Roda de Leitura de Histórias
Por Maria Anunciação Souza | 29/07/2009 | Educação"A Leitura do mundo precede da leitura da palavra". Paulo freire.
RESUMO
O presente artigo tem como objetivo discutir sobre a forma como a leitura é iniciada com crianças em Escola de Educação Infantil, ressaltando a importância de uma prática educativa que conceba a leitura como um ato prazeroso e não como uma obrigação.
Palavras-chaves: educação infantil roda de leitura, histórias
O Referencial Curricular Nacional para Educação Infantil – RCNEI (1998, vol 3) ressalta a importância do manuseio de materiais, de textos (livros, jornais, cartazes, revistas etc), pelas crianças, uma vez que ao observar produções escritas a criança, vai conhecendo de forma gradativa as características formais da linguagem. Isso é visível quando uma criança folheia um livro imite sons e faz gestos como se estivessem lendo.
Entretanto no cotidiano escolar, isso pode não ocorrer devido ao medo de que os livros se estraguem.
Porém os alunos só aprenderão a ter cuidado com os materiais, se tiveram em contato com os mesmos. A criança só construirá conhecimento a cerca da leitura se estiver inserida em um ambiente favorável ao letramento que a possibilite presenciar e participar de situações de iniciação a leitura. Segundo Rosana Becker apud Maricato (2005 p. 22) para trabalhar literatura com as crianças é preciso possibilitar a elas o contato com os dois materiais: aquele que é para ser lido (livros, revistas, jornais, entre outros) e, aquele que é para ser rabiscado (folha sulfite, caderno de desenho, lousa, chão).
De acordo com Nelly Coelho (2000), "O espaço da escola pode ser dividido em 2 ambientes um seria estudo programado (sala de aula, bibliotecas para pesquisa etc) e outro espaço que seria de atividades livres (sala de leitura, recanto de invenções, oficina de palavra, laboratório de criatividade etc)".
Nesta dualidade de ambientes o aluno assimila as informações e conhecimentos, e é estimulado pra liberar suas potencialidades específicas em cada um dos ambientes.
Segundo Edmir Perrotti apud Maricato (2005 p.25), quanto mais cedo às crianças tiverem contato com histórias orais e escritas, maiores serão as chances de gostarem de ler.
Ao folhear um livro, tocá-lo e observar suas figuras, mesmo que ainda não decodifique a língua escrita, a criança está ao seu modo praticando a leitura e, esta prática de leitura é denominada de "Letramento" por Magda Soares apud Maricato (2005 p. 18).
O Letramento consiste em fazer uso social da leitura e da escrita e, isso ocorre quando a criança desde cedo explora e vivencia práticas de leitura e escrita. Diante disso, cabe ao professor possibilitar este contato do aluno com a literatura orientando – sobre como fazer uso deste material escrito. E segundo RCN, organizando o espaço físico de forma atraente e aconchegante, com almofadas, iluminação adequada, livros de diversos gêneros, de diferentes autores, revistas, histórias em quadrinhos, jornais, trabalhos de outras crianças etc, sendo que as crianças devem ter livre acesso a este espaço.
Em relação à organização do ambiente para leitura Perrotti apud Maricato (2005, p. 26), defende que ao contrário de uma biblioteca para adultos (silêncio e imobilidade), na biblioteca infantil as crianças podem circular, falar e interagir com o adulto que o ajudará a encontrar o caminho para a leitura. Um espaço no qual a criança tem que ficar quieta sentada na cadeira e sem se relacionar com os livros acaba de acordo com professor da USP associando a leitura à obrigação e não a um ato prazeroso. Ainda de acordo com o autor o respeito pelo interesse do pequeno leitor permite a associação da leitura à escolha e ao prazer.
É certo que a leitura na escola tem um propósito didático e se constitui como um objeto de aprendizagem apenas se puder vir associada à sua prática social. O encantamento e o gosto pela leitura e pela literatura não virão, com certeza, como frutos de uma tarefa ou exercício compulsório de ler, ao contrário, será através da fruição lúdica. Em geral os professores lêem contos de fadas para crianças e muitos consideram isso fundamental na educação infantil. A questão é saber exatamente o que se aprende com a leitura de contos de fadas e outros gêneros e, qual o papel desses textos na aprendizagem da leitura e da escrita. Garantir que as crianças desenvolvam comportamentos leitores é garantir que elas tenham contato com os diversos tipos de textos do nosso universo literário, que possam ler - por si mesmo ou por intermédio do professor - textos reais e inteiros (nunca simplificados) e ainda, que se aproximem deles a partir de seus usos sociais. Soares apud Maricato (2005 p. 20);"A escrita não se apresenta de forma homogênea. Por isso, aprender a ler e ser um leitor, efetivamente, significa conhecer e entender vários tipos de textos. Os romances, os contos, as poesias, as cantigas, as cartas e bilhetes, as reportagens, as crônicas, as histórias em quadrinhos... Cada tipo de texto tem uma origem e uma função comunicativa distinta, por isso são escritos e lidos de formas diferentes". Um leitor de jornal seleciona determinadas matérias a serem lidas, um leitor de poesias não precisa ler o livro todo. Já, num romance, se faz necessário seguir a ordem dada pelo autor. Esse tipo de conhecimento não poderia ser construído em um processo de ensino que priorizasse a aprendizagem de algumas poucas palavras a partir de um esforço de decifração. Por isso é fundamental apoiar, o processo de alfabetização nos textos, comparados com outros gêneros dentro do contexto a que chamamos diversidade textual.
LERNER (1996), "Afirma que o contato sistemático possibilita aproximações sucessivas com os textos. As leituras, os contos, as escritas individuais e coletivas calçam as crianças para que construam esse saber específico sobre os diversos gêneros". Os contos e as fábulas devem ser lidos de acordo com o fascínio que exercem, há tanto tempo, sobre a humanidade. Aspectos do fantástico, da imaginação e invenção estão sempre presentes na leitura desses textos, que de um modo tão especial, sabem falar sobre o homem, seus medos, desejos e desafios.
Numa roda de história, por exemplo, o caráter da leitura não deve ser o de checagem de informações ou de compreensão, até porque o professor não tem - e nunca terá - o controle do que foi assimilado por seus alunos; ao contrário, a preocupação deve ocorrer no sentido que a leitura tem para cada criança; comentando sobre o que foi lido, associando o texto às suas próprias reminiscências. Além do caráter cognitivo, há também o afetivo em jogo, na medida em que questões pessoais também podem ser contempladas em uma leitura.
Soares apud Maricato (2005 p. 20): "A leitura de um conto ou de uma fábula, por sua vez, deverá garantir a possibilidade de encantamento e de identificação de sentimentos e dilemas humanos, no que concerne ao seu conteúdo. Em se tratando de sua forma e estrutura de escrita, deverá aparecer para as crianças levando em conta o seu tipo de narrativa, com enredo e construção do texto". Características, personagens e fatos semelhantes em contos e fábulas vindos de países e culturas distintas podem fazer-nos pensar acerca desse gênero, desde a sua tradição oral, até a sua forma de contar histórias, que lhe é tão peculiar. Atentar e conversar sobre os contos e outras leituras, cria um espaço para que as crianças possam se ver enquanto leitoras desse tipo de texto, fazendo suas próprias associações e reconhecendo diversas histórias como típicas desse gênero literário. O processo de formação de leitores não se dará nunca de uma maneira imperativa, ao contrário, ele se constrói na medida em que todos podem se situar enquanto leitores e escritores, ativos e pensantes. E os saberes sobre os textos, por sua vez, nunca se dão sem eles, o que acontece é exatamente o oposto: saber sobre os textos é saber com os textos: lendo, pensando, dialogando com eles. LERNER (1996), "Outro ponto bastante importante na leitura de um texto diz respeito à possibilidade de relações entre os textos, sua estrutura, aos elementos que o compõem e à forma como são escritos." O "era uma vez" dos contos, por exemplo, não surge nos quadrinhos, que possuem uma escrita ágil, onomatopéias e gírias. Tudo isso deve estar ao alcance das crianças e deverá ser evidenciado para elas, desde a escolha inicial. Uma prática constante de leitura deve considerar a qualidade literária dos textos. A oferta de textos supostamente mais fáceis e curtos afasta as crianças do acesso à boa leitura. O professor não precisa omitir simplificar ou substituir por um sinônimo familiar as palavras que consideram difíceis, pois se o fizer, correrá o risco de empobrecer o texto. Mais uma vez, a leitura de histórias é uma rica fonte de aprendizagem de novos vocabulários. Um bom texto deve admitir várias interpretações, superando-se, assim, o mito de que ler é somente extrair informação da escrita.
LERNER (1996), "O professor pode ler o que as crianças gostam, introduzi-las no que não conhecem, e avançar, progressivamente, de modo que as crianças conheçam cada vez mais e melhores textos e tenham bons modelos de comportamento leitor".
Roda de leitura de histórias: sugestões para o planejamento de atividades permanentes de leitura: A leitura pelo professor deve ser uma atividade permanente, realizada todos os dias preferencialmente dentro de uma seqüência de ações informada previamente às crianças. Para o momento da leitura compartilhada, o ambiente deve ser preparado de modo que as crianças possam sentar em círculo, seja em cadeiras ou no chão, com tapetes ou almofadas, e todas possam ver e ouvir a voz do professor.
NEMIROVSKY (2002), "O professor pode, enquanto as crianças não estão familiarizadas com a realização deste momento, estabelecer uma pequena introdução, na forma de uma canção ou brincadeira, de modo que todos estejam sentados e concentrados rapidamente. À medida que as crianças têm ampliada a sua experiência como leitores esses rituais perdem sua função e o professor pode começar a atividade sem mediações".
A escolha do texto a ser lido deve levar em conta a experiência leitora das crianças, de modo que o texto não seja tão além de suas possibilidades que soe incompreensível, nem tão aquém que não traga mais nenhum aprendizado ou prazer na escuta. Deve-se evitar escolhas pautadas unicamente na "mensagem" do texto, feitas com a intenção de deixar um ensino moral, critério que não pode estar acima da qualidade literária, ou de textos com informações banalizadas e distorcidas, os textos "fáceis", escritos supostamente para um "público infantil". A leitura de um texto desconhecido, de contos de um mesmo autor, de contos de autores nacionais, como Câmara Cascudo, de contos de um mesmo tipo de personagem (bruxas, piratas), de uma época determinada (como o tempo dos reis e princesas), de um lugar (contos de Japão, contos russos), pode dar às crianças a vez de escolha de um texto de sua preferência. O professor deve ter a intenção clara ao planejar, que seus alunos conheçam, ao longo de um período da escolaridade, textos variados – deve escolher quais e com que grau de familiaridade.
Esta atividade tem três momentos distintos: Revista Avisa Lá (2000, p. 06 - 18), antes da leitura, o professor:
· Anuncia a leitura a ser feita, ou a história a ser contada, de modo a marcar claramente sua opção por contar ou ler, ações distintas, com sentido e características também diferentes.
· Explicita os motivos ou motivos de sua escolha, porque é uma história atrativa e interessante, porque está relacionada com algo já tratado em sala ou com um tema de trabalho, porque é divertida, porque quer compartilhar com o grupo de crianças uma de suas histórias preferidas na infância, etc.. Os motivos podem ser muitos, o importante é que estejam claros para o professor no ato da escolha, e para as crianças no compartilhar, possibilitando que elas, ao longo do tempo, também se vejam como leitores com preferências pessoais.
· Comunica onde e como encontrou o texto: se é um livro, mostra a capa e lê os dados (título, autor, editora); se é um jornal, faz referencia à seção na qual a notícia aparece; se é um poema, diz onde está, em que livro, de quem...
· Quando necessário, traz informação complementar: lê partes da introdução, conta dados biográficos do autor (ou ilustrador, no caso de fazer menção às ilustrações ou fazer uma leitura visual) ou traz informações sobre a coleção, etc.
Durante a leitura, o professor:
· Cuida para que todos os seus alunos possam ouvi-lo, lê em voz alta e clara o texto que já preparou anteriormente.
· Apresenta sua "leitura pessoal" do texto e envolve o leitor: altera a ênfase nas entonações, faz pausas intencionais, etc. Coloca em jogo diante dos alunos seu próprio comportamento de leitor "expert": mostra-se interessado, surpreso, emocionado, divertido.
· Faz interrupções de acordo com a possibilidade de seus leitores: faz suspense e continua no dia seguinte de modo a criar nos alunos o desejo da continuidade da leitura, lê uma história em capítulos...
· Não deve interromper a leitura para explicar palavras que as crianças não conheçam. Em geral, elas descobrem o significado a partir do contexto.
· Possibilita que as crianças falem. Principalmente, no caso de textos conhecidos e dizeres que as crianças facilmente memorizam como as falas de personagens marcantes ou trechos de canções. Depois da leitura, o professor:
· Após a leitura de um texto, ao invés de o professor preocupar-se em saber se os alunos entenderam (até porque nunca há um único entendimento possível), ele poderá tecer os seus comentários sobre o que foi lido, instigando as crianças a falarem também acerca de suas próprias impressões, tal como nós fazemos diante de um romance, conto ou poesia. Nesse sentido, o papel e uso social da literatura estarão evidenciados para as crianças, que se verão como leitores, no sentido mais genuíno do termo.
· Pode voltar a ler um parágrafo do texto, uma parte surpreendente da história, a fala de uma personagem, de modo a possibilitar maior compreensão ou prazer na interação com o texto,
· Abre espaço para conversas sobre o texto, opina sobre o que leu, troca seus pontos de vista com os das crianças, estimula-as a que exponham o seus, a que se manifestem como leitores em um contexto não escolar.
· Diante de alguns comentários das crianças ou diante de interpretações diferentes, sugere a volta ao texto: localiza o fragmento que provocou o comentário e o relê para confirmar ou retificar as interpretações sugeridas.
Referências Bibliográficas
COELHO, Nelly Novaes. Literatura infantil, teoria, análise, didática. 1ª ed. – São Paulo. Moderna, 2000.
LERNER, Délia. Ler e Escrever na Escola - o real o possível e o necessário. Porto Alegre: Artmed, 2002.
__________, Délia - V Seminário Internacional Escola da Vila - Conhecimento Didático e a tarefa do Professor. SP. março, 1996.
MARICATO, Adriana. O prazer da leitura se ensina. Criança. Brasília. s/ v, n. 40, p. 18-26, set. 2005.
NEMIROVSKY, Myriam - O Ensino da Linguagem Escrita. Porto Alegre: Artmed, 2002.
Revista Avisa Lá. Ler por prazer e para aprender. n. 40, p. 06-18,set. 2000.