Resenha de obra ''Viver é a melhor opção'' de André Trigueiro
Por Rogério Duarte Fernandes dos Passos | 22/04/2020 | ResumosResenha de obra de André Trigueiro
Rogério Duarte Fernandes dos Passos
TRIGUEIRO, André. Viver é a melhor opção. A prevenção do suicídio no Brasil e no mundo. Correio Fraterno: São Bernardo do Campo, 5ª ed., 2018, 198 p.
1. Sobre o autor.
André Trigueiro Mendes é jornalista profundamente dedicado, dentre outros, ao tema do meio ambiente, possuindo pós-graduação em Gestão Ambiental pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), onde ministra a disciplina Geopolítica Ambiental, sendo que também é professor e criador do curso de Jornalismo Ambiental da Pontifícia Universidade Católica da mesma cidade (PUC-Rio).
Atuando no âmbito jornalístico nas organizações Globo do Rio de Janeiro, o autor também colabora na Rádio Boa Nova AM 1450 Khz, emissora da Fundação Espírita André Luiz localizada em Guarulhos, na região metropolitana de São Paulo e, na presente obra resenhada, superando os cinquenta mil exemplares vendidos, doou todos os direitos autorais para o Centro de Valorização da Vida (CVV), entidade filantrópica que desde 1962 gratuitamente oferece, por meio do trabalho voluntário, apoio emocional aos necessitados e, mesmo, a atenção para a prevenção ao suicídio.
2. Sobre a obra.
André Trigueiro traz o tema do suicídio por meio de uma abordagem sensível e humana, analisando os preocupantes números sobre o problema coletados junto ao Ministério da Saúde no Brasil, e os mundiais, junto à Organização Mundial da Saúde (OMS), que considera o autoextermínio como uma questão de saúde pública.
Trigueiro destaca que estamos todos em uma viagem, no que não somos apenas passageiros, mas companheiros de jornada, onde recebemos ajuda e ajudamos os outros. Exsurge, assim, o dever de solidariedade em tema tão sensível como o suicídio, onde há muito a fazer.
A questão possui dimensões socioeconômicas, no que o autor conclui que na maioria dos casos o suicídio pode ser prevenido (p. 37), de forma que falar sobre o problema é derrubar um tabu (p. 41), possivelmente oriundo, dentre outros fatores, do chamado “Efeito Werther”, em alusão ao romance “Os Sofrimentos do Jovem Werther”, de Johann Wolfgang von Goethe (1749-1832), o qual se supõe ter causado uma onda de suicídios pela Europa em alusão ao que ocorre no enredo de uma de suas personagens.
Não obstante, destaca o autor que é necessária a abordagem responsável ao tema por parte dos veículos de comunicação, em conduta recomendada pela própria OMS, onde o ato de “noticiar acerca do suicídio de uma forma apropriada, cuidadosa e potencialmente útil pelas mídias esclarecidas poderá prevenir trágicas perdas de vida” (p. 46).
Por sinal, ao que tange à mídia Trigueiro assevera que ela “deve proporcionar debates, discussões e reflexões que influenciem hábitos e comportamentos, e amadureçam a visão de mundo de sua sociedade, bem como o exercício pleno da cidadania” (p. 50), de maneira que em relação ao suicídio, como que enunciando uma nova ética ao tema, ela necessita: 1) Evitar a repetição de histórias; 2) Recorrer a fontes confiáveis e comentários de especialistas; 3) Evitar explicações sobre o suicídio; 4) Dar visibilidade à relação que existe entre o tema e os transtornos mentais, em particular depressão e alcoolismo; 5) Evitar a glorificação/ “glamourização” dos que cometem tais atos; 6) Cuidado redobrado ao noticiar os eventos relacionados a celebridades; 7) Buscar a calibragem correta de informações; 8) Trazer a apresentação de modelos positivos; 9) Fornecer poucos detalhes sobre meios empregados; 10) Divulgar informações sobre onde se conseguir ajuda; 11) Não utilizar a palavra suicídio em manchetes; 12) Não divulgar fotos do falecido; 13) Não permitir que a palavra suicídio seja vista como saída, opção ou solução; 14) Evitar a linguagem sensacionalista; 15) Não utilizar a censura, pois que perpetua o tabu; 16) Reconhecer que jornalistas também podem ficar vulneráveis; 17) Publicar sobre fatores de risco para o suicídio (p. 51-54).
Ademais a postura não passiva diante do problema indica que os amigos podem funcionar como uma rede de proteção (p. 65), no que nunca é demais recordar a “Oração da Serenidade” – invocada até pelos que “em nada acreditam” – rogando a serenidade de aceitar o que não pode ser mudado, coragem para modificar o que é possível, e sabedoria para a distinção entre uma coisa e outra (p. 65-66).
O debate acerca do perigo que envolve a flexibilização das drogas em relação ao tema não é ignorado (p. 80-81), bem como os problemas causados pelas manifestações de vingança e bullying virtual (p. 86-87), sendo necessário estimular os jovens no espaço educacional para se permearem por criatividade e inovação, de forma que o conhecimento seja prazeroso, no que o uso do ambiente da rede mundial de computadores não se destine apenas para o alcance de status e “curtidas” (p. 89-90), e de sorte também que os jovens alcancem resiliência, onde se possa buscar o necessário auxílio sem pré-julgamentos ou reprimendas quando necessário (p. 95).
Sendo um problema que alcança militares, policiais e a todos, o acesso às armas de fogo deve ser muito bem controlado, e a valorização da vida um ideário a ser buscado em políticas públicas, no que a satisfação humana deve ser propugnada em valores do ser, e não do consumismo exacerbado (ou seja, do ter). Ao lado da questão relacionada aos armamentos, o autor demonstra preocupação no acesso a gazes, medicamentos, agrotóxicos e pesticidas, que podem ser usados indevidamente para o autoextermínio.
No enfrentamento da questão André Trigueiro destaca o trabalho dos Samaritanos, de Londres, organização que inspirou a criação do CVV, no Brasil, entidade que vem prestando um inestimável serviço ao país por meio do apoio ao ser humano, oferecendo ajuda, carinho e solidariedade através do telefone 188, que gratuitamente atende por vinte e quatro horas em todo o território nacional, concretizando algo que parece simples, mas que faz toda a diferença, que é justamente dispor de tempo e paciência para ouvir, sob os auspícios da compreensão, fraternidade, cooperação e crescimento interior, somados ao exercício de uma vida plena, no que, obviamente, só assim o será se vivida.
Caminhando em direção ao final da obra, o autor realiza uma entrevista com Carlos Felipe D’Oliveira, psiquiatra do Ministério da Saúde e coordenador da Estratégia Nacional de Prevenção ao Suicídio (2005-2009), donde destacamos a necessidade de adoção de medidas que, uma vez implementadas, podem reduzir e barrar o autoextermínio, como a instalação de grades de proteção em pontes (p. 141-142) ou em áreas de circulação em shoppings que acessam vãos centrais. Entrementes, é possível, em guisa de auxílio, firmar um “Pacto pela Vida”, onde alguém com dificuldades e que tenha manifestado intenções suicidas, possa procurar um amigo ou uma ajuda especializada para lidar com o problema, combinando-se inclusive a retirada de algo que exista na residência daquele que sofre e que seja potencialmente apto a colocá-lo em risco, em uma ação que mostra envolvimento, preocupação e cuidado com o ser humano (p. 145). Vale mencionar também que devemos crer que o suicídio pode ser evitado e que, por meio de atitudes como essas, há muito o que possa ser feito em face do assunto (p. 149).
Fecha o livro de André Trigueiro o capítulo que traz a visão da Doutrina Espírita sobre o tema, no que se enfatiza que no âmbito cristão o suicídio não é uma solução, e no Espiritismo um profundo empecilho na trajetória de um espírito imortal que busca a evolução e a aproximação do propósito maior de um Pai infinitamente amoroso e justo. O suicídio não é meio para fuga dos sofrimentos – eles, os sofrimentos, inclusive são explicados pela Doutrina –, no que esse entendimento pode propiciar melhor restauração de lucidez e combate à invigilância de ânimo para a superação das dores e para o alcance do conforto sentimental. Advirta-se que, à luz doutrinária do Espiritismo, o suicídio não é apenas o ato voluntário singularmente praticado nesse sentido, mas tudo o que se faça de forma consciente para acelerar a extinção das forças vitais do indivíduo em sua seara de realizações no planeta Terra.
Dentre outros nomes de escol da Doutrina, resgata-se também o notável trabalho da médium Yvonne do Amaral Pereira (1900-1984), com a obra psicografada “Memórias de um Suicida”, verdadeiro libelo contra o suicídio, nos enfatizando a dádiva de forças vitais que a espiritualidade nos concede para que bem se cumpra a missão no planeta Terra, no que o autoextermínio, em momento algum, se concretiza enquanto possibilidade de resolução de problemas e de ponto final nos sofrimentos.
É importante destacar que com a presente resenha, em momento algum se procurou substituir a pesquisa de fôlego e o excelente manuscrito de André Trigueiro. Pelo contrário, objetiva-se aqui a divulgação de seu nobre trabalho, de forma a incentivar que o máximo possível de pessoas – inclusive educadores – possam lê-lo, e, outrossim, que granjeemos cada vez mais prevenir o suicídio, e, por que não dizer, em âmbito social e global erradicá-lo. Ademais, será importante que por meio dessas ações consigamos, verdadeiramente, impulsionar uma sociedade que se quer fraterna e solidária, de forma que vale frisar que abordar o tema não significa colocar-se ou arrogar-se em uma posição de superioridade, visto que todos nós somos portadores de dificuldades, vulnerabilidades, limitações, sofrimentos e provações.
Por derradeiro, recomendando vivamente a leitura da presente obra resenhada, destacamos a mensagem de André Trigueiro, a qual nos conclama ao entendimento de todos nós termos uma missão única, que somos únicos e que podemos auxiliar e sermos auxiliados. Inclusive quando as dificuldades parecerem intransponíveis na jornada que enfrentamos. De forma que ele, de forma inspiradora, nos encoraja em belo fecho de sua obra (p. 198):
“O mais importante é perceber que nenhum sofrimento dura para sempre.
Por mais assustadora que seja a tempestade, ela sempre passa.
Se o hoje te parece desagradável e angustiante, espera e confia.
A melhor saída é a vida”.