Resolução por Onerosidade Excessiva. Teoria da Imprevisão

Por Carlos Roberto Carvalho Junior | 04/05/2009 | Direito

1 INTRODUÇÃO

A resolução de um contrato pela onerosidade excessiva, a ser tratada no presente trabalho, será baseada na Teoria da Imprevisão, onde a mesma se resume no surgimento de fatos extraordinários, imprevisíveis, que possibilitam que a execução obrigatória do cumprimento contratual não seja exigível nas mesmas condições anteriormente pactuadas, sendo necessário um ajuste no contrato a fim de que deixe de ser para uma das partes contratantes excessivamente onerosas.

Contudo a Teoria da Imprevisão, orientada pelo brocardo jurídico Rebus Sic Standibus, vem demonstrar que ainda que exista em um contrato o cumprimento obrigatório, fazendo lei entre as partes a fim de se assegurar o negócio, nem sempre poderá ser adimplida, tendo como principal finalidade de viabilizar o equilíbrio contratual anteriormente existente afetado por um fato inesperado, adequando a sua nova realidade.

Também faz menção, a certo abalo que a teoria da Imprevisão provoca na expressão latina Pacta Sunt Servanda, devido a seu princípio da força obrigatória em que o contrato obriga as partes nos limites da lei.

2 CONCEPÇÃO HISTÓRICA DA TEORIA DA IMPREVISÃO

O Código de Hammurabi, grafado em pedra já trazia aspectos relativos à resolução do contrato pela onerosidade imprevista:

"se alguém tem um débito a juros, e uma tempestade devasta o campo ou destrói a colheita, ou por falta de água não cresce o trigo no campo, ele não deverá nesse ano dar trigo ao credor, deverá modificar sua tábua de contrato e não pagar juros por esse ano."

As origens históricas deste princípio nos remontam à Idade Média onde os juristas atentos ao fato de que, nos contratos de execução diferida poderia ocorrer um ambiente diferente do em que fora aperfeiçoado o contrato, sustentaram tal tese fundados na constatação atribuída a Neratius, em torno da aplicação da condictio causa data non secuta.

O reaparecimento desta teoria encontrou terreno fértil após as duas grandes guerras mundiais, período no qual os países enfrentaram forte desvalorização de suas moedas nacionais, acarretando forte desequilíbrio nos contratos de longo prazo. Esta disparidade acabou por gerar beneficio desarrazoados para uma das partes em detrimento da outra que assou a arcar com excessiva onerosidade. Como efeito colateral do afetamento da economia contratual, houve prejuízo tmbém para a economia geral.

Assinala Arnaldo Rizzardo que "os contratos celebrados antes das hecatombes dificilmente tinham condições de ser cumpridos, nos mesmos termos, após o conflito. O credor receberia, em pagamento, uma moeda de tal sorte desvalorizada, cuja significação real não bastaria para adquirir um objeto qualquer, sem qualificação em relação ao que ocorria na ocasião do negócio"[1]

Procurando coibir as vantagens desarrazoadas e as onerosidades excessivas, vários países editaram leis para se restabelecer o equilíbrio contratual evitando os já citados efeitos ocasionados pela desvalorização das moedas nacionais. A França, em 21 de Janeiro de 1918 votou a Lei Faillot, versando acerca dos contratos de fornecimento de carvão, concluídos antes da guerra, ao passo que na Inglaterra fora editada a doutrina Frustation of Adventure, e na Itália constatou – se a volta da já conhecida cláusula rebus sic standibus, Notamos assim que por todo o mundo fora reconstituído o mecanismo de proteção do contratante contra a excessiva onerosidade superveniente.

Com a I Guerra Mundial (1914-1918) ocorreu um grande desequilíbrio para os contratos em longo prazo. Franqueou benefícios desarrazoados a um contratante, em prejuízo do outro. Afetou a economia contratual, com prejuízo para a economia geral. Procurando coibi-lo, votou a França a Lei Faillot, de 21 de janeiro de 1918, sobre os contratos de fornecimento de carvão, concluídos antes da guerra e alcançados por ela, ao mesmo tempo imaginou-se na Inglaterra a doutrina da Frustration of Adventure, retomou-se na Itália a cláusula rebus sic stantibus; reconstituiu-se por toda parte o mecanismo da proteção do contratante contra a excessiva onerosidade superveniente.

O revogado Código Civil Brasileiro de 1916 nada mencionava a respeito do assunto. A cláusula rebus sic standibus e a Teoria da Imprevisão somente eram passiveis de aplicação e ainda assim com muita cautela em casos excepcionais onde realmente restasse comprovado a ocorrência de fato extraordinário e imprevisível gerador de onerosidade excessiva para uma das partes.

Em verdade o responsável pela introdução da Teoria da Imprevisão em nosso ordenamento jurídico foi o Código de Defesa do Consumidor em seu artigo 6º, V estabelecendo como princípio da relação de consumo o equilíbrio contratual, possibilitando ao consumidor, por ser parte hipossuficiente, o ingresso com ação competente para alteração de cláusulas contratuais que lhe gerassem prestações desproporcionais ou, que por motivos estranhos ao da época da celebração do contrato, se tornassem excessivamente onerosas.

Com o advento do Código Civil de 2002 consolidou – se em nosso ordenamento a possibilidade de resolução do contrato por onerosidade excessiva, estampada na Seção IV, do Capítulo II, materializada nos artigos 478 a 480, a serem tratados em momento oportuno.

3 RESOLUÇÃO POR ONEROSIDADE EXCESSIVA. TEORIA DA IMPREVISÃO

O princípio da autonomia da vontade das partes não é onímodo, não obstante tal fato é limitado pelo dirigismo contratual que intervém na economia do contrato aplicando normas de ordem pública e impondo a adoção de sua revisão judicial, o que ocorre sempre que por motivo superveniente extraordinário e imprevisível se proceda a impossibilidade subjetiva de sua execução, ocorrendo de um lado a onerosidade excessiva e de outro um lucro desarrazoado.

Para se entender melhor a resolução de um determinado contrato pela onerosidade excessiva, a Teoria da Imprevisão vem a esclarecer, surgindo na necessidade de se fazer determinados ajustes no contrato que possam surgir sem a possibilidade de se prever seu acontecimento, seja ele pela ocorrência de novos acontecimentos, até então imprevisíveis pelas partes e a elas não imputáveis, refletindo sobre a economia ou na execução do contrato, autorizando sua revisão posterior, para ajustá-lo as novas circunstâncias

A imprevisão poderá ocorrer logo após a afirmação do contrato, independentemente da vontade das partes, de forma extraordinária e anormal, preza que em tais condições se respeitando o contrato uma das partes seria extremamente prejudicada em benefícios anormais de outra. Neste caso, a imprevisão tenta alterar ou excluir tal obrigatoriedade dos contratos, é importante ressaltar que a teoria da imprevisão não será aplicada em casos onde se provam que a parte fez um mau negócio, caracterizando este um risco previsto.

Com a erudição que lhe é peculiar, ensina – nos o professor Miguel Maria da Serpa Lopes:

"A imprevisão consiste, assim, no desequilíbrio das prestações sucessivas ou diferidas, em conseqüência de acontecimentos ulteriores à formação do contrato, independentemente da vontade das partes, de tal forma extraordinários e anormais que impossível se tornava prevê-los razoável e antecedentemente. São acontecimentos supervenientes que alteram profundamente a economia do contrato, por tal forma perturbando o seu equilíbrio, como inicialmente estava fixado, que se torna certo que as partes jamais contratariam se pudessem ter podido antes antever esses fatos. Se, em tais circunstâncias, o contrato fosse mantido, redundaria num enriquecimento anormal, em benefício do credor, determinando um empobrecimento da mesma natureza, em relação ao devedor. Consequentemente, a imprevisão tende a alterar ou excluir a força obrigatória dos contratos."

Se no momento da celebração do contrato, os contratantes vislumbraram a situação econômica contemporânea, e de maneira razoável puderam prever situação futura, o contrato devera ser obrigatoriamente cumprido, ainda que ambas as partes ou apenas uma delas não tenha logrado o benefício esperado uma vez que a norma jurídica deve – se ocupar em tutelar apenas as ocasiões em que haja uma mudança significativa no ambiente econômico decorrentes de fatos extraordinários e imprevisíveis, e não nos casos onde que houve foi um "negociar mal". Contudo em se verificando uma mudança profunda nas condições econômicas da época contemporânea à da execução do contrato, que a torne de tal modo excessivamente onerosa a prestação de uma das partes, e proporcione lucros também excessivos à outra parte, cabe ao prejudicado insurgir-se e recusar a prestação. É digno de nota que, não se faz configurar o desequilíbrio da prestação qualquer fato como, verbi gratia, as flutuações havidas nas áreas econômicas, mas sim motivos realmente ponderosos, extraordinário, imprevisíveis, inimagináveis, pois não fosse assim a segurança jurídica estaria seriamente comprometida.

Para que se compreenda melhor e tenha – se uma correta noção dos casos em que a resolução por onerosidade excessiva proceder – se – a, necessário faz – se uma análise sistemática do artigo 478 do Código Civil, que rege:

"Art.478. Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato. Os efeitos da sentença que a decretar retroagirão à data da citação."

Como já disposto em vários momentos do presente trabalho, o art.478 do Código Civil exige que, além de extraordinário e imprevisível o acontecimento deve gerar uma extrema vantagem para uma das partes. Explicita ainda o presente artigo os requisitos para se invocar a resolução por onerosidade excessiva, são os seguintes: a) vigência de um contrato de execução diferida ou continuada: É necessário que se trate de contrato de duração, no qual se percebe um prazo, um lapso temporal entre sua celebração e sua contraprestação, momento este onde deverá ocorrer o fato extraordinário e imprevisível, estranho ao momento da celebração do contrato. Importante ressaltar que nos contratos de execução instantânea não será possível o instituto da resolução por onerosidade excessiva uma vez que a prestação e contraprestação se dão em um único momento, sendo, portanto impossível a ocorrência de fato superveniente; b)alteração radical das condições econômicas objetivas no momento da execução, em confronto com o ambiente objetivo no da celebração: É fundamental que se proceda uma mudança radical nas condições econômicas que torne totalmente distinto o ambiente da celebração como ambiente da execução, sendo importante também que esta alteração possua um caráter de generalidade e não apenas na esfera individual de um dos contratantes; c) onerosidade excessiva para um dos contratantes e benefício exagerado para o outro: Deve haver vantagens desarrazoadas para uma das partes e conseqüente empobrecimento da outra; d) imprevisibilidade daquela modificação: A modificação ocorrida no ambiente econômico alem de ser radical e excessivamente onerosa deve ainda ser imprevisível de forma que ao celebrarem o contrato as partes de maneira alguma poderiam prever tão modificação, excedendo a álea normal do contrato.

É de grande valia observar a regra do artigo 399 do Código Civil pelo qual o instituo em estudo não socorre o contratante que estiver em mora quando dos fatos extraordinários que lhe gerem a onerosidade excessiva, pois encontrando – se em tal situação responderá pelos riscos supervenientes, "salvo se provar isenção de culpa, ou que o dano sobreviria ainda quando a obrigação fosse oportunamente desempenhada." (C.C. art. 399)

O art. 479 do nosso Código Civil é de louvável inteligência, pois oferece as partes que se evite o desenlace oferecendo a modificação eqüitativa das condições de execução. O dispositivo supra citado concilia o princípio da autonomia da vontade com a intervenção estatal que nos tempos presentes é sempre tido em caráter de exceção. "O que a lei concede ao contratante é a resolução. A alteração das cláusulas de cumprimento será iniciativa do credor, que voluntariamente aquiesce em oferecer oportunidade de solução menos onerosa ao devedor, como meio de salvar a avença.

Nunca haverá lugar para a aplicação da teoria da imprevisão naqueles casos em que a onerosidade excessiva provém da álea normal e não do acontecimento imprevisto, como ainda nos contratos aleatórios, em que o ganho e a perda não podem estar sujeitos a um gabarito predeterminado."[2]

Nem sempre a resolução do contrato será a melhor opção, visto que sempre q possível e razoável, poderá o magistrado adequar as cláusulas do contrato as novas condições fáticas de forma a se restabelecer o equilíbrio contratual com vistas a se tentar manter o vínculo contratual firmado entre as partes, à luz do princípio da conservação do contrato.

"A teoria da imprevisão não aboliu simplesmente o princípio da força obrigatória dos contratos, nem permitiu que se pretendesse a resolução ou revisão judicial do negócio, simplesmente porque a execução ficou mais onerosa, dentro da previsibilidade natural inserta na álea de todo o contrato. Ou seja, não se admite a aplicação da teoria simplesmente porque a parte fez um mau negócio (risco previsto)".[3]

4 A TEORIA DA IMPREVISÃO NO CÓDIGO CIVIL

A cláusula rebus sic stantibus é uma exceção aplicada aos contratos, pois os eles são regidos pelo princípio da obrigatoriedade, onde as partes contratantes obrigam-se em acordo com os limites legais. É o que a expressão latina pacta sunt servanda estabelece. De acordo com ela, os contratos são feitos para serem cumpridos e a garantia, a autonomia da vontade, a liberdade de contratar e a segurança jurídica previstos no nosso ordenamento jurídico civil são aplicáveis a todos os contratos. Entretanto, se quando da execução do contrato as condições fáticas mudarem de forma brusca, se comparadas à situação contemporânea da época da celebração do contrato, dificultando ou inviabilizando o adimplemento, por tornar a obrigação onerosa para uma das partes, aplica-se a teoria da imprevisão que está implícita em todos os contratos, admitindo a resolução ou a modificação eqüitativa das condições do contrato. O Código Civil disciplina a matéria entre os artigos 478 a 480, onde trata da Resolução por Onerosidade Excessiva, assim disposto: "Art. 478. Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra em virtude acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato. Parágrafo único. Os efeitos da sentença que decretar a resolução do contrato retroagirão à data da citação. Art. 479. A resolução poderá ser evitada, oferecendo-se o réu a modificar eqüitativamente as condições do contrato. Art. 480. Se no contrato, as obrigações couberem a apenas uma das partes, poderá ela pleitear que a sua prestação seja reduzida, ou alterado o modo de executá-la, a fim de evitar a onerosidade excessiva". Observa-se que a revisão não é a única alternativa que se apresenta aos contratantes, pois é possível a resolução do contrato.

Em acordo com os dispositivos supracitados, observam-se os caracteres da Teoria da Imprevisão: o primeiro deles é a existência de um contrato comutativo de execução diferida ou de trato sucessivo, o segundo é a ocorrência de um fato extraordinário e imprevisível, o terceiro é a alteração considerável da situação existente no momento da execução do contrato em relação à situação da celebração do contrato e o quarto é a ligação entre a onerosidade excessiva do contrato e o evento superveniente. Os acontecimentos supervenientes devem alterar a economia do contrato, de forma a perturbar o seu equilíbrio, como inicialmente estava previsto, tornando certo que as partes não contratariam se tivessem a ciência dos fatos supervenientes. Se ocorrer tal fato, fica nítida a desigualdade contratual e o enriquecimento indevido de uma parte em prejuízo da outra.

5 A POSSIBILIDADE DA REVISÃO CONTRATUAL NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

Conforme já visto o verdadeiro responsável pela inserção da Teoria da Imprevisão em nosso ordenamento jurídico foi Código de Defesa do Consumidor, que o fez antes mesmo do novo Código Civil, tratando de tal instituto em seu art. 6º, inciso V, tratando como essência das relações de consumo o equilíbrio contratual, prevendo a possibilidade de ingresso em juízo sempre que uma prestação se tornasse excessivamente onerosa para o consumidor.

O Código de Defesa do Consumidor, embasado na Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5°, inciso XXXII, traz em seu corpo formas de proteção ao consumidor como parte hipossuficiente na relação consumeirista como normas de ordem pública e de relevante interesse social, tratando-se de uma intervenção estatal no mundo dos contratos. A teoria da imprevisão aplica-se às relações de consumo em acordo com o artigo 6°, inciso V do Código de Defesa do Consumidor que assim dispõe:

"São direitos do consumidor:

V – a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas."

Para a aplicação do dispositivo citado, não se faz necessária a imprevisão dos fatos supervenientes à realização da compra, basta que as prestações tornem-se excessivamente onerosas para o consumidor. Então, mesmo que o fato seja previsível, é totalmente aceitável a revisão contratual quando ocorrer a onerosidade excessiva em face do consumidor, dando o equilíbrio necessário à relação contratual existente. Assim sendo, o dispositivo supracitado é a cláusula rebus sic stantibus aplicável às relações de consumo,apesar de algumas diferenças em relação ao Código Civil como a impossibilidade de resolução do contrato e de relatividade em relação aos fatos supervenientes que não precisam ser previsíveis.

6 TEORIA DA IMPREVISÃO versus CASO FORTUITO E FORÇA MAIOR

É muito comum que se confunda instituto da Teoria da Imprevisão com o Caso Fortuito e Força maior, entretanto, como veremos, trata – se de institutos bem diferentes.

Em princípio há que se ressaltar que estes dois institutos são tratados em partes diferentes do código, o Caso Fortuito e Força Maior é tratado no Título IV, Capítulo I, artigo 393, ao passo que a Teoria da Imprevisão é tratada no Título V, Capítulo II, Seção IV, dos artigos 478 a 480.

Não há, ainda, que se confundir a Teoria da Imprevisão com caso fortuito ou força maior porque a Teoria da Imprevisão pressupõe a ocorrência de fato imprevisto que dificulta o adimplemento do contrato para uma das partes, ensejando a possibilidade de revisão das cláusulas contratuais com a finalidade de devolver o equilíbrio natural do contrato; ao passo que o caso fortuito, fato inevitável que independe da vontade e condição do homem e a força maior, aquele previsível, mas indeterminável, podem ocasionar a impossibilidade no cumprimento da avença, dando margem à extinção do contrato, em acordo com o artigo 393 do Código Civil.

7 PACTA SUNT SERVANDA (a força obrigatória). REBUS SIC STANTIBUS (a teoria da imprevisão)

A força obrigatória dos contratos (Pacta sunt servanda) e a teoria da imprevisão (Rebus sic satandibus) são dois institutos mutuamente relacionados visto que embora por caminhos antagônicos acabam por levar à um mesmo ponto em comum, qual seja, a garantia de um fim juridicamente protegido.

7.1 Pacta Sunt Servanda:

Brocardo Latino, princípio pelo qual os contratos devem ser obrigatoriamente cumpridos pelas partes. Encerra o principio da força obrigatória dos contratos, segundo o qual o contrato faz lei entre as partes, representando a força vinculante das convenções. Por este motivo é também chamado de princípio da intangibilidade dos contratos e princípio da força vinculante dos contratos.

A luz do princípio da autonomia da vontade, ninguém é obrigado a contratar, sendo as partes livres para contratarem com quem quiserem e o que quiserem (lembrando sempre a liberdade para contratar é ilimitada porem a liberdade contratual é limitada não devendo o contrato ferir preceito de ordem pública). Nosso ordenamento jurídico confere a cada um a liberdade contratual, sendo as partes livres para estabelecer os termos e os objetos da avença. Todavia tendo – se realizado o contrato de maneira válida, observados os requisitos para validade e eficácia dos contratos, devem obrigatoriamente cumpri – la não podendo a seu bel prazer deixar de adimplir com a obrigação avençada uma vez que foram as partes que estabeleceram os termos e o objeto do contrato, vinculando – se a este.
"O princípio da força obrigatória do contrato significa em essência, a irreversibilidade da palavra empenhada"[4]

"O aludido princípio tem por fundamentos: a) a necessidade de segurança nos negócios, que deixaria de existir se os contratantes pudessem não cumprir a palavra empenhada, gerando a balbúrdia e o caos; b) a intangibilidade ou imutabilidade do contrato, decorrente da convicção de que o acordo de vontades faz lei entre as partes, personificada pela máxima pacta sunt servanda (os pactos devem ser cumpridos), não podendo ser alterado nem pelo juiz. Qualquer modificação ou revogação terá de ser, também, bilateral, o seu inadimplemento confere à parte lesada o direito de fazer uso dos instrumentos judiciários para obrigar a outra a cumpri – lo, ou a indenizar pelas perdas e danos, sob pena de execução patrimonial (CC, art. 389)"[5].

Há que se fazer constar que malgrado o princípio seja o da força obrigatória dos contratos tal obrigatoriedade não é absoluta, sendo assim cumpre – nos afirmar que o princípio da pacta sunt servanda é o princípio pelo qual o cumprimento dos contratos é obrigatório, ou seja, obriga as partes ao seu cumprimento, porém dentro das linhas limítrofes da lei.

7.2 Rebus Sic Standibus:

Rebus sic standibus que pode ser interpretada como "enquanto as coisas estão assim" é uma expressão que teve sua origem no Direito Canônico, sendo utilizada para designar o Princípio da Imprevisão, princípio este que acarretou um abalo no princípio da força obrigatória.

Esta teoria consiste em presumir – se implícita nos contratos comutativos de trato sucessivo uma clausula pela qual a obrigatoriedade do cumprimento das prestações consiste em manter – se inalterada as situações de fato. Todavia sobrevindo uma situação extraordinária (por situação extraordinária entenda – se algo realmente incomum, impossível de ser prevista) que acabe por tornar excessivamente oneroso para o devedor o adimplemento da obrigação avençada, poderá este requerer ao juiz que se restabeleça o equilíbrio contratual ou o isente da obrigação, parcial ou totalmente.

Para fins de melhores esclarecimentos tratemos o tema da seguinte maneira: Trata – se o termo Teoria da Imprevisão de algo relativo ao surgimento de fato extraordinário, incomum, inesperado, imprevisível, de tal monta que a execução da obrigação contratual não seja exigível nas mesmas condições pactuadas antes do acontecimento do fato extraordinário. Esta obrigação contratual continua sendo exigível, entretanto não nas mesmas condições que seria a época da avença, tornando – se – lhe mais onerosa, sendo necessário um ajuste no contrato afim de que deixe de ser excessivamente oneroso a uma das partes.
A cláusula Rebus sic standibus é exatamente a materialização, a instrumentalização deste ajuste. É a clausula implícita nos contratos que viabiliza este equilíbrio contratual ante ao surgimento de um fato, que possibilita sua adequação a nova realidade.

Este princípio opõe – se ao princípio da obrigatoriedade justamente por permitir aos contratantes, frente a um motivo imprevisto e extraordinário, que recorram a tutela jurisdicional a fim de obter a alteração do contrato, procedendo – se ao seu equilíbrio. Daí se dizer que tal teoria ocasionou certo abalo no princípio da força obrigatória e também, devido a ele, hoje tem – se que o contrato obriga as partes nos limites da lei.

8 COMPREENDENDO A DIFERENÇA ENTRE TEORIA DA IMPREVISÃO, CALUSUA REBUS SIC STANDIBUS E RESOLUÇÃO POR ONEROSIDADE EXCESSIVA

A "Teoria da Imprevisão", parte do principio que os contratos poderão ser rediscutidos a partir da ocorrência de fatos novos, imprevisíveis quando da afirmação do mesmo. Trata-se da aplicação do principio da boa fé.

A expressão "Clausula Rebus Sic Stanibus" remonta a tempos imemoriais. Ela preza que sempre haverá uma clausula implícita nos contratos em que a convenção não permanece em vigor se as coisas não permanecerem como eram no momento da celebração.

A onerosidade excessiva tem o foco na desproporção das partes, ou seja, uma das partes deixa de cumprir o contrato por verificar sua onerosidade excessiva por circunstâncias supervenientes e não propriamente de imprevisibilidade.

9 ENTENDIMENDO DOS TRIBUNAIS E JURISPRUDÊNCIA

Os Tribunais pátrios assim como a doutrina são pacíficos em afirmar que só serão dignos de resolução por onerosidade excessiva os casos em que o motivo for superveniente à formação do contrato, nunca contemporâneo a este, e ainda, que sejam os motivos realmente extraordinários e imprevisíveis, não cabendo em qualquer caso a Teoria da Imprevisão, aplicando – se lhe restritivamente e em casos extraordinários uma vez que sua aplicação de maneira desordenada poria em risco a segurança jurídica e o princípio da força obrigatória dos contratos e da segurança da atividade econômica moderna.

10 CONCLUSÃO

A onerosidade excessiva irá ocorrer sempre de modo superveniente a vontade das partes, para tanto a Teoria da Imprevisão vem solucionar os problemas gerados para uma das partes que sofre um prejuízo desproporcional, que ao tempo da realização do contrato não podia prever.

O direito positivado através dos casos concretos observa tais acontecimentos inesperados, e procura regulamentá-los, para que em uma relação jurídica, uma das partes contratantes não venha a sofrer prejuízos excessivos em face de lucros desarrazoados auferidos pela outra parte, para tanto com a Teoria da Imprevisão, esta permite a revisão do contrato, ajustando novas cláusulas para se adequar a nova situação econômica ocorrida de maneira superveniente, extraordinária e imprevisível que não puderam ser razoavelmente previstas pelos contratantes, de forma que tal situação nova afete a sociedade em geral e não que fique apenas na esfera individual de um dos contratantes. .


[1] Arnaldo Rizzardo – Contratos, 4º Edição - p. 137

[2] Caio Mário – Instituições de Direito Civil III

[3] Pablo Stolze Gagliano – Algumas Considerações sobre a Teoria da Imprevisão

[4] Caio Mário da Silva Pereira, Instituições de Direito Civil III, p. 14-15

[5] Carlos Roberto Gonçalves, Direito Civil Brasileiro III, p. 28