RECURSO EXTRAORDINÁRIO: REPERCUSSÃO GERAL COMO NOVO REQUISITO DE ADMISSIBILIDADE
Por Giselle Ashitani Inouye | 16/08/2013 | DireitoINTRODUÇÃO
Considerando o recurso extraordinário como um instrumento do controle difuso de constitucionalidade, iniciamos o presente estudo por uma breve análise da origem do controle de constitucionalidade no Brasil. Verificamos que por inspiração no direito norte-america, foi introduzido na Constituição de 1891 o controle difuso de constitucionalidade, consagrado pela previsão de um recurso ao Supremo Tribunal Federal.
No segundo capítulo traçou-se a evolução histórica do recurso extraordinário nas Constituições Brasileiras para uma melhor compreensão do seu perfil na atualidade. Concomitantemente, analisamos, sucintamente, o problema do volume de recursos extraordinários submetidos à apreciação do Supremo Tribunal Federal e seu reflexo no desempenho deste como guardião da Constituição.
No terceiro capítulo intentamos esboçar um panorama geral acerca do novo requisito de admissibilidade do recurso extraordinário, qual seja: a repercussão geral. Sem pretensão de esgotamento do tema, buscamos destacar as características básicas do instituto, tais como fundamento legal, conceito, finalidade, vigência e seus efeitos na distribuição de recursos extraordinários.
Por fim, concluímos o presente estudo com uma reflexão sobre a necessidade da elaboração de um Código de Processo Constitucional para melhor ordenação da matéria.
1. BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE O CONTROLE DIFUSO DE CONSTITUCIONALIDADE NO BRASIL
1.1. Antecedente histórico: sistema norte-americano
O controle judicial de constitucionalidade originou-se nos Estados Unidos, sendo seu marco histórico a célebre decisão proferida pelo Juiz John Marshall, da Suprema Corte, no caso “Marbury versus Madison”, de 1803, sintetizado por PALU[1] nos seguintes termos, in verbis:
“O episódio passou do seguinte modo. Vencidos nas eleições presidenciais, procuravam os federalistas, no seu pouco tempo restante de administração, entrincheirar-se nos tribunais. Nova Lei judiciária foi sancionada em 27 de fevereiro visando à extensão do Judiciário nacional e criando numeroso lugares de juízes. Na véspera da posse de Jefferson, o presidente eleito, até as 21h00, Adams ainda lavrava nomeações, cujos beneficiários foram apelidados de juízes da meia-noite. Marbury, que era cidadão norte-americano, fora legalmente nomeado, em 1801, nos últimos dias do governo Adams, juiz de paz no Distrito de Colúmbia. Madison, Secretário de Governo, seguindo instruções de Jefferson, o novo Presidente, negou-lhe a posse. Requerida ordem de mandamus contra Madison, este não se defendeu e a causa correu à revelia. Em 1802, nos jornais e no Congresso, foi a Corte violentamente atacada, sugerindo James Monroe o impeachment contra os juízes, se ousassem ‘aplicar os princípios da common Law à Constituição’. A mesma providência foi pleiteada, dias antes da decisão por um jornal oficioso do governo; se concedida, a medida certamente não seria cumprida. Enfrentava-se assim uma situação dificílima. Indeferir simplesmente o pedido seria, conforme observou Crosskey, capitulação demasiado visível; afirmar apenas que alei judiciária somente autorizava o mandamus pela Corte Suprema em grau de apelação era resultado satisfatório. A Corte, de modo hábil, procurou dissimular o recuo inevitável, com um ato de afirmação contra o partido no poder. Invertendo a ordem do exame das questões preliminares, decidiu que Madison, na realidade, agira ilegalmente ao negar a posse de Marbury, e de acordo com os princípios aplicáveis da common law, havia remédio para tal caso, o mandamus, pelo qual Madison poderia ser compelido a dar posse a Marbury. Não cabia, porém o writ, porque pedido diretamente à Corte Suprema, cuja competência originária era estritamente definida na Constituição e não poderia ter sido dilatada pela Lei Judiciária de 1789. Era, assim, institucional e nulo o art. 13 dessa lei, que atribuía competência originária à Suprema Corte para expedir ordens de mandamus (Leda Boechat Rodrigues, A corte suprema e o direito constitucional americano, p. 21). Evitou a Suprema Corte o confronto com o Executivo, e ao mesmo tempo afirmou a possibilidade de o Poder Judiciário anular leis votadas pelo Congresso.”
Em sua decisão o Juiz John Marshall assim se pronunciou:
“Ou havemos de admitir que a Constituição anula qualquer medida legislativa que a contrarie, ou anuir que a legislatura possa alterar a Constituição por medidas ordinárias. Não há por onde se contestar o dilema. Entre as duas alternativas não se descobre meio termo. Ou a Constituição é uma lei superior, soberana, irreformável mediante processos comuns, ou se nivela com os atos da legislação usual e, por estes é reformável à vontade da legislatura. Se a primeira proposição é verdadeira, então o ato legislativo, contrário à Constituição, não será lei; se é verdadeira a segunda, então as Constituições escritas são esforços inúteis do povo para limitar um poder pela própria natureza ilimitável. Ora, com certeza, todos os que têm formulado Constituições escritas, sempre o fizeram no objetivo de determinar a lei fundamental e suprema da Nação; e conseguintemente, a teoria de tais governos deve ser a da nulidade de qualquer ato da legislatura ofensivo da Constituição. Esta doutrina está essencialmente ligada às escritas, e assim, deve-se observar como um dos princípios fundamentais da nossa sociedade.”[2]
A partir de uma interpretação lógica do sistema, pois não havia previsão expressa na Constituição, Marshall afirmou, pela primeira vez, a competência do Poder Judiciário para realização do controle de constitucionalidade das leis.
O controle de constitucionalidade impede a existência de mandamentos infraconstitucionais, no ordenamento jurídico, que violem o que fora estabelecido na Constituição. Dessa forma, assegura-se a supremacia da Constituição e o cumprimento dos preceitos constitucionais, mitigando-se os excessos cometidos pelos demais poderes, Executivo e Legislativo.
A decisão de Marshall inaugurou, também, o chamado controle difuso de constitucionalidade das leis, também denominado aberto, repressivo ou posterior, por via de exceção. Difuso ou aberto, pois pode ser realizado por qualquer juiz singular ou tribunal; repressivo ou posterior, uma vez que se dá, necessariamente, a partir de um caso concreto no qual uma das partes defende-se de uma ofensa causada por uma lei ou ato normativo inconstitucional; por via de exceção tendo em vista que a declaração da inconstitucionalidade vai excepcionar o indivíduo da aplicação da lei ou ato normativo.
Não se pode negar, assim, importância do controle de constitucionalidade para a manutenção da harmonia do ordenamento jurídico e, principalmente, para a concretização dos mandamentos constitucionais.
1.2. Controle de constitucionalidade no Brasil
No Brasil, o sistema de controle de constitucionalidade foi inaugurado com a Constituição de 1891, inspirado no modelo norte-americano do controle difuso de constitucionalidade.
Com o decurso do tempo, foram adotados alguns aspectos do controle concentrado, idealizado por Hans Kelsen e materializado na Constituição Austríaca de 1920-29.
Embora não seja objeto do presente estudo, cumpre-nos tecer alguns breves esclarecimentos acerca do modelo kelseniano de controle de constitucionalidade.
No controle concentrado de constitucionalidade verifica-se a existência da Corte Constitucional, órgão de natureza jurídica criado para a guarda da Constituição. Apenas esta Corte possui competência para análise de inconstitucionalidade dos mandamentos infraconstitucionais, não sendo possível a realização do controle por qualquer juiz ou tribunal.
Além disso, o controle concentrado se dá por via de ação, não se operando, como no controle difuso, num caso concreto, razão pela qual é também denominado controle abstrato.
Assim, o objeto da ação no controle concentrado é a própria inconstitucionalidade, enquanto que no modelo norte-americano o objeto é a tutela do indivíduo contra uma inconstitucionalidade.
No Brasil, como anteriormente mencionado, após a Constituição de 1891, introduziu-se alguns elementos do controle concentrado de constitucionalidade, caracterizando-se um modelo misto de controle de constitucionalidade.[3]
No presente estudo, dar-se-á especial atenção ao Recurso Extraordinário, que consiste no principal instrumento pelo qual se dá o controle difuso de constitucionalidade no Brasil.
- 2. DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO
Como se sabe, é no curso de uma demanda que se dá o controle difuso de constitucionalidade. A parte prejudicada por uma suposta inconstitucionalidade submete a questão à análise do juiz da causa ou do Tribunal. Uma vez confirmada a decisão em seu prejuízo, pode a parte interpor Recurso Extraordinário ao Supremo Tribunal Federal que analisará a questão.
A possibilidade da participação popular no controle de constitucionalidade faz do recurso extraordinário um importante instrumento para concretização dos preceitos constitucionais, em especial para tutela e garantia dos direitos fundamentais.
2.1. Origem do Recurso Extraordinário: Evolução histórica do Recurso Extraordinário nas Constituições Brasileiras
A supremacia da Constituição encontra relação direta com a maior dificuldade de alteração do texto constitucional, ou seja, com a rigidez[4] da Carta Maior.
No sistema das Constituições rígidas, faz-se, em primeiro lugar, distinção entre o poder constituinte e os poderes constituídos. A Constituição, obra do poder constituinte, é quem cria e delimita a esfera de competência dos poderes constituídos, de tal sorte que estes apenas poderão atuar nos limites estabelecidos pelo texto constitucional.
A maior estabilidade e rigidez da Constituição em relação à legislação ordinária é proporcionada pelo especial procedimento adotado para sua alteração. Daí decorrem o princípio da supremacia da Constituição e o sistema de hierarquia das normas jurídicas.
Uma vez caracterizada a supremacia da Constituição, bem como a inferior hierarquia dos demais atos ordinários (atos do governo e normas jurídicas), imperativa a existência de um instrumento de controle de constitucionalidade.
No Brasil, antes do advento da Constituição de 1891, não se vislumbrava a existência de um controle de constitucionalidade, pois, como esclarece Paulo Bonavides[5]:
“A Constituição de 25 de março de 1824 – Constituição do Império – não favorecia o advento de um sistema de verificação de constitucionalidade. Com efeito, a Constituição só em parte era rígida: a parte respeitante aos limites e atribuições dos Poderes Políticos (o Poder Legislativo, o Poder Moderador, o Poder Executivo e o Poder Judicial) e aos direitos políticos e individuais dos cidadãos, conforme decorria do art.178. Apálida inspeção de constitucionalidade prevista no art. 173 da Carta outorgava guardava ainda feição política: à Assembléia Geral, no princípio de suas sessões, caberia examinar se a Constituição havia sido “exatamente observada para prover como for justo”.
Pois bem. A Constituição promulgada em 24.2.1891 estabeleceu a República Federativa como forma de governo e, constituído pela união perpétua indissolúvel das antigas províncias, os Estados Unidos do Brasil. Adotou-se o regime presidencialista e a tripartição dos poderes, da doutrina de Montesquieu, criando os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário.[6]
A Constituição de 1891, pondo fim à separação antes existente entre a parte rígida e a flexível da Constituição, dilatou a rigidez a todas as disposições constitucionais. Como forma de garantir a supremacia da Constituição e da legislação federal, por influência do Direito norte-americano, inaugurou o sistema de controle difuso de constitucionalidade[7].
Para tanto, introduziu ao seu texto dispositivo semelhante ao previsto no Decreto 848, de 11.10.1890[8], prevendo a existência de um recurso para o Supremo Tribunal Federal nas seguinte hipóteses:
“Art. 59: Ao Supremo Tribunal Federal compete:
- § 1º - Das sentenças das Justiças dos Estados, em última instância, haverá recurso para o Supremo Tribunal Federal:
a) quando se questionar sobre a validade, ou a aplicação de tratados e leis federais, e a decisão do Tribunal do Estado for contra ela;
b) quando se contestar a validade de leis ou de atos dos Governos dos Estados em face da Constituição, ou das leis federais, e a decisão do Tribunal do Estado considerar válidos esses atos, ou essas leis impugnadas.
§ 2º - Nos casos em que houver de aplicar leis dos Estados, a Justiça Federal consultará a jurisprudência dos Tribunais locais, e vice-versa, as Justiças dos Estados consultarão a jurisprudência dos Tribunais Federais, quando houverem de interpretar leis da União.”
Verifica-se, portanto, que a partir da Constituição de 1891 atribuiu-se competência ao Supremo Tribunal Federal para julgamento de recurso interposto contra decisão das Justiças Estaduais, que contrariassem lei federal ou quando leis e atos dos Governos dos Estados contrariassem a Constituição.
A expressão “recurso extraordinário” foi empregada pela primeira vez na Constituição de 1934, que foi responsável por introduzir profundas alterações no controle de constitucionalidade das leis[9].
Nos termos do artigo 76, 2, III:
Art. 76, caput: “À Corte Suprema compete: (...) 2 – Julgar: (...) III – em recurso extraordinário, as causas decididas pelas Justiças locais em única ou última instância:
a) quando a decisão for contra literal disposição de tratado ou lei federal, sobre cuja aplicação se haja questionado;
b) quando se questionar sobre a vigência ou validade de lei federal em face da Constituição, ou lei federal, e a decisão do tribunal local negar aplicação à lei impugnada;
c) quando se contestar a validade de lei ou ato dos governos locais em face da Constituição, ou de lei federal, e a decisão do tribunal local julgar válido o ato ou a lei impugnados;
d) quando ocorrer diversidade de interpretação definitiva de lei federal entre Cortes de Apelação dos Estados diferentes, inclusive do Distrito Federal ou dos Territórios, ou entre um destes tribunais e a Corte Suprema, ou outro tribunal Federal;
As Constituições posteriores, de 1937[10] e 1946[11], mantiveram a previsão do recurso extraordinário, pouco alterando a redação do dispositivo supramencionado.
A Constituição de 1967, com as Emendas Constitucionais 1/69 e 7/77, promoveu importante alteração quanto às hipóteses de cabimento do recurso extraordinário. Vejamos:
Art. 119: “Compete ao Supremo Tribunal Federal: III – julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância por outros tribunais, quando a decisão recorrida:
a) Contrariar dispositivo desta Constituição ou negar vigência de tratado ou lei federal;
b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal;
c) julgar válida lei ou ato do governo local contestado em face da Constituição ou de lei federal;
d) der à lei federal interpretação divergente da que lhe tenha dado outro tribunal ou o próprio Supremo Tribunal Federal.
- §1º As causas a que se refere o item III, alíneas, a e d, deste artigo serão indicadas pelo Supremo Tribunal Federal no regimento interno, que atenderá à sua natureza, espécie, valor pecuniário e relevância da questão federal.”
Em relação às Constituições anteriores, verifica-se que foi incluído o parágrafo primeiro que permitiu a criação de um mecanismo de filtragem dos recursos extraordinários. Por meio desse dispositivo, limitou-se às hipóteses de cabimento do recurso nos termos indicados pelo regimento interno do Supremo Tribunal Federal, que deveriam atender aos critérios de natureza, espécie, valor pecuniário e relevância da questão federal.
Esse mecanismo de filtragem foi incluído como forma de garantir o perfil atribuído ao Supremo Tribunal Federal desde a sua criação. O Supremo Tribunal Federal foi concebido como órgão de cúpula do Poder Judiciário, sendo, inicialmente, a última instância tanto em matéria constitucional quanto infraconstitucional federal.
Para que cada vez mais o STF se aproximasse da idéia de um Tribunal Constitucional, a Constituição de 1988 inovou criando o Superior Tribunal de Justiça, ao qual foi outorgada a competência para zelar pela guarda, interpretação e aplicação uniforme da legislação infraconstitucional[12].
Dessa forma, a competência em matéria de recurso extraordinário restou assim definida:
Art. 102, III: “Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:
III- julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida:
a) contrariar dispositivo desta Constituição;
b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal;
c) julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face desta Constituição.
Percebe-se, assim, que com o decurso do tempo o caráter excepcional do recurso extraordinário foi se aclarando. Não há dúvidas de que, antes de garantir a satisfação de um direito subjetivo num determinado caso concreto, sua função é a de garantir supremacia da Constituição por meio do controle de constitucionalidade dos atos e mandamentos infraconstitucionais.
Por sua finalidade excepcional suas hipóteses de cabimento, especificidades e exigências são distintas dos recursos ordinários. Como bem lembra Mancuso, os recursos excepcionais “apresentam uma rigidez formal de procedibilidade; são restritos às quaestiones júris; dirigem-se aos Tribunais de cúpula judiciária; não são vocacionados à correção da mera ‘injustiça’ da decisão e apresentam, como diz Frederico Marques, a particularidade de exigirem ‘a sucumbência e um plus que a lei processual determina e especifica” [13]. Daí concluir-se que a realização da justiça em um determinado caso concreto é, portanto, uma decorrência lógica da ‘manutenção da integridade da Constituição Federal’[14].
Aludidas considerações são corroboradas pela recente Emenda Constitucional 45/2004, que ao incluir o parágrafo 3º no artigo 102, acrescentou ao recurso extraordinário a repercussão geral como um novo requisito de admissibilidade, verbis:
“Art. 102, §3º: No recurso extraordinário o recorrente deverá demonstrar a repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso, nos termos da lei, a fim de que o Tribunal examine a admissão do recurso, somente podendo recusá-lo pela manifestação de dois terços de seus membros.”
Em observância ao mencionado dispositivo, a parte, além de cumprir os demais requisitos de admissibilidade, deve demonstrar que a questão constitucional suscitada na demanda importa em interesse que transcende às partes compostas na lide. A exigência da repercussão geral realça a finalidade do recurso extraordinário e o papel exercido pelo Supremo Tribunal Federal em nosso sistema jurídico-político.
- 3. REPERCUSSÃO GERAL COMO REQUISITO DE ADMISSIBILIDADE DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO
Em que pese a existência de outros requisitos de admissibilidade do recurso extraordinário, no presente estudo daremos especial atenção ao requisito da repercussão geral face à sua importância para o delineamento do atual perfil do Supremo Tribunal Federal e dos seus efeitos no âmbito do processo constitucional.
3.1. Fundamento legal
Nos capítulo anterior verificamos que a repercussão geral foi inserida no ordenamento constitucional por meio da Emenda Constitucional 45/2004, que inclui no artigo 102 o parágrafo 3º. É esse, portanto, o fundamento constitucional do requisito.
Todavia, como se pode verificar em mencionado dispositivo, a Constituição ao dispor sobre o assunto consignou que a repercussão geral deveria ser demonstrada “nos termos da lei”, ou seja, dependeria de regulamentação por parte do legislador ordinário.
Assim, em 19 de dezembro de 2006 foi promulgada a lei 11.418 que, regulamentando o §3º, do artigo 102 da Constituição, acrescentou ao Código de Processo Civil os artigos 543-A e 543-B.
Por sua vez, assim como a Constituição, o Código de Processo Civil reservou ao Supremo Tribunal Federal,em seu Regimento Interno, a competência para estabelecer as normas necessárias à execução da lei (11.418/2006).
À luz disso, foram editadas as Emendas Regimentais 21/2007, 23/2008, 24/2008, 27/2008, 24/2008, 29/2009 e 31/2009, que atualizaram os artigos 13, 322-A, 324, 328, 328-A do Regimento Interno do STF.
Em resumo, verificamos os seguintes fundamentos legais da repercussão geral:
Constituição Federal |
Artigo 102, parágrafo 3º, incluída pela Emenda Constitucional 45/2004 |
Código de Processo Civil |
Artigos 543-A e 543-B, incluídos pela Lei 11.418/2006 |
Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal |
Artigos 13, 322-A, 324, 328, 328-A |
3.2. Conceito
A Constituição, ao tratar da repercussão geral como um dos requisitos de admissibilidade do recurso extraordinário, não determinou como deve ser compreendida a expressão “repercussão geral”[15].
Por sua vez, o Código de Processo Civil, ao regulamentar o dispositivo constitucional, sem conceituar ou determinar as hipóteses de repercussão geral, estabeleceu elementos indicativos a serem observados pelos Ministros do Supremo Tribunal Federal na análise de sua existência ou não.
Nos termos do artigo 543-A de aludido diploma legal, a existência ou não da repercussão geral dependerá da constatação da relevância da questão sob os pontos de vista: i) econômico; ii) político; iii) social ou iv) jurídico. Além disso, a relevância da questão deve ultrapassar os interesses subjetivos da causa.
Essa indeterminação do conceito da repercussão geral não foi causada por um equívoco do legislador. Ela é característica própria do texto constitucional.
Como esclarece Celso Bastos:
“a norma constitucional, muito freqüentemente, apresenta-se como uma petição de princípios ou mesmo como uma norma programática sem conteúdo preciso ou delimitado. Como conseqüência desse fenômeno, surge a possibilidade da chamada “atualização” das normas constitucionais.”[16].
Seria impossível prever no texto constitucional todas as hipóteses de existência de repercussão geral. Na medida em que as relações sociais se transformam é preferível a existência de conceitos vagos ou abstratos para que estes possam ser aplicados ao maior número de hipóteses possível. Trata-se de conferir à Constituição uma maior flexibilidade e durabilidade, vez que esta poderá ser constantemente atualizada. Para tanto, segundo Celso Bastos:
“(...) a interpretação cumpre uma função muito alem da de mero pressuposto de aplicação de um texto jurídico, para transformar-se em elemento de constante renovação da ordem jurídica, de forma a atender, dentro de certos limites oriundos da forma pela qual a norma está posta, às mudanças operadas na sociedade, mudanças tanto no sentido do desenvolvimento quanto no de existência de novas ideologias.”[17]
Dessa forma, a inexistência de um conceito fechado, bem como de um detalhamento das hipóteses de existência da repercussão geral, decorrem da necessidade de se garantir ao texto constitucional uma abertura que obste o seu engessamento face à constante evolução/transformação da realidade social e conseqüente atualização da norma constitucional.
3.3. Finalidade
O expressivo volume de processos submetidos ao julgamento do Supremo Tribunal Federal há tempos vem sendo alvo de preocupação dos estudiosos.
Além da morosidade inevitável na apreciação dos processos, a sobrecarga dos Ministros acarreta ainda o enfraquecimento da própria instituição: a qualidade dos julgados resta comprometida na medida em que os magistrados não dispõem de tempo para uma melhor reflexão sobre o assunto; a Suprema Corte é obrigada a se manifestar em inúmeros processos de menor importância ou complexidade.
Com vistas a diminuir o volume de processos submetidos à apreciação do Supremo, ao longo dos anos vários foram os mecanismos implantados no sistema jurídico. Dentre eles: i) o introduzido pela Lei 3.396, de 1958, que determinou que nos recursos extraordinários interpostos, caberia aos presidentes dos Tribunais locais o juízo de admissibilidade, devendo estes negar seguimento ao recurso caso não fossem preenchidos os requisitos; ii) a Súmula 400 do STF; iii) a criação do Superior Tribunal de Justiça pela Constituição de 1988 e iv) a argüição de relevância.
Nesse cenário, a repercussão jurídica como requisito de admissibilidade do recurso extraordinário traduz-se como o mais recente mecanismo para redução do infindável número de recursos extraordinários submetidos à apreciação da Suprema Corte.
E não é outro o entendimento do próprio STF, na medida em que, nos termos do Relatório da Repercussão Geral elaborado pelo gabinete da Presidência do Supremo Tribunal Federal, assim foi definida aludida finalidade:
“Delimitar a competência do STF, no julgamento de recursos extraordinários, às questões constitucionais com relevância social, política, econômica ou jurídica, que transcendam os interesses subjetivos da causa. Uniformizar a interpretação constitucional, sem exigir que o STF decida múltiplos casos idênticos sobre a mesma questão constitucional.”[18]
3.4. Vigência
A Emenda Constitucional 45/2004, que incluiu o parágrafo 3º no artigo 102 da Constituição, entrou em vigor em 31.12.2004. Regulamentando aludido dispositivo, em 18.2.2007 entrou em vigor a Lei 11.418/2006.
Todavia, apesar da previsão constitucional e da regulamentação legal, a preliminar formal da repercussão geral passou a ser exigida nos recursos extraordinários tão somente a partir de 3.5.2007, data da entrada em vigor da Emenda Regimental nº 21/2007 ao Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal (RISTF), que estabeleceu as normas necessárias à execução das disposições legais (Artigos 543-A e 543-B do Código de Processo Civil) e constitucionais (Artigo 102, parágrafo 3º, da Constituição).
Restou ainda determinado, por meio das questões de ordem suscitadas nos AI 715.423 e RE 540.410, que os “recursos extraordinários e respectivos agravos de instrumento anteriores e posteriores a 3.5.2007, quando múltiplos, sujeitam-se a sobrestamento, retratação e reconhecimento de prejuízo sempre que versarem sobre temas com repercussão geral reconhecida pelo STF. Os que estiverem pendentes no STF poderão também ser devolvidos à origem”[19].
3.5. Efeitos da repercussão geral na distribuição dos recursos extraordinários
Se antes do advento da Emenda Constitucional 45/2004, uma vez cumpridos os requisitos de admissibilidade, o Supremo Tribunal Federal era obrigado a analisar todos os recursos extraordinários interpostos, após a Emenda essa situação mudou.
Com a inserção do parágrafo 3º no artigo 102 da Constituição, nem todos os recursos interpostos serão analisados pelo STF. Por exemplo, no caso dos recursos extraordinários múltiplos, ou seja, aquele em que discute a mesma matéria, o tribunal de origem selecionará cerca de três recursos representativos da matéria e os encaminhará ao STF para análise da repercussão geral. Os demais recursos restarão sobrestados sem a necessidade de realização do juízo prévio de admissibilidade. O STF selecionará um dos recursos, leading case, e, se decidir pela inexistência da repercussão geral, os recursos sobrestados serão considerados não admitidos.
Por outro lado, uma vez reconhecida a repercussão, os recursos sobrestados deverão aguardar a solução do mérito. A partir desta, são duas as possibilidades: i) se o acórdão de origem estiver de acordo com a decisão do STF, consideram-se prejudicados os recursos extraordinários anteriores e posteriores; ii) se o acórdão de origem for contrário à decisão proferida pelo STF, os recursos extraordinários serão remetidos ao Tribunal de origem para retratação.
Apesar do pouco tempo decorrido desde a implementação do mecanismo da repercussão geral, é sensível a redução do volume de recursos extraordinários distribuídos no STF. Em 2006 foram distribuídos 54.575 recursos e, a partir de 2007, verifica-se que esse número diminuiu na seguinte proporção: 49.708 em 2007; 21.531 em 2008; 8.348 em 2009 e 3.134 em 2010 (até 30 de junho), tal como representado na tabela[20] a seguir:
Ano |
Total Processos Distribuídos |
RE distribuídos |
% RE/Relação Proc.distribuídos |
1990 |
16.226 |
10.780 |
66,4 |
1991 |
17.567 |
10.518 |
59,9 |
1992 |
26.325 |
16.874 |
64,1 |
1993 |
23.525 |
12.281 |
52,2 |
1994 |
25.868 |
14.984 |
57,9 |
1995 |
25.385 |
11.195 |
44,1 |
1996 |
23.883 |
9.265 |
38,8 |
1997 |
34.289 |
14.841 |
43,3 |
1998 |
50.273 |
50.595 |
41 |
Ano |
Total Processos Distribuídos |
RE distribuídos |
% RE/Relação Proc.distribuídos |
1999 |
54.437 |
22.280 |
40,9 |
2000 |
90.839 |
29.196 |
32,1 |
2001 |
89.574 |
34.728 |
38,8 |
2002 |
87.313 |
34.719 |
39,8 |
2003 |
109.965 |
44.478 |
40,4 |
2004 |
69.171 |
26.540 |
38,4 |
2005 |
79.577 |
29.483 |
37 |
2006 |
116.216 |
54.575 |
47 |
2007 |
112.938 |
49.708 |
44 |
2008 |
66.873 |
21.531 |
32,2 |
2009 |
42.729 |
8.348 |
19,5 |
2010 |
18.975 |
3.134 |
16,5 |
Muitos podem discordar desse novo mecanismo de filtragem sob as mais diversas alegações – que ele impede o acesso ao Poder Judiciário, que a pacificação dos conflitos individuais não tem mais acesso a todas as esferas do Poder Judiciário ou, ainda, que em prol da coletividade a função de guardião da Constituição estaria comprometida quando afastada a análise de uma inconstitucionalidade legal face à inexistência de repercussão geral – todavia, não se pode negar que a sobrecarga do STF pode ser ainda mais prejudicial à evolução do sistema jurídico pátrio, quem sabe para a formação de um verdadeiro Tribunal Constitucional.
- 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Inicialmente traçamos um breve histórico da origem do sistema de controle de constitucionalidade no Brasil. Verificou-se que, por influência do sistema norte-americano, em 1891, introduziu-se no sistema jurídico pátrio o controle difuso de constitucionalidade.
A partir da Constituição de 1891, qualquer juiz ou tribunal poderia analisar uma questão de ordem constitucional, desde que suscitada pelo indivíduo no curso de uma demanda judicial. Nesse cenário, o recurso extraordinário tornou-se um importante instrumento da jurisdição constitucional, pois permitia que a mesma questão fosse submetida, em última instância, à apreciação do Supremo Tribunal Federal, guardião da Constituição.
Dessa forma, uma vez preenchidos os requisitos de admissibilidade do recurso extraordinário, o Supremo Tribunal Federal era compelido a analisar toda e qualquer questão de violação de um preceito constitucional. Embora democrática, essa possibilidade aliada às demais competências da Suprema Corte acarretou na sua sobrecarga.
Assim, como forma de limitar o volume de processos distribuídos perante o Supremo Tribunal Federal, foram criados filtros, sendo o mais recente o da repercussão geral.
Como já visto, não se pode negar que até o presente momento o novo instituto tem de fato reduzido o número de recursos extraordinários submetidos à apreciação do Supremo Tribunal Federal.
A despeito das diversas discussões que pairam sobre o tema, chamamos a atenção, nesse momento, para a questão da previsão legal do instrumento e sua respectiva regulamentação.
Como pudemos observar, a repercussão geral, está prevista no §3º, do artigo 102 da Constituição. A regulamentação parcial do instituto se deu pela inserção de dispositivos ao Código de Processo Civil, artigos 543-A e 543-B. Parcial porque a parte que diz respeito ao procedimento e processamento do instituto perante a Suprema Corte, bem como os reflexos daqueles nos tribunais locais foi disciplinada no Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal.
Uma vez que o requisito da repercussão geral abrange todos os recursos extraordinários, independentemente da natureza da causa ou da questão discutida, ele deverá, inclusive, ser observado nas causas de natureza criminal[21].
Em que pese o v. entendimento do Supremo Tribunal Federal, acreditamos que a matéria não foi convenientemente regulamentada. Não apenas em relação à abrangência do recurso extraordinário, mas principalmente por sua própria natureza.
O próprio STF reconheceu que
“O recurso extraordinário e recurso especial são institutos de direito processual constitucional. Trata-se de modalidades excepcionais de impugnação recursal, com domínios temáticos próprios que lhes foram constitucionalmente reservados.”[22]
“Ao recurso extraordinário, reservou-se, em sua precípua função jurídico-processual, a defesa objetiva da norma constitucional, cabendo, ao Supremo Tribunal Federal, nesse contexto, a guarda e a proteção da intangibilidade da ordem jurídica formalmente plasmada na Constituição da República. (...)”[23]
Sobre processo constitucional, José Alfredo Baracho, esclare que:
“A exigência do Processo Constitucional surge como elemento da estrutura de um ordenamento jurídico complexo, no qual é indispensável o constante controle da conformidade da norma ordinária com a Carta Constitucional. É preciso que o remédio possa ser concebido e delineado em um enquadramento instrumental que o aceito com princípio geral.(...)
O Processo Constitucional move-se em abstrato, não para regular um direito, mas sim estabelecer a legitimidade de uma lei, fonte mesma do direito. Não fixa uma situação constitutiva, não realiza uma composição jurídica, comum às sentenças do juízo ordinário, mas limita-se a verificar a conformidade de uma norma vigente com a Constituição.”[24]
Dessa forma, por ser de natureza eminentemente processual constitucional, não nos parece adequado que o recurso extraordinário seja disciplinado pelo Código de Processo Civil, mas sim por um Código de Processo Constitucional.
Se hoje o recurso extraordinário encontra-se previsto na Constituição e sua regulamentação dividida entre o Código de Processo Civil e Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, com o advento do Código de Processo Constitucional toda a regulamentação da matéria seria compilada num mesmo instrumento.
Talvez a elaboração de um Código de Processo Constitucional esteja um tanto distante da nossa realidade, entretanto, pretendeu-se, por hora, destacar a necessidade de uma melhor disciplina da matéria para melhor eficácia do próprio instrumento de garantia da ordem constitucional, no caso, do recurso extraordinário.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BARACHO, José Alfredo de Oliveira. Processo constitucional. Rio de Janeiro: Forense, 1984.
BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 9ª ed. São Paulo: Malheiros, 2000.
CANOTILHO, José Joaquim Gomes Canotilho. Direito Constitucional. 4ª ed. Coimbra: Almedina.
MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Recurso extraordinário e Recurso Especial. 5 ed. ver.atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998. In TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006.
MEIRELLES, Hely Lopes. Mandado de segurança. 26ª ed. São Paulo: Malheiros, 2003.
PALU, Oswaldo Luiz. Controle de constitucionalidade: conceitos, sistemas e efeitos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999.
SANTOS, Aloysio Vilarino dos Santos. A defesa da Constituição como defesa do Estado. São Paulo: RCS, 2007.
SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. 32ª ed. ver e atual.. São Paulo: Malheiros, 2009.
TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006.
VIEIRA, Oscar Vilhena. Supremo Tribunal Federal – Jurisprudência política. 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 2002.
[1] PALU, Oswaldo Luiz. Controle de constitucionalidade: conceitos, sistemas e efeitos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999.
[2] Teixeira, José Horácio Meirelles. Curso de Direito Constitucional. Texto revisto e atualizado por Maria Garcia. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1991.
[3] Sobre a introdução de elementos do controle concentrado no controle de constitucionalidade brasileiro, José Afonso da Silva leciona: “A Constituição de 1934, mantendo as regras do critério difuso em seu art. 76, a e b, trouxe três inovações importantes: a ação direta de inconstitucionalidade interventiva (art. 7º, I, a e b), a regra de que só por maioria absoluta de votos dos seus membros os tribunais poderiam declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato do Poder Público (art. 179) e a atribuição ao Senado Federal de competência para suspender a execução, no todo ou em parte, de lei ou ato declarado inconstitucional em decisão definitiva. Essas três inovações se incorporaram definitivamente no Direito Constitucional brasileiro. Sob a Constituição de 1946 foram introduzidas duas outras novidades por meio da EC 16, de 6.12.65, que criou uma nova modalidade de ação direta de inconstitucionalidade, de caráter genérico, ao atribuir competência ao Supremo Tribunal Federal para processar e julgar originariamente a representação de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, federal ou estadual, apresentada pelo Procurador-Geral da República (art. 2º, k), e estatuiu que a lei poderia estabelecer processo, de competência originária do Tribunal de Justiça, para declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato municipal, em conflito com a constituição estadual (art.19). Esta última inovação não prosperou tal como previsto, mas a Constituição de 1969 instituiu a ação direta interventiva para defesa de princípios da constituição estadual, promovida pelo Chefe do Ministério Público do Estado e de competência do Tribunal de Justiça (art. 15, §3º, d). A Constituição de 1988 introduziu mais duas novidades: previu a inconstitucionalidade por omissão (art. 103,§2º) e ampliou a legitimação para a propositura da ação direta de inconstitucionalidade, por ação ou omissão (art. 103).(...) Outra novidade veio com a EC3, de 17.3.93: a ação declaratória de constitucionalidade, (...). Em suma, à vista da Constituição vigente temos a inconstitucionalidade por ação ou omissão, e o controle de constitucionalidade é o jurisdicional, combinando com os critérios difuso e concentrado, este de competência do Supremo Tribunal Federal. Portanto, temos o exercício do controle por via de exceção e por ação direta de inconstitucionalidade e ainda a referida ação declaratória de constitucionalidade.(...) (SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo.32ª ed. ver e atual.. São Paulo: Malheiros, 2009.
[4] Sobre Constituições rígidas esclarece Canotilho: “A opção por um “texto rígido”, no sentido assinalado, é hoje justificado pela necessidade de se garantir a identidade da constituição sem impedir o desenvolvimento constitucional. Rigidez é sonónimo de garantia contra mudanças constantes, freqüentes e imprevistas ao sabor das maiorias legislativas transitórias. A rigidez não é um entrave ao desenvolvimento constitucional, pois a constituição deve poder ser revista sempre que a sua capacidade reflexiva para captar a realidade constitucional se mostre insuficiente.” CANOTILHO, José Joaquim Gomes Canotilho. Direito Constitucional. 4ª ed. Coimbra: Almedina, p.215.
[5] BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 9ª ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p.294 e 295.
[6] SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. 32ª ed. ver e atual.. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 78 e 79.
[7] BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 9ª ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p.294 e 295.
[8] Decreto 848, art. 9º, parágrafo único, alíneas a e b: “ Parágrafo único. Haverá também recurso para o Supremo Tribunal Federal das sentenças definitivas proferidas pelos tribunais e juízes dos Estados: a) quando a decisão houver sido contrária à validade de um contrato ou convenção, à aplicabilidade de uma lei do Congresso Federal, finalmente, à legitimidade do exercício de qualquer autoridade que haja do obrado em nome da União – qualquer que seja a alçada; b) quando a validade de uma lei ou ato de qualquer Estado seja posta em questão como contrária à Constituição, aos tratados e às leis federais e a decisão tenha sido em favor da lei ou ato.”
[9] Salienta Oscar Vilhena que houve um aperfeiçoamento do sistema de controle de constitucionalidade. Esclarece ele que a Constituição de 1934 “(...) Manteve o sistema de controle difuso criado em 1890, atribuindo ao Senado Federal a competência de “suspender a execução, no todo ou em parte, de qualquer lei ou ato, deliberação ou regulamento, quando hajam sido declarados inconstitucionais pelo Poder Judiciário” (art 91, IV, Constituição de 1934). A partir desse dispositivo as declarações de inconstitucionalidade proferidas pelo Supremo Tribunal Federal não mais veiculariam apenas as partes no processo, pois deveriam ser informadas ao Senado que suspenderia a execução da lei inconstitucional, afetando a toda a sociedade. Deste modo o tribunal não seria obrigado a retornar a uma mesma questão jurídica, toda vez que ela surgisse em um novo processo. Fato esse que não ocorre nos Estados Unidos em função do princípio do stare decisis, pelo qual os Tribunais ficam vinculados pela decisão da Suprema Corte. Essa disposição é, portanto, extremamente relevante, na medida em que faz do Suprem um autêntico legislador negativo, ainda que auxiliado pelo Senado Federal.” VIEIRA, Oscar Vilhena. Supremo Tribunal Federal – Jurisprudência política. 2ª ed. São Paulo: Malheiros. 2002, p.120.
[10] Art. 101, III, da Constituição de 1937: “a) quando a decisão for contra a letra de tratado ou lei federal, sobre cuja aplicação se haja questionado; b) quando se questionar sobre a vigência ou validade de lei federal em face da Constituição, e a decisão do tribunal local negar aplicação à lei impugnada; c) quando contestar a validade de lei ou ato dos governos locais em face da Constituição, ou lei federal, e a decisão Fo tribunal local julgar válida a lei ou ato impugnado; d) quando decisões definitivas dos Tribunais de Apelação de estados diferentes, inclusive do Distrito Federal ou dos territórios, ou decisões definitivas de um destes Tribunais e do Supremo Tribunal Federal derem à mesma lei federal inteligência diversa.
[11] Art. 101, III, da Constituição de 1946: “a) quando a decisão for contrária a dispositivo desta Constituição ou letra de tratado ou lei federal; b) quando se questionar sobre a validade de lei federal em face desta Constituição, e a decisão recorrida negar aplicação à lei impugnada; c) quando se contestar a validade lei ou ato do governo local em face desta Constituição ou de lei federal e a decisão recorrida julgar válida a lei ou o ato; d) quando na decisão recorrida a interpretação da lei federal invocada for diversa da que lhe haja dado qualquer dos outros tribunais ou o próprio Supremo Tribunal Federal;”
[12] Art. 105, III, da Constituição de 1988: “Compete ao Superior Tribunal de Justiça: III- julgar, em recurso especial, as causa decididas, em única ou última instância, pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando a decisão recorrida: a) contrariar tratado ou lei federal, ou negar-lhes vigência; b) julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face de lei federal; c) der a lei federal interpretação divergente da que lhe haja atribuído outro tribunal. “
[13] MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Recurso extraordinário e Recurso Especial. 5 ed. ver.atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998. In TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 300.
[14] TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 301.
[15] “Art. 102, §3º: No recurso extraordinário o recorrente deverá demonstrar a repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso, nos termos da lei, a fim de que o Tribunal examine a admissão do recurso, somente podendo recusá-lo pela manifestação de dois terços de seus membros.”
[16] BASTOS, Celso Ribeiro. Hermenêutica e interpretação constitucional. 3ª ed. São Paulo: Celso Bastos, 2002, p. 111.
[17] Idem. op cit. p. 111
[18]Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verTexto.asp?servico=jurisprudenciaRepercussaoGeralRelatorio, acesso em 20.7.2010.
[19] Relatório da Repercussão Geral, p. 5. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verTexto.asp?servico=jurisprudenciaRepercussaoGeralRelatorio, acesso em 22.7.2010.
[20] Dados atualizados até 30/6/2010. Fonte: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verTexto.asp?servico=estatistica&pagina=REAIProcessoDistribuido
[21] Ao ser questionado sobre o assunto, o Plenário do Supremo Tribunal Federal entendeu que:
“1. O requisito constitucional da repercussão geral (CF, art. 102, §3º, red. EC 45/2004), com a regulamentação da L. 11.418/06 e as normas regimentais necessárias à sua execução, aplica-se aos recursos extraordinários em geral, e, em conseqüência, às causas criminais. (...). 4.Não tem maior relevo a circunstância de a Lei 11.418/06, que regulamentou esse dispositivo, ter alterado apenas o texto do Código de Processo Civil, tendo em vista o caráter geral das normas nele inseridas.(...)” Supremo Tribunal Federal, Questão de Ordem no Agravo de Instrumento 664567-2/RS. Tribunal Pleno. Ministro Relator Sepúlveda Pertence. Julgamento em 18.6.2007, DJ em 6.9.2007.
[22] Supremo Tribunal Federal. Agravo Regimental no Recurso Extraordinário 507.939-2/PR. Segunda Turma. Relator Ministro Celso de Mello. Julgamento em 13.3.2007, DJ em 22.6.2007.
[23] Supremo Tribunal Federal. Agravo Regimental no Recurso Extraordinário 245214-9/SP. Segunda Turma. Relator Ministro Celso de Mello. Julgamento em 23.11.2009, DJ em 5.5.2000.
[24] BARACHO, José Alfredo de Oliveira. Processo constitucional. Rio de Janeiro: Forense, 1984, p. 347.