Reflexões sobre Mosaicos de Unidades de Conservação

Por Isis Alves do Sacramento Perdigão | 24/06/2011 | Geografia

Universidade Federal do Rio de Janeiro
Instituto de Geociências
Departamento de Geografia

Reflexões sobre Mosaicos de Unidades de Conservação

Isis Alves do Sacramento Perdigão
Orientador: Evaristo de Castro Júnior
Rio de janeiro
Outubro de 2010

Dedico este trabalho à Fabiane Dias Albuquerque, querida companheira de faculdade e da minha trajetória profissional. À minha "orientadora" predileta, obrigada por existir!
"A Natureza adora ocultar-se". (Heráclito)

Perdigão, I. A.do S.

Reflexões sobre Mosaicos de Unidades de Conservação / Isis Alves do Sacramento Perdigão - 2010.

I - Apresentação:
O presente trabalho "Mosaicos de Unidades de Conservação: uma análise sobre o Mosaico Bocaina e suas ações institucionais" é fruto de minha trajetória no Projeto de Extensão Universitária "Raízes e Frutos: uma vivência nas comunidades caiçaras da Juatinga - Paraty - RJ", que demandou relações de pesquisa e trabalho com diferentes segmentos sociais e institucionais, atuantes na área de abrangência do mosaico Bocaina.
A equipe de trabalho do Raízes e Frutos, projeto vinculado à Pró-Reitoria de Extensão Universitária (Pr-5) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), foi composta por estudantes de graduação em Geografia, História, Comunicação, Ciências Sociais e Engenharia Florestal; sob a coordenação do Professor Dr. Evaristo de Castro Junior, integrante do corpo docente do Departamento de Geografia da UFRJ. Em sua criação, o Raízes e Frutos tinha como objetivo geral "(...) estender os recursos acadêmicos universitários para um seguimento da sociedade brasileira isolado dos benefícios das pesquisas cientificas, apesar de já ter sido objeto de diversas delas". (PROJETO INSTITUCIONAL, 2007). O público alvo eram as comunidades caiçaras da Reserva Ecológica da Juatinga (REJ), situada na região natural do mosaico Bocaina. Segundo Diegues em "Diversidade biológica e culturas tradicionais litorâneas: o caso das comunidades caiçaras", o termo define grupos de pescadores artesanais que habitam a costa marítima entre os estados do Rio de Janeiro, São Paulo e Paraná, originários da miscigenação entre portugueses e indígenas. Já Adams entende que esse grupo como predominantemente agricultor e pescador, acrescentando que "há diferenças com relação à dependência que cada comunidade possui das atividades agrícolas com relação a outras fontes de renda, como a pesca". (Adams,00). A REJ, locus da cultura caiçara, tornou-se área protegida na década de 1980, por estar inserida num fragmento florestal estratégico para uma rede de agentes da conservação biológica.
Durante o ano de 2007 o projeto Raízes e Frutos foi balizado por quatro eixos de ação: 1. Propostas pedagógicas; 2. Vivências agroecológicas; 3. Divulgação e comunicação e; 4. Relações institucionais - que representou a UFRJ nas reuniões dos Conselhos Gestores da Reserva Ecológica da Juatinga (REJ) e da Área de Proteção Ambiental (APA) Cairuçu.
As atividades de campo do último eixo, do qual fiz parte, tiveram como objetivo incluir a Academia no processo de negociação e de tomada de decisão no que tange a gestão das unidades de conservação. Por isso realizamos atividades de campo em Ponta Negra e na Praia do Sono, a fim de compreender a organização das comunidades tradicionais locais e a relação dessas com os órgãos gestores responsáveis. Nessas atividades de campo a equipe foi percebendo que a REJ era apenas uma das áreas protegidas dentro de um Corredor de Biodiversidade (Ecológico e Etnológico) maior, porção integrante do chamado corredor ecológico da Serra do Mar, o que exigiu do grupo uma investigação sobre a gestão dos recursos socioambientais desse corredor. Realizamos, ainda, o intercâmbio de informações entre as comunidades locais e os conselheiros da APA Cairuçu, onde a equipe do eixo relações institucionais realizou a lavratura das atas oficiais.
A partir dessa vivência, verificou-se que tanto a REJ quanto as demais unidades de conservação que formam essa extensa mancha verde em escala regional era administrada e gerenciada de maneira fragmentada, em áreas protegidas individualizadas, com um chefe para cada uma delas. Uma questão imediata que surgiu ao grupo foi como era a comunicação entre essas áreas (caso existisse) para a realização de ações? Quais instrumentos eram utilizados na integração de áreas protegidas fragmentadas? Em termos de pesquisa acadêmica, acompanhei o processo de convocação de reuniões, tive acesso às atas e planos, dentre outros produtos da gestão de áreas protegidas, desenvolvidas pelo conselho consultivo do mosaico Bocaina, via on line. A partir do dia 14 de Dezembro de 2007 fui incluída no yahoogroups do conselho, o que possibilitou o acompanhamento dos processos decisórios

I. Introdução:

Assistimos nas últimas décadas uma convergência política cada vez maior em direção às questões ambientais. Essas políticas se operam em diversas escalas e envolvem atores de naturezas e poderes também diversos, logo envolvendo fatores muito alem dos ecológicos. Expressão da complexidade das políticas ambientais, o mosaico visa integrar a gestão das unidades de conservação.
De acordo com a lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação, (lei 9.985/2000), artigo primeiro; uma "unidade de conservação é um espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com características naturais relevantes, legalmente instituído pelo Poder Público, com objetivos de conservação e limites definidos, sob regime especial de administração, ao qual se
aplicam garantias adequadas de proteção". (SNUC, 2000). O Sistema prevê, ainda, a criação de um instrumento para integrar unidades de conservação contínuas e/ ou sobrepostas espacialmente, intitulado mosaico de unidades de conservação; conforme artigo 26. O seu principal objetivo é assegurar a conservação da biodiversidade, através da aplicação de corredores ecológicos; e garantir a sociodiversidade, através da criação de uma instância gestora regionalizada, o conselho consultivo.
O corredor ecológico, critério fisiogeográfico que justifica a formação do mosaico, também previsto no SNUC; consiste na "conexão entre diferentes modalidades de áreas protegidas e outros espaços com diferentes usos do solo. (MMA,2005). O conselho consultivo, uma arena decisória regional, composta por diferentes segmentos sociais, além do Estado; é o responsável pela gestão dos recursos ambientais e mediação de processos sociais decorrentes.
O conselho é a ferramenta participativa da gestão ambiental que visa reduzir conflitos de ordenamento circunscritos na área do mosaico. Interseções espaciais entre áreas de unidades de conservação (uc's) próximas significam, também, sobreposição de responsabilidades e de seus conflitos resultantes; pois sobre uma mesma região, operam diferentes instituições gestoras e políticas regulatórias, barreiras político administrativas a serem diluídas nessa arena decisória regional.
De acordo com Theodoro e Zeke e Beck (2005), gestão ambiental sugere "um conjunto de ações que envolvem políticas públicas, o setor produtivo e a sociedade de forma a incentivar o uso racional e sustentável dos recursos ambientais. Ela é, portanto, um processo que liga as questões da conservação e do desenvolvimento em todos os níveis". Nessa linha, a configuração da gestão ambiental brasileira começou a se formada, de fato, a partir da década de 80; quando da incorporação da temática no aparelho estatal, através da "adequação da legislação nacional para a proteção do meio ambiente. (citar); por meio da Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (lei 6.938/81), e da Constituição Federal de 1988. Além dos marcos legislativos, a emergência de instituições públicas para estruturara-los administrativamente, como a criação do Ministério do Meio Ambiente, suas secretarias e colegiados; a partir de 1992.
Na década de 90, o Brasil se tornou membro do programa Man and Biosphere (MaB), da UNESCO, responsável por normatizar e incentivar a demarcação das reservas da biosfera em cerca de 100 países no mundo. Agências bi e multilaterais, empresas, fundos, fundações privadas, bancos internacionais, entre outros agentes patrocinam a realização desse programa e de outros; intervenções contempladas em diferentes partes do mundo no âmbito do conceito de reserva da biosfera. Ao se incorporar ao programa MaB, o Brasil se tornou alvo desses patrocínios, o que gerou uma nova arena de atuação para outras instituições, que não as públicas.
O interessante é que, apesar de a matéria ambiental ser uma temática incorporada na administração pública brasileira recentemente, a partir da efetivação de políticas regulatórias, estruturadoras e operacionais, ela já se configurou tendo em vista um cenário macroeconômico global. Para elucidar essa afirmativa, o objetivo geral desse trabalho é constatar através de um mosaico específico, o mosaico de unidades de conservação da Bocaina, 2 ações institucionais por ele vivenciadas. Essas ações significam a assinatura de 1 contrato de doação entre o Instituo Amigos da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica (IA-RBMA) e o Fundo de Parceria para Ecossistemas Críticos - CEPF para o seu reconhecimento e estruturação; e de 1 outro contrato, entre a Conservation International e o Centro de biodiversidade - CI/CBC-Brasil, para o fortalecimento institucional da instância gestora, o conselho consultivo (através dos
projetos de comunicação, contratação de secretária e de levantamento de práticas sustentáveis).
O mosaico Bocaina está localizado no corredor de biodiversidade da Serra do Mar, bioma Mata Atlântica, entre o litoral sul do Rio de Janeiro e o litoral norte de São Paulo, delimitado, ao fundo, pela serra da Bocaina.