Resenha Crítico-informativa
Por Adna Couto | 25/03/2008 | ResumosLogo na parte introdutória do livro, o autor afirma que o único sentido da avaliação é cuidar da aprendizagem.Avaliação, se mal feita, só atrapalha. Se bem feita, entretanto, pode ser estratégia fundamental, por vezes decisiva.O autor comenta ainda que não se pode depositar sobre avaliação esperança excitada, porque é apenas parte do processo, muito menos imaginar que se possa inventar um tipo perfeito e final de avaliação. Toda avaliação é incompleta, incômoda e injusta, além de muito facilmente estigmatizante, insidiosa e mesmo fraudulenta. Ainda assim, pode ser apoio substancial, se for concebida e praticada para cuidar da aprendizagem do aluno com dedicação diária. Comete-se um grande erro ao pensar que avaliação "oficial" é a "prova", assim como ensino "oficial" é a "aula". Ambas são caricaturas pálidas ou deturpantes da aprendizagem mais autêntica.No lugar da prova é urgente colocar outros procedimentos que, ao avaliar, não se restrinjam aos laivos negativos sempre também presentes, mas impliquem o contexto necessariamente pedagógico da avaliação, ou seja, objetivo de cuidar da aprendizagem dos alunos.
No primeiro capítulo, o autor discute conceitos sobre aprender e conhecer. Ele afirma que aprendizagem é dinâmica reconstrutiva política, como mostra hoje também a biologia. Outros autores como Maturana e Varela (1994) cunharam o termo "autopoiese", para designar esta característica de todo ser vivo de funcionar de dentro para fora.Os seres vivos são auto-referentes, porque compreendem arealidade a partir de si mesmos, não apenas da realidade como tal externa. Não há acesso direto e imediato à realidade externa, mas mediado pelos sentidos e pelo cérebro, de maneira sempre reconstrutiva.
A realidade externa não pode ser reduzida a mero ponto de partida, porque é, como a biologia também mostra, ambiente essencial do desenvolvimento do ser vivo. Ao fim, predomina a percepção autopoiética, porque não se pode elidir o sujeito, mas a realidade externa, bem como os outros em sociedade, também nos são constitutivos. A vida não é máquina mecânica, reprodutiva, mas construção e permanente reconstrução biológica e histórica, dotada de sujeito inalienável. Pedro Demo cita um exemplo interessante, ele diz que se reunimos 10 pessoas em torno de mesa redonda e contarmos para a número l uma história, para que conte adiante para a número 2, até à número 10, veremos que esta história pode chegar bastante retocada ou mesmo irreconhecível. A razão é autopoiética ou hermenêutica: não sabemos reproduzir a história. Ao contarmos uma história, o fazemos na condição de sujeitos, não de objetos.
O autor reforça a idéia citada acima dizendo que aprendizagem é, pois, "dinâmica reconstrutiva", de dentro para fora. Quer dizer que o aluno somente aprende se reconstruir conhecimento. Não pode permanecer em escutar, copiar e devolver de modo reproduzido na prova.
No que diz respeito a conhecimento e aprendizagem, os dois termos não são sinônimos, obviamente, até porque pode existir forte tensão entre ambos (Demo, 2000a), mas são correlates em vasta extensão e intensidade. Conhecimento é dinâmica tipicamente reconstrutiva e política, porque conhecer implica aprender em sua energia mais intensa e profunda. Aprendizagem, todavia, é conceito bem mais amplo, porque não se restringe, em hipótese nenhuma, à razão cognitiva (Damásio, !996;Goleman, 1996) ou ao que chamamos de racionalidade. Entre as dinâmicas mais fantásticas do desenvolvimento humano está a habilidade infinita de aprender e conhecer. Por isso, institucionalizamos processos educativos recorrentes em sociedade, em parte obrigatórios, porque internalizamos a convicção de que conhecimento é fundamental para a vida, principalmente para mudar de vida. Becker, inclusive diz que conhecimento só é conhecimento no processo de construção, não apenas no processo de reprodução.
Nos capítulos 2 e 3, o autor fala sobre o processo de descarrilamento da avaliação e que é realmente avaliar. Por não ser nada fácil avaliar, ele diz que os educadores estão de mal com a avaliação, é como se ela fosse realizada apenas para cumprir um requisito escolar e não com a função de auxiliar o aluno no processo de aprendizagem. O autor comenta quepassamos de um extremo a outro. Antes, avaliava-se para excluir, humilhar, estigmatizar. Agora, já não se faz avaliação nenhuma. Os alunos eram mantidos sob constante estado de vigilância, com provas de supetão a qualquer momento, exposição em plena sala dos que não sabiam responder questões à queima-roupa, repreensões duras e agressivas, expressando em grande parte a prepotência escolar. Memorizar era praticamente tudo: de um lado, repassar montanhas de conteúdos; de outro, absorver e devolver na prova. Silva (1987) comenta que este procedimento ainda não morreu, em especial em algumas disciplinas mais formais, como matemática. Muitas escolas de engenharia, por exemplo, medem sua qualidade pelos alunos reprovados a cada ano. Foi importante superar este estereótipo escolar, mas não cabe ir ao outro extremo, já que a pedagogia da exclusão não pode ser substituída pela do abandono ou do faz-de-conta.
É interessante perceber que o crescimento de cada aluno, no seu ritmo e contexto, pode ser mais fundamental do que a comparação com outros colegas. É deste pano de fundo que emergem, geralmente, as vozes contrárias à "classificação", embora, excluindo sem mais a referência classificatória, também deixam de avaliar. O fato preocupante, entretanto, é que processos avaliativos vinculam-se com excessiva facilidade com procedimentos excludentes, à medida que privilegiam em demasia desempenhos.Ultimamente, com o advento das "inteligências múltiplas" e o realce da "inteligência emocional", a noção de desempenho foi selo menos alargada e flexibilizada.
Comentando sobre o que é avaliar, o autor diz que a atividade de avaliar pode aparecer em inúmeras circunstâncias, tais como: constrastar quantidades, qualidades, qualificar desempenhos, comparar situações, dinâmicas, propor padrões, distribuir expectativas, evitar excessos, prevenir obstáculos e impedimentos, entre outras.
Por conta da complexidade da avaliação, é sempre importante diversificar as maneiras de avaliar, no que se pode incluir também "auto-avaliações", desde que não sejam exclusivas.
Buscando melhorar cada vez mais o processo avaliativo o autor propõe criticar a avaliação. Ele diz que do ponto de vista educacional, toda avaliação é: sempre injusta, pois não é possível avaliar seres humanos por outros seres humanos de forma justa. É sempre incômoda, sempre incompleta, ideológica, facilmente autóritária, excludente, humilhante, insidiosa. Um procedimento citado pelo autor, em relação a avaliação é a democracia desse processo. Alguns pontos a serem considerados poderiam ser: avaliar o avaliador, o avaliado precisa entender como se dá o processo avaliativo, precisa ter o direito de pedir explicações. O avaliado deve ter o direito de refazer o que fez equivocado. A avaliação deve ser pedágógica, ou seja, garantir o direito de aprender. Por último toda avaliação é discutível. Com essa visão em mente, torna-se mais clara a pequenez da prova. Embora seja prática nacional, é uma forma extremamente frágil de avaliação.O verdadeiro "milagre" do professor é conseguir que seu aluno saiba pensar, torne-se cidadão autónomo, cresça em seu processo emancipatório, aprenda a confrontar-se com a realidade, desconstrua e reconstrua conhecimento.
No último capítulo do livro,o autor volta a temática principal de toda a obra, fala sobre a intrínseca ligação que deve existir entre aprendizagem e avaliação. Ele afirma que o foco da avaliação precisa ser retirado da prova e de outras querelas que giram em torno da prova, como nota, para centrar-se nodesafio da aprendizagem reconstrutiva política e aí servir de apoio sistemático. Avalia-se para garantir o direito de aprender. Este desafio compensa todas as misérias da avaliação e que, como vimos, são inúmeras e preocupantes. O aluno precisa elaborar toda semana - este é requisito fundamental, ainda que não cabal, nem exclusivo. Em vez de ficar escutando o professor, tomando nota do que diz ou escreve no quadro, copiar a apostila ou o livro didático, o aluno deve ser levado a produzir textos próprios, começando do começo. Nada do que ocorre em sala de aula pode ser reproduzido, nem a aula do professor. Tudo que existe em sala de aula não passa de "material de pesquisa", que deve ser manejado pelo aluno na condição de sujeito, não de objeto.
O autor comenta que o aluno não vem para a escola escutar aula.Vem para reconstruir conhecimento e arquitetar sua cidadania integral (corporal, emocional e espiritual). Sala de aula é, antes de tudo, ambiente de estudo e pesquisa, pela razão simples de que pesquisa é o ambiente de aprendizagem (Demo, 1996a). Pesquisa não é atividade esporádica, eventual, voluntária, intermitente, mas centro da dinâmica autopoiética da aprendizagem.
Por fim, o autor mostra que a finalidade da avaliação é de cuidar todo dia deste processo. Muda a posição do professor. Não é transmissor de conhecimento, porque sua função não é instruir, mas educar, formar. Seu desafio socrático emerge com toda força: é de provocação, orientação, instigação, sobretudo de "cuidado". Cuidar da aprendizagem traduz, ademais, a integralidade do processo de aprendizagem, que nunca se reduz ao aspecto racional lógico. Está em jogo a formação da personalidade humana como um todo.
COMENTÁRIO PESSOAL
A obra traz excelentes dicas de como entender melhor o processo avaliativo dos alunos e como fazer dele algo mais eficiente. Avaliar não é uma tarefa fácil e se for realizada de qualquer maneira pode interferir negativamente, na formação e no desenvolvimento do alunado. Os educadores devem estar conscientes de seu papel, que deve ser o de preocupar-se com o aprendizado dos alunos, fazer com que o aluno realmente aprenda. Devem estar empenhados em tranformar seus alunos em seres cada vez mais autônomos e construtores de conhecimento. Somos seres pensantes, e não meros reprodutores de saber. O que está em jogo no processo avaliativo não é uma simples nota, mas a formação de um indivíduo como um todo.