RESUMO - Brava Gente

Por Eugênio Pereira da Silva | 25/04/2017 | Geografia

Brava Gente: A trajetória do MST e a luta por terra no Brasil. /João Pedro Stedile, Bernardo Monçano Fernandes. – 2.ed – São Paulo: expressão popular, coedição Fundação Perseu Abramo, 2012. 

O livro Brava Gente nos traz perguntas e respostas de uma importante entrevista realizada em 1998, concedida a Bernardo Mançano Fernandes pelo membro coordenador nacional do MST João Pedro Stedile. Nos mostra a história do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), a Trajetória do MST e a Luta Pela Terra No Brasil'.

Stedile declara que a gênese do MST se deu por vários fatores, mas o   principal deles foi o aspecto socioeconômico das transformações que a agricultura brasileira sofreu na década de 1970, nessa época ocorreu o período mais rápido e mais intenso da mecanização da lavoura brasileira, esse período teve denominado “modernização dolorosa”. A mecanização da agricultura, uma agricultura com características mais capitalista, expulsou uma grande parte da população que viviam no campo, os mesmos enfrentaram grandes dificuldades, isso os obrigou tentar resistir no campo e buscar outras formas de luta pela terra nas próprias regiões onde viviam.

Outro fator importante na formação do MST foi o surgimento da CPT, que ajudou na reorganização das lutas camponesas, trazendo de início, uma motivação regional, representando um avanço muito importante principalmente pelo aspecto ideológico do trabalho da CPT, considerado o segundo grande fator da gênese do movimento. A CPT foi uma força que contribuiu para a construção de um único movimento, de caráter nacional. O terceiro fator foi a luta dela democratização da sociedade brasileira, a luta pela democratização da sociedade brasileira e contra a ditadura militar, que criou as condições necessárias para o surgimento do MST.

O MST nasceu como um movimento camponês, que tinha como bandeiras as três reivindicações prioritárias, terra, reforma agraria, e mudanças gerais na sociedade. Três características principais podem ser destacadas dessa organização. A primeira foi a de ser um movimento popular, em que todo mundo pode entrar. A segunda por ser um componente sindical no sentido corporativo, e a terceiro é o caráter político do movimento.

O movimento teve origem em vários Estados da região Centro-Sul. Consideramos, porém, janeiro de 1984 a data da fundação do MST, quando se formalizou como um movimento nacional, surgindo com a palavra de ordem “Terra pra quem nela trabalha”. O termo “sem-terra” nunca foi discutido, o nome, foi a imprensa que de fato adotou, batizando como “Movimento Sem Terra”, seja na época Master, seja mais tarde, quando retornamos a luta com a ocupação da Fazenda Macali e com as outras lutas, em diversos estados.

Alguns princípios organizativos são citados como contribuição tanto na gênese, como para garantir a continuidade da organização, são eles: direção coletiva, divisão de tarefas, disciplina, estudo, formação de quadros, a luta pela reforma agrária e a vinculação com a base.

O MST é a continuidade de um processo histórico das lutas populares, é importante fazermos o resgate histórico das nossas lutas, isso nos dá a noção exata das limitações, e assim podemos dar continuidade a nossa luta. Há dois fatores que influenciaram a trajetória ideológica do movimento. Um é decorrente do fato de estar sempre ligado a realidade e o outro está relacionado a teologia da libertação, a contribuição que a teologia da libertação trouxe foi a de ter abertura para várias ideias.

No período de transição de governo dos militares a Itamar, vivíamos uma época de crise econômica e de grandes transformações na agricultura, os mesmos fizeram com que fossem abertas brechas para a luta pela terra e para o crescimento dos movimentos de massas urbanas que lutavam pela democratização do pais. No período de 1985 a 1989, o governo da nova república tentava mostrar para a sociedade que queria fazer a reforma agraria, mas nós, insistíamos que a reforma agraria só avançaria com ocupações, foi quando levantamos as bandeiras – “Sem reforma agrária não há democracia” e “A ocupação é a única solução”

A derrota da candidatura Lula foi uma derrota política após dez anos de ascensão do movimento de massas no Brasil, éramos um movimento fraco, a derrota afetou o ânimo da militância e aquela expectativa de que era possível fazer uma reforma agrária rápida. Passamos a viver um período de muitas dificuldades materiais, o governo Collor além de não fazer a reforma, resolveu reprimir o MST, essa repressão nos afetou muito, muita gente foi presa, começaram a fazer escutas telefônicas, tivemos no mínimo quatro secretarias estaduais invadidas pela Polícia Federal. O governo Collor foi nosso batismo de fogo, porque poderíamos ter acabado ali. Se o governo dele durasse os cinco anos previsto e nos apertasse um pouquinho mais, poderia ter nos destruído. Só com a entrada do governo Itamar Franco foi que tivemos alívio.

Existe a compreensão que o MST deve lutar contra três cercas: a do latifúndio, do capital e a da ignorância. Esta última não no sentido apenas de alfabetizar pessoas, mas no sentido de democratizar o conhecimento para um número maior de pessoas. O desenvolvimento depende disso.

O processo eleitoral, é feito após as avaliações dos que já ocupam algum cargo, e de possíveis novos candidatos. Um processo democrático envolvendo um maior número de pessoas nas discussões. A votação é uma espécie de formalização do debate político e acontece num evento nacional, respeitando as diferenças regionais e geográficos, dando oportunidade para cada estado decidir como implementar as linhas políticas. A direção nacional é formada por 21 pessoas, escolhidas no processo, quem ocupa um cargo nacional obrigatoriamente precisa do respaldo da base, das instâncias estaduais.

Não sabíamos a forma que o movimento iria tomar, tudo foi se transformando com o tempo. Ninguém imaginava que iriamos ter um setor de produção, de Assentamentos etc. Este último setor, começou basicamente em 1986, quando realizamos o I Encontro Nacional dos Assentados, em Cascavel (PR).

O que assimilamos do capitalismo é a divisão do trabalho, não com objetivos capitalistas. O capitalismo se utiliza da divisão do trabalho para explorar as pessoas. A divisão do trabalho foi nascendo com o processo natural de desenvolvimento das forças produtivas. Vemos a divisão ligada ao desenvolvimento técnico das forças produtivas que existem na sociedade. Estamos provando que é possível implantar a divisão do trabalho como uma forma de desenvolvimento das forças produtivas, em que essa divisão esteja a serviço do bem-estar de todos.

A luta pela terra se transforma em luta pela reforma agrária e, em consequência, num projeto político dos trabalhadores se estes, na sua luta, adquirirem consciência social para mudar a sociedade. E para mudar a sociedade tem que mudar o Estado. Queremos que o assentamento seja um cartão de visita para a sociedade. Queremos que, nessas áreas, tanto as pessoas que moram lá como os visitantes se sintam bem, felizes e orgulhosos do resultado da luta pela terra. Vamos ter que construir esse desenvolvimento que sonhamos em nossos espaços, para provar que é viável.