Quebra do roteiro
Por Milena de Araújo Salmazo | 02/07/2013 | Sociedade
Quebra do roteiro
Um mero aperto de botão no controle remoto e logo já se ingressa na audiência à ‘vida midiática’. Passa-se a pouco espaço dos olhos fatigados o que a vários quilômetros, ou, muitas vezes, nem tão distante, ocorre na denominada realidade. Que, para alguns ora pelo distanciamento produzido pelo status - bem atual tão almejado - ora pelo comodismo, esquecem que dela fazem parte. Os protagonistas são inúmeros que, diferentemente de romances utópicos, mesclam-se vilões, heróis e dublês. E no roteiro, é irrefutável que há a tentativa de fazê-lo por inteiro bom, sem ‘quebras’. Mas, como dito anteriormente, nosso espaço é a realidade.
Como ocorrido no capítulo de 1929, com um renomado e tão influente ator global, os Estados Unidos, com o ‘crack’ da Bolsa de Valores de Nova York, as ações das grandes empresas sofreram uma queda vertiginosa. Que, no panorama brasileiro, sua atuação se deu por grande parte do volumoso estoque de café produzido no Brasil ter ficado sem mercado consumidor. Assim, não se conseguiu conter o desastre econômico que abalou a classe cafeicultora, e por consequência as próprias estruturas políticas da República Velha, abriu caminho, então, para a Revolução de 1930, que levou Getúlio Vargas ao poder.
Ao continuar com o cenário brasileiro, percebemos que o ‘crack’, ainda é um capítulo muito discutido, mas muda o elenco, agora, para mauricinhos, favelados, traficantes, classe média, ou seja, um grupo heterogêneo de atores que encontraram sua ‘pedra no caminho’. Tal droga não escolhe classe, cor, nacionalidade em que vai atuar, mas muda completamente o final, caso o ator não tenha em seu curso cênico desenvolvido as técnicas de força de vontade.
Há também um ‘jeitinho brasileiro’ em relação a isso, afinal, somos campeões do Carnaval, do futebol, da violência, das filas e, também, dos programas sociais e das bolsas. Temos Bolsa Família, Bolsa Escola, Auxílio Reclusão (Bolsa Preso), Bolsa Remédio, Fome Zero... E, agora, Bolsa crack, carinhosamente apelidada de ‘Cartão Recomeço’ que, de acordo com o roteiro, vai pagar R$ 1.350,00 por mês para custear o tratamento do dependente para as famílias que têm viciados em casa.
Recomeço ou retrocesso?! Nessa peça, cautela é a palavra-chave, tal programa já passa em Minas Gerais, com o nome de Aliança pela Vida, pagando módicos R$ 900,00 por mês. Se por um lado tal capítulo da bolsa pode ajudar no roteiro de dependentes, isso não é regra, pois por outro não é completo por não reinseri-los nos palcos da vida além do aumento proporcional do desânimo por parte dos cidadãos pagadores de impostos em relação as ‘medidas remendos’ tomadas, os quais estão à espera de uma ‘bolsa cidadão comum’, ou até ‘bolsa desânimo’ por conta disso.
Enfim, a opção de remediar com a criação de bolsas, é como pegar o papel da peça que foi amassado e tentar renová-lo, inegável que continuará com dobras e irá divergir do resultado de ter acompanhado o desenrolar da peça, e até, evitado o motivo de tal atitude perante a folha amassada. Contudo, a peça já estará ‘desatualizada’ de certo modo, assim como os dependentes, pois - reforço - é preciso, também, além de tratamento, ajudá-los a voltar atuar na sociedade, senão o risco de recaída é alto. Sem contar que é necessária uma força de vontade imensurável para abandonar tais vícios, encontrada apenas em raros atores.
Do ponto de vista paliativo, a medida é realmente válida; não é ‘estreia’ de o governo arcar com os custos de serviços particulares para suprir a falta de recursos públicos. Porém, contanto que o "Bolsa Crack" seja apenas um dos primeiros passos, talvez uma medida de contenção ajude em alguma coisa. Incorro na repetição de que o dinheiro deveria ser deslocado, principalmente, para o combate ao tráfico, a prevenção ao uso e ao apoio social dos usuários.
Milena de Araújo Salmazo
2º semestre do Curso de Direito - UFMS - Três Lagoas - MS