PUNIBILIDADE E PSICOPATIA
Por Ana Paula Cortes Dias Teodoro Guerino | 17/07/2019 | DireitoPUNIBILIDAE X PSICOPATIA
O tema abordado no presente artigo, refere-se à necessidade categórica e urgente de política criminal específica para criminosos diagnosticados como psicopatas.
Trar-se-á em foco a alta possibilidade de reincidência bem como a impossibilidade de recuperação do criminoso psicopata, demonstrando obsoletas as estratégias e diretrizes definidas pela Política Criminal atualmente vigente no ordenamento jurídico.
Entretanto, exclui-se do escopo do tema aspecto referente ao aprofundamento sobre a personalidade psicopática, bem como análise de casos específicos, salvo alguns exemplos com o intuito de contextualizar as premissas relacionadas neste trabalho.
Diante de um cenário com alto índice de crimes violentos e horrendos, onde a sociedade fica à esmo de uma legislação penal arcaica atrelada a uma política criminal deficiente e utópica, a qual colabora para o sentimento de impunidade e desproteção, fundamental evidenciar particularidades inerentes à criminosos que se destacam negativamente sobre os demais pela total falta de empatia e remorso, frieza nas suas atitudes e alto grau de crueldade nos crimes cometidos.
Importante, também, fomentar a discussão acerca da necessidade de uma política criminal específica para crimes cometidos por psicopatas, visto ser tema polêmico diante de lacunas nas ciências psicológica e psiquiátrica quanto ao diagnóstico e tratamento de pessoas que possuem tais características antissociais. Mediante método científico, sendo identificado o criminoso como psicopata e determinada sua periculosidade, o que deve ser feito com aqueles que, na data de encerramento do cumprimento de sua pena, continuarem a representar um perigo concreto para a sociedade?
No ordenamento jurídico vigente não há forma diferenciada de tratamento aos criminosos diagnosticados como psicopatas, a princípio, declarando sua imputabilidade, após o cumprimento da sua pena o mesmo será posto em liberdade, retornando ao convívio social independente do quanto cruel é o indivíduo. Ressaltando que conforme Constituição Federal de 1988 não é permitido prisão perpétua ou de morte, e por sua vez o Código Penal limita o tempo de cumprimento da pena privativa de liberdade à 30 (trinta) anos.
Para que se tenha equilíbrio no convívio social, factível é a proteção dos direitos fundamentais do ser humano, primordialmente o direito à vida e à integridade física e psicológica.
A Criminologia, ciência do ser, busca identificar e entender o crime, criminoso, vítima e controle social. Segundo Nestor Sampaio Penteado Filho, “pode-se conceituar criminologia como a ciência empírica (baseada na observação e experiência) e interdisciplinar que tem por objetivo de análise o crime, a personalidade do autor do comportamento delitivo, da vítima, e o controle social das condutas criminosas. (PENTEADO FILHO, 2012, p. 18)
Destarte, sob a ótica da personalidade dos delinquentes, mais precisamente aqueles que possuem transtornos de personalidade, classificado como psicopatas, não compreendem a pena como um meio de punição e correção, tão pouco estão abertos à mudança de comportamento por entenderem que não agiram errado.
Neste sentido, Odor Ramos Maranhão, no livro Psicologia do Crime tece o seguinte comentário:
“A experiência não é significativa incorporada pelo psicopata (antissocial). O castigo, e mesmo o aprisionamento, não modificam seu comportamento” (MARANHÃO, 1995, p. 88)
Nas palavras do Douto Jorge Trindade, “ são sujeitos que não internalizam a noção de lei, transgressão e culpa. Na realidade, os psicopatas sentem-se ‘além’ das normas, quando, na verdade, são sujeitos ‘fora’ e ‘aquém’ do mundo da cultura. Pensar em psicopatia como uma incapacidade de internalizar valores e uma insujeição à norma aponta menos para uma doença nos moldes médico e psicológico e mais para uma constelação de caráter com precárias condições para realizar aquisições éticas”. (TRINDADE, 2010, p. 47)
Os psicopatas reincidem três vezes mais que os criminosos comuns além de acharem que são imunes a punições de qualquer situação. Nesse sentido analisa-se a falha do sistema penitenciário brasileiro, o qual não possui um procedimento de diagnóstico para os presos que pedem redução de pena, tendo em vista que países que o aplicam têm a reincidência dos criminosos diminuída em dois terços, já que mantém mais psicopatas longe das ruas, como afirma Vasconcelos, (2012). Nesse sentido posiciona-se pelo afastamento do psicopata do convívio social. (disponível em: https://jandermachado.jusbrasil.com.br/artigos/335301163/da-punibilidade-do-psicopata-no-direito-brasileiro)
Por fim, de acordo com Hilda Clotilde Penteado Morana, na tese apresentada em 2003, “A taxa de reincidência criminal é ao redor de três vezes maior para os psicopatas do que para outros criminosos. Sendo que, para crimes violentos, a taxa é de quatro vezes maior para os psicopatas quando são comparados aos não psicopatas”. (Disponível em: www.teses.usp.br/teses/disponiveis/5/5142/tde-14022004.../HildaMorana.pdf)
Ultrajante vislumbrar que o psicopata, contento total consciência dos seus atos, sabedor do que é certo e errado, tanto moralmente quanto juridicamente, cumpra medida de segurança sendo esta aplicável àqueles que são inimputáveis, por ser afastada a culpabilidade dos seus atos. Ao mesmo tempo, temerosa a classificação do acometido por psicopatia como um indivíduo imputável, pois o cumprimento da sua pena será em estabelecimento criminal juntamente com presos “comuns” e por um período limitado de anos, ou seja, voltará para a sociedade.
A prevenção, baseada na proteção da criança contra maus tratos e traumas familiares, vem em auxílio na mitigação de problema futuro. Acompanhamento e tratamento para aqueles que demonstram desvio de personalidade traz à tona a possibilidade, mesmo que reduzida, de recuperação restrita à idade tenra. Passando para a fase adulta, exposta fica a sociedade à crueldade e vasta possibilidade de sofrer com inescrupulosos atos criminosos.
Uma decisão ímpar do poder Judiciário Brasileiro, após manifestação do Ministério Público, com endosso do STF, foi atribuída ao psicopata, mesmo após extinta a punibilidade, o instituto da interdição afim de mantê-lo afastado da sociedade, em tratamento, prevenindo o cometimento de novo crime. Contudo, tal medida é possível atestando que o indivíduo possui doença mental, questionável na ciência psiquiátrica onde aduz que o transtorno de personalidade não constitui doença mental.
Como, constitucionalmente, a competência para legislar sobre matéria penal é privativa da União, fundamental trazer à tona projeto de lei abordando especificamente o tema acerca do tratamento a ser dispensado ao psicopata criminoso, indo além, imperiosa a necessidade de escrever e aprovar políticas criminais a fim de prevenir a sociedade do ataque de psicopatas.
Diante do vasto conteúdo exposto neste trabalho, notório que toda a gama de sanções, alternativas, estudos, medidas, definidos e permitidos não atingem a finalidade para o indivíduo psicopata. Preocupante a morosidade em discutir e assumir que na sociedade há perfis humanos que necessitam de atenção diferenciada, bem como na criação de legislações preventivas com foco específico nos acometidos de transtornos de personalidade.
Assim, apesar da dificuldade em definir a psicopatia e seu grau de gravidade, diante de cenários horrendos moldados por crimes cometidos por psicopatas, importante recorrer à psiquiatria forense aprofundando no estudo destas mentes criminosas, buscando práticas adotadas em outros países, afim de impedir que a sociedade fique vulnerável, à margem de atitudes perversas.
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