Relativização da impenhorabilidade
Por afonso celso menezes | 20/08/2013 | DireitoRelativização da impenhorabilidade nos casos dos bens de família.[1]
Afonso Celso Menezes de Jesus Filho[2]
SUMÁRIO: Introdução; 1 Bens de família ; 2 Relativização da penhora dos bens de família ; Conclusão; Referências.
RESUMO
Realizou-se uma pesquisa a respeito dos bens na execução que devem ser relativizados, pois em tese seriam impenhoráveis mas por conta do seu valor econômico ser excessivo, alguns tribunais vem aceitando a penhora dos mesmos. Foi abordado o seu conceito, apresentado as leis que se encontram em nosso ordenamento jurídico que abordam a impenhorabilidade, fazendo um foco nos bens da família, assim como elencado os julgados que admitem a relativização da impenhorabilidade.
PALAVRAS-CHAVES:
Bens de Família. Impenhorabilidade. Relativização.
Introdução
A execução é um conjunto de atos promovidos pelo estado, na qual é legitimo para adentrar no patrimônio do devedor, não importando se possui ou não a autorização, para que assim garanta o cumprimento da obrigação estabelecida entre o exequente e executado, se os mesmos não o fizerem de forma espontânea.
A Execução atualmente busca meios para possibilitar uma maior eficácia e celeridade no processo, para que seja obtido o direito material garantido na obrigação, mas a busca pela celeridade do processo pode gerar a análise indevida de determinados aspectos como a penhorabilidade ou não de determinados bens como: o salário, os bens de família, tais bens em tese são impenhoráveis mas se o seu valor for muito alto, existem julgados que admitem a penhora dos mesmos, havendo assim uma relativização da impenhorabilidade.
1 BEM DE FAMÍLIA
O bem de família esta assegurado no artigo 226 da constituição federal, em que apresenta o direito de moradia como sendo um dos direitos que são de personalidade inerente da pessoa humana como pressuposto ou elemento de integridade do individuo. O estado tutela a moradia como sendo um objeto possuidor de direito subjetivo, um poder que representa a vontade e gera um dever jurídico de respeito desse poder por parte de terceiros.
Com relação a natureza jurídica do bem de família podemos apresentar essa posição mais aceita, que considera ele como um patrimônio especial pois mesmo não saindo da patrimônio do instituidor ele tem uma caracterização diferente dos demais bens por sua função e sua regulamentação específica.
2 RELATIVIZAÇÃO DA PENHORA DOS BENS DE FAMÍLIA
Em regras, todos os bens que o executado possui, estão sujeitos a penhora mas o código de processo civil em seu artigo 591, elenca que “estarão sujeitos a penhora todos os bens presentes ou futuros do executado salvo as restrições prevista na lei”, nota-se aqui a imposição de limites na penhora dos bens do executado. Para melhor explicação é importante ressaltar que de acordo com Montenegro Filho:
“A penhora é instituto que pertence ao direito processual, tendo por objetivo efetuar a apreensão de bens do patrimônio do devedor e/ou do responsável, com vista a permitir a posterior satisfação do credor, considerando que a execução por quantia certa contra devedor solvente é marcada pelo fato de ser expropriatória (art. 646 do CPC), atuando o Estado de forma substitutiva, mediante atos de sujeição impostos ao devedor, coma autorização para que o seu patrimônio seja invadido mesmo contra a sua vontade” (MONTENEGRO FILHO, 2007, p. 402) [3]
Com as alterações feitas no artigo 649 pelas leis 11.382/2006 e pela Lei nº 11.694/2008, é válido a transcrição do mesmo que considera como bens absolutamente impenhoráveis :
“Artigo 649: São absolutamente impenhoráveis:
I - os bens inalienáveis e os declarados, por ato voluntário, não sujeitos à execução;
II - os móveis, pertences e utilidades domésticas que guarnecem a residência do executado, salvo os de elevado valor ou que ultrapassem as necessidades comuns correspondentes a um médio padrão de vida;
III - os vestuários, bem como os pertences de uso pessoal do executado, salvo se de elevado valor; IV - os vencimentos, subsídios, soldos, salários, remunerações, proventos de aposentadoria, pensões, pecúlios e montepios; as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, observado o disposto no § 3º deste artigo;
V - os livros, as máquinas, as ferramentas, os utensílios, os instrumentos ou outros bens móveis necessários ou úteis ao exercício de qualquer profissão;
VI - o seguro de vida;
VII - os materiais necessários para obras em andamento, salvo se essas forem penhoradas;
VIII - a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família;
IX - os recursos públicos recebidos por instituições privadas para aplicação compulsória em educação, saúde ou assistência social;
X - até o limite de 40 (quarenta) salários mínimos, a quantia depositada em caderneta de poupança.
XI - os recursos públicos do fundo partidário recebidos, nos termos da lei, por partido político.
§ 1º A impenhorabilidade não é oponível à cobrança do crédito concedido para a aquisição do próprio bem.
§ 2º O disposto no inciso IV do caput deste artigo não se aplica no caso de penhora para pagamento de prestação alimentícia.
Explicado tão questão entramos no ponto da impenhorabilidade dos bens de família, em que teve na lei 8.009/90 um dispositivo legal que protegia os bens de família, sendo considerado com tal, aquele bens que estão no poder de uma determinada entidade familiar, para esse bem, não é possível que o estado adentre nele e o tire forçadamente de seus entes pois estaria assim ferindo a dignidade familiar. Para que ocorra essa impenhorabilidade, o casal deve ter apenas um único imóvel como moradia permanente do mesmo.
O legislador ao formular essa lei, visou criar uma proteção aos bens de família do então devedor mas acabou fazendo uma proteção de uma forma exagerada e equivocado-se em alguns aspectos, pois acabava por considerar todos os bens ate os de valores muitos altos como sendo impenhoráveis e também considerando apenas bens de família aqueles adquiridos por casais. O STJ tem o entendimento que a impenhorabilidade do bem de família também diz respeito ao imóvel pertencente as pessoas solteiras, separadas e viúvas, conforme expresso pela súmula 364. Com essa súmula existe agora a proteção dos bens de famílias mono parentais. Sobre os bens de família, Alexandre Câmara possui o entendimento que:
“A impenhorabilidade a que se refere a lei 8.009/90, ou seja, a impenhorabilidade do bem de residência, inclui não apenas o imóvel utilizado para moradia, mas também os móveis que o guarnecem, excluindo-se apenas os veículos, obras de arte e os adornos suntuosos(art. 1º, parágrafo único, c/c art. 2º da Lei 8.009/90). Não se pode, porém, pensar que este dispositivo é capaz de excluir da responsabilidade patrimonial todos os bens móveis que se encontrarem na residência do devedor. Isto porque, como se sabe, a regra é a penhorabilidade dos bens, e a impenhorabilidade exceção. Desta forma, deve-se interpretar restritivamente as normas que estabelecem a penhorabilidade de bens. Assim é que, a nosso sentir, deve-se considerar como adorno suntuoso todo e qualquer bem que não possa ser considerado indispensável à sobrevivência digna do devedor e de sua família. É preciso que este dispositivo seja à luz do que dispõe o art. 649, II do CPC, que afirma a absoluta impenhorabilidade dos móveis que integrarem o padrão médio de vida da população (como televisão, geladeira ou fogão), mas não os aparelhos que ultrapassem essa média(como é o caso de equipamentos eletrônicos de última geração). A idéia fundamental por tras dessa regra é a de que apenas o essencial à sobrevivência deve ser considerado impenhorável”. [4]
Assim percebemos que a impenhorabilidade dos bens de família deve ocorrer com o intuito de proporcionar uma “subsistência digna da família”, não sendo considerado como tal aquele bens de valores suntuosos em que o juiz pode utilizar da penhora para satisfazer a divida feita pelo executado. Os tribunais veem admitindo de forma mais frequente que essa impenhorabilidade seja tratada de forma mais flexível, devendo ser analisado caso a caso e não somente a letra da lei. Sobre essa relativização da impenhorabilidade Maurício Maidame apresenta:
“Por isso, propõe-se que o juiz possa, em certos casos, ultrapassar as barreiras rígidas da impenhorabilidade, desde que respeite o núcleo essencial dos direitos do devedor. A proteção dos interesses do credor encontra fundamentação no catálogo de direitos fundamentais(fundamentação forte) e, por isso, mantendo-se a dignidade do devedor, propõe-se a penhorabilidade de parcela da remuneração, de parcela da residência e, em casos muito restritos, a penhora de bens públicos – o que não viola em absoluto a segurança jurídica, posto que também estão no sistema a garantia de tutela jurisdicional efetiva, a propriedade do credor e os deveres fundamentais da pessoa para com as outras da comunidade. O sistema de garantias fundamentais é “via de mão dupla”, e o legislador, ao contemplar soluções que protegem somente o devedor, viola a igualdade, atraindo a “pretensão de consideração”, o que permite, no caso concreto, o ajuste da ordem jurídica pelo magistrado. Um regime muito liberal de impenhorabilidade, além de causar prejuízos ao credor, leva a uma degradação social ruinosa. Encarecimento do crédito, consumo e crescimento econômico refreados, descrédito na justiça, além de construir regra que convida a uma enorme gama de fraudes e burlas- ante a proteção exagerada que dá ao devedor”. [5]
Esses são os casos do executado que possui um bem de família com um valor muito alto, e que a lei 8.009/90 assegura sua impenhorabilidade. Nessa situação o juiz, com base nos princípios norteadores do processo civil como: razoabilidade, proporcionalidade, dignidade, dentro outros, deve admitir a penhora do bem, mas resguardando um valor para que o executado possa adquirir outro imóvel e que nele possa subsistir dignamente com a sua família e assim quitar sua divida com o exequente.
CONCLUSÃO
Diante do que já foi exposto, percebe-se a intenção do legislador em fazer um dispositivo que garantisse a execução fosse justa não só ao exequente como também ao executado, não trazendo assim um prejuízo maior do que é devido a ele. O problema em questão reside no magistrado se ater unicamente a letra da lei e não verificar caso a caso, relativizando assim a impenhorabilidade absoluta que reside nos bens de família, pois esse bem é resguardado para poder proporcionar aos integrantes dessa família, uma existência digna, mas até que ponto proteger da penhora, um bem de valor extremamente alto, seria considerado viver com dignidade? Não devendo esquecer que a penhora nesses casos, ocorre resguardando um valor estipulado pelo juiz para que o executado possa adquirir outro bem imóvel e assim possa subsistir com dignidade com a sua família e quitar a divida com o exequente.
Também foi verificada a mudança do entendimento da letra da lei com a realidade da sociedade de hoje em dia, que considera agora bem de família, os bens de famílias mono parentais como: de viúvas, solteiras e separadas. Percebemos assim que existe um maior esforço do legislador em alterar a lei, corrigindo os pontos obscuros que causavam injustiça não só ao executado como ao exequente.
Referências:
CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil. 16.ed. vol.2. Rio de Janeiro. 2008.
MAIDAME, Márcio Manoel. Impenhorabilidade e Direitos do Credor. Juruá Editora.. Biblioteca em homenagem ao Professor Arruda Alvim. 2007.
MONTENEGRO FILHO, Misael. Teoria Geral dos Recursos, Recursos em espécie e Processo de Execução. Atlas Editora. Vol.2. 2007
TEODORO JUNIOR, Humberto. Processo de Execução e Cumprimento de Sentença, Processo cautelar e Tutela de Urgência. Vol.2. 2007.
[1] Paper apresentado a disciplina de Processo de Execução, ministrada pelos Profs.
[2] Aluno do 7° período vespertino do curso de Direito da UNDB
[3] MONTENEGRO FILHO, Misael. Teoria Geral dos Recursos, Recursos em espécie e Processo de Execução. Atlas Editora. Vol.2. 2007. Pag 402
[4] CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil. 16.ed. vol.2. Rio de Janeiro. 2008. Pag. 280
[5] MAIDAME, Márcio Manoel. Impenhorabilidade e Direitos do Credor. Juruá Editora.. Biblioteca em homenagem ao Professor Arruda Alvim. 2007. Pag. 184