Proteção do paciente ou reserva de mercado?

Por Deborah Akemi Terrin | 04/07/2013 | Direito

Aprovado na Câmara e no Senado, e aguardando-se, por ora, a sanção (ou não) da Presidente Dilma Roussef, o projeto de lei nº 268/2002, que dispõe sobre o exercício da medicina, lista, como atos privativos do médico, diagnóstico, prescrição e indicação de cirurgias, e aponta, como atos não exclusivos do médico, aplicação de injeções subcutâneas já prescritas pelo médico e coleta de material para exame laboratorial.

A polêmica sobre esse projeto orbita principalmente em torno de duas questões:

i) para o Conselho Federal de Medicina, ao regulamentar o ato médico, essa lei supostamente traria mais segurança aos pacientes;

ii) para os demais Conselhos das demais profissões do setor da saúde, essa lei seria uma forma de reserva de mercado aos médicos, em detrimento à autonomia de outras profissões da saúde, uma vez que centraria o atendimento no médico e limitaria a função de outros profissionais.

A respeito de, tornando-se lei, esse projeto trazer mais segurança aos pacientes, é preciso observar que, em que pese a validade da regulamentação do ato médico, a segurança do paciente deve ser consequência natural da adequada e elevada formação dos profissionais da Medicina. Em outras palavras, não haverá lei que forneça essa segurança ao paciente enquanto, por exemplo, 54,5% dos formandos em Medicina do Estado de São Paulo reprovarem nas provas de conhecimentos técnicos por acertarem menos de 60% da prova (ou seja, menos de 71 das 120 questões) aplicadas pelo próprio Conselho de Medicina, conforme dados fornecidos pelo próprio Cremesp em seu site: http://www.cremesp.org.br/?siteAcao=Imprensa&acao=sala_imprensa&id=260

Quanto à reserva de mercado aos médicos em detrimento das demais profissões, o conceito de equipes multiprofissionais parece abarcar mais a ideia de segurança procedimental aos pacientes ao não ferir nem hierarquizar a autonomia e a capacidade técnica de cada profissional. Nesse raciocínio, legítimas as reivindicações dos Conselhos de Enfermagem, Psicologia e demais, no sentido de defenderem o direito já regulamentado a esses profissionais de continuar a realizarem procedimentos como diagnósticos de necessidade do paciente (exemplo: identificação de um edema e a prescrição de cuidados básicos), partos normais e aplicação de vacinas sem prescrição médica, a exemplo dos postos de saúde, identificação de sintomas de doenças como depressão e transtornos psicológicos.

Soma-se a essa legitimidade do Cofen, CFP etc, o impacto negativo que esse projeto causaria à população, pois atos praticados todos os dias pela enfermagem, na rede pública de saúde, tais como diagnóstico de doenças como malária, tuberculose e a prescrição de medicamentos para tratá-las (de acordo com protocolos de atendimento do Ministério da Saúde) seriam proibidos.

Dessa forma, se de um lado o projeto em questão regulamenta atos médicos, por outro não pode prejudicar as atividades já regulamentadas de outras profissões, tirando-lhes a autonomia outrora conquistada e, muito menos, lesar o maior interessado disso tudo: o povo, estorvando, ainda mais, o atendimento e o acesso à saúde.

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