REFLEXÕES SOBRE O SISTEMA PENITENCIÁRIO BRASILEIRO

Por Bruno Mantovanni Alcântara Barroso | 23/05/2018 | Direito

REFLEXÕES SOBRE O SISTEMA PENITENCIÁRIO BRASILEIRO

Bruno Mantovanni Alcântara Barroso

Bruno Barbosa

Lorena Moura

De acordo com Gonçalves (2004), o ato de punir é um fato abstrato que só adquire forma quando o indivíduo comete uma ação contrário ao ordenamento jurídico, ou seja, uma ação ilícita perante a Lei. De outro modo, com a prática da infração penal, surge o direito de punir sob a responsabilidade do Estado, ou seja, a punibilidade nada mais é do que a probabilidade jurídica de o Estado estabelecer a sanção ao agente do delito.

Ante isto, considerado um regulador social, o sistema jurídico desenvolve-se no sentido de reestabelecer um conjunto de condutas para que a ordem social seja imposta sem quebrar a paz interna do sistema. Por natureza, o ser humano é um ser sociável, e o Direito deve impor as regras que regulem a convivência na sociedade. Na literatura existe os mais diversos conceitos doutrinários sobre a pena, entretanto nenhum dos estudos discordam sobre a finalidade da sua sanção.

O conceito mais adotado dentre eles é o elaborado por Soler (1962), o qual afirma que “a pena é uma sanção aflitiva imposta pelo Estado, através da ação penal, ao autor de uma infração (penal), como retribuição de seu ato ilícito, consistente na diminuição de um bem jurídico e cujo fim é evitar novos delitos”.

Por sua vez, o Direito Penal é um instrumento que tem por finalidade prevenir o ato ilícito através de regras impostas, como também combatê-lo quando o ato preventivo falhar.  Para Prado (2006), o Direito Penal é a parcela ou o setor do ordenamento público jurídico interno que estabelece as ações delitivas, decretando dessa maneira as consequências jurídico-penais. De outra maneira, a pena é considerada a sanção por excelência do Direito Penal. Dessa maneira, a pena nada mais é do que uma consequência legal da conduta ilícita, e a sua consolidação é o principal objetivo da ação penal.

O processo da execução da pena é conduzido por princípios constitucionais e próprios, os quais devem ser observados inevitavelmente, tendo em vista o predomínio das normas. Dessa maneira, a Constituição Federal evidência um diálogo com o Direito Penal, uma vez que em seu artigo 5º, inciso XXXIX, afirma que: “não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”.

Para Ribeiro e Marta (2011), reconhecer a força normativa dos princípios constitucionais durante o processo de execução é indispensável para que se alcance o ideal de segurança e justiça na aplicação das normas, principalmente no que tange os limites ao jus puniendi (O Direito de Punir) estatal, na tentativa de evitar um Estado arbitrário que vá conta o conceito de Estado Democrático de Direito.

A individualização da pena é expressa no artigo 5º, inciso XLVI, da Constituição Federal:

XLVI -  a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes:

a)  privação ou restrição da liberdade;

b)  perda de bens;

c)  multa;

d)  prestação social alternativa;

e)  suspensão ou interdição de direitos;  

Ainda de acordo com os autores supracitados, Ribeiro e Marta (2011), a pena deve ser aplicada levando em consideração somente o infrator, o qual deve ser avaliado individualmente, analisando a personalidade, seus antecedentes, as circunstâncias em que ele se encontrava no ato do crime, sua conduta na sociedade, dentre outros. Assim, a pena imposta deve se ajustar da melhor maneira possível e não fique nem aquém e nem além dos limites da culpabilidade do infrator.

Deste modo, Mirabete (2000) afirma que o direito penitenciário é um conjunto de normas jurídicas reguladoras da execução das penas e medidas privativas de liberdade. Diante ao exposto, a partir de agora será tratado nessa discussão a pena privativa de liberdade e a algumas reflexões do atual sistema penitenciário brasileiro.

O Estado de Direito é o responsável pelo criminoso no sistema penitenciário, onde ocorre a materialização do direito de punir. A principal ideia é transformá-lo num indivíduo capaz de viver em sociedade, de respeitar os ordenamentos e os outros indivíduos. Em outras palavras, são nos presídios, penitenciárias e cadeias que se observa o resultado da pena, onde os indivíduos presos, por terem afrontado o uso da força do Estado e descumprido a ordenação jurídica, pagam suas penas.

Dessa maneira, a pena privativa de liberdade perde seu principal objetivo quando deixa de ser praticada com a intenção de reeducar e reintegrar o agente infrator a sociedade. Os artigos 82 a 86 do cap. da Lei de Execução Penal, Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984, tratam das disposições gerais sobre os estabelecimentos penitenciários:

           

Art. 82. Os estabelecimentos penais destinam-se ao condenado, ao submetido à medida de segurança, ao preso provisório e ao egresso.

§ 1° A mulher e o maior de sessenta anos, separadamente, serão recolhidos a estabelecimento próprio e adequado à sua condição pessoal.

§ 2º - O mesmo conjunto arquitetônico poderá abrigar estabelecimentos de destinação diversa desde que devidamente isolados.

Art. 83. O estabelecimento penal, conforme a sua natureza, deverá contar em suas dependências com áreas e serviços destinados a dar assistência, educação, trabalho, recreação e prática esportiva.

§ 1º Haverá instalação destinada a estágio de estudantes universitários. 

§ 2o Os estabelecimentos penais destinados a mulheres serão dotados de berçário, onde as condenadas possam cuidar de seus filhos, inclusive amamentá-los, no mínimo, até 6 (seis) meses de idade

§ 3o Os estabelecimentos de que trata o § 2o deste artigo deverão possuir, exclusivamente, agentes do sexo feminino na segurança de suas dependências internas. 

§ 4o  Serão instaladas salas de aulas destinadas a cursos do ensino básico e profissionalizante. 

§ 5o  Haverá instalação destinada à Defensoria Pública.

Art. 84. O preso provisório ficará separado do condenado por sentença transitada em julgado.

§ 1° O preso primário cumprirá pena em seção distinta daquela reservada para os reincidentes.

§ 2° O preso que, ao tempo do fato, era funcionário da Administração da Justiça Criminal ficará em dependência separada.

Art. 85. O estabelecimento penal deverá ter lotação compatível com a sua estrutura e finalidade.

Parágrafo único. O Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária determinará o limite máximo de capacidade do estabelecimento, atendendo a sua natureza e peculiaridades.

Art. 86. As penas privativas de liberdade aplicadas pela Justiça de uma Unidade Federativa podem ser executadas em outra     unidade, em estabelecimento local ou da União.

§ 1o A União Federal poderá construir estabelecimento penal em local distante da condenação para recolher os condenados, quando a medida se justifique no interesse da segurança pública ou do próprio condenado. 

 § 2° Conforme a natureza do estabelecimento, nele poderão trabalhar os liberados ou egressos que se dediquem a obras públicas ou ao aproveitamento de terras ociosas.

§ 3o Caberá ao juiz competente, a requerimento da autoridade administrativa definir o estabelecimento prisional adequado para abrigar o preso provisório ou condenado, em atenção ao regime e aos requisitos estabelecidos.  

De acordo com o relatório divulgado pelo Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN) em 2006, o sistema penitenciário brasileiro apresentou a maior população carcerária da América Latina em 2005. Segundo a informações extraídas do relatório, o Brasil apresentou, em 2005, uma população prisional de 361.402 mil presos para apenas 206.559 mil vagas. Não muito distante do problema da superpopulação, surgem ainda os problemas com rebeliões, maus-tratos,  motins, desrespeito aos direitos humanos, ect.

Apesar de o sistema penitenciário está ligado diretamente ao direito de punir, e existir legislações e códigos penitenciários regulamentadores na legalidade e no respeito aos direitos humanos, contudo, essa não é uma realidade adota em muitos dos Estados. Uma vez que o sistema penitenciário é caracterizado por estabelecimentos prisionais superlotados, maus tratos, precários,  violência, fugas, rebeliões, corrupção dos agentes penitenciários.

Perante a precariedade que se é observado na maior parte dos estabelecimentos penitenciários brasileiros, com uma inadequada estrutura física, impossibilitando o fato de abrigar, com a segurança mínima e necessária, a enorme e crescente população carcerária. Portanto,  o resultado é a ampliação da criminalidade, e em caso mais sérios, a insuficiência de estabelecimentos que possam abrigar novos infratores.

Assim, é preciso conjeturar-se como uma instituição que vá cumprir do papel ressocializador e o de inibidor da criminalidade, acatando os direitos humanos e as legislações penitenciárias. Sem comprometer a segurança e os interesses da sociedade como um todo.

Por sua vez, Lima (2011) aponta que a prisão em si já é uma violência protegida pela lei. O desrespeito aos direitos dos condenados já é uma violência contra a própria lei. Debate ainda que as autoridades devem ter em mente que o fato de aplicar a pena ao preso não será uma garantia de que o mesmo estará recuperado e sim, terá como resultado um preso mais desmotivado com a sua atual situação, visto que viveu com as situações sub-humanas que lhe foi imposto.

É evidente que a pena privativa de liberdade se depara com uma crise extrema. Ou seja, o sistema prisional suprimiu o seu principal objetivo, a ressocialização do condenado para lhe dar o direito ao convívio em uma sociedade livre. Sendo considerada, portanto como uma falha gravíssima, onde aocorre a falta do cumprimento da lei em todo no sistema penitenciário.

Por fim, para concluir essa discussão inicial, as sugestões detalhadas na literatura existente nessa temática aponta que a melhor saída para os problemas enfrentados no atual sistema penitenciário é a parceria com organizações da sociedade, adquirir um maior investimento do Estado tanto no setor capital humano, quanto na estrutura física. Portanto, é de fundamental importância considerar que os aspectos socioeconômicos, jurídicos e políticos não atuam isoladamente, e sim se relacionando para um melhor funcionamento do sistema.

 

REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988.

______, Código Penal, Decreto Lei nº 2.848/1940.

______, Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984. Institui a Lei de execução penal. Diário Oficial da União, Brasília, DF, jun. 1984.

GONÇALVES, V. E. R. Direito Penal – Parte Geral. São Paulo: Ed. Saraiva, 2004, p. 168.

LIMA, E. A. A. Sistema Prisional Brasileiro. 2011. 40 p. Monografia (Graduação em Direito), Universidade Presidente Antônio Carlos – UNIPAC, Barbacena, 2011.

MIRABETE, J. F. Execução Penal: comentários à lei nº 7.210, 11-7-1984, 9ª ed., São Paulo: Atlas, 2000.

PRADO, L. R. O curso de Direito Penal Brasileiro. Ed. 6º, Revista Atual e Ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006.

RIBEIRO, N. F.; MARTA, T. N. A Finalidade da Pena Privativa de Liberdade: Ressocializar ou Revidar? In: 63 Reunião Anual da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência), Goiânia-Goiás, julho, 2011. Disponível em: http<http://eventos.uenp.edu.br/sid/publicacao/artigos/25.pdf>. Acesso em 21 de Maio de 2018.

SOLER, S. Interpretación de la ley. Barcelona: Ariel, 1962.

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