REFÚGIO¹

Por Dérick Macêdo Silva | 07/11/2016 | Direito

Dérick Macêdo Silva[2]

José Humberto G. de Oliveira[3]

INTRODUÇÃO

Ao se falar sobre a situação jurídica do estrangeiro no país, alguns tópicos vêm logo à mente: a entrada e saída do estrangeiro; direitos e deveres que possuem; proibições; expulsão; extradição; deportação; dentre outros. Todavia, devido ao atual cenário mundial, um desses tópicos se sobressai, qual seja: o refúgio.

É difícil não haver ao menos uma reportagem por semana falando sobre a situação e/ou o encontro de refugiados em botes e em países cujas línguas sequer sabem falar o básico. Conheça-se um pouco acerca do refúgio.

1 NO QUE CONSISTE O REFÚGIO?

Através da Lei 9.474/1997, mais precisamente em seu artigo 1º, o Brasil conceituou o refugiado da seguinte forma:

Art. 1º Será reconhecido como refugiado todo indivíduo que:

I - devido a fundados temores de perseguição por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas encontre-se fora de seu país de nacionalidade e não possa ou não queira acolher-se à proteção de tal país;

II - não tendo nacionalidade e estando fora do país onde antes teve sua residência habitual, não possa ou não queira regressar a ele, em função das circunstâncias descritas no inciso anterior;

III - devido a grave e generalizada violação de direitos humanos, é obrigado a deixar seu país de nacionalidade para buscar refúgio em outro país.

Vale ressaltar que esta definição dada pelo Brasil é mais ampla que a Convenção de 51 e o Protocolo de 1967 acerca do assunto, pois, como se observa no supracitado inciso III, o simples desrespeito aos direitos humanos pode ensejar a concessão do refúgio.[4]

2 REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DE REFÚGIO

Quando da leitura do supracitado artigo, nota-se que, para a concessão do refúgio, não há um ato discricionário realizado pelo país, mas tão somente a obediência de requisitos, os quais, uma vez obedecidos, o Brasil tem o dever de conceder o status de refugiado à pessoa e acolhe-la ou enviá-la para outro país que assim o faça. O que não pode ocorrer é a sua devolução ao país de origem em detrimento do princípio da não-devolução.[5]

Não há apenas os requisitos expostos no artigo 1º da Lei 9.474. Têm-se também as chamadas cláusulas de exclusão, previstas no artigo 3º da mesma lei.

Art. 3.º Não se beneficiarão da condição de refugiado os indivíduos que:

I – já desfrutem de proteção ou assistência por parte de organismos ou instituição das Nações Unidas que não o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados – ACNUR;

II – sejam residentes no território nacional e tenham direitos e obrigações relacionadas com a condição de nacional brasileiro;

III – tenham cometido crime contra a paz, crime de guerra, crime contra a humanidade, crime hediondo, participado de atos terroristas ou tráfico de drogas;

IV – sejam considerados culpados de atos contrários aos fins e princípios das Nações Unidas.

Desta forma, ainda que a pessoa preencha os requisitos de um dos artigos, caso não preencha os do outro, não poderá receber o status de refugiado. Ademais, vale mencionar que, uma vez concedido o refúgio à pessoa, o benefício atinge o cônjuge, ascendentes, descendentes e outros membros do grupo familiar, ou seja, estes receberão a condição por tabela, conforme estabelece o artigo 2º da lei.

3 CESSÃO OU PERDA DO STATUS DE REFUGIADO

A condição de refugiado não é perpétua, podendo cessar ou ser perdida caso ocorra alguma das situações previstas nos artigos 38 e 39 da já referida lei.

Art. 38. Cessará a condição de refugiado nas hipóteses em que o estrangeiro:

I – voltar a valer-se da proteção do país de que é nacional;

II – recuperar voluntariamente a nacionalidade outrora perdida;

III – adquirir nova nacionalidade e gozar de proteção do país cuja nacionalidade adquiriu;

IV – estabelecer-se novamente, de maneira voluntária, no país que abandonou ou fora do qual permaneceu por meio de perseguição;

V – não puder mais continuar a recusar a proteção do país de que é nacional por terem negado de existir as circunstâncias em consequência das quais foi reconhecido como refugiado;

VI – sendo apátrida, estiver em condições de voltar ao país no qual tinha sua residência habitual, uma vez que tenham deixado de existir as circunstâncias em consequência das quais foi reconhecido como refugiado.

 Art. 39. Implicará perda da condição de refugiado:

I – a renúncia;

II – a prova de falsidade dos fundamentos invocados para o reconhecimento da condição de refugiado ou a existência de fatos que, se forem conhecidos quando do reconhecimento, teriam ensejado uma decisão negativa;

III – o exercício de atividades contrárias à segurança nacional ou à ordem pública;

IV – a saída do território nacional sem prévia autorização do Governo brasileiro.

4 REFÚGIO X ASILO

Por fim, é interessante diferenciar refúgio de asilo. Certamente há pontos em comum entre eles, porém não se confundem. Veja-se o quadro a seguir elaborado por Liliana Lyra Jubilut[6]:

 

Asilo

Refúgio

Semelhança

Objetivos: ambos visam à proteção de indivíduos por outro Estado que não o de origem e/ou residência habitual desses.

Fundamentação: ambos se fundam na solidariedade e na cooperação internacionais.

Fundamentação legal: ambos se fundam no respeito aos direitos humanos e, consequentemente, ambos podem ser entendidos como abarcados pelo Direito Internacional dos Direitos Humanos.

Caráter: ambos têm caráter humanitário.

Proteção Assegurada: a saída compulsória dessas pessoas fica limitada.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Diferenças

Data da Antiguidade.

É positivado tão-somente no século XX.

É atualmente praticado, sobretudo, na América Latina.

Tem abrangência universal.

Tema de tratados regionais desde o século XIX

Tem como base tratados universais, sendo somente a partir da década de 60 do século XX que ele passa a ser tema de tratados regionais

Hipóteses discricionárias de concessão

Hipóteses claras de reconhecimento do status de refugiado

Limitado a questões políticas

5 motivos (opinião política, raça, religião, nacionalidade e pertencimento a grupo social)

Baseia-se na perseguição em si

O elemento essencial de sua caracterização é o bem fundado temor de perseguição, ou seja, a perseguição não precisa ter sido materializada

Não existe um órgão internacional encarregado de fiscalizar a prática do asilo

Existe um órgão internacional encarregado de fiscalizar a prática do refúgio

Não exige que o indivíduo esteja fora de seu Estado de origem e/ou nacionalidade (na modalidade do asilo diplomático)

Exige que o indivíduo esteja fora de seu Estado de origem e/ou nacionalidade

Não há cláusulas de exclusão

Tem limitações quanto às pessoas que podem gozar dele (cláusulas de exclusão), para que seja coerente com os princípios e propósitos da ONU, uma vez que é um órgão dessa organização que fiscaliza a sua aplicação

Não há cláusulas de cessação

A proteção concedida pelo refúgio tem previsões para deixar de existir (cláusulas de cessação)

Decisão de concessão de asilo é constitutiva

Reconhecimento do status de refugiado é declaratório

Da concessão não decorrem obrigações internacionais ao Estado de acolhida

Do reconhecimento do status de refugiado decorrem obrigações internacionais ao Estado de acolhida

Não decorrem políticas de integração local

Devem decorrer políticas de integração local dos refugiados

[1] Atividade apresentada à Disciplina de Direito Internacional Privado do 10 º período do Curso de Direito da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB;

[2] Aluno da disciplina;

[3] Professor da disciplina.

[4] Cf. BARBOSA, Fernanda Pereira. O refúgio no Brasil: definição e requisitos. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XIV, n. 90, jul. 2011. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=9836>. Acesso em: 03/11/2016.

[5] Idem.

[6] JUBILUT, Liliana Lyra. O direito internacional dos refugiados e sua aplicação no orçamento jurídico brasileiro. São Paulo: Método, 2007, p. 49-50.