REDUÇÃO DE DIREITOS TRABALHISTAS POR NORMA COLETIVA DO TRABALHO

Por Thyciana Maria Brito Barroso de Carvalho | 15/06/2017 | Direito

SINOPSE DO CASE:REDUÇÃO DE DIREITOS TRABALHISTAS POR NORMA COLETIVA DO TRABALHO¹                                                    

                                                                                                        Thyciana Maria Brito Barroso de Carvalho                                                                                   

1 DESCRIÇÃO DO CASO 

Pedro Correa de Castro era empregado contratado da Montadora de Veículos WFFGM Ltda, ao tempo em que fora firmado ACT, em 02/01/2015, entre a empresa e o sindicato obreiro. No referido instrumento coletivo, ficou pactuada a estabilidade provisória no emprego de todos os 902 empregados, isto na vigência do período de 01/02/2015 a 31/12/2015, tudo nos seguintes termos: a jornada diária seria estendida por 2h remuneradas + 10%, e os empregados não perceberiam o 13º salário. Em contrapartida, no caso de rescisão, todos os direitos trabalhistas seriam pagos com valores dobrados, incluindo-se a multa do FGTS.

Pedro Correa de Castro foi então dispensado em 30/09/2015, tendo percebido todas as verbas rescisórias em dobro, com reflexos até o dia 02/02/2016 (considerando o aviso prévio de 33 dias).

Contudo, em 04/02/2016, o ex-empregado ingressou com reclamação trabalhista requerendo a nulidade do acordo coletivo de trabalho, assim como o pagamento, por parte da reclamada, das seguintes parcelas: 720 horas extras + 40% e 13º salário referente a 2015. 

2. O ACORDO COLETIVO DE TRABALHO É NULO, UMA VEZ QUE VIOLA OS PRINCÍPIOS FUNDANTES DO DIREITO DO TRABALHO. 

No caso em comento, o trabalhador Pedro Correa de Castro alega a nulidade das cláusulas do Acordo Coletivo, isso porque a negociação coletiva fere os princípios norteadores do Direito do Trabalho que são assegurados aos empregado, uma vez que o acordo firmado entre o sindicato e a empresa, trouxe a prorrogação da jornada do empregado com o percentual sobre as horas extras reduzido, somando-se a isso, tem-se que a supressão do 13º salário. Portanto, o acordo fere nitidamente o princípio da indisponibilidade de direitos, princípio este onde não há renuncia a direito mesmo que as partes tenham acordado.

No que concerne à questão da flexibilização das parcelas trabalhistas, é possível vislumbrar sua ocorrência quando as normas autônomas “juscoletivas” realizam um modelo de direitos que seja superior ao modelo geral que tem sua base legal na legislação heterônoma  ou quando normas autônomas “juscoletivas” negociam parcelas trabalhistas que sejam de indisponibilidade não absoluta  (DELGADO, 2013, p. 1359).

Diante dos fatos, pode-se declarar que o acordo coletivo de trabalho ajustado contém vício de consentimento, na medida em que este acordo fora imposto ao empregado em questão, tendo como consequência o prejuízo do sustento seu e de sua família. Nesse diapasão, é perfeitamente cabível o entendimento de que ainda que o acordo seja fruto de decisão de assembleia de trabalhadores, não há que se presumir o consentimento de todos (LIMA apud AZEVEDO, 2010).

Um dos termos pactuados no acordo analisado foi o da prorrogação da jornada diária em 2 horas remuneradas com o acréscimo de 10% sobre a hora normal, termo esse que afronta o texto constitucional, uma vez que a Constituição Federal, art. 7º, inciso XVI estabelece que o percentual mínimo a ser pago sobre a hora normal é de no mínimo 50%, valor esse que não pode ser alterado ainda que por acordo coletivo. Portanto, a cláusula que trata sobre a jornada de trabalhado deve ser declarada nula, motivo pelo qual a Pedro Correa, é devido o pagamento das horas extras trabalhadas quando da vigência do acordo, devendo o percentual de 50% ser calculado na horas extras, além das verbas contratuais e rescisórias que devem ser pagas em dobro mediante o que fora estipulado no acordo.

 É válido ressaltar que também está previsto no texto constitucional, a possibilidade de flexibilização de alguns direitos trabalhistas, no que se refere ao período de jornada de trabalho, o art. 7º, inciso XIII nos diz que “a duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho”. No que concerne a prorrogação da jornada de trabalho a CLT, traz no seu art. 59 que “a duração normal do trabalho poderá ser acrescida de horas suplementares, em número não excedente de duas, mediante acordo escrito entre empregador e empregado, ou mediante convenção coletiva de trabalho”.

Dentre os direitos que Pedro Correa ainda fazem jus, pode-se arguir o 13º salário referente ao ano de 2015, haja vista esse direito ter sido suprimido pelo acordo coletivo. Isso porque, em que pese o texto constitucional abrir margem a flexibilização salarial, não há permissão para supressão do salário, conforme ocorreu com o acordo coletivo.  

Diante de todo exposto, verifica-se ser perfeitamente pertinente o pedido autoral no que concerne ao recebimento da 13ª verba salarial referente ao ano de 2015, levando-se em consideração o vício constante na cláusula do acordo coletivo que dispõe sobre a supressão salarial. 

2.3 O ACORDO COLETIVO DE TRABALHO É VÁLIDO. 

O art. 444 da CLT estabelece que as “relações contratuais de trabalho podem ser objeto de livre estipulação das partes interessadas”. Tomando por base esse preceito, vislumbra-se ser plenamente possível que direitos trabalhistas venham a ser flexibilizados por acordos ou convenções coletivas.

De acordo com Sérgio Pinto Martins, o fenômeno da flexibilização de direitos trabalhistas tem como objetivo:

 

Assegurar o conjunto de regras mínimas ao trabalhador e, em contrapartida, a sobrevivência de empresas, por meio de modificações de comandos legais, procurando garantir aos trabalhadores certos direitos mínimos e ao empregador a possibilidade de adaptação de seus negócios, mormente em épocas de crise econômica. (MARTINS, 2009, p. 506).

 

Nessa linha, é válido invocar o princípio no qual os setores trabalhistas conduzem a negociação ou acordo coletivo, qual seja, o princípio da adequação setorial. Não sendo viável, durante a negociação trabalhista, a renúncia de direitos por qualquer das partes, sendo cabível negociar direitos ditos como disponíveis. (DELGADO, 2013). E, como o próprio texto constitucional autoriza, é perfeitamente possível tratar acerca da jornada de trabalho, bem como reduzir as parcelas salariais, mas desde que haja conveniência e seja necessário.

 

O reclamante pede que seja declarada a nulidade do acordo, por acreditar que seu direito trabalhista não fora garantido. Entretanto, o acordo coletivo foi estabelecido de forma bilateral (sindicato e a montadora), não sendo possível se falar de prejuízo por conta de dispensa não motivada.

A montadora, em acordo com o sindicato, ainda que tenha prorrogado a jornada dos empregados, garantiu uma estabilidade pelo período de 1 ano para mais de 900 pessoas, em um cenário de conturbada crise política e econômica vivida pelo país. Logo, além de ser previsto em lei, é muito aconselhável negociar coletivamente.

Há que se falar ainda nas verbas rescisórias que foram pagas em dobro, além da multa do FGTS. Como houve a dispensa imotivada de Pedro Correa, o ex-empregado terá direito ao pagamento de verbas além das estipuladas, que ao final do somatório será superior ao valor do 13º salário e das horas extras.

Mediante todos os fatos acima expostos, o acordo coletivo firmado entre as partes (montadora e sindicato) merece surtir todos os efeitos contidos, uma vez que todos os direitos do reclamante fora observados e as obrigações impostas a reclamada foram perfeitamente cumpridas.

 

REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988.

 

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil.Brasília: Senado Federal, 1988.

 

BRASIL. Lei Complementar nº 75, de 20 de Maio de 1993. Dispõe sobre a organização, as atribuições e o estatuto do Ministério Público da União. Itamar Franco: Brasília, 1993.

 

BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. RO: 106715720105020000.Relator Min. Walmir Oliveira da Costa. Data de Julgamento. 13/04/2015. Seção Especializada em Dissídios Coletivos. Data de Publicação: DEJT 17/04/2015.

 

DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 12. ed. São Paulo: LTr, 2013.

 

DELGADO. O direito constitucional e a flexibilização das normas trabalhistas. In: Revista Magister de Direito Trabalhista e Previdenciário, vol. 6, nº 32, set./out. 2009. 

 

LIMA, Marla Beatriz Miguel de Souza. Ação Anulatória de Cláusula: Uma Visão Sobre o Instituto e o Impacto sobre os Dissídios Individuais de Trabalho.Disponível em < http://www.tst.jus.br/documents/1295387/1312891/8.+A%C3%A7%C3%A3o+anulat%C3%B3ria+de+cl%C3%A1usula+-+uma+vis%C3%A3o+sobre+o+instituto+e+o+impacto+sobre+os+diss%C3%ADdios+individuais+de+trabalho > Acessado em março de 2016

 

MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do trabalho. 25. Ed. – 2. Reimpr. – São Paulo: Atlas, 2009. 

NASCIMENTO, Amauri Mascaro. O Debate sobre Negociação Coletiva. In Revista LTr. Vol. 64, nº  9, Setembro de 2000. SP: LTr, 2000.