Rastreabilidade: produtos de origem animal, do campo à mesa (Parte II)

Por Romão Miranda Vidal | 01/03/2010 | Sociedade

Rastreabilidade: produtos de origem animal, do campo à mesa (Parte II)

No artigo anterior falamos da importância relacionada com a contaminação dos alimentos de origem animal, que muitas vezes ocorre, mesmo com Protocolos pré-estabelecidos, devidamente submetidos a Sistemas de Rastreabilidade. Enquanto na propriedade, quando tal vem a acontecer, podem ficar comprometidos e comprometer a saúde humana. Devido a má manipulação e ou conservados indevidamente, possibilitando o aparecimento de surtos de doenças entéricas, nervosas ou intoxicantes. Vimos também que o surgimento de novos processos de abastecer as populações com o fabrico e produção de alimentos em escala comercial, pode afetar de forma direta toda uma nação e um povo, deixando em situação precária a SEGURANÇA ALIMENTAR. E por fim vimos que uma das grandes ferramentas a serem utilizadas na conservação dos alimentos, e que age de forma positiva na eliminação de patógenos, seria o uso da RADIAÇÃO IONIZANTE dos alimentos.

Bueno! Vamos então para os assuntos que ainda nos chamam a atenção e quer queiram ou não, estão embutidos na RASTREABILIDADE. Referimo-nos ao uso indiscriminado de ANTIBIÓTICOS. Quem não se lembra dos "cases" do uso errôneo e criminoso das Tetraciclinas, do famoso NF-180, que foram comercializados como banana nas esquinas ou nas feiras? Hoje o mundo exige que o alimento a ser ofertado se apresente isento de medicamentos que possam interferir ou causar resistências, assim como exige que se coloque de forma direta e prática todas as informações a respeito das terapias medicamentosas utilizadas para um animal enfermo, fato este crível pela adoção da RASTREABILIDADE.

Hoje é sabido que estamos enfrentando situações nunca antes pensadas. Estamos nos defrontando com situações cada vez maiores de resistência de vários microrganismos a uma série de antibióticos, o que tem exigido esforços enormes na busca de novos medicamentos. E tal situação pode ser creditada não só pelo uso irresponsável pelo ser humano, como também pela Medicina Veterinária e, pior ainda, por criadores que se valem das facilidades nas aquisições de antibióticos polivalentes, e os usam sem a devida prescrição médica veterinária. No ser humano os casos citados de resistência a determinadas espécies variantes de Stafilos é gritante. Comprovadamente o Staphilococcus aureus é um dos que mais se destacam. Na microbiologia aprofundada no estudo dos estafilococos, pode-se notar que eles apresentam uma produção elevada de exotoxina, que é termoresistente e que pode se fazer presente em alimentos, quando indevidamente manipulados. Pior ainda, os tratamentos convencionais de antibioterapia têm-se mostrado incapazes até o momento de resolver a contento estas situações. E agravam-se ainda mais quando se têm noticias da resistência de algumas bactérias em condições desfavoráveis, como alteração do pH, alterações de temperaturas (choque térmico), e que por conseqüência apresentam maior virulência, em função das mutações genéticas que desenvolvem.

E surge então a grande pergunta: O QUE FAZER?

Não somos fanáticos pela RASTREABILIDADE, mas podemos afirmar sem medo de errar que através da RASTREABILIDADE, pode-se monitorar e antecipar todos os procedimentos que venham a implicar uma situação de uso indevido e irresponsável do uso de antibióticos, facilitando com isto o diagnóstico e o acompanhamento clínico pelo Médico, quando necessário, é lógico. Mas ainda não respondemos totalmente a questão. Voltamos a destacar a necessidade da adoção da RASTREABILIDADE na produção dos alimentos, do pasto ao prato, exigindo um monitoramento constante e responsável, chegando-se a exaustão de todos os fatores de risco que possam comprometer os alimentos e a saúde humana. E uma delas deverá ser futuramente a adoção da RADIAÇÃO IONIZANTE DE ALIMENTOS, desde que devidamente submetidos a um SISTEMA DE RASTREABILIDADE.

Por que esta afirmação? Simples. Em se tratando de alimentos de origem animal (falo da minha competência, não falo de origem vegetal), é uma irresponsabilidade afirmar que existe um elemento denominador como risco zero, no atual momento. Não menos importante, o mundo também convive com um elemento que pouca importância se deu até o momento presente, que são os efeitos deletérios (haja língua vernácula) das micotoxinas, tão presentes no dia-a-dia do Médico(a) Veterinário(a), mas que pouco ou quase nada se sabe e se aplica na Medicina Humana. Sabidamente para a Medicina Veterinária convivemos com este assunto, assim como sabemos dos efeitos que se potencializam na sua acumulutividade que resultam no agravamento de muitas doenças, em especial as de origem neoplásicas relacionadas com o fígado. Vem daí a importância para o Médico(a) Veterinário(a) que opera sistemas de produções, em que o uso de grãos na alimentação dos animais são uma constante, em exigir exames que informem a não presença de micotoxinas. Como e por quê? Resposta: RASTREABILIDADE e RESPONSABILIDADE PROFISSIONAL.

O BRASIL de dimensões enormes convive, igualmente, com um grave problema de ordem sanitária, que aos poucos deverá ser erradicado, mediante a aplicação da RASTREABILIDADE SANITÁRIA. Especificamente são as patologias que ainda carecem de uma política sanitária mais agressiva e coerente. Falamos da Tuberculose e da Brucelose Bovina. Com a implantação da RASTREABILIDADE SANITÁRIA, um dos segmentos de todo o complexo RASTREABILIDADE, pode-se ver uma luz no final do túnel. Pois é sabido que em especial a BRUCELOSE é causa e efeito de muitos quadros patológicos não somente no que se refere aos animais, mas também com repercussão gravíssima na saúde humana. A Comunidade Européia, com toda a empáfia que lhe é peculiar (em exigir dos outros países que lhe forneçam alimentos de origem animal com uma política rigorosíssima em relação a BRUCELOSE e a TUBERCULOSE), não divulga para ninguém que em Portugal são acima de 2.000 casos comprovados de BRUCELOSE HUMANA.

Encerrando esta nossa abordagem, vamos nos ater então em dois assuntos.

1. CONSUMIDOR EDUCADO, CONSUMIDOR PROTEGIDO. Sabe-se que os quadros de toxi-infecções alimentares são resultantes da falta de informação de uma parcela significativa de consumidores que não têm a devida educação informativa, de como proceder com os alimentos de Origem Animal, após tê-lo adquirido. Não existe uma política sócio-educativa que venha sanar esta lacuna. Não irá adiantar em nada um produto de Origem Animal ser submetido a RASTREABILIDADE, IRRADIAÇÃO, INSPEÇÃO, MANIPULAÇÃO e ARMAZENAMENTO corretos, se o Consumidor não tomar as devidas precauções inerentes e exigíveis, até chegar ao prato.

2. O BRASIL ainda não se acostumou com o binômio: PRÊÇO/QUALIDADE. Vai daí que estamos diante de uma situação um tanto esquisita. O perfil do consumidor brasileiro em termos de alimentos deixa muito a desejar. Primeiro porque vivemos em um mundo de subconsumo, devido a vários motivos, e não nos resta outra saída se não aquela de se adquirir o alimento de cada dia pelo preço compatível com o dinheiro que se tem de momento, isto sem falar na diferença escandalosa das camadas sociais, ou seja, quanto mais baixa for esta classificação, menor será a QUALIDADE e SEGURANÇA ALIMENTAR (exemplo da criança no lixão). E justamente neste patamar, em que as intoxicações alimentares ocorrem com maior freqüência.


3. Qual é a Política de SEGURANÇA ALIMENTAR, de RASTREABILIDADE, de INSPEÇÃO DE PRODUTOS DE ORIGEM ANIMAL? De nada irá adiantar campanhas políticas e seus programas alimentícios, da mesma forma que não adianta em nada sermos "top de linha" em produção de alimentos, se não forem ouvidas as personagens deste estranho e triste enredo. Os pesquisadores das Universidades e dos Centros de Pesquisas e os consumidores, em especial os de menor poder aquisitivo, que sempre que lhe é permitido, quando o é, tentam levar algum alimento para casa, ainda que de baixa qualidade, são os principais elementos a serem ouvidos e atendidos.

4. Todos os esforços na produção de alimentos, na sua transformação, processamento, manipulação, armazenagem, distribuição, e até chegar ao prato do consumidor, serão jogados no ralo comum, se não forem adotadas políticas sérias de RASTREBILIDADE, SEGURANÇA ALIMENTAR e INSPEÇÃO DE PRODUTOS DE ORIGEM ANIMAL, estribadas no conhecimento científico oriundo, repito, dos Pesquisadores das Universidades e dos Centros de Pesquisas.

Por favor, não confundam Identificação Animal com RASTREABILIDADE.