REFLEXÃO ACERCA DA INTERSECÇÃO ENTRE SAÚDE COLETIVA E SANEAMENTO BÁSICO SOB O PRISMA DA LEI 11.445/2007
Por André Farias | 02/05/2009 | AmbientalIntrodução
Consoante estabelecido na Constituição da Organização Mundial de Saúde – OMS, "saúde é um estado de completo bem-estar físico, mental e social", "saúde coletiva é a ciência e arte de promover, proteger e recuperar a saúde, através de medidas de alcance coletivo e da motivação da população" e "saneamento é o controle de todos os fatores do meio físico do homem, que exercem efeitos deletérios sobre o seu bem estar físico, mental ou social". Nesse contexto, é possível associar o conceito de saúde coletiva ao conceito de saneamento básico, uma vez que a ausência desse leva a conseqüências desastrosas daquele (1).
Sob esse aspecto, dentre as principais conseqüências relacionadas à falta de saneamento básico destacam-se:
1) A ausência de sistemas adequados de esgotamento sanitário que obriga as comunidades a conviverem com seus próprios excrementos, agravando os riscos de mortalidade devido a doenças transmissíveis por veiculação hídrica ou por vetores como moscas, mosquitos, baratas e ratos. São exemplos de tais doenças: cólera, esquistossomose e males gastrointestinais;
2) A ausência de abastecimento de água, além de agravar igualmente as condições de saúde, não possibilita os cuidados com a higiene pessoal e doméstica;
3) As formas inadequadas de disposição de lixo urbano, lançados nos lixões a céu aberto ou nas águas e mangues, afetam o ambiente, poluindo o solo, a água, o ar, destruindo fauna e flora e prejudicando as comunidades locais que passam a conviver com os agentes patogênicos (vírus, bactérias, protozoários e fungos) e vetores transmissores de doenças;
4) A ausência, insuficiência ou entupimentos da rede de drenagem urbana (sistema de escoamento das água de chuva) produz as enchentes e inundações e leva ao aparecimento da cólera, da leptospirose e da hepatite, entre outras, nas comunidades afetadas (2).
Pesquisas realizadas comprovaram que a implantação de medidas de saneamento básico - abastecimento de água, esgotamento sanitário, destinação final adequada dos resíduos (lixo) e controle de vetores - preveniu a ocorrência de enfermidades, reduzindo em média a mortalidade por diarréia em 26%, a ascaridíase em 29%, o tracoma, enfermidade ocular, em 27%, a esquistossomose em 77% e a mortalidade infantil em 55% (2).
Portanto, o saneamento básico é condicionante indispensável à saúde do homem (3). Saneamento básico é definido pela OMS como o controle de todos os fatores do meio físico do homem que exercem ou podem exercer efeito deletério sobre o seu bem-estar físico, social e mental. Estima-se que 80% de todas as doenças do mundo são causadas por saneamento inadequado, poluição de água ou água sem avaliação, o tratamento domiciliar é de grande valia para tornar potável a água consumida, podendo diminuir o risco de infecção (4).
Assim, com o propósito de proceder a uma revisão sobre o impacto do saneamento básico na saúde coletiva, o presente trabalho objetiva traçar uma breve reflexão acerca da intersecção entre saúde coletiva e saneamento básico sob o prisma da Lei 11.445/2007.
Tópicos referentes à Lei 11.445/2007
Segundo a Lei 11.445/2007, saneamento básico constitui o conjunto de serviços, infra-estruturas e instalações operacionais de: abastecimento de água potável, constituído pelas atividades, infra-estruturas e instalações necessárias ao abastecimento público de água potável, desde a captação até as ligações prediais e respectivos instrumentos de medição; esgotamento sanitário, constituído pelas atividades, infra-estruturas e instalações operacionais de coleta, transporte, tratamento e disposição final adequados dos esgotos sanitários, desde as ligações prediais até o seu lançamento final no meio ambiente; limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos, que compreende o conjunto de atividades, infra-estruturas e instalações operacionais de coleta, transporte, transbordo, tratamento e destino final do lixo doméstico e do lixo originário da varrição e limpeza de logradouros e vias públicas; e drenagem e manejo das águas pluviais urbanas, que compreende o conjunto de atividades, infra-estruturas e instalações operacionais de drenagem urbana de águas pluviais, de transporte, detenção ou retenção para o amortecimento de vazões de cheias, tratamento e disposição final das águas pluviais drenadas nas áreas urbanas (5).
Essa lei possui doze princípios fundamentais, dos quais três tem relação intrínseca com a saúde coletiva, a saber: abastecimento de água, esgotamento sanitário, limpeza urbana e manejo dos resíduos sólidos realizados de formas adequadas à saúde pública e à proteção do meio ambiente; disponibilidade, em todas as áreas urbanas, de serviços de drenagem e de manejo das águas pluviais adequados à saúde pública e à segurança da vida e do patrimônio público e privado; e articulação com as políticas de desenvolvimento urbano e regional, de habitação, de combate à pobreza e de sua erradicação, de proteção ambiental, de promoção da saúde e outras de relevante interesse social voltadas para a melhoria da qualidade de vida, para as quais o saneamento básico seja fator determinante (5).
Com relação à formulação da política pública de saneamento básico, o titular dos sérvios deve adotar parâmetros para a garantia do atendimento essencial à saúde pública, inclusive quanto ao volume mínimo per capita de água para abastecimento público, observadas as normas nacionais relativas à potabilidade da água (5).
No artigo 29, a Lei 11.445/2007 estabelece que os serviços públicos de saneamento básico terão a sustentabilidade econômico-financeira assegurada, sempre que possível, mediante remuneração pela cobrança dos serviços. Entretanto, na instituição das tarifas, preços públicos e taxas para os serviços de saneamento básico será observado, como diretriz, a prioridade para atendimento das funções essenciais relacionadas à saúde pública.Ademais, será levada em consideração a quantidade mínima de consumo ou de utilização do serviço, visando à garantia de objetivos sociais, como a preservação da saúde pública, o adequado atendimento dos usuários de menor renda e a proteção do meio ambiente (5).
É importante salientar que a Lei traz em seu bojo uma espécie de proteção à saúde coletiva ao estabelecer no parágrafo 3º do artigo 40 que a interrupção ou a restrição do fornecimento de água por inadimplência a estabelecimentos de saúde, a instituições educacionais e de internação coletiva de pessoas e a usuário residencial de baixa renda beneficiário de tarifa social deverá obedecer a prazos e critérios que preservem condições mínimas de manutenção da saúde das pessoas atingidas (5).
Com relação à Política Federal de Saneamento Básico, a Lei estabelece que a União, no estabelecimento de sua política de saneamento básico, observará, como diretriz, melhoria da qualidade de vida e das condições ambientais e de saúde pública. Ademais, ainda destaca que as políticas e ações da União de desenvolvimento urbano e regional, de habitação, de combate e erradicação da pobreza, de proteção ambiental, de promoção da saúde e outras de relevante interesse social voltadas para a melhoria da qualidade de vida devem considerar a necessária articulação, inclusive no que se refere ao financiamento, com o saneamento básico (5).
Ainda com relação à Política Federal de Saneamento Básico, um de seus objetivos tem importante ligação com a saúde coletiva, qual seja: minimizar os impactos ambientais relacionados à implantação e desenvolvimento das ações, obras e serviços de saneamento básico e assegurar que sejam executadas de acordo com as normas relativas à proteção do meio ambiente, ao uso e ocupação do solo e à saúde (5).
Outra proteção à saúde coletiva estabelecida pela Lei 11.445/2007 é a de que é permitida a aplicação de recursos orçamentários da União na administração, operação e manutenção de serviços públicos de saneamento básico não administrados por órgão ou entidade federal, em situações de eminente risco à saúde pública e ao meio ambiente, por prazo determinado (5).
Considerações finais
A compreensão das relações entre saneamento básico e saúde coletiva trazida pela Lei 11.445/2007 constitui uma etapa inicial importante tanto no desenvolvimento da Política Social de Saneamento Básico como no desenvolvimento da saúde coletiva de uma maneira geral. Dessa forma, como o saneamento básico é condicionante indispensável à saúde do homem, é imprescindível que sejam destacadas e publicadas as conseqüências da ausência de saneamento básico, bem como as melhorias à saúde coletiva e ao saneamento básico após estabelecimento de mecanismos legais que garantam eficácia, eficiência e efetividade no controle de todos os fatores do meio físico, que exercem efeitos deletérios sobre a saúde humana.
Referências
- Constituição da Organização Mundial de Saúde – OMS;
- Saúde e Saneamento. Saneamento básico. Direito do cidadão e dever do Estado. http://www.geocities.com/siteambiental/saneamento.htm;
- Cynamon, S.E. Política de Saneamento - proposta de mudança. Cadernos de Saúde Pública vol.2, nº2, Rio de Janeiro, April/June, 1986;
- LAMPERT, J.B. et al. Condições de Saneamento domiciliar da cidade de Santa Maria. Revista Saúde, São Paulo, V. 20, n-3-4, p. 53-63, julho/dez. 1994;
- Lei 11.445, de 5 de Janeiro de 2007.