Sem motivação, apenas "incentivo"

Por Carla Moura | 17/10/2010 | Política

Democracia: "governo do povo; soberania popular; democratismo", conceito segundo Aurélio. Ao ouvirmos essa palavra, certamente nos vem à mente algo familiar, não poderia ser de outra forma quando estamos em um país caracterizado democrático e cujo valor nos é lembrado constantemente. Mas, ao ouvirmos o conceito, talvez não nos familiarizemos tanto assim. Tais palavras conceituais não configuram a realidade no nosso país, distanciando assim dessa definição universal e criando uma concepção própria do que é a democracia aqui desempenhada.
Historicamente, podemos dizer que a democracia nunca teve uma sociedade legítima. Voltando para o seu "berço" na antiga Grécia, nos deparamos com uma sociedade em que os cidadãos podiam decidir diretamente sobre os assuntos de seu interesse, tendo direito de falar e votar as suas leis, além de atuar como governantes. Porém, para os gregos, cidadãos eram todas as pessoas menos mulheres, escravos e estrangeiros e isso implicava, na época, em 98 % da população. Isso não configurou nem mesmo o conceito que havia na época, segundo Aristóteles, de que democracia é uma forma de governo em que as decisões políticas são tomadas diretamente pelo povo e não por seus representantes; pois até então, havia representantes (2% da população).
Voltando-nos novamente para o nosso "lar", Brasil. Um país que desde os seus primeiros passos é marcado pela submissão, alienação e repressão, "preconceitos" esses que são reflexos de nada mais do que da desigualdade social. Classe alta, média, baixa e até mesmo sem classe; essas denominações são frutos da realidade, esta que acaba por caracterizar cada uma delas quanto ao acesso à educação, alimentação, saúde e aos bens materiais. A classe a qual cada um pertence é estabelecida então pela grau de relação que se tem com os "benefícios" citados anteriormente, isso gera uma hierarquização da sociedade, onde os mais favorecidos acabam sendo superiores aos menos favorecidos, determinando assim , também o papel que será desenvolvido por cada um na sociedade.Então, as maiores classes acabam por desempenhar papéis que subordinam as menores classes. Não se excluem desses papeis, os cargos governamentais.
Falar em democracia no Brasil , é o mesmo que falar em eleições pois o ato de votar é considerado o maior exemplo de democracia praticado no país. Mas será que é verdade?
Eleição é um processo de escolha dos dirigentes - devem representar a população, garantindo e lutando por seus direitos - de um país (inclui-se ai estados e municípios), através do voto de seus cidadãos. A Constituição define os poderes políticos, incluindo o voto, em seu artigo 14, parágrafos I e II. Nele é especificado que o voto é obrigatório a todos os maiores de 18 anos e facultativo aos maiores de 16 e menores de 18, maiores de 70 anos e analfabetos; e é vetado aos estrangeiros e durante o serviço militar. Analisando esse conceito de eleição e esse artigo, podemos dizer que realmente todas as pessoas têm o direito e obrigação de escolher seus representantes, então, por que existe esse conceito tão distorcido de democracia?
Retomando a definição inicial "governo do povo". A população vota nas pessoas que se candidatam a algum cargo - presidente, governador, senador... - sabendo que serão elas que irão representá-las, isso implica lutar pelos direitos - educação, saúde, moradia, alimentação, segurança, transporte ? e garanti-los. Isso poderia ser sim, aceitável como democracia, mas a partir do momento em que esses "porta vozes" não defendem as necessidades e vontades da população, esse sistema democrático passa a ser falho e normalmente é isso que acontece. O problema estaria então nos representantes, porém quem os elegeram foi a população, assim esta passa a ser vítima das suas próprias escolhas.
"A consciência político-social dos cidadãos, derivada de sua formação, seu nível de instrução e acesso a informação qualificada, é fundamental para determinar a possibilidade de seu nível de participação efetiva, entendida como sua capacidade para reconhecer, expressar e defender seus interesses nas discussões políticas" *. Com esse parecer, voltamos aos conceitos de classes que foram abordados, as pessoas que não têm acesso principalmente à educação e informação são facilmente manipuladas no seu voto e não têm um fácil acesso ou condição para que se sujeite a votação. Isso confirma ainda mais a desigualdade social e a distinção dos papéis por classes na sociedade.
Consciência, definitivamente é o que falta a população ao escolher seus representantes. Acontece que a maioria das pessoas se deixa levar por falsas promessas, por favores, amizades, influências, entre outras coisas, deixando de analisar as condutas e propostas dos candidatos, devido a isso erram na escolha e elegem candidatos que não contribuem para o social. Por outro lado, sendo minoria, existem pessoas que estabelecem métodos para decidir em quem votar. Diante dessa situação, serão analisadas as motivações dos eleitores na hora do voto.
Os eleitores no fundo sempre têm alguma motivação pacífica para votar em algum candidato, motivos esses que visam sempre uma melhoria em algum setor público seja ele educacional, hospitalar, estrutural ou alimentício. É perceptível que as intenções de voto mudam de acordo com a faixa etária dos eleitores ou pela sua ocupação na sociedade.
Analisando as propostas dos candidatos, os jovens buscam principalmente soluções para a melhoria do ensino público municipal, estadual e federal, como também do ensino técnico, tendo em vista o mercado de trabalho que está cada vez mais exigente. Quando se trata de mercado de trabalho, eles também ficam atentos, pois estão em uma fase de inserção neste ramo e precisam de oportunidades, ou seja, de mais empregos. As propostas de novas indústrias e empresas no setor comercial, também são vistas como oportunidades.
Melhoras no setor alimentício e no transporte público são promessas que chamam atenção dos adultos, visto que são necessidades básicas para uma família. A alimentação é precisa todos os dias e programas que ajudem a diminuir os preços dos produtos ou que ofereçam cestas básicas ? para as famílias mais necessitadas ? são bem vindos pelos patriarcas. No transporte público, argumentos sobre o aumento dos ônibus, metrôs, novas alternativas de condução, assim como alterações no valor da passagem são aceitas com atenção pelos adultos que precisam desse setor para ir e vir.
As propostas acerca da saúde: mais hospitais, médicos, farmácias com preços acessíveis, campanhas de vacinação, entre outras melhorias nessa área, são mais atraentes para as pessoas acima de 50 anos, que por pressuposto precisam mais desses serviços.
Observando agora sob o ponto de vista dos profissionais. Nesse caso a ampliação do mercado de trabalho, aumento do salário mínimo e atenção aos direitos trabalhistas são propostas, é claro, vistas como essenciais. Podemos observar outros casos particulares como: o agricultor, que está atento as promessas de assistência maior ao setor primário; o médico, que espera por melhorias nos hospitais, assim como instrumentos e medicamentos; o taxista, que precisa de políticas públicas que melhorem o trânsito; o professor que ainda espera o reconhecimento e uma melhor assistência no tocante a materiais escolares; o comerciante que espera por ações governamentais que incentivem e movimentem o comércio. Ações assim propostas chamam a atenção dos profissionais e contando que não passem de promessas, podem motivar o voto.
Existem propostas que chamam a atenção de um público alvo, que é o das pessoas portadoras de deficiência, então a idéia de um programa de assistência e políticas que promovam a inclusão delas na sociedade, orientam também o voto. Sendo esse um problema ainda muito grande na sociedade, a atenção que algum candidato dá a esta causa, passa a ser um diferencial. É importante comentar que muitas pessoas portadoras de deficiência estão lançando candidatura justamente para defender os direitos desse grupo.
Podemos associar a motivação do voto, às idéias de um sociólogo muito conhecido que é Max Weber. Ele nos seus estudos sobre o poder político e legitimidade deste, concluiu que existem três tipos de dominação por parte das autoridades, são eles: poder tradicional, poder carismático e poder legal/racional.
Na visão tradicional, quem detém a autoridade é denominado senhor ou patriarca e os que estão sob suas ordens são chamados súditos. Nesse caso as pessoas se subordinam a esse tipo de autoridade por crença. Não seria um motivo eleitoral mas sim, uma forma de aceitar o representante apenas por tradição.
No poder carismático, a autoridade detém uma qualidade pessoal incomum, é carismático, tido como herói, possuidor do poder intelectual e da oratória, por esses motivos ele ganha seguidores. Muitos candidatos aqui no Brasil são eleitos justamente pelo poder carismático que têm, principalmente os representantes de governos populares. Aqui em Alagoas podemos citar o atual prefeito de Maceió, Cícero Almeida que tem a grande simpatia da população e o ex-presidente da república e atual candidato ao governo Fernando Collor que possui muitos seguidores principalmente pela sua oratória e trajetória considerada por alguns como heróica. Podemos citar outros líderes carismáticos na história brasileira como no período da Primeira República onde se destacam os movimentos messiânicos promovidos pelos beatos Padre Cícero, que comandou a revolta de Juazeiro (1911), e Antônio Conselheiro, que chefiou a revolta de Canudos (1896).
O poder legal/racional, conhecido também como dominação burocrática, existe quando há a crença em um estatuto. A dominação se legitima nas leis, e estas determinam como será a nomeação da autoridade. É o que acontece justamente com as eleições, que é uma forma legal de escolher os representantes e a população aceita isso como norma, reconhecendo assim a autoridade.
Infelizmente o que motiva a escolha do voto não são somente as propostas, mas também ou somente, os incentivos. Muitos vêem as eleições como um negócio, um cargo do executivo ou legislativo como um emprego qualquer, então se utilizam de todas os meios para ganhar as eleições, meios esses que são ilegais como a compra de voto e promessa de cargos públicos. Acontece que isso passa a ser uma condição para votar e se torna cada vez mais comum na sociedade.
O que impressiona é que na maioria das vezes as pessoas trocam seus votos por bens materiais banais, ou algum dinheirinho, até mesmo um emprego e votam em candidatos sem propostas e sem conduta e é essa a causa dos problemas sociais que insistem como a pobreza, a fome, os crimes, a má qualidade de um sistema público de saúde e educação. Então como já foi dito, acaba sendo vítima da sua própria escolha.
Como podemos notar, as motivações que levam a população a votar são as mais diversas, são métodos conscientes e inconscientes, prevalecendo este último que elegem candidatos que vão interferir na vida da sociedade por quatro anos. Tendo em vista a importância que um cargo como este tem é preciso confiá-lo sempre a uma pessoa com propostas consistentes e como dizemos atualmente, com a ficha limpa. Então é preciso que a população repense sobre esse problema ao eleger um representante e que passe a partir de agora ter motivos para votar e não apenas "incentivos".