Queria ser uma pássaro
Por cláudia juliana ochs maciel | 05/07/2010 | ContosNa minha vida nada deu certo. Quis ser engenheiro, mas virei pedreiro. Quis Eva, mas foi com Joaquina que casei. Quis mudar de vida e acabei por ter mais filhos. Quis um cavalo, mas achei uma mula. Quis alimentar minha família e mais uma vez decepcionei. Quis mesmo foi ser feliz.
Naquele dia, ao acordar, percebi que só me restava um caminho, o de voar. Com isso minha família ganharia num dia, o que eu não conseguiria durante alguns anos, por que um dos maiores sacrifícios que concretizei foi o de obter meu seguro de vida.
Joaquina preparou meu café com o olhar triste, pensante, deveria estar concentrando-se para me falar que não havia uma "quentinha" naquele dia. Mas ela se esqueceu naquela hora, bendito minuto, e eu a abracei forte e lhe disse o quanto a amava. Dei um beijo em Mariazinha, José e Pedro enquanto sonhavam, e fiz uma oração para que estivessem com coisas boas em suas cabecinhas. Como foi dolorido deixá-los. Até da Cinderela, minha mula, eu me despedi, e revelei apenas para ela o meu segredo.
Ao caminho da construção a dor fluía por meus pensamentos. Será que estava fazendo a coisa certa? Todos os meus colegas desanimados como eu, pediam para eu cantar aquela música, mas eu já não tinha ânimo. Subi, subi, subi, até chegar à superfície mais alta do prédio, onde com certeza morariam pessoas felizes e realizadas, o que me dava certa inveja. Lá de cima olhei pela última vez o horizonte e aquela cidade que tanto me fizera sofrer. Mas foi quando vi os pássaros voando livres e belos que tive o intuito maior, que me consumiu até o fundo da alma, eu voei. E enquanto voava observava os pássaros cada vez mais longínquos e pensei em tudo que não fui.
Já no chão, pessoas passavam e olhavam rapidamente, com uma mistura de medo e pena. Algumas se quer davam importância. Os carros, aos montes, buzinavam, como seu eu ainda possuísse vida para me levantar e liberar a passagem. E aqueles pássaros me observavam tristonhos, como se eu fosse um filhote que não aprenderá a voar.