RELATO DE EXPERIÊNCIA NO DESENVOLVIMENTO INOVATIVO DE UM GRUPO TERAPÊUTICO COM FOCO NAS EMOÇÕES PARA CRIANÇAS E ADOLESCENTES NO CONTEXTO ESCOLAR

Por Morgana de Sousa Campos Vasconcelos | 21/05/2024 | Psicologia

RELATO DE EXPERIÊNCIA NO DESENVOLVIMENTO INOVATIVO DE UM GRUPO TERAPÊUTICO COM FOCO NAS EMOÇÕES PARA CRIANÇAS E ADOLESCENTES NO CONTEXTO ESCOLAR

 

Ariel Santana Freitas1, Fabiana Teodoro Ferreira Tavares1, Morgana de Sousa Campos Vasconcelos1, Carina do Carmo Couto2, Ana Cristina Silva De Novais2, Elton Rost2

 

1 Discente. Instituto Luterano de Ensino Superior de Itumbiara – ILES/ULBRA Curso de Psicologia. Itumbiara-GO.

2 Docente e Orientadora do projeto. Instituto Luterano de Ensino Superior de Itumbiara – ILES/ULBRA Curso de Psicologia. Itumbiara-GO.

 

*E-mail: mor1216@hotmail.com

 

RESUMO

 

 Este trabalho tem como objetivo relatar a experiência de atuação em Extensão Psicossocial dos alunos do curso de Psicologia no grupo terapêutico para crianças e adolescentes de uma escola do ensino básico. Como proposta, buscou-se contribuir com o conhecimento em relação à atuação do psicólogo no contexto escolar, destacando a importância do seu papel neste ambiente e demonstrando como possibilidade sua atuação dentre os escolares. A intervenção teve como metodologia a Psicoterapia Cognitivo-Comportamental. O referencial teórico utilizado propôs uma estruturação das atividades desenvolvidas, com objetivos e relatos de cada sessão. Por fim, trazendo perspectivas e a importância da psicoeducação na sala de aula. Os resultados, obtidos através das duas dissertações realizadas no início e no fim do grupo, apontaram maior nível de reflexão sobre a compreensão das emoções, sobre a auto-observação, sobre a importância do trabalho em grupo, sobre o manejo das emoções boas e ruins, sobre a empatia e sobre a comunicação assertiva.

 

 

PALAVRAS-CHAVE: Psicologia escolar; Grupo terapêutico; Emoções; Psicoeducação.

 

 

1. INTRODUÇÃO

 

Este trabalho visa relatar a experiência de extensão universitária proporcionada pela disciplina de Intervenção Psicossocial. Baseado nos pressupostos teórico-práticos da matéria, a proposta de intervenção foi construída levando em consideração o papel do profissional atuante cujas as práticas objetivam-se o bem-estar psicossocial do grupo em que se tem como alvo de atuação. (SARRIERA et al., 2000)

Através do convite realizado pela diretora de uma escola para o Centro de Psicologia Aplicada da ULBRA, foi realizada uma reunião que contou com a presença da equipe escolar, professores responsáveis pela supervisão, pelo capelão do ILES/ULBRA e os alunos responsáveis pela intervenção. Na oportunidade, foi pautado a possibilidade de intervenção terapêutica na turma do 6º Ano do Ensino Fundamental. Pela escuta da diretora e supervisora, foi apresentado como demanda a dificuldade no manejo de comportamentos agressivos na turma.

A partir da primeira reunião, percebe-se o papel fundamental da escola no levantamento e manejo dos comportamentos agressivos. Para Petrucci, Borsa e Koller (2016), crianças em idade escolar têm a oportunidade de desenvolver suas habilidades socioemocionais através da sua exposição aos pares no ambiente escolar, sendo, muita das vezes, o seu primeiro espaço de encontro com a vida pública e o segundo em seu contexto social. Del Prette et. al. (2015), consideram que o desenvolvimento das habilidades sociais na infância impactam diretamente na qualidade de vida do indivíduo, sendo cruciais para a qualidade das relações interpessoais, para a manutenção da autoestima e para o bom rendimento acadêmico. Em conjunto, Abed (2016), defende a manutenção do papel da escola no desenvolvimento das competências interpessoais de seus alunos.

Petrucci, Borsa e Koller (2016), afirma que a relação do aluno com o professor contribui para seu ajustamento social, uma vez que lhe é atribuído o papel de cuidador. Contudo, essa relação não é considerada duradoura devido ao carácter transitório em sala de aula, limitada ao período letivo. Abed (2016) e Da Silva e Ferreira (2014), colaboram com esse aspecto ao elencar o formato pedagógico tradicional e a dificuldade do professor especializado em determinada matéria atuando fora do contexto de sua formação, levando em consideração o manejo de comportamentos desafiadores.

Segundo Fonseca (2022), o psicólogo escolar é capaz de ser a peça mediadora e promotora da saúde mental no espaço em que compreende os desafios da relação escola e aluno, em que, os mecanismos institucionais pressionam as problematizações através da individualização das mesmas. Portanto, mediante o exposto, observou-se a relevância da intervenção na demanda levantada.

Como objetivo, este estudo relata sobre a experiência de intervenção grupal com crianças e adolescentes, voltada para a psicoeducação das emoções. Para tal, será apresentado as atividades realizadas pela equipe, da abordagem utilizada, dos resultados obtidos e da importância do trabalho em psicoeducação na escola.

 

2. METODOLOGIA

 

A proposta de estágio em Intervenção Psicossocial, no curso de Psicologia, visa a integração de saberes teóricos através da atuação prática do aluno, além da capacitação para a pesquisa-ação pela construção do relato de experiência, promovendo o desenvolvimento e a divulgação científica. Para isso, contou-se com a supervisão semanal das professoras responsáveis pela ação e feedback por parte da escola sobre possíveis intercorrências após as ações.

O projeto teve como amostra um grupo fechado, composto por 32 integrantes com idades entre 11 e 12 anos, estudantes da turma do 6º Ano do Ensino Fundamental II. Na oportunidade, pela presença compulsória dos alunos, as intervenções foram desenvolvidas na própria instituição, onde foram realizados um total de 6 encontros com duração aproximada de 1 hora e 40 minutos.

Devido ao número de participantes, foi identificado a necessidade da composição de uma equipe de intervencionistas, composta pelos alunos responsáveis pela atividade extensionista.

A abordagem utilizada para a estruturação dos encontros foi a Terapia Cognitivo-Comportamental, com enfoque na psicoeducação e na atuação com crianças e adolescentes, seguindo a seguinte programação: 1º dia, etapa 1 – Apresentação, com objetivo de apresentar a proposta da formação; 1º dia, etapa 2 – Construção do contrato terapêutico, que se deu com a participação dos escolares e teve como objetivo a criação de regras a serem seguidas durante a condução, bem como a criação do rapport entre os integrantes; 1º dia, etapa 3 – Atividade de autoconhecimento, que se deu pela criação de uma redação individual não estruturada, em que cada um teve a oportunidade de se expressar livremente através de uma dissertação, narração ou desenho. Essa atividade teve como objetivo conhecer cada integrante e ter a oportunidade de levantar demandas próprias da turma; 2º Dia, etapa 1 – Dinâmica de quebra-gelo, intitulada “passar por dentro do papel”. Foi entregue uma folha de papel A4 para cada aluno e foi feita a conferência se todos possuíam tesouras, com a afirmativa passou para a parte das informações a respeito do que deveria ser feito. Foi explicado pela estagiária que assumiu o papel de terapeuta, que era possível passar dentro do papel A4 usando apenas a tesoura, foi deixado claro que o uso da imaginação era o ponto principal para o êxito na atividade, ressaltando que não era permitido fazer emendas. A turma foi dividida em 5 grupos, tendo 10 minutos para a execução da atividade. Essa atividade teve como objetivo a preparação dos alunos para o trabalho em grupo, além de proporcionar aos terapeutas a observação das relações interpessoais previamente estabelecidas na turma; 2º dia, etapa 2 – As emoções no filme Divertida Mente (2015), embora não foi possível apresentar o filme, foi questionado sobre se todos os participantes o assistiram. Tendo a afirmativa unânime, prosseguiu-se com a mesma formação dos grupos anteriores e foi proposto a cada grupo escrever sobre a emoção recebida através de um formulário aberto, contendo o personagem representante da emoção. Essa atividade teve como objetivo a introdução à psicoeducação das emoções; 2º dia, etapa 3 – Roda de conversa. Após o término da atividade anterior, foi feita uma roda de conversa, com todos sentados no chão, para que pudessem compartilhar suas percepções em relação às emoções. Neste encontro foi falado a respeito do nojo e da raiva. Essa etapa teve como objetivo conduzir os integrantes a falar sobre as emoções e, ao mesmo tempo, ter a oportunidade de receber as percepções dos pares e dos terapeutas; 3º dia, etapa 1 – Continuidade da roda de conversa, em que foi dada a oportunidade da apresentação dos outros grupos, que ficaram com as emoções alegria, tristeza e medo; 4º dia, etapa 1 – Balão das Emoções. Neste encontro, foi distribuído um balão para cada participante. Eles receberam a instrução para escrever em um papel as emoções que desejasse colocar dentro do balão para então enchê-lo e amarrá-lo. Além disso, foi disposto no meio da sala uma mesa com vários palitos. A única instrução passada foi para que zelasse do próprio balão, sendo que a disposição dos palitos não foi explicada. O objetivo da atividade compreendeu a observação dos comportamentos dos integrantes com a possibilidade de poder furar o balão do próximo 4º dia, etapa 2 – Esperando como consequência o estouro de todos os balões, a próxima etapa compreendeu na roda de conversa sobre o ocorrido. Nela, o objetivo foi apresentar como psicoeducação o papel das emoções nas dinâmicas sociais; 5º dia, etapa 1 – “A corrente humana”. Com o objetivo de trabalhar o que foi exposto na etapa anterior, foram realizadas duas dinâmicas que possibilitaram o exercício do diálogo. Antes da aplicação, foi instruído aos integrantes que para o bom desenvolvimento das atividades eles teriam que usar a comunicação. Na primeira dinâmica aplicada, foi instruído a todos a necessidade de formar um círculo e de dar as mãos. Em seguida, foi passado para que cada um memorizasse quem estava do seu lado direito e do seu lado esquerdo, para que em seguida todos soltassem as mãos e andassem livremente pela sala. Percebendo uma boa desconfiguração em relação à posição inicial deles, foi solicitado para que todos, no lugar em que estavam, dessem as mãos para as mesmas pessoas que estavam do seu lado na roda, tanto na mão direita como na esquerda. O passo seguinte era desfazer o nó, sem que pudessem soltar as mãos, com o objetivo de refazer o círculo; 5º dia, etapa 2 – “O telefone sem fio” e a roda de conversa. Terminado as dinâmicas, foi solicitado a todos que sentassem no chão, formando um círculo para que todos apresentassem suas impressões sobre elas. 6º – Feedback. Com o objetivo de avaliar o que foi aprendido, foi solicitado aos integrantes a elaboração de uma dissertação sobre o que aprenderam sobre os encontros.

 

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

 

De forma geral, a terapia cognitivo-comportamental proporciona uma visão analítica do processo terapêutico, sendo possível a análise crítica dos resultados obtidos ao comparar com a literatura científica sobre o assunto. Sabendo disso, são apresentados nos próximos parágrafos os resultados obtidos para cada atividade em conjunto com uma discussão, apresentada através da literatura utilizada para a construção do grupo terapêutico.

Para o início das atividades, no primeiro contato com os integrantes, a construção do contrato terapêutico demonstrou-se de suma importância para o estabelecimento do rapport com o grupo, uma vez que foi possível constatar, pelos diálogos, o engajamento dos integrantes. Em um segundo momento, a atividade para autoconhecimento foi oportuna para a construção de uma autorreflexão dos integrantes, além de possibilitar o levantamento das demandas do grupo. Esta experiência foi corroborada por Reis, Habigzang e Sperb (2015), que consideraram a criação do contrato e o levantamento das questões dos adolescentes como primordiais.

A atividade de quebra-gelo possibilitou a construção do envolvimento dos integrantes pela participação ativa de cada um, despertando o interesse, a atenção e o desejo pelo diálogo. Com isso, foi possível estabelecer a ponte para a apresentação da próxima atividade de psicoeducação. Visto que os integrantes já tinham assistido o filme Divertida Mente, seu uso foi considerado como uma forma de introdução a psicoeducação das emoções.

Conforme aponta Neufeld, Daolio e Longhini (2015), para a superação dos desafios da psicoeducação com público infantojuvenil, os terapeutas devem se valer tanto de atividades que promovam o movimento dos integrantes como também de atividades que proporcionem o diálogo. Deste modo, foi possível criar um ambiente em que os integrantes pudessem apresentar seus conceitos emocionais em roda de conversa.

Na mesma linha, a atividade “Balão das Emoções” foi oportuna para os integrantes na compreensão da dinâmica das emoções no meio social. Segundo Motta (2019, p. 50, apud WEISSBERG, et al 2013), “A educação socioemocional (ESE) é o processo de adquirir habilidades necessárias para reconhecer e gerenciar emoções, desenvolver cuidado e preocupação com outros, estabelecer relações positivas, tomar decisões responsáveis e manejar situações desafiadoras de forma eficaz”. Dentre algumas falas, os integrantes trouxeram que a atitude de ter estourado o balão dos outros colegas se deu pela raiva de ter o próprio balão estourado, o que trouxe como oportunidade a reflexão para a compreensão da própria atitude em relação à suas emoções e também na compreensão do mesmo processo nos outros participantes.

Na atividade em que se propôs aos integrantes relatarem o que foi aprendido durante os encontros, foi possível relacionar as falas comuns entre eles. Dentre os relatos, foram levantados os seguintes tópicos que corroboram com os objetivos do projeto, são eles: o maior nível de reflexão sobre a compreensão das emoções, sobre a auto-observação, sobre a importância do trabalho em grupo, sobre o manejo das emoções boas e ruins, sobre a empatia e sobre a comunicação assertiva.

Percebe-se que a aplicação de grupo terapêutico na sala aula demonstra ser de grande importância devido a sua capacidade de alcance se colocado em perspectiva em relação aos desafios na busca individualizada por tratamentos em saúde mental. Para Neufeld (2015), essa atuação se abrange nos aspectos da promoção e prevenção ao instrumentalizar os escolares, proporcionando a eles conceitos sobre saúde psicológica e, por consequência, a busca pelo seu bem-estar.

 

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

Os resultados apresentados mostraram que os objetivos foram alcançados, pois contribuíram na construção de habilidades para a regulação emocional e pela busca de formas assertivas para compreender-se e comunicar-se em relação às emoções trabalhadas. No levantamento por referencial teórico, percebeu-se que a quantidade de estudos sobre o tema continuam em fase inicial no Brasil e não possuem esquemas específicos para o tema publicados. Sendo assim, tem-se a expectativa de que este estudo possa contribuir para pesquisas futuras na possibilidade de consagrar esquemas grupais com temas de emoções para crianças e adolescentes, promovendo a continuidade do trabalho. Para futuros estudos teóricos-práticos, sugere-se a construção de esquemas que visem integrar as emoções conjuntamente com as habilidades de comunicação.

 

5. REFERÊNCIAS

ABED, A. L. Z. O desenvolvimento das habilidades socioemocionais como caminho para a aprendizagem e o sucesso escolar de alunos da educação básica. Construção Psicopedagógica, v. 24, n. 25, p. 8–27, 2016.

DA SILVA, L. G. M.; FERREIRA, T. J. O papel da escola e suas demandas sociais. Projeção e docência, v. 5, n. 2, p. 6–23, 2014.

DEL PRETTE, Z. A. P. et al. Habilidades sociais ao longo do desenvolvimento: Perspectivas de intervenção em saúde mental. Em: Prevenção e promoção em saúde mental: Fundamentos, planejamento e estratégias de intervenção. Novo Hamburgo: Sinopsys, 2015. p. 318–340.

FONSECA, C. DA C. Psicologia Escolar: A evolução do papel do psicólogo na escola. Boletim de Conjuntura, v. 11, n. 31, p. 54–62, 2022.

MOTTA, Pierre Cerveira; ROMANI, Patrícia Fasolo. A Educação Socioemocional e Suas Implicações no Contexto Escolar: Uma Revisão de Literatura. Psicologia da Educação, São Paulo, ed. 49, p. 49-56, 2019. DOI 10.5935/2175-3520.20190018. Disponível em: https://revistas.pucsp.br/psicoeduca/article/view/45675. Acesso em: 7 nov. 2022.

NEUFELD, C. B.; DAOLIO, C. C.; LONGHINI, L. Z. Desafios da terapia cognitivo-comportamental em grupo com crianças e adolescentes. Em: NEUFELD, C. B. (Ed.). Terapia cognitivo-comportamental em grupo para crianças e adolescentes. Porto Alegre: Artmed, 2015. p. 14.

PETRUCCI, G. W.; BORSA, J. C.; KOLLER, S. H. A Família e a escola no desenvolvimento socioemocional na infância. Temas em Psicologia, v. 24, n. 2, p. 391–402, 2016.

REIS, A. H.; HABIGZANG, L. F.; SPERB, T. M. Manejo da Raiva em Grupo. Em: NEUFELD, C. B. (Ed.). Terapia cognitivo-comportamental em grupo para crianças e adolescentes. Porto Alegre: Artmed, 2015. p. 190.

SARRIERA, J. C. et al. Intervenção psicossocial e algumas questões éticas e técnicas. Em: Psicologia Comunitária: Estudos Atuais. Porto Alegre: Sulina, 2000. p. 19–41.

SPOSITO, M. P. A instituição escolar e a violência. Cadernos de pesquisa, n. 104, p. 58–75, 2013.

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