PROPOSTA DE UNIFICAÇÃO DOS COMANDOS DAS POLÍCIAS NO ESTADO DE SANTA CATARINA (1998 – 2002) - PARTE CXCIII - “DE ALMA LAVADA E MARES REVOLTOS”.
Por Felipe Genovez | 23/04/2018 | HistóriaData: 18.05.99, horário: 09:10 horas – “A reunião do Conselho”:
Cheguei na reunião do Conselho Superior da Polícia Civil cerca de dez minutos atrasado e para variar constatei que todos tinham sido pontuais, menos eu. Entretanto, no meu caso senti que aquilo por enquanto era um pequeno detalhe, mas na próxima reunião trataria de ser exatamente pontual na próxima convocação. Ao reparar o ambiente constatei que todos os presentes até aquele momento estavam de terno e gravata o que dava uma imagem sobriedade, de seriedade e formalismo, enfim... Mais a seguir, para o meu alívio, chegaram também os Delegados Maurício Eskudlark e Lourival.
O assunto no Conselho era só discutir Lei Complementar 098/93, a Lei Especial de Promoções que mexia com tudo e com todos. Moreto era o maestro e coordenava muito bem os trabalhos demonstrando aquilo que eu já sabia, se apresentava com destreza nas suas atitudes e observações, observava sua presença de espírito e habilidade, uma visão espacial e temporal de todos, sensibilidade, intuição, assimilação, motivação na condução dos trabalhos e, também, jogo de cintura, tolerância, instinto de sobrevivência..., tudo isso temperado por seu jeito simples e seu ar humildade.
E como o assunto era novamente a Lei Especial de Promoções, compreendia com mais profundidade o que ele tinha me dito noutro dia:
“...Tem algumas questões que nós temos que discutir sobre a Lei de Promoções, especialmente, porque nós já temos uma história com essa lei, mesmo porque antes nós não tínhamos nada, inclusive, tu que trabalhastes nela...”.
E agora participando das reuniões do Conselho, vendo muitos daqueles que tanto me criticaram ali discutindo essa mesma legislação, demonstrando vibração com o assunto antes inexistente e ignorado, e fiquei com a sensação de “alma lavada”, mas guardei isso só para mim.
Horário: 11:00 horas, “O revolto Delegado Braga”:
Braga veio até a “sala de reuniões” para me dizer que tinha um tal de Amauri chato na “Assistência Jurídica” que ele não suportava mais e como sabia que eu já estava ao lado tratou de dispensar o sujeito:
(...)
- Rapaz, não aguentava mais esse sujeito, mas que cara chato...!
E vi que realmente que Braga estava passado, era duro para ele ficar longe de “comandos”, fiquei imaginando quem gostava de estar à frente dirigindo, dando ordens, vibrando a cada tomada de decisão importante, emocionar-se com resultado, se fazer ouvir, gritar... e estar distante disso tudo, ter que se controlar e ouvir uma pessoa falando sobre um assuntos banais que não fossem do seu interesse..., e ter que suportar tudo aquilo com cara de “tacho”, realmente deveria ser uma tortura, não merecia aquele destino também, foi colocado num castigo cruel, e logo tratei de satisfazer um pouco a sua curiosidade:
- Estavas lá na reunião do Conselho...?
- Eu não fui...!
- Pois é, acabou agora.
- Deliberaram alguma coisa?
- O assunto foi as promoções, só promoções.
- Ah, é, eu não concordo com o teu entendimento.
- Eu sei, mas é isso aí, mesmo se eu fosse te assessorar como Delegado-Geral diria a mesma coisa.
- Eu sei, mas não concordo com o cancelamento das promoções, se bem que o pessoal fala, fala... e sabe o que vai acontecer, ninguém vai entrar na Justiça.
- Bom se entrarem vai ser pior. porque o processo vai ficar todo emperrado.
- Ninguém vai entrar na Justiça, podes crer, o pessoal reclama, reclama... e acabam não entrando.
- Pois é Braga eu estava falando com o Wilmar lá embaixo e parece que ele está renunciado ao Conselho?
- Ah, é?
- Sim, também está próximo dele se aposentar, até entendo ele.
- Mas eu acho que ele está fazendo isso porque não concorda com a quebra de hierarquia, ele acha que o pessoal tem que ser todo especial.
- Pois é, mas sempre foi assim e nunca ninguém tomou uma medida drástica.
- Eu vou fazer a mesma coisa, vou renunciar, não concordo que delegados que não sejam especiais participem do Conselho, isso é quebra de hierarquia.
- Pois é Braga tu dizes isso agora, mas e quando tu eras Diretor e participavas do Conselho porque não tomastes essa iniciativa?
- Era diferente.
- Não senhor, veja bem o Sala te substituiu, era Delegado de Terceira Entrância e participava das reuniões do Conselho e ninguém disse nada.
- Na época do Ademar todos eram especiais, eu posso não gostar do Ademar, mas reconheço que nisso ele acertou e eu sou testemunha, todos os Diretores eram especiais.
- Espera aí Braga, o Rachadel não era Especial e era o Diretor da Academia, lembra?
- Mas só o Rachadel!
- Ah é? Então tá!
- Eu estou feliz, estou feliz... eu estava falando com um delegado e ele me parabenizou, bem parabenizou primeiro eu, depois..., bom, em segundo lugar ele te mencionou, mas primeiro eu..., de que foi muito importante não ter pedido cargo algum, o pessoal comenta que viu isso com bons olhos.
- Pois é Braga, mas tu sabes, olha onde que eu estou, aqui no mesmo “salão vermelho”, não é?
- Sim, eu sei.
- Fui até convidado para assumir a “Assistência Jurídica”, ali no teu lugar e não aceitei.
- Mas eu estou saindo dali, tu podes ir!
- O quê? Tu sabes que eu não pedi cargo e se fosse para ali seria na mesma situação tua.
- Eu acho que agora eles vão deferir o meu pedido, falei com o Moacir, vão me colocar na “Armas e Munições” eu não gosto daquele serviço ali, não suporto ficar ali.
- No caso do Conselho eu me sinto na obrigação de ajudar a Polícia Civil já que fui eleito, posso até mudar de opinião porque não concordo com muita coisa... Nessa questão de hierarquia tu sabes muito bem que eu abdiquei de qualquer cargo comissionado em razão justamente da situação dos Delegados Especiais.
- A situação dos Especiais é crítica, nunca foram tão desvalorizados, o que o pessoal fala por aí dos especiais é brincadeira, eles acham que eu não faço nada, que o doutor Felipe não faz nada, tu pensas que eles valorizam esse teu serviço aí?
- Olha Braga houve uma época em que eu me preocupava muito com o que os outros pensavam, principalmente no período da Fecapoc, hoje eu vejo que a coisa não é bem assim, deixa eles falarem...
- Felipe alguém tem que começar a cobrar a hierarquia, eu acho que o Wilmar está certo, vou fazer a mesma coisa.
- Pois é Braga, mas será esse o caminho?
- Tem que ser, se não nós vamos ficar a vida toda nos rebaixando.
- Eu respeito esse teu posicionamento, acho que deve ser por aí, é preciso que tenhamos posições firmes a respeito de nossos princípios.
(...)”.
Depois de encerrarmos nossa conversa Braga deixou o local parecendo meio irritado, não sei o que se passava na sua cabeça, parecia que estava irado com tudo a sua volta, nada estava bom, claro que antes e agora... e tinha perdido todas as esperanças na volta triunfal do Heitor Sché.
Acabei lembrando do requerimento que Braga dias atrás dirigiu à presidência do Conselho:
Ilustríssimo Senhor Dr. Evaldo Moretto – DD Presidente do Conselho Superior da Polícia Civil
Lauro Cezar Radke Braga, Delegado de Polícia Especial, membro eleito do Conselho Superior da Polícia Civil, considerando que a hierarquia e a disciplina, além de serem elementos basilares da Instituição Policial Civil, constituem-se em requisitos para uma corporação forte, como ocorre em outros órgãos, tais como a Magistratura, o Ministério Público e a Polícia Militar, em que os cargos de direção superior são ocupados pelos integrantes do último nível da carreira funcional e considerando que muitos cargos de direção superior na Polícia Civil estão sendo ocupados por Delegados de Polícia integrantes das entrâncias inferiores, requer o afastamento provisório deste Egrégio Conselho até o resgate pleno da hierarquia no meio policial civil.
Nestes Termos,
Pede e Espera Deferimento
Florianópolis, 09 de março de 1999
Lauro Cezar Radtke Braga
Delegado de Polícia Especial
(DGPC, protocolado em 09.03.99)
Horário: 16:00 horas - "Wilmar(um)":
No ex-gabinete de Osnelito encontro Wilmar sentado... realmente deve ter tomado posse do local... e ao seu lado agora parece que como aparente e fiel escudeiro tinha Walter sentado ao lado do telefone vermelho... este uma figura congelada no tempo... e pronto para farejar tudo... ouvir... firmar julgamentos... dizer uma coisa numa determinada hora e em seguida dizer outra... e aquele com seus gestos de nobreza... e às vezes mal compreendido... e mais uma vítima:
- E daí...? (Felipe)
- Ôôô doutor... (Wilmar)
- Não fosse a reunião do Conselho? (Felipe)
- Não... (Wilmar)
- Pois é... o pessoal tomou conhecimento para deliberação do teu pedido de renúncia... (Felipe)
- O quê? (Wilmar)
- Bom, deixou eu ser eufemístico... vamos dizer em vez de deliberação, pessoal tomou conhecimento para louvá-lo... (Felipe)
- O quê? (Wilmar)
- Deixa eu ser mais eufemístico..., homenageá-lo... (Felipe)
- Não vai dizer que eles pretendem deliberar... é um direito meu renunciar ao cargo... não pode haver ingerência sobre minha vontade... (Wilmar)
- Eu sei Wilmar...eu sei... e respeito a tua posição... só que é aquilo que eu já te disse ontem... (Felipe)
- Sim... eu sei... (Wilmar)
- Mas a minha mãe deixou um ditado... ‘prudente como a serpente’... (Felipe)
- É... são coisas que a gente não esquece... ((Wilmar)
- Pois é... acho que nós temos um compromisso com nossa instituição..., mas vou pensar... (Felipe)
- Sim, está lá na Assistência Jurídica? (Wilmar)
- Não. Estou no mesmo lugar de sempre... naquele amplo salão... (Felipe)
- Que é todo vermelho... (Walter)
- É... tem um tapete bem grande..., mas eu estou lá por opção... não porque foi compulsório... já no governo passado poderia Ter ido trabalhar em algum lugar... como numa Delegacia de Polícia..., só que não fiz isso porque justamente fui eu quem legislou que a lotação dos Delegados Especiais é na Delegacia Geral e não seria justamente eu quem iria pedir para quebrar a regra... ficaria mal... (Felipe)
- É verdade... (Wilmar)
- Bom, estou subindo... apareça. (Felipe)