SEGURANÇA PÚBLICA NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO NO BRASIL
Por Antonio Roberto | 20/07/2009 | FilosofiaAntonio Roberto Xavier*
*SGT da ativa da PMCE; Graduado em História pela UECE, Especialista em História e Sociologia pela URCA, Mestre em Políticas Públicas e Mestre em Planejamento pela UECE.
Resumo: Este artigo trata, especificamente, sobre segurança pública no Estado Democrático de Direito no Brasil. Em princípio, se faz um breve histórico sobre segurança pública no Brasil discutindo os principais conceitos e definições utilizados por estudiosos do assunto que analisam essa temática e pela Constituição Federal Brasileira de 1988. Num segundo momento, o debate gira em torno da segurança pública e sua inclusão na relação dos Direitos Humanos e direito fundamental no Estado Democrático de Direito.
Palavras-chaves: Estado Democrático de Direito, Segurança Pública, Direitos Humanos
Abstract: This article treats, specifically, on public safety in the Democratic State of Right in Brazil. In beginning, it is made a historical abbreviation on public safety in Brazil discussing the main concepts and definitions used by the main authors that analyze that theme and for the Constitution Federal Brazilian of 1988. In a second moment, the debate rotates around the public safety and his/her inclusion in the relationship of the Human Rights. Second, the debate revolves around the public safety and its inclusion in the relation the Human Rights and fundamental right in the Democratic of Right.
Key-words: Democratic State of Right, Public Safety, Human Rights
1. Segurança pública: conceitos e definições
A história nos informa que durante o período colonial os capitães-mores e/ou autoridades locais, ao serem nomeados pela metrópole, acumulavam abusiva e promiscuamente funções administrativas, judiciárias e policiais. No decorrer do império, os juízes togados ou nomeados e a formação de milícias particulares pertencentes à aristocracia rural exerciam também o cargo de chefes de polícia. No período republicano, da República da Espada (1889-1891) e durante toda à República Velha (1891-1930), a questão da segurança pública continuava voltada para atender aos interesses privados das classes dominantes e dos oligopólios políticos no âmbito dos grandes latifundiários ou "coronéis", dentro de uma ordem sempre militarizada. Da década de 1930 até bem pouco tempo as práticas de uso do serviço público da segurança a fim de atender a interesses privados continuaram quase intactas. Com efeito, no Brasil, o uso de serviços públicos para fins de interesses privados sempre foi uma prática recorrente (CHAUÍ, 1992; FERNANDES, 1973; FERNANDES, 1995; BRASIL, 2000; HOLANDA, 1995; DEMO, 1994; e FAORO, 2001a, 2001b).
Indubitavelmente, desde a instalação da República o desafio dos governos de efetivarem reformas e aperfeiçoarem os organismos diretamente ligados à área da segurança pública, continuam postos. Conforme Adorno (1996), a segurança pública é uma das áreas mergulhadas numa crise de credibilidade dos aparelhos policiais, na falta de eficácia e eficiência destes em pacificar a sociedade, em solucionar seus conflitos nos ditames do Estado Democrático de Direito. Por outro lado
A reprodução do sistema distorcido exige que o paciente Brasil seja silenciado pela anestesia da falsa consciência tão bem produzida nos meios de comunicação coniventes no analfabetismo funcional, na amnésia das experiências fracassadas e dolorosas, pela utilização de relações e de instrumentos autocráticos, despótico-militares ou civis -, tidos como necessários para assegurar o silêncio do protesto, calar o clamor dos excluídos e o estertor dos sacrificados (CAMPOS, 1997, p. 201-202).
Após a era Vargas (1930-1945), o período populista (1946-1964) e dos 21 anos de regime militar (1964-1985), no qual o País esteve mergulhado num enorme autoritarismo político e a segurança pública baseada na Doutrina da Segurança Nacional militarizada, a transição à redemocratização não rompeu com as estruturas autoritárias e as práticas de poder. Segundo Brasil (2000), o legado autoritário dessas estruturas de abuso de poder se estende de maneira contundente aos organismos policiais que denunciam a continuidade de práticas ilegais e a manutenção da truculência no âmbito da segurança pública.
Desta maneira, a redemocratização do País não significou o fim das práticas ilegais e do uso indiscriminado da violência instrumental que tem caracterizado o dia-a-dia dos dispositivos policiais, como aparelhos de Estado, detentores do monopólio da força legal... O retorno ao Estado democrático de Direito não quer dizer, no nosso caso específico, a hegemonia dos princípios democráticos e da legalidade na operacionalização dos serviços policiais. Isto se vem contrapor ao pensamento de Norbert Elias (1997), ao dizer que a instauração do monopólio da força no Estado vai controlar o uso indiscriminado da violência, visto que, nos espaços pacificados, o uso da violência é uma exceção, já no caso brasileiro, tem sido uma regra constitutiva, ao longo de nossa história, quer nos espaços pacificados, quer nos espaços não pacificados (BRASIL, 2000, p. 95-96)
Com efeito, o retorno do País à redemocratização pós-1985, possibilitou amplas conquistas de autonomia institucionais, garantias de um grande leque de direitos individuais, políticos e sociais, diminuição de graves violações de Direitos Humanos. Porém, não significou a descontinuidade de práticas ilegítimas, ilegais e abusivas por parte dos organismos policiais que não sofreram as devidas reformas necessárias para seguir o caminhar democrático institucional (ADORNO, 1995). Como disse o então senador da república FHC, o "entulho autoritário" da legislação do País está longe de ser removido (PERALVA, 2000).
A Nova República, pós-1988, significou mudança de regime governamental com abertura do pluralismo partidário político com novos grupos de representantes nas esferas federal, estadual e municipal. Entretanto, uma gama de elementos constitutivos da ditadura militar se manteve intacta, como lideranças políticas ligadas às antigas oligarquias. Essa continuação de estruturas políticas e militarizadas permitiu que práticas autoritárias, ilegais repressivas e de violação de Direitos Humanos continuassem nas entranhas das instituições no Estado constitucional. Neste sentido, a permanência das estruturas da ditadura e as práticas autoritárias têm emperrado a consolidação do regime democrático e atrofiado o desenvolvimento e solidificação do Estado de Direito.
Se examinarmos, como fazemos aqui, a combinação da sobrevivência das práticas desses contingentes políticos com a manutenção de alguns preceitos legais da organização política da ditadura, em pleno regime democrático, concluiremos que prevalece um sistema de governo marcado pela continuidade, diferente daquele do regime autoritário que o precede mas incapaz atender satisfatoriamente os pré-requisitos da formalidade democrática. Entre a democracia populista, o regime militar e o atual regime democrático com o governo civil após o fim da ditadura e os governos eleitos, tanto federal como estaduais, se considerados sob a perspectiva da garantia dos direitos humanos, ressalvado o fim da repressão política, há muito mais pontos de contato que diferenças. Diante da corrupção, do agravamento das violações dos direitos humanos e de sua impunidade, o regime autoritário (1964-85) e o regime constitucional de 1988 com os governos civis, de transição e eleitos, dada a ausência de rupturas significativas na área da cidadania, foram expressões diferenciadas de uma mesma estrutura de dominação fundada na hierarquia, discriminação, impunidade e exclusão social (PINHEIRO, 1995, p. 11).
Deste modo, a forma de transferência do poder dos militares aos civis, pós-1979, com o fim do Ato Institucional Nº. 5 – AI-5, no plano da segurança pública teve resistências significativas, sobretudo no tocante às polícias militares que desde o Decreto Lei Nº. 667/1969 era diretamente vinculada ao Ministério do Exército Brasileiro. Somente a partir da CF de 1988 é que as Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares passaram a se subordinarem aos Governadores dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios. Todavia, essas forças militares continuaram sendo também forças auxiliares e reserva do Exército com formação, estatutos, códigos, inspetorias, hierarquia e disciplinamento próprios das Forças Armadas Militares (CF, 1988, art. 144, Inc. IV, § 6º).
Conforme Peralva (2000), o advento da redemocratização herdou quatro sustentáculos principais que explicam a violência-criminal como fator de insegurança: o legado autoritário militarista, a desorganização das instituições, a pobreza e a mudança social. Relacionando a este trabalho, destaca-se o legado militarista às Polícias e Corpos de Bombeiros Militar que significou a continuidade autoritária da Lei de Segurança Nacional da Ditadura como também representou a herança das práticas de repressão de delitos por essas instituições que permaneceram desqualificadas e despreparadas para agir respeitando e garantindo os direitos civis e políticos no Estado Democrático de Direito. Esses são paradoxos existentes na redemocratização no Brasil que, somados ao excesso de formalismo jurídico, que significa morosidade judicial e processual, contribuem para os fatores de insegurança com conseqüente violação dos direitos da pessoa humana, fazendo crescer o sentimento de impunidade (ADORNO, 1996, 2000).
Sabe-se que a segurança pública no Estado Democrático de Direito tem por objetivo garantir o exercício das liberdades fundamentais, assegurando espaços pacíficos para que haja prosseguimento de convivência harmoniosa em sociedade. As chamadas "Forças da Ordem" – termo usado por Castel (2005) – que são os organismos policiais – são empregados legal e legitimamente para efetivar essa missão. Contudo, essa tarefa não é de fácil cumprimento em função de lacunas profundas legadas por governos anteriores e a continuação dessas lacunas nos governos presentes. A persistente política oligárquica de concentração de poderes sempre manteve seus interesses privados com base nesse setor. Além disso, essas instituições por si só não podem e nem devem ser responsabilizadas, exclusivamente, pela segurança pública que como já foi citado é responsabilidade do Estado e dever de todos. Essas forças públicas fazem parte do aparelho repressor do Estado e agem ideologicamente no sentido de manter a ordem e o funcionamento legal desse Estado (COTRIM, 1988).
Os manuais de técnicas policiais e jurídicos definem segurança pública como uma condição concreta que o indivíduo alcança quando o Estado legal proporciona garantia e preservação de seus direitos e liberdades individuais, como o de propriedade, o de locomoção, o de proteção contra o crime em todas as suas formas. Esta é a parte operacional de proteção civil. Mas, a proteção civil depende também da proteção social, por isso o verbete "segurança" no dicionário jurídico de De Plácido e Silva (1963), define segurança como
[d]erivado de segurar, exprime, gramaticalmente, a ação e efeito de tornar seguro, ou de assegurar e garantir alguma coisa. Assim, segurança indica o sentido de tornar a coisa livre de perigos, de incertezas. Tem o mesmo sentido de seguridade que é a qualidade, a condição de estar seguro, livre de perigos e riscos, de estar afastado de danos ou prejuízos eventuais. E Segurança Pública? É o afastamento, por meio de organizações próprias, de todo perigo ou de todo mal que possa afetar a ordem pública, em prejuízo da vida, da liberdade ou dos direitos de propriedade de cada cidadão. A segurança pública, assim, limita a liberdade individual, estabelecendo que a liberdade de cada cidadão, mesmo em fazer aquilo que a lei não lhe veda, não pode turbar a liberdade assegurada aos demais, ofendendo-a.
Isto significa dizer que essa proteção civil somente ocorrerá se a proteção social como equilíbrio e segurança à comunidade, seguridade social, preservação do capital, do trabalho, enfim, realização concreta dos direitos civis, políticos, sociais, econômicos e coletivos também forem garantidos, efetivamente pelo Estado constitucional de direito (LAFER, 1991; BONAVIDES, 2000). Segurança pública nesse caso é um bem comunitário e também um direito social que tem um valor geral comum e vital para as comunidades. É um anseio e uma aspiração de todos em sociedade viverem em segurança. No âmbito do aspecto jurídico segurança pública é o afastamento, por meio de organizações próprias, de todo perigo, ou de todo mal que possa afetar a ordem pública, em prejuízo da vida, da liberdade, ou dos direitos de propriedade do cidadão. É a garantia individual de que sua pessoa, seus bens e seus direitos não serão violados e, caso sejam, o Estado tem a responsabilidade de reparar todos os danos causados à pessoa na sua individualidade (CF, art. 5º e 6º).
Na teoria jurídica, a palavra segurança assume o sentido geral de garantia, proteção, estabilidade de situação ou pessoa em vários campos, dependente do adjetivo que a qualifica. Segurança social significa a previsão de vários meios que garantam aos indivíduos e suas famílias condições sociais dignas; tais meios revelam-se basicamente como conjunto de direitos sociais, como dimensão dos direitos fundamentais do homem (FARIAS, 2003, p. 66).
Outro fator de segurança previsto, inclusive, no texto constitucional é o fato de que nenhuma pessoa será obrigada a fazer ou deixar de fazer algo que não esteja previsto em lei (CF, 1988, art. 5º, inc. II). Esse é o princípio da legalidade que rege as relações sociais de direito em sociedade.
[o]utra regra que protege a segurança das pessoas é a que estabelece limitações quanto à pena a ser imposta nos casos de crime. Nenhuma pena pode ir além da pessoa do delinqüente. Seja qual for o crime, só quem teve participação nele é que pode sofrer uma punição. Qualquer acusado tem o direito de ampla defesa, com assistência judiciária gratuita, e de ser julgado pelo juiz ou tribunal que a lei encarrega do assunto. Também está contido na Constituição que não será concedida a extradição de estrangeiro por crime político ou de opinião, bem como, que em nenhuma hipótese será concedida a extradição de um brasileiro (ibidem, p. 68).
A Constituição de 1988, em seu artigo 144, assevera que a segurança pública é "dever do Estado", mas também "direito e responsabilidade" de todas as pessoas. A finalidade da segurança pública, é a preservação da ordem pública e a incolumidade das pessoas e do patrimônio. Para a efetivação destas metas, o texto constitucional define os organismos policiais e CBM, como os órgãos diretamente responsáveis pela promoção da ordem e da segurança pública. Todavia, a discussão sobre a segurança pública envolve muito mais do que conceitos técnicos e jurídicos. Por isso, é de suma importância o aprofundamento investigativo político-histórico-sociológico acerca dessa temática que necessita de reformas urgentes, bem como cooperação mútua entre as esferas federal, estadual e municipal.
É racional afirmar que desde o advento da República no Brasil (1889), a história dos organismos policiais, responsáveis diretos pela promoção da ordem e da segurança pública, tem sido marcada por oscilações entre a autonomia estadual e o controle federal. No decorrer dos períodos de exceção ou autoritários, os organismos de segurança pública foram submetidos ao controle federal. Neste caso, não se pode falar em cooperação, mas em subordinação das polícias estaduais às diretrizes do governo federal. Nos períodos republicanos, os Estados tiveram maciça autonomia para organizar e controlar seus organismos policiais. Todavia, tanto nos períodos de autonomia estadual quanto nos períodos de controle federal, não aconteceram iniciativas concretas para a implantação de uma política ou um programa nacional de segurança pública (MJ – SENASP - SUSP, 2003, 2004, 2005).
Entretanto, alguns sinais de mudanças relativos à melhoria da segurança pública começaram a ser efetivados já no último governo de FHC, com a criação do PNSP (2000) e continuou no Governo de LULA, com o Programa Nacional de Segurança Pública do Governo Federal. Esses sinais estão sendo operacionalizados sob os auspícios da Secretaria Nacional de Segurança Pública – SENASP através do SUSP. De acordo com a proposta do Projeto Segurança Pública para o Brasil (2003), o atual modelo de duas polícias de ciclo incompleto, no plano estadual, está esgotado, ultrapassado. Além disso, o SUSP tem por objetivo criar um novo modelo de organismos policiais para todo o País com qualidade de formação profissional, melhores salários, com políticas de incentivo, amparo e valorização profissional. Neste sentido, o modelo para a segurança pública proposto pelo SUSP é um agir integrado entre União, Estados e Municípios por meio de polícias e guardas municipais. A esperança, segundo o SUSP, é uma formação e integração para acabar de vez as rivalidades historicamente entre PM e PC. Para mudar o modelo autoritário é preciso mudanças profundas no Sistema de Segurança Pública para romper com o modelo autoritário que está implantado.
Com efeito, desde o ano de 2003, o Governo Federal intensificou esforços visando cumprir os programas e planos para a segurança pública brasileira, o que é considerado um marco histórico. A SENASP se consolidou assumindo o papel central de executar as políticas de segurança pública para o País. A SENASP, muito mais que um simples órgão repassador de recursos para os Estados, se institucionalizou como órgão central e mentor na promoção da reforma das polícias no Brasil. Sedimentada nos princípios da gestão federalista, a SENASP tem por meta elaborar e efetivar ações estruturantes através da operacionalização do SUSP visando mudanças e reformas nos organismos policiais, herdeiros de uma cultura militarizada e da Doutrina de Segurança Nacional. Segundo a Síntese do Relatório de Atividades da SENASP (2003, 2004 e 2005, p. 37-38), vem
Atuando em um contexto de consolidação do sistema democrático brasileiro, a SENASP não possui apenas a função de executar ações direcionadas para a melhoria da situação de segurança pública no Brasil. É responsável também por promover a estabilidade democrática em seu campo de atuação. Nesse contexto, a SENASP pode ser vista como um órgão que executa a articulação e a mediação das relações estabelecidas entre diferentes grupos sociais que incorporam especificidades quanto à identificação de problemas e soluções sobre a área de segurança pública no país. Por essa razão, optamos por uma gestão pautada na ação técnica e operacional distanciando-nos e protegendo-nos dos interesses políticos imediatistas que privilegiavam uma visão parcial da questão. Ao invés de realizar investimentos que nos levassem a adquirir "mais do mesmo" e que nos levaram ao estado de coisas que vivemos na segurança pública atualmente, desenvolvemos ações estruturantes da reforma das polícias no Brasil.
As mudanças mais profundas na segurança pública, que demarcarão o fim do modelo de polícia criado nos períodos autoritários, exigem o estabelecimento de um novo marco legal para o setor de segurança. A proposta do SUSP é de colocar mais policiais nas ruas, com melhoria na qualidade e na eficiência do serviço público prestado, garantindo-lhes salários compatíveis com a importância da profissão. A meta é se ter profissionais mais motivados, para não ser preciso fazer o serviço extra (o bico) para complemento o salário. A otimização de recursos propiciará o aprimoramento do aparelho policial com melhorias tecnológicas e investimento no material humano e logístico.
Segundo o PNSP/2003, para a melhoria no âmbito da segurança pública, o Governo Federal considera essencial a reforma nos organismos policiais visando torná-los mais eficientes, respeitadores dos Direitos Humanos e voltados para a construção da paz ao invés de organismos que vejam o seu próximo como inimigos em potencial. Nesse sentido, o PNSP/2003 do Governo Federal considera ser necessário à efetivação de políticas públicas de segurança que acolham a participação multidisciplinar e interinstitucional, envolvendo, além de policiais, outros setores governamentais, entidades da sociedade, movimentos sociais e organizações do terceiro setor, incluindo também a contribuição das universidades com pesquisas voltadas para a área. Além disso, "[o] Programa de Segurança Pública para o Brasil propõe que o instrumento fundamental para a efetivação das referidas mudanças nas polícias brasileiras é a educação" (MJ - SENASP. Relatório de Atividades 2003/2004/2005, p. 9).
Essas propostas estiveram explícitas durante a campanha eleitoral de Lula em 2002, dentro de um outro programa do governo federal para a segurança pública, o SUSP. Todavia, na prática, pouco se tem tido reformas nessa área, pois, a verdadeira segurança pública depende do respeito pelos direitos humanos de todos. Isso implica proteger as pessoas de serem mortas e de sofrerem violência em todas as suas formas (Relatório da Anistia Internacional – AI, 2005). É necessário ressaltar que
[p]romover uma reforma das polícias não é uma ação tão simples de ser executada, pois não envolve apenas ações de modernização tecnológica, treinamento de policiais e reaparelhamento das organizações de segurança pública. Essa reforma pressupõe a realização de uma mudança na cultura das Polícias em todo o Brasil. Esse processo é lento e complexo. Envolve uma mudança de paradigma na área de segurança pública. Porém, mesmo nesse sentido, já temos sinais que nos permitem identificar que a mudança vem ocorrendo. Hoje, muitas organizações de segurança pública no país elaboram suas ações tendo como pano de fundo a análise dos resultados alcançados. Um dos temas de maior freqüência de curso de capacitação dos policiais no Brasil é o dos Direitos Humanos. Dessa forma, identificamos que as forças policiais começam a entender que a segurança pública não é apenas 'assunto de polícia'. Pela primeira vez, tivemos uma apreciação das Nações Unidas quanto ao processo de formação de Direitos Humanos empreendido na área de segurança pública no Brasil (MJ – SUSP – SÍNTESE DO RELATÓRIO DE ATIVIDADES, 2003/2004/2005, p. 37).
É necessário ressaltar que a segurança pública no Estado Democrático de Direito é um programa ideal para garantir a ordem e a incolumidade das pessoas. Contudo, segundo Castel (2005), esse programa não pode erradicar plenamente a insegurança porque, para fazê-lo, seria necessário que o Estado controlasse todas as possibilidades individuais e coletivas de transgressão da ordem social. Castel esclarece, ainda que a questão da segurança e da insegurança segue o paradigma proposto por Hobbes, ou seja, a total segurança somente pode existir se o Estado é Absoluto, isto é, se o Estado tem o direito e o poder de erradicar irrestritivamente todos os desejos efêmeros, fantasias e ilusões que atentem contra a segurança das pessoas – segurança civil e dos bens – segurança social. Por outro lado, caso o Estado se torne mais ou menos democrático colocando, conseqüentemente limites ao seu irrestrito poder, evitando o despotismo e o totalitarismo, as liberdades individuais e coletivas de seus membros infringirão a ordem social e a segurança jamais será plena no âmbito público.
Ainda, segundo Castel (2005), um Estado Democrático e de Direito é impedido de ser protetor a qualquer modo e a qualquer custo, pois caso o seja, esse Estado passa a ser também totalitário ou despótico. A existência de princípios constitucionais, a institucionalização da separação dos poderes, o cuidado de se respeitar o direito no uso da força, incluindo a pública, põem tantos limites ao exercício de um poder absoluto e criam indireta, mas necessariamente, as condições de uma certa insegurança. Um exemplo citado por Castel é o controle da magistratura sobre a polícia que se enquadra nas formas de intervenção e limita suas liberdades. Outro fator que favorece a insegurança, em geral, paira na possibilidade do delinqüente tirar vantagem do cuidado de se respeitar às formas legais e a impunidade da qual se beneficiam alguns delitos é uma conseqüência quase necessária da sofisticação do aparelho judiciário. Além disso,
[o]s 'bairros sensíveis' cumulam os principais fatores de insegurização: altas taxas de desemprego, empregos precários e atividades marginais, habitat degradado, urbanismo sem alma, promiscuidade entre os grupos de origem étnica diferente, presença permanente de jovens ociosos que parecem exibir sua inutilidade social, visibilidade de práticas delinqüentes ligadas ao tráfico de drogas e às receptações, freqüência das 'incivilidades' dos momentos de tensão e de agitação e dos conflitos com as 'forças da ordem', etc. A insegurança social e a insegurança civil coincidem aqui e se entretêm uma à outra (CASTEL, 2005, p. 55).
Com efeito, o fato é que quanto mais um Estado se afasta do modelo Leviatã – absolutista – descrito por Hobbes (1983) e amplia seus princípios democráticos, desenvolvendo uma aparelhagem jurídica complexa, mais corre o risco de ludibriar a exigência de assegurar a proteção total de seus membros. Como destaca Castel (2005), a busca da segurança absoluta põe em risco contradição os princípios do Estado de Direito. Deste modo, a total segurança pública no Estado Democrático de Direito é apenas uma utopia.
No entanto, espera-se que, pelo menos, a segurança pública relativa à proteção pessoal e de propriedade seja garantida por esse Estado através de seus organismos e instituições incubidos dessa tarefa.Seguindo o raciocínio de Castel (op. cit), se é verdade que a insegurança é consubstancial numa sociedade de indivíduos, e que se deve combatê-la, inevitavelmente, a fim de que esses indivíduos possam coexistir em um mesmo conjunto, faz-se necessário a instituição de um Estado equipado de um poder efetivo para desempenhar a função de prover as proteções e garantias suficientes de segurança civil e social. Todavia, não se coaduna com a idéia do Estado de Direito ser violado para que se tenha uma segurança pública eficaz. Ao contrário, reafirmando Velho (2002, p. 26-27), "somente governantes legitimados democraticamente pela sociedade civil e voltados para os direitos humanos terão alguma possibilidade de exercer com sucesso o poder e a força contra a criminalidade".
2. Segurança pública no rol dos Direitos Humanos
Com o advento da redemocratização do País, pós-1985, e a promulgação de sua Constituição (1988), um dos grandes desafios postos seria como o Estado brasileiro promoveria segurança pública garantindo e respeitando os DH, em função do legado autoritário decorrente do regime militar e da falta de reformas para adaptação desses organismos, ao novo regime de governamentação.
Os DH são conquistas do ser humano na luta por melhores condições de vida em sociedade. A história de luta por tais direitos vem desde a Antigüidade. Segundo Farias (2003, p. 53-54),
[a] história dos direitos da pessoa humana confunde-se com a luta da humanidade pela realização de seus anseios democráticos. Datam da mais remota antigüidade as primeiras iniciativas neste sentido. As primeiras compilações dos direitos surgiram como produto da fusão de várias fontes, desde as mais remotas tradições arraigadas nas antigas civilizações, até a conjugação dos pensamentos filosófico-jurídicos e do ideário cristão com o direito natural. Essas fontes fluíam a um ponto fundamental comum: a necessidade de limitação e controle dos abusos de poder do estado e da autoridade constituída e a consagração dos princípios básicos da igualdade e da legalidade como regentes do estado moderno contemporâneo... Falar em direitos humanos ou direitos do homem e, afinal, falar de algo que é inerente à condição humana, independentemente das ligações com particularidades determinadas de indivíduos ou grupos.
Todavia, a conquista desses direitos se deu, sobretudo com a fundação do Estado-Nação, pós-Revoluções Americana (1776) e Francesa (1789). Direitos Humanos dizem respeito essencialmente às conquistas de meios necessários à manutenção da vida e, muito mais, da vida vivida com dignidade. Ao longo da historicidade dos DH, é perceptível sua inserção e inscrição nos textos constitucionais mediante Declarações de Direitos do Homem, aprovadas pelos EUA em 1776, pela Assembléia Nacional Francesa, em 1789 e pela Declaração Universal dos Direitos do Homem, aprovada pelas Nações Unidas, em 1948. Para nós brasileiros, grande parte desses direitos está inserida na CF de 1988. Com o advento do Estado Moderno e conseqüente superação da sociedade estamental e o surgimento de um modelo de sociedade individualista, os DH passaram a ser garantidos formalmente, com esteio em Declarações e outros documentos produzidos ao longo da construção do Estado-Nação (CHÂTELET, DUHAMEL & PSIER-KOUCHNER, 2000).
Com efeito, os Direitos Humanos são diferentes dos direitos do cidadão, isto porque esses são de caráter natural, universal, histórico e, também indivisível e interdependente. Por outro lado, os direitos do cidadão são aqueles atribuídos individualmente como membros de dada sociedade, nacionalidade. "Mas Duguit sustenta que 'os direitos do cidadão não são distintos dos direitos do homem"' (FARIAS, 2003, p. 54). Conforme Soares (1998), os DH são indivisíveis e interdependentes na medida em que são acrescentados aos outros direitos fundamentais da pessoa humana não podendo mais serem fracionados ou direcionados para um grupo, classe social, indivíduos, etnia ou a qualquer outro separadamente. Os DH são diferentes dos direitos e deveres pertencentes à conquista da cidadania.
E quais são esses DH que, já insisti, são universais, comuns a todos os seres humanos sem distinção alguma de etnia, nacionalidade, cidadania política, sexo, classe social, nível de instrução, cor, religião, opção sexual, ou de qualquer tipo de julgamento moral? São aqueles que decorrem do reconhecimento da dignidade intrínseca de todo ser humano. Já estamos acostumados aceitar o tipo de denúncia por racismo, por sexo, ou por nível de instrução etc. Mas a não-discriminação por julgamento moral é ainda uma das mais difíceis de aceitar; é justamente o reconhecimento de que toda pessoa humana, mesmo o pior dos criminosos, continua tendo direito ao reconhecimento de sua dignidade como pessoa humana. É o lado mais difícil mais difícil no entendimento dos Direitos Humanos. O fato de nós termos um julgamento moral que nos leve a estigmatizar uma pessoa, mesmo a considerá-la merecedora das punições mais severas da nossa legislação, o que é natural e mesmo desejável, não significa que tenhamos que excluir essa pessoa da comunidade dos seres humanos (SOARES, 1998, p. 42).
De acordo com Lafer (1991), os DH são classificados em primeira, segunda, terceira e quarta gerações. Os DH da primeira geração são os direitos civis e políticos surgidos no final do século XVIII pós-Revoluções Americana e Francesa. São direitos individuais fundamentados no contratualismo do Estado liberal. São vistos como direitos inerentes ao indivíduo e tidos como direitos naturais, uma vez que antecedem o contrato social. Esses direitos foram formalizados contra o poder absoluto do Estado de tudo poder fazer, inclusive, sem leis regulamentadoras ou com leis próprias de um tirano. A formalização desses direitos possibilitou a liberdade de associações que formaram posteriormente os partidos políticos e os sindicatos e demais agremiações.
Os DH de segunda geração, ou direitos socioeconômicos surgiram a partir do século XX, como reivindicação do "bem-estar social". Esses direitos são a garantia de trabalho, saúde, educação, segurança civil etc. São direitos a serviços públicos que o indivíduo como sujeito ativo deve exigir do Estado como sujeito passivo que os faça cumprir.
[p]odem ser encarados como direitos que tornam reais direitos formais: procuram garantir a todos o acesso aos meios de vida e de trabalho num sentido amplo, impedindo, desta maneira, a invasão do todo em relação ao indivíduo, que também resulta da escassez dos meios de vida e de trabalho (LAFER, 1991, pp. 127-128).
Os direitos sociais foram reconhecidos como dever do Estado desde a promulgação da Constituição Francesa de 1848, no período que ficou conhecido como o da Revolução Social na Europa em função da onda de movimentos sociais por melhorias trabalhistas, sobretudo na França. Contudo, esses direitos sociais considerados como um legado do socialismo, somente vai estar presente nos textos constitucionais no século XX, como conseqüência das Revoluções: Mexicana, em 1917, Russa, em 1918 e com a Constituição de Weimar, em 1919 (ibidem).
Os DH de terceira geração e quarta geração, analisados por Lafer (op. cit.) são direitos cujo titular é a coletividade. Neste sentido, esses DH tem como titular sujeitos diferentes do indivíduo, isto é, são grupos humanos como o povo, a família, a associação, o sindicato, a nação, coletividades regionais e a própria humanidade. Conforme Bobbio (1992), a universalização e abrangência dos DH vão se dá a partir do fim da 2ª Guerra Mundial devido ao aumento da quantidade de bens merecedores de tutela; a extensão da titularidade de alguns direitos humanos típicos a sujeitos diversos do homem individual, os direitos da coletividade. Daí por diante vão surgindo, gradativamente diversas declarações de DH às coletividades, como da criança, do doente mental, do doente físico, da mulher etc.
Retornando ao pensamento de Farias (2003), diversos pensadores têm desenvolvido inúmeras teorias com o objetivo de justificar e esclarecer os fundamentos dos DH. Destacando-se entre essas teorias a jusnaturalista, a positivista e a moralista. A jusnaturalista fundamenta os DH em uma ordem superior universal, imutável e inderrogável, são de caráter natural e estão presentes na consciência de cada ser humano. Deste modo, os DH não são criação de legisladores, tribunais ou juristas. Em contrapartida, a teoria positivista busca sedimentar a existência dos DH dentro de uma ordem normativa, como legítima manifestação da soberania popular. Neste sentido, apenas aqueles direitos expressamente previstos e definidos no ordenamento jurídico positivado devem ser considerados como Direitos Humanos. Por último, a teoria moralista fundamenta a existência dos DH na própria experiência e consciência moral de um determinado povo. A formulação das leis tem como base a observação da conduta e da prática consuetudinária dos indivíduos e das coletividades.
Entretanto, a inigualável importância dos DH não permite nenhuma nem outra teoria, isoladamente, explicá-los ou fundamentá-los. Essas teorias são por demais insuficientes para fundamentar os DH de forma genérica e definidora. O que há de ser procedido é uma fusão dessas teorias e outras que, por ventura busquem fundamentar os DH, para uma maior eficácia na construção e realização dos DH.
[n]a realidade, as teorias completam-se, devendo coexistirem, pois somente a partir da formação de uma consciência social, baseada principalmente em valores fixados na crença de uma ordem superior, universal e imutável, é que o legislador ou os tribunais encontram substrato político e social para reconhecerem a existência de determinados direitos humanos fundamentais como integrantes do ordenamento jurídico (FARIAS 2003, p. 58).
Com efeito, a abordagem acerca de DH tem sido exaustivamente produzida nos meios acadêmicos, nas associações de bairros, lideranças comunitárias, mecanismos e representações governamentais, Organizações não- Governamentais – ONGs, organismos internacionais, constituições dos países, enfim, num amplo leque de considerações oficiais e não oficiais. A guisa de exemplo, a Constituição brasileira de 1988 traz, em seu artigo 5º com 77 incisos, 24 alíneas e dois parágrafos, referências aos direitos e deveres individuais e coletivos. Desses direitos cinco são destacados: o direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade. Estes direitos figuram como os principais ou fundamentais. Os demais direitos enunciados nos outros incisos constitucionais são derivações desses direitos fundamentais universais e inalienáveis.
3. A segurança pública como direito fundamental
Para efeito de abordagem neste trabalho, destaca-se o direito de segurança à pessoa humana como direito fundamental citado no texto da Declaração Universal dos Direitos do Homem (1948), artigo 3: "Todo homem tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal". No caso da segurança pública, esta é definida e prevista como "dever do Estado, direito e responsabilidade de todos", no artigo constitucional, de nº. 144, da CF brasileira. O direito à segurança pública é a garantia fornecida a pessoa humana de que tanto ela, física e juridicamente, como seus bens e seus direitos não serão violentados, sob pena de reparação de danos tanto por particulares quanto pelo poder público. Retomando a discussão lançada no primeiro parágrafo deste tópico, a questão central é como a segurança pública inserida no rol dos DH é efetivada.A falta da garantia do direito à vida, à segurança individual física e jurídica viola frontalmente os DH.
No âmbito da segurança pública, segundo Carvalho (2004), o problema se agrava em função da inadequação dos órgãos responsáveis diretamente pela promoção desse serviço, como polícia militarizada, treinada para exterminar o inimigo e não para proteger as pessoas e policiais tanto civis como militares que são denunciados constantemente por crime de extorsão, de corrupção, abuso de autoridade, prisões ilegais etc. A insegurança possibilitada pelo Estado brasileiro tem sido uma constante causa de preocupação da população.
Quanto ao Poder Judiciário, também há problemas crônicos. O acesso à justiça é privilégio de uma pequena parcela da população. A maioria do povo ou desconhece seus direitos, ou, se os conhece, não tem condições de usufruí-los de maneira plena e satisfatória.
Os poucos que dão queixa à polícia têm que enfrentar depois os custos e a demora do processo judicial. Os custos dos serviços de um bom advogado estão além da capacidade da grande maioria da população. Apesar de ser dever constitucional do Estado prestar assistência jurídica gratuita aos pobres, os defensores públicos são em número insuficiente para atender à demanda. Uma vez instaurado o processo, há o problema da demora. Os tribunais estão sempre sobrecarregados de processos, tanto nas varas cíveis como nas criminais. Uma causa leva anos para ser decidida. O único setor do Judiciário que funciona um pouco melhor é o da justiça do trabalho. No entanto, essa justiça só funciona para os trabalhadores do mercado formal, possuidores de carteira de trabalho. Os outros que são cada vez mais numerosos, ficam excluídos. Entende-se, então, a descrença da população na justiça e o sentimento de que ela funciona apenas para os ricos, ou antes, de que ela não funciona, pois os ricos não são punidos e os pobres não são protegidos (CARVALHO, 2004, p. 214-215).
Num sentido amplo, é possível se afirmar que o Estado brasileiro é o primeiro a violar os DH. O abandono de milhões de crianças e adolescentes sem acesso à educação, à moradia digna, à saúde e à segurança; às discriminações raciais; os precários serviços públicos dispensados à maioria da população, sobretudo a pobre, preta e periférica e a negação de acesso ao trabalho digno etc. demonstram que o Estado brasileiro, apesar do esforço dos últimos governos no regime democrático, ainda continua violando os DH. Quanto à segurança pública esta tem se apresentado sempre como um grave problema social.
Poucos problemas sociais mobilizam tanto a opinião pública como a criminalidade e a violência. Não é para menos. Este é um daqueles problemas que afeta toda a população, independentemente de classe, raça, credo, religioso, sexo ou estado civil. São conseqüências que se refletem tanto no imaginário cotidiano das pessoas como nas cifras extraordinárias representadas pelos custos diretos da criminalidade violenta. Receosas de serem vítimas de violência, elas adotam precauções e comportamentos defensivos na forma de seguros, sistemas de segurança eletrônicos, cães de guarda, segurança privada, grades e muros altos, alarmes, etc. Já se disse que o presídio tornou-se modelo de qualidade residencial no Brasil (BEATO FILHO, 1999, p. 13).
Embora o Brasil apresente apenas 3% da população planetária é responsável por cerca de 11% dos homicídios em escala mundial. Segundo relatório da Organização dos Estados Ibero-Americanos – OEI, entre 84 países, o Brasil encontra-se na 3ª posição, estando os jovens no auge desse ranking (WWW. DIÁRIO. GLOBO.BR).
Uma pesquisa divulgada pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância – UNICEF, em dezembro de 2004, esclarece que a violência criminal contra jovens no Brasil mata mais do que guerras. A quantidade de adolescentes mortos de maneira violenta faz do Brasil uma nação em estado permanente de guerra não declarada de direito, mas real de fato. A pesquisa revelou que em média, por ano, 14 mil adolescentes de 12 a 19 anos morrem de causa violenta e que essa triste realidade faz parte do ciclo da violência que cresce nas comunidades e nasce, muitas vezes, no seio das famílias desordenadas e desassistidas ou excluídas, socialmente (DIÁRIO DO NORDESTE, 10/12/04, p. 18, - Cidade)
4. Considerações finais
É bem verdade que os últimos governos de FHC e de LULA têm se esforçado em desenvolver planos, programas e projetos voltados para a área da segurança pública com a finalidade de melhoramento desse serviço. Todavia, o aumento da violência criminal continua em ascensão. A necessidade do envolvimento da sociedade civil, das Universidades e de Organizações Não Governamentais no combate e controle da violência e da criminalidade parece ser imprescindível. Além de ações objetivas repressoras como estratégias e investimentos em recursos nos organismos policiais, ações de caráter preventivo-educativas podem ter um papel relevante quanto à promoção da segurança pública.
Os planejadores de políticas públicas governadores, prefeitos, empresários, líderes comunitários, ONGs, universidades etc., todos precisam se juntar se quiserem ter algum êxito contra o aumento da violência e da criminalidade no País. Medidas em curto prazo podem ser efetivadas, tais como: a) identificação e ações concretas nas áreas geográficas sensíveis e de riscos; b) iluminação pública de melhor qualidade; c) urbanização de áreas abandonadas; d) construção de áreas esportivas; e) resolução dos conflitos fundiários; f) atribuição de poderes às mulheres e aos líderes comunitários; g) criação de organismos locais dedicados exclusivamente à prevenção do crime; e, h) o engajamento de todas as pessoas que tenham conhecimento, aptidão e prática na área da segurança pública como famílias, religiosos, policiais, médicos, funcionários, líderes juvenis masculinos e femininos, acadêmicos, pesquisadores etc.
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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