino e o feminino.

O corpo de um homem e sua subjetividade são construídos para domínio de si e do outro, para a constituição de uma relação de oposição com o mundo, com as pessoas e até mesmo com amigas/os, parceiros/as,. Isso demonstra que tecnologias corporais são, portanto, tecnologias de gênero, pois tornam as pessoas a formas sócias compreendidas como masculinas e femininas. Assim “um dos preços da masculinidade, portanto, era uma eterna vigilância das emoções, dos gestos do próprio corpo” (DAMATTA, 1997).

Retomando DaMatta (1997), pode-se considerar as nádegas dos homens como zonas proibidas, porque se o falo (a parte anterior, o pênis) caracteriza os homens, as nádegas ( a parte posterior) funcionam como o outro lado da medalha, nivelado às mulheres.

Não só o toque em determinadas partes do corpo masculino deve ser evitado, mas também determinados gestos e comportamentos são autorizados para o ‘‘macho’’ devem ser excluídos na expressão masculina como diz um dos entrevistados: “Não quero fazer nunca mais! Constrangedor! Não aceito não!”.

O fato de se falar de uma doença, que às vezes nem o nome se pronuncia, pode comprometer a busca de um diagnóstico. A idéia do que não é pronunciado pode ter influenciado alguns dos nossos entrevistados quando fala: “Fiquei cismado...”.

A não busca de medidas preventivas do câncer da próstata também pode ser influenciada por aspectos culturais que refletem na socialização dos homens em geral. Segundo os entrevistados: “Por causa do preconceito tive vergonha... Fiquei cismado!”

A possível indiferença em relação ao cuidar de si por parte dos homens pode ser explicada a partir da perspectiva da construção social. Segundo essa perspectiva, mulheres e homens pensam e agem de maneira diferenciada porque são influenciados pela construção de uma feminilidade e masculinidade ditada por sua cultura, ou seja, os indivíduos são estimulados a adaptar-se a estereótipos que leva a assumir normas dominantes de feminilidade e masculinidade. Tais normas, culturalmente construídas, podem suscitar sentimentos e comportamentos que se diferenciam por gêneros (GOMES, 2008).

A necessidade de responder a uma norma de masculinidade também afeta a solicitação, por parte dos homens, atenção aos serviços de saúde. Para o homem, é muito difícil ocupar o papel de paciente, e com frequência nega a possibilidade de estar enfermo e procura um médico, só em último caso, já que ao contrario poderia estar assumindo um papel passivo, dependente e de fragilidade e só procura os serviços quando algo vai mal e há muita debilidade.

Estas questões apresentadas pelos nossos sujeitos não se relacionam apenas às especificidades dos seguimentos masculinos, mas também podem ser fatores impeditivos para a população em geral, principalmente no que se refere aos grupos economicamente mais desfavorecidos. Outro aspecto que compõem o cenário da nossa discussão se relaciona à questão escolaridade. Há um pressuposto de que informação pode influenciar na decisão dos homens, tanto em relação ao autocuidado em geral, como também, em relação à prevenção do câncer de próstata, principalmente no que diz respeito a realizar o toque retal. Ilustrando esse posicionamento, destacamos a seguinte fala: “Vi passar na televisão e todo mundo fazendo e vendo os estudantes da Universidade Estadual de Santa Cruz... palestrando, fiquei com medo...”.

Seguindo esse raciocínio, observamos que o toque retal, para os entrevistados pode suscitar constrangimentos e vicio. Nesse sentido, o toque retal não toca apenas na próstata, mas também no sentido mais íntimo do homem: “por causa do preconceito tive vergonha...; não quero fazer mais nunca...!; Constrangedor, não aceito não!; não volta mais, mas tem que voltar senão a próstata fica grande...”

O toque retal não pode ser visto apenas como exame físico que diagnostica precocemente o câncer da próstata. Esse exame não toca apenas na próstata, ele toca em aspectos simbólicos do ser masculino, que se não trabalhados, podem não só inviabilizar essa medida preventiva como também a atenção à saúde do homem em geral. Com base na interpretação das falas dos nossos entrevistados, podemos dizer que, mais que na próstata, o toque retal na masculinidade: “muitas pessoas comentam que quem faz esse exame fica viciado, é mentira!” Influenciados por modelos de masculinidade, as condutas masculinas podem trazer comprometimentos não só para saúde do homem, como também, para a saúde dos seus familiares.

      Em contrapartida, a socialização dos homens estaria mais associada a invulnerabilidade, força e virilidade, características incompatíveis com a demonstração de sinais de fraqueza, medo, ansiedade e insegurança, representa pela procura por serviços de saúde, que colocaria em risco a masculinidade e aproximaria o homem das representações de feminilidade. No imaginário social, é comum associar masculinidade a risco. Em geral, os homens costumam ser influenciados pelas “prescrições sociais que representam o risco não com algo a ser evitado pelos homens, mas como algo a ser superado cotidianamente por eles” (COSTA, 2003).

O toque retal pode suscitar nos sentimentos mais recônditos dos homens a invasão do “eu”, “macho”, do “ativo”. Outro sentido atribuído ao toque retal vincula-se à “dor” quando não há o posicionamento correto do paciente, lubrificação abundante e introdução digital suave, pois são as condições fundamentais para evitar tal situação. Existe ainda entre nós, por condicionamento sociocultural, uma espécie de inibição ou vergonha, quando se fala em exame anorretal. Com tudo, explicando-se ao paciente com clareza a importância e a necessidade do exame, as barreiras se desfazem e ocorre diminuição das tensões e um relaxamento esfincteriano promovendo conforto e alívio da dor. A dor foi manifestada entre os informantes da pesquisa: “senti dores na hora que o médico fez o exame...; senti dores no pé da barriga...”. Essas falas apontam que existem diferentes formas de se subjetivar o exame em questão. Segundo elas, o exame, de um lado que suscitar constrangimento, dor (física e simbólica) e, de outro “medo”.

Apesar de muitos dos entrevistados citarem sentimentos negativos em relação ao exame e saber que não havia nenhuma doença na próstata: “não tive sentimentos negativos...; me sinto bem...; ao fazer o exame da próstata e ao receber o resultado que tudo está bem, fiquei tranquilo.”

Escutar as suas falas e olhar as suas ações é de fundamental importância para que possamos encontrar a forma mais adequada de abordá-los e de lidarmos com eles. Na primeira categoria encontramos os sentimentos mais íntimos que homens formularam após realizarem o exame clinico da próstata (toque retal) – as subcategorias, Positivos (SMP); Negativos (SMN); Neutros (SMN). Portanto, a realização do exame é dificultada pelas limitações psicoemocionais envolvidas no imaginário mental e social no qual o homem está inserindo. Neste sentido, é interessante observar que os sujeitos veem-se tomados por um misto de sentimentos que envolvem de uma lado bem-estar, tranquilidade, alivio e alegria, e por outro, medo, preconceito e censura.

Historicamente, a atenção à saúde no Brasil tem investido na formulação, implementação e concretização de políticas de promoção, proteção e recuperação da saúde. Há, pois, um grande esforço na construção de um modelo de atenção à saúde que priorize ações de melhoria da qualidade de vida dos sujeitos e coletivos. No entanto, ao longo dos anos, o entendimento da integralidade passou a abranger outras dimensões, aumentando a responsabilidade do sistema de saúde com a qualidade da atenção e do cuidado (GOMES, 2008).

A integralidade implica, além da articulação e sintonia entre as estratégias de produção da saúde, na ampliação da escuta dos trabalhadores e serviços de saúde na relação com os usuários, quer individual e/ou coletivamente, de modo a deslocar a atenção da perspectiva estrita do seu adoecimento e dos seus sintomas para o acolhimento de sua história, de suas condições de vida e de suas necessidades em saúde, respeitando e considerando suas especifidades e suas potencialidades na construção dos projetos e da organização do trabalho sanitário. Promover a qualidade de vida e reduzir vulnerabilidade e ricos à saúde relacionados aos seus determinantes e condicionantes – modos de viver, condições de trabalho, habitação, ambiente, educação, lazer, cultura, acesso a bens e serviços essenciais. (GOMES, 2008).

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por meio deste estudo foi possível conhecer os sentimentos expressados pelos usuários do SUS após submissão do toque retal no exame da próstata, os quais perpassaram por sentimentos Positivos; Negativos; e em algumas situações Neutros.

Também, foram averiguados os possíveis medos e tabus dos usuários do SUS, em relação ao toque retal, para exame da próstata e identificados os motivos que levaram o usuário à realização o exame clínico da próstata. Os seguintes sentimentos foram relatados: alívio, por ter cumprido o que recomenda os serviços de saúde, sentimentos negativos, como, medo por ser uma situação desconhecida, dor, preconceito, por causa dos comentários negativos em torno do exame, vergonha, cisma, constrangimento.

Os motivos que levam à realização do exame, perpassou pelo conhecimento da importância de se submeter ao exame, pela idade acima de 40 anos, como rotina anual, à manifestação de sinais e sintomas de algum desconforto, a exemplo de dor e dificuldade de urinar.

Concluímos que os objetivos propostos foram alcançados e que discussões precisam ser ampliadas para a compreensão das questões sobre a prevenção/diagnóstico do câncer prostático, seja melhor elaborada e aceita por população.

 

6. REFERÊNCIAS:

 

BARDIN, Laurence.  Análise de conteúdo. Ed. Actualize. Lisboa-Portugal. Ano: Março/2008.  

 

BARDIN, Laurence.  Análise de conteúdo. Ed. Actualize. Lisboa-Portugal. Ano: Março/2004.

 

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Assistência à Saúde. Instituto Nacional do Câncer. Documento de consenso. Rio de Janeiro: INCA, 2002.

 

COSTA, R. G. Concepção de filhos, concepção de pais: Algumas reflexões sobre reprodução e gênero.  Revista de Ciências Sociais, São Paulo 2003

 

DAMATTA. Tem pente aí?, PP 31-49 In D Caldas (org.). Homens. Editora Senac, São Paulo. 1997

 

DANGELO, José Geraldo. Anatomia humana sistêmica e segmentar, 3ª Ed. – São Paulo; Editora Atheneu., 2007.

 

GOMES, R. Sexualidade masculina e saúde do homem: proposta para uma discussão. Rev C S Col 2003.   

 

GOMES, R. Câncer de próstata e masculinidade: motivações e barreiras para a realização do diagnóstico precoce da doença. [texto na Internet] 2005 [acessado 2005 Out 30]. Disponível em: https://www.abep.nepo.unicamp.br      

 

GOMES, R. Sexualidade masculina, Gênero, e saúde. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2008.

 

MINAYO, Maria Cecília de Souza. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 11 ed.- São Paulo: 1996.

 

PINHO, O. A. Etnografias do Brau: corpo masculinidade e raça. Estudos feministas. Bahia 2005

 

SMELTZER, S. C.; BARE, B. G. Enfermagem médico-cirúrgico. Volume 2, editora koogan, ano 2008..

SCHPUN, M. R. As várias dimensões do masculino: Traçando itinerários possíveis. São Paulo, 2004 

TORTORA, Gerard. Anatomia orientada para a clínica. Rio de Janeiro. Ano: 2009.

 

Artigo completo: