Relações dialógicas entre as obras dos poetas ricardo reis e horácio

Por Daiana S. Moura | 22/04/2012 | Educação

Relações dialógicas entre as obras dos poetas Ricardo Reis e Horácio

 

A obra de Ricardo Reis, o poeta neoclássico criado por Fernando Pessoa, inventor de mais de 75 autores fictícios, inegavelmente estabelece diálogo com Horácio, o poeta latino da época do imperador Otávio Augusto, auge do Império Romano.

As duas obras para a análise estão abaixo:

Horácio:

Tu ne quaesieres (scire nefas) quem mihi, quem tibi

Finem di dederint, Leuconoe, nec Babylonios

Temptarias números. Vt melius quicquid Eric pati!

Seu pluris hiemes seu tibuit Iuppiter ultimam

Quae nune oppositis debilitar pumicibus maré

Tyrrhenum, sapias, uina liques et spatio brevi

Spem longam reseces. Dum loquitur, fugerit invida

Aetas: carpe diem, quam minimum crédula postero.

 

Tradução:

Não tentes (é inútil) saber do amanhã, do que, Leuconia,

nos reserva o destino nem mesmo nos horóscopos da Babilônia

e aceita: o que tiver de ser assim será. Quer nos demais invernos,

Júpiter, ou somente este que, nas rochas, do rio Madeira as ondas

vão quebrar, Vive, bebe o teu vinho, no curto prazo, no longo,

nunca se sabe. Afinal enquanto loquaz falo o tempo se escoa

Goza teu dia, hoje, que o amanhã é incerto como o vento.

 

 

Ricardo Reis:

Não quero recordar nem conhecer-me.

Somos demais se olhamos em quem somos.

Ignorar que vivemos

Cumpre bastante a vida.

 

Tanto quanto vivemos, vive a hora

Em que vivemos, igualmente morta

Quando passa conosco,

Que passamos com ela.

 

Se sabê-lo não serve de sabê-lo

(Pois sem poder que vale conhecermos?)

Melhor vida é a vida

Que dura sem medir-se.

 

 

A partir da análise das relações dialógicas ente dois poemas podemos verificar algumas semelhanças. Horácio apresenta em sua obra verbos no imperativo, discute sobre a brevidade da vida, sobre o desapego da matéria a fim de se libertar das paixões. O autor medita sobre a vida e a morte, em todo o tempo traz o aconselhamento de viver a vida de forma intensa, não se incomodando com o futuro.

Os dois poemas apresentam em seu núcleo um pensamento moral de que é preciso viver a vida porque a morte é algo inevitável.

Tanto Horácio quanto Fernando Pessoa falam sobre o Carpe Diem (aproveitar o dia). Os autores reconhecem que a vida é efêmera, transitória. Nem mesmo o zodíaco é capaz de definir precisamente o futuro. A preocupação precisa ser com o aqui e o agora, não com o ontem ou com o amanhã.

Há intertextualidade ou dialogismo entre os textos, porém esse diálogo mostra-se implícito quando Reis trata do mesmo assunto com termos diferentes.