Repercussões do pacote fiscal de junho

Por Alexsandro Rebello Bonatto | 07/07/2009 | Economia

A redução do custo do investimento anunciada em 29 de junho pelo governo é de fato significativa, trazendo os juros para níveis realmente baixos para os padrões brasileiros, dizem economistas e representantes da indústria.

O pacote de redução de juros do BNDES, um dos pilares das medidas anunciadas pelo governo, tem como meta principal levar as empresas a antecipar investimentos produtivos. As novas condições dos empréstimos do banco devem reduzir em 21% o custo dos investimentos em máquinas e equipamentos financiados em prazo de dez anos. Hoje a diretoria do BNDES vai aprovar as medidas e até amanhã o banco deve enviar carta circular aos agentes financeiros informando-os das mudanças.

Apenas os bens de capital financiados nas diversas modalidades do programa Finame, que estão na lista dos beneficiados pela redução de juros, representaram, em 2008, quase um terço do desembolso total do BNDES, de R$ 92 bilhões naquele ano. Fonte do governo tem a expectativa de que as novas condições trarão de volta os investimentos e levarão a um novo recorde de desembolsos em 2009, superior a R$ 110 bilhões.

A entrada em operação das novas condições de financiamento vai depender de portaria de equalização do Tesouro Nacional, que, em geral, leva duas semanas para ser publicada no "Diário Oficial da União". A equalização será necessária porque o custo de captação para o banco vai superar o juro final dos empréstimos aos tomadores. Nos bens de capital, por exemplo, a taxa final foi reduzida de 10,25% para 4,5% ao ano. O novo percentual inclui 3% de spread do agente financeiro e 1,5% do BNDES. O custo mínimo de captação do BNDES nos empréstimos passará a ser de 7% (6% do novo valor da TJLP mais 1% de spread básico). O Tesouro, neste caso, terá que equalizar 5,5%.

Com a diminuição das taxas cobradas nos empréstimos para compra e produção e bens de capital, o preço do dinheiro não deve ser um obstáculo para quem pretende investir na modernização e ampliação da capacidade produtiva. A expectativa, porém, não é de uma explosão das inversões no segundo semestre. As perspectivas para a economia global seguem ruins, o que é ruim para setores exportadores, e a capacidade ociosa da indústria segue elevada.

Repercussões
O pacote do BNDES foi bem recebido por executivos e entidades de classe. Fernando Bueno, vice-presidente da Abimaq, disse que as medidas deverão permitir "desengavetar" projetos. A dúvida é se os benefícios chegarão às pequenas e médias empresas.

Na avaliação de executivos da área de bens de capital, a redução dos juros nas linhas do BNDES é uma tentativa de reverter a forte queda do investimento fixo nos cinco primeiros meses do ano. Segundo a Abimaq, os investimentos no setor produtivo caíram cerca de 25% de janeiro a maio em relação ao mesmo período de 2008.

O diretor corporativo e de operações do grupo Randon, Erino Tonon, explicou que o aumento dos prazos e a redução dos juros para a aquisição de caminhões por pessoas físicas e jurídicas foram pauta de conversa de empresários e executivos com o ministro do Desenvolvimento, Miguel Jorge, durante a missão comercial à África no início deste mês. De acordo com ele, a medida é mais importante do que a manutenção do IPI sobre o produto e sobre semirreboques rodoviários em 0% até o fim do ano.

"Em financiamentos com quase cem meses de prazo, mesmo uma pequena redução da taxa de juros faz uma grande diferença", comentou o executivo. O incentivo para a venda de caminhões também tem impacto positivo sobre o segmento de autopeças, que representa cerca de 50% do faturamento do grupo, explicou.

Mesmo assim, Tonon afirmou que a isenção do IPI de 5% sobre semirreboques desde abril ajudou o grupo a encerrar o segundo trimestre com desempenho superior ao do primeiro, quando o número de implementos rodoviários vendidos ficou em 4,4 mil. O volume ainda não alcançou o registrado no segundo trimestre de 2008, quando a Randon vendeu 6,4 mil unidades, mas o executivo reconhece que aquele número representou um "ponto fora da curva".

Fontes de empresas fabricantes de equipamentos para a indústria de mineração e siderurgia receberam a notícia com cautela. A constatação é de que esses setores estão praticamente parados em função da crise. As fontes reconheceram que as condições financeiras do BNDES se tornaram muito favoráveis, mas têm dúvidas se elas serão suficientes para levar os empresários desses setores a retomar investimentos, pois as empresas do setor trabalham com capacidade ociosa entre 30% e 40%.

Impactos da crise
Com o agravamento da crise a partir de setembro do ano passado, a produção de bens de capital despencou abruptamente, como mostra um estudo da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib).

Em sete meses, de setembro de 2008 a março deste ano, a fabricação desses bens caiu nada menos que 31,4%, um tombo significativo num curto espaço de tempo. Em abril, houve uma ligeira recuperação. O estudo compara o desempenho da produção de bens de capital com outras cinco crises anteriores (a do México, em 1994, a da Ásia, de 1997, a da Rússia, em 1998, a do apagão e da Argentina, em 2001, e a da temor da transição do governo FHC para o governo Lula, em 2002). Na do México, a fabricação desses produtos chegou a cair 32,5% em relação ao começo da turbulência, em dezembro de 1994, mas o fundo do poço demorou mais para ser atingido - 13 meses.

O presidente da Abdib, Paulo Godoy, diz que as medidas anunciadas pelo governo "estão na direção correta", citando não apenas a queda dos juros como também a desoneração do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) de bens de capital. "É uma medida importante, porque o país é um dos únicos países do mundo que tributam o investimento." Ele é cauteloso, porém, ao falar das perspectivas para o segmento de bens de capital no segundo semestre. Setores da economia que dependem mais do mercado interno podem retomar algum investimento para aproveitar o custo mais baixo que vai vigorar até o fim do ano, avalia Godoy. No caso de setores exportadores, a situação é mais desanimadora, porque as perspectivas para a economia global continuam nebulosas. Outra questão é que as medidas são transitórias - valem até o fim do ano.

Agir no setor que mais puxou para baixo a economia brasileira no último semestre, o de máquinas e equipamentos, foi um caminho acertado, na opinião de economistas, ao comentarem o pacote anunciado pelo governo. Responsável por aumentar a capacidade produtiva do país, o investimento caiu 14% no primeiro trimestre, a maior queda desde 1996. Com o barateamento de custos e crédito facilitado, projetos de investimento que estavam em vias de acontecer e foram suspensos por causa da crise podem ressurgir, dizem analistas.

Bibliografia
Jornal Valor Econômico de 30 de junho de 2009
Jornal O Estado de S. Paulo de 30 de junho de 2009 Jornal Folha de S. Paulo de 30 de junho de 2009
Jornal O Globo de 30 de junho de 2009