RECURSOS EXCEPCIONAIS E AS MUDANÇAS DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL: Dos requisitos de admissibilidade dos recursos excepcionais e o acesso à justiça.

Por Danilo Costa Silva | 28/05/2014 | Direito

RECURSOS EXCEPCIONAIS E AS MUDANÇAS DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL: Dos requisitos de admissibilidade dos recursos excepcionais e o acesso à justiça. [1]

 

Danilo Costa Silva [2]

Christian Barros Pinto[3]

 

RESUMO

 

O presente trabalho visa, num primeiro momento, fazer uma análise a respeito dos recursos de forma geral, dando ênfase às restrições impostas aos jurisdicionados quanto a possibilidades de cabimento dos recursos especiais e extraordinários no que diz respeito ao instituto da repercussão geral. Este requisito é alvo de discussão e crítica por parte de juristas uma vez que se trata de um critério de juízo de admissibilidade de recursos junto ao Supremo Tribunal Federal.

 

Palavras-chave: recursos excepcionais, acesso à justiça, prequestinamento, repercussão geral.

 

 

 

INTRODUÇÃO:

Com base na análise dos fundamentos de sustentam a possibilidade de uma segunda análise das decisões judiciais, temos que esta se reveste de uma garantia ao acesso à justiça e se propões a assegurar àqueles que litigam a possibilidade e um “melhor” oferecimento da tutela jurisdicional. A evolução notada quanto às restrições impostas pelos requisitos de admissibilidade dos recursos especiais são alvo de críticas e divergências doutrinárias, o que destacaremos no presente trabalho, principalmente quanto à possibilidade de prequestionamento e a chamada repercução geral.

Temos como recursos excepcionais aqueles que como o nome diz, não comuns,ou seja, aqueles cujo procedimento encontra uma diferenciação relevante dos demais recursos, inclusive, quanto à sede de atendimento desta fase recursal; eles são os chamados recursos ordinários e extraordinários. Tais recursos possuem fundamento basilar previsto na constituição e, deste modo, são considerados de fundamental importância para a garantia do devido processo legal.

1-                 Do conceito de recurso:

O inconformismo quanto ao teor das decisões judiciais, ou mesmo confusão no teor da sentença representam alguns motivos que levam as partes a buscar uma reanálise do conteúdo decisório. Deste modo, visualizamos que os recursos são submetidos a princípios e critérios conforme o caso concreto, sendo que estes objetivam a revisão, aprimoramento, anulação, coerência ou o clareamento deste conteúdo atacado, devendo o interessado provocar o reexame da decisão tida como não satisfatória, sem que haja remessa necessária. “Nos recursos, porém, ao contrário do que se sucede com outras vias de impugnação de decisão judicial, esta finalidade é obtida dentro da mesma relação processual em que se insere a decisão judicial atacada, submetendo à reapreciação por outro órgão (em regra).” (MARINONI,2011.p.500)

Deste modo, recurso é “remédio voluntário idôneo a ensejar, dentro do mesmo processo, a reforma, a invalidação, o esclarecimento ou a integração de decisão judicial que se impugna.” (MOREIRA, 2003, p.233) Atrelado ao conceito de recurso está o princípio do duplo grau de jurisdição, este trata da possibilidade de a decisão judicial poder ser revisada caso possa provocar prejuízo a qualquer das partes. Tal revisão é feita por outro órgão do poder judiciário, não sendo necessário que esta apreciação seja feita por órgão de hierarquia superior, atentando-se ao fato de haver divergência doutrinária a respeito de sua previsão constitucional, uma vez que não há neste corpo legal previsão expressa.

Neste ínterim, cabe destacar que tal princípio não é absoluto, encontrando limitações, seja pelo teor das decisões, seja por restrições impostas pelas próprias regras que tratam do tema. A exemplo, as limitações impostas à apreciação de recursos ordinários e extraordinários que estudaremos mais a frente.

“Na verdade o princípio do duplo grau de jurisdição não chega a constituir uma garantia, pois a Constituição Federal apenas a ele se refere, não o garantindo. A única Constituição de tratou do duplo grau de jurisdição como garantia absoluta foi a de 1824; as demais deixaram de se lhe conferir este atributo. A atual Constituição Federal apenas prevê o princípio do duplo grau de jurisdição, não tratando de discipliná-lo como garantia.” (DIDIER, 2011.p. 24)

Por conseguinte, faz-se necessário destacar que a doutrina percebe alguns pontos negativos acerca deste princípio, dentre eles “(...) a dificuldade de acesso à justiça, o desprestígio da primeira instância, a quebra da unidade do poder jurisdicional, a dificuldade na descoberta da verdade mais próxima possível da real e a inutilidade do procedimento oral.” (DIDIER, 2011.p. 24)

2-      Do direito de acesso à justiça:

A previsão constitucional no Art. 5°, XXXV, que assim dispõe: "A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito” garante o direito de acesso à justiça a todos. Conforme determina esta mesma carta constitucional, esta garantia é intimamente ligada ao princípio da isonomia, o qual garante a todos um dos principais pilares do Estado Democrático de Direito, a igualdade entre os cidadãos brasileiros.

Observamos também como garantias asseguradas por este modelo estatal citado, sustentáculos principiológicos como o Devido Processo Legal, o Juiz Natural, a Inafastabilidade do Controle Jurisdicional, o Contraditório e a Ampla Defesa, a Vedação da Prova Ilícita, o Duplo Grau de Jurisdição, a Publicidade dos Atos Processuais, a Motivação das Decisões Judiciais e a Razoável Duração do Processo ou Celeridade Processual. Estas previsões constitucionais têm como objeto garantir um estado de tranquilidade mínima e segurança patrimonial através da efetivação de um judiciário operante, e no qual todos poderão buscar seus direitos de forma eficaz junto ao Poder Judiciário.

Das citadas garantias, notamos que o acesso à justiça, por meio da ofensa aos princípios da Inafastabilidade da Jurisdição com as restrições impostas pelas recentes e significativas modificações quanto ao juízo de admissibilidade dos recursos especial e extraordinário ficou demasiadamente prejudicado, porém, conseguiu-se reduzir significativamente a carga processual que era extremamente elevada e sobrecarregava Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal, atrasando assim o julgamento dos processos que tramitavam junto a estes órgãos, provocando prejuízos irreparáveis às partes.

3-      Dos requisitos de admissibilidade dos recursos:

A simples vontade de recorrer da decisão proferida não é suficiente para a admissibilidade de interposição dos recursos especial e ordinário, embora o ato postulatório seja o primeiro dos ato-complexo que compõe o procedimento válido . “ o exame de validade do ato postulatório é, a fortiori, o exame de validade do próprio procedimento. A particularidade consiste apenas  na circunstancia de ser o primeiro ato, que, uma vez invalidado, implicará na nulificação do procedimento ab ovo.” ( DIDIER, 2011.p. 42)

“Toda postulação que se sujeita a um duplo exame do magistrado: primeiro, verifica-se se será possível o exame do conteúdo da postulação; após, em caso de um juízo positivo num primeiro momento, examina-se a procedência ou não daquilo que se postula. O primeiro exame tem prioridade lógica, pois tal atividade (análise do conteúdo da postulação) só se há de desenvolver plenamente se concorrerem os requisitos indispensáveis para tornar legítimo o seu exercício. No juízo de admissibilidade, verifica-se a existência dos requisitos de admissibilidade. Distingue-se do juízo de mérito, que é aquele em que se apura a existência ou a inexistência de fundamento para o que se postula, tirando daí suas conseqüências cabíveis, isto é, acolhendo ou rejeitando a postulação. No primeiro, julga-se  esta admissível ou inadmissível; no segundo procedente ou improcedente.” ( DIDIER, 2011.p. 42, 43)

O estudo desses pressupostos de admissibilidade divide-se em duas situações, os de natureza subjetiva, relacionados diretamente aos sujeitos do processo, e os de natureza objetiva, que se relacionam com a própria situação jurídica em análise. As constantes críticas feitas sobre estes critérios de admissibilidade se dão em função do seu crescente alargamento, o que dificulta, ou mesmo impede o aceso à justiça uma vez que estes funcionam como barreiras que impedem a apreciação de determinados recursos.

Nos tribunais superiores juízo de admissibilidade dos recursos direcionados a estes órgãos, pode ser exercido tanto pelo tribunal recorrido quanto pela corte competente para analisar o mérito do mesmo.

4-      Dos recursos especial e extraordinário:

Quanto aos recursos Extraordinário e Especial, estes são cabíveis contra decisões judiciais proferidas em única ou última instância, quando for configurada alguma das situações previstas, respectivamente, nos Arts. 102, III e 105, III, da Constituição Federal de1988, que te as seguintes redações: “Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo‑lhe: III – julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida: a) contrariar dispositivo desta Constituição; b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal; c) julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face desta Constituição; d) julgar válida lei local contestada em face de lei federal. Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça: III – julgar, em recurso especial, as causas decididas, em única ou última instância, pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos Tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando a decisão recorrida: a) contrariar tratado ou lei federal, ou negar‑lhes vigência; b) julgar válido ato de governo local contestado em face de lei federal; c) der a lei federal interpretação divergente da que lhe haja atribuído outro Tribunal.”

Tais recursos são revestidos de caráter diferenciado, pois ao contrário dos demais recursos estes não se prestam a exercer juízo sobre o mérito da decisão discutida, “ o recurso especial e o extraordinário têm por finalidade principal assegurar o regime federativo, por meio do controle e aplicação da lei federal ao caso concreto” (MARINONI, 2011. P.559) ou seja, estes recursos visam a correta aplicabilidade da lei federal e da Constituição Federal por parte do juízes e tribunais do país.

Estas recursos são tidos como recursos de fundamentação vinculada, pois estes somente permitem a discussão de situações que envolvem controvérsia na aplicação de matérias que envolvam a interpretação de lei federal ou preceito constitucional, sendo por tão somente apreciáveis matérias de Direito.

Do exame dessas duas regras da Constituição Federal, observa-se prontamente que a guarda da lei maior fica a cargo do Supremo Tribunal Federal, a quem é dirigido o recurso extraordinário. O Superior Tribunal de Justiça se reserva à correta aplicabilidade da Lei Federal. Estes órgãos possuem fundamental importância para o asseguramento da segurança jurídica através da coerência entre as decisões judiciais, ou seja, a coerência de interpretação de tais normas legais.

Em função especialidade destes recursos são especiais também seus critérios de admissibilidade. Além da já citada matéria discutível por estes tribunais notamos a existência também do chamado prequestionamento e a chamada repercussão geral,este primeiro trata da

“Utilização dos embargos de declaração, para o fito de provocar a manifestação expressa do por órgão jurisdicional a quo a respeito da questão legal ou constitucional controvertida. Assim, se o tribunal (ou juízo) não se manifesta expressamente sobre a aplicação ou interpretação da lei federal ou da regra constitucional, incumbe ao interessado na interposição do recurso valer-se dos embargos de declaração, provocando o órgão jurisdicional a apreciar especificamente o tema legal ou constitucional (SÚMULAS 356 do STF e 98 do STJ).” (MARINONI, 2011. P.563)

Tanto o STF quanto o STJ entendem a matéria prequestionada quando ela é abordada de forma expressa pela decisão recorrida, com a ressalva de que para o STF quando forem interpostos embargos de declaração e o tribunal ou juiz a quo se recusar a suprir a omissão alegada.

5-      Da repercussão geral:

Umas das modificações trazidas pela Emenda Constitucional n.45/2004 foi a inclusão da repercussão geral como pressuposto de admissibilidade para casos a serem discutido no STF (observa-se que os demais critérios não são excluídos). Esta emenda acrescentou ao art. 102, da CF o § 3° “No recurso extraordinário o recorrente deverá demonstrar a repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso, nos termos da lei, a fim de que o Tribunal examine a admissão do recurso, somente podendo recusá‑lo pela manifestação de dois terços de seus membros.”

Para efeito de repercussão geral, temos que esta será considerada como a existência de questões relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico e que estes ultrapassem os interesses subjetivos da causa, alcançando assim um interesse maior para toda a sociedade. Nota-se também que, restará suprido este requisito quando a decisão atacada for contrária á súmula ou decisão contrária à jurisprudência dominante no STF.

O caráter aberto do conceito de repercussão geral não pode ser suprido por parâmetros gerais, foiçando a cargo do próprio STF a definir, em casos concretos tais critérios de definição. É fundamental a influência dos princípios da motivação e da publicidade para que os jurisdicionados tenham uma definição mais acertada do que vem a ser tratado pelo STF  como repercussão geral, devendo as partes delimitar,  em sede de preliminar, ao recurso interposto a repercussão geral tratada.

“O exame de tal questão estará afeto, exclusivamente, a análise do supremo Tribunal Federal, não se admitindo a negativa de segmento do recurso extraordinário no tribunal de origem, por que seu presidente tem entendido inexistente tal “repercussão geral”. Vale dizer que somente o Supremo Tribunal Federal tem o poder de analisar o que é ou não é questão de repercussão geral. O exame feito pelo Supremo Tribunal Federal poderá até ulteriormente ser utilizado na instancia inferior para negar seguimento ao recurso extraordinário (art. 543- B, § 2°), mas apenas aquele tribunal tem a autorização para interpretar o que se deve entender por questão de repercussão geral. Ao presidente o tribunal inferior, portanto, caberá apenas aplicar aquilo que o Supremo Tribunal Federal estiver decidido, sem que tenha autonomia para dizer, o por si, o que pode ou não ser considerado como questão de repercussão geral para negar seguimento a recurso extraordinário.” (MARINONI, 2011. P.566-567)

Neste ponto, cabe fazer alusão aos critérios de julgamento deste pressuposto, uma vez que se o STF fosse analisar caso a caso a fim de determinar o que é ou não repercussão geral, este instituto teria pouca eficácia frente ao princípio da celeridade processual, da razoável duração do processo, da economia, dentre outros. Neste ponto cabe destacar a forma como este procedimento avaliatório é feito.

“Obviamente, a aplicação indiscriminada desta regra a todos os recursos extraordinários faria com que seu julgamento fosse ainda mais demorado, já que todos deveriam ser submetidos ao plenário, para a avaliação (por maioria de dois terços) da presença da repercussão geral. Para evitar esse inconveniente, a disciplina da questão se valeu da experiência norte americana da chamada (regra dos quatro), por meio da qual, se houver, na turma ( a quem compete a apreciação do recurso extraordinário) no mínimo quatro votos concluídos pela presença da questão de repercussão geral, será o recurso admitido, dispensando-se a remessa do caos ao plenário( art. 543-A, § 4).caso não se atinja este quorum na turma,deverá o recurso ser levado a exame do plenário do Supremo Tribunal Federal para deliberação sobre a presença ou não da repercussão geral” (MARINONI, 2011. P.566-567)

Negada a existência da repercussão geral, os recursos que por ventura encontrarem-se suspensos, em função da análise de existência, serão de pronto inadmitidos.

“É possível concluir , sem receio, que o incidente para a apuração da repercussão geral por amostragem é um procedimento de caráter objetivo, semelhante ao procedimento da ADIN, ADC e ADPF, de profundo interesse público, pois se trata de exame de uma questão que diz respeito a um sem - número de pessoas, resultando na criação de uma norma jurídica de caráter geral pelo STF. É mais uma demonstração do fenômeno de objetivação do controle difuso de constitucionalidade das leis.”   ( DIDIER, 2011, p.340)

Uma vez reconhecida a repercussão geral, é concedido ao juízo a quo após a decisão do STF, a permissão de retratação, caso não haja a retratação, poderão STF,  cassar ou reformar liminarmente o acórdão contrário à decisão deste órgão.

6-      Conclusão

Com base na análise dos institutos estudados chegamos a conclusão de que embora haja divergências e críticas quanto à limitação ao acesso ao judiciário temos que o instituto da repercussão geral é de fundamental importância prática, uma vez que com a utilização deste como critério de admissibilidade de recursos junto ao STF,  fica garantido, a um número maior de pessoas, por tanto de interesse geral, um uso mais qualificado do Poder Judiciário, uma vez que é promovida a celeridade e outros princípios fundamentais à prestação da tutela jurisdicional.

7-      Referencias

-CAMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processo Civil. Vol. II. 9. ed. Editora Lemen Júris, Rio de Janeiro: 2003.

- DIDIER, Fredie Jr. Curso de direito processual civil: meios de impugnação às decisões judiciais e processo nos tribunais. vol. 3. 12.ed. Salvador: JusPodivm. 2011.

- MARINONI, Luiz Guilherme. Curso de Processo Civil.Processo de conhecimento. Vol 2. 9.ed. ver e atualizada – São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011.

- THEODORO, Humberto Júnior. Curso de Direito Processual Civil. Vol. I. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 2007.

-GRINOVER, Ada Pellegrini. Teoria geral do processo. 25.ed. São Paulo.Malheiros, 2009.

            - MOREIRA, José Carlos Barbosa. Comentários ao código de processo civil. 11.ed ver. E atual. Rio de Janeiro: forense, 2003.

 



[1] Paper a ser apresentado à disciplina Recursos no Processo Civil, da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco.

[2] Acadêmico do 6º período noturno do Curso de Direito da UNDB.

[3] Professor da disciplina de Recursos no Processo Civil da UNDB, orientador.

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