PROPOSTA DE UNIFICAÇÃO DOS COMANDOS DAS POLÍCIAS - CRIAÇÃO DA PROCURADORIA-GERAL DE POLÍCIA NO ESTADO DE SANTA CATARINA – GOVERNO ESPERIDIÃO AMIM – 1998/2002 - PARTE LXIV: “CANDEIAS” (Felipe Genovez)
Por Felipe Genovez | 26/03/2018 | HistóriaData: 13.10.98, horário: 12:30 horas, “O Reencontro”:
Já era meia hora e eu estava chegando no Restaurante Candeias atrasado. Mas não estava muito preocupado, pois havia me demorado no Banco do Estado de Santa Catarina - BESC com uma fila enorme. Logo que estacionei percebi que Jorge Xavier já estava no local juntamente com seu filho “Cesinha”. Logo que me viu Jorge veio até a porta para me recepcionar com aquele seu jeito especial e solene de anfitrião, como se estivesse recebendo seus amigos e convidados na sua própria residência. E quando me aproximei certamente que as vibrações aumentaram já que nada mais importante naquela hora contar com amizades puras e verdadeiras. Logo que adentrei o recinto, depois dos cumprimentos como se fôssemos infantes, soou a frase articulada e solene que contrastava com o momento que deveria ser de descontração:
- O Gilmar e o Júlio ainda não chegaram. (Jorge)
- Sim, mas eles vêm?
- Sim. Eu confirmei primeiramente com o próprio Gilmar, de manhã ainda, e depois consegui o telefone da residência do Júlio, a esposa dele disse que ele estava na Assembleia. Telefonei para lá e a Tereza bem baixinho disse que ele não estava lá, aí eu lembrei a ela o nosso compromisso. Ela disse que o Júlio não esqueceu e que estaria no local, mas eu acho que ela falou daquele jeito porque tinha gente por perto, aquele pessoal que nós já conhecemos deveria estar fazendo plantão lá.
- Jorge, eu não te disse que eles já devem estar de saco cheio, não aguentam mais aquele pessoal do Wanderley lá dentro?
- Bom, aquilo é brincadeira, o pessoal fica fazendo plantão lá, eu não sei como é que eles foram permitir uma coisa dessas.
- Mas Jorge, em política é assim mesmo, antes era uma coisa, agora é outra, só que o Júlio não pode de um momento para outro dispensar o pessoal assim, tem que comer cobras e largatos.
Em seguida chegaram Wilmar Domingues, Cláudio e Krieger, quase todos juntos. E logo em seguida apareceu também Garcez sorridente tipo um colegial, em cujo instante investi sobre ele:
- Pô! Garcez, isso é hora, os Deputados chegaram a retardar a chegada porque você estava atrasado.
E todos riram como se estivéssemos já mais para estado “tribal” e tupiniquim.
- Mas vocês não sabem o que é essa BR 101, havia engarrafamento. (Garcez se justificando)
E Jorge Xavier aproveitou que estávamos todos presentes para falar sobre o porquê do nosso encontro, a necessidade de dar apoio a Júlio, a questão do nosso “Plano”, bem como pretendendo se inteirar sobre a situação em que deveria ficar a Secretaria de Segurança Pública. Depois disso, fiz a seguinte proposta:
- Bem que nós poderíamos sentar e tomar uma cerveja, é um bom começo.
Logo que acabei de proferir essas palavras “Cesinha” que estava ligado ao momento da chegada dos nossos convidados especiais anunciou:
- Olha, eles estão chegando, estão juntos.
Imediatamente Jorge pediu a Cesinha que fosse recebê-los:
“Momento de Introspecção Crítica”:
E nisso surgiu em primeiro lugar Júlio Teixeira com camisa azul de manga comprida, calça jeans e gravata, passando a cumprimentar primeiramente Garcez, em seguida os demais, mas era aquele cumprimento político profissional que parecia já estar introjetado. Notava-se mais uma vez que faltava aquele espirito humanístico a Júlio Teixeira, na verdade ele procurava ser um político pragmático, amigo de todos, tipo venham a nós o meu reino. Achei que aquele comportamento (profissional e político) acabava fazendo muito mal ao nosso convidado. Pensei que se ele tratasse as pessoas de maneira mais pessoal e singular, certamente passaria mais segurança e confiança. Enfim, aquela forma de cumprimentar a todos e ninguém ao mesmo tempo era coisa superada, ainda mais em se tratando de pessoas da mesma profissão, ainda mais que nós tínhamos um mínimo de sensibilidade capaz de detectar imediatamente a diferença entre um amigo e um político superficial que vive assim como morre no momento que virava às costas. Certamente que aquele “oba-oba” na chegada não era bom para ele e nem para nós. Outro detalhe do Júlio Teixeira era a dissimulação e os atos cênicos e prolixos nos gestos e palavras, marca muito forte do seu estilo, mas totalmente descartáveis. Também, não que visse naquele seu comportamento a necessidade de uma reação em contrário, fazia parte do cenário político e sempre foi marca registrada daqueles que se enveredavam por esse universo. Mas essa característica existia nele até como mecanismo de defesa, autoafirmação e como reflexo da química interna que é acionada em momentos do brilho do momento quando se é o “destaque”, de maneira a achar que estava parecendo com sua tribo de políticos e ao mesmo tempo passando a velha imagem de político sério, confiável e atuante. De outra parte parecia vaidoso e talvez essa fosse uma das características mais marcantes observadas nos últimos tempos quando a convivência passa a descortinar o imaginário para dar lugar ao real. Procurei ser seletivo e estratificar níveis de informações ouvidas nas interlocuções, considerando o grau de interesse nas pessoas, mantendo minha percepção aguçada para me corresponder com os presentes. Naquele momento eram validadas as frases de efeito, as roupas casuais, as feições descontraídas e carreadas de trejeitos para se buscar inclusão, aceitação. Nisso valia tudo, os sorrisos, os pensamentos compatíveis para cada instante e, dependendo de quem seja o interlocutor, funcionava como um mecanismo de vitrine, sobrevivência, ascensão política... e, nesse sentido, queremos parecer melhor do que verdadeiramente somos Procurei baixar toda guarda possível para acreditar e confiar naquelas pessoas, buscar alianças, tudo isso por um “Plano” que talvez nunca tenha sido o real motivo daqueles presentes, somente eu no meu imaginário.
Gilmar Knaesel bem mais natural e tranquilo, sem a necessidade de querer mais que isso, menos cênico, veio até nós como quem vem como um velho amigo desde os tempos de criança. Trazia consigo marcas do seu carisma, de quem sabe estar próximo das pessoas e se colocar no seu lugar, aparentava ter personalidade, apesar de todo o seu traquejo para fazer com que a gente se sentisse o melhor amigo do mundo. Entretanto, também pude notar que às vezes se cansava rápido, o que exigia algumas habilidades desenvolvidas para não se fazer notar. Era como se de um momento para outro quisesse dar um pulo, mas esse seu comportamento era aleatório, inesperado e imprevisível. Outra coisa que se podia notar era a sua abstração, muitas vezes você está conversando com ele e poderia se observar que estava pensando em outra coisa fazendo com que se quisesse se desvencilhar das pessoas, como se fosse perdendo o interesse por aquilo que inicialmente demonstrou estar ligado. Duas coisas certamente eram capazes de manter sua atenção: aglomeração de pessoas importantes e belas mulheres. Mas dava para perceber sua capacidade de se renovar, como se fosse um “sol” ainda jovem. Noutro dia tudo voltaria ao normal e não tinha mais que matar algum leão perdido. Achei que aquilo pudesse significar ser também uma pessoa temperamental, muito pelo contrário, muito embora houvesse resquícios de uma possível tendência a ser depressivo, o que era totalmente afastado pelo entretenimento exponencial que o poder político e a proximidade das pessoas de tantos matizes e interesses difusos. Knaesel passava uma imagem de pessoa equilibrada, daqueles que devagar vai longe, sabe o que quer e como pretendia chegar lá, o problema era se perder no caminho, achando que acima dele só Deus. Também demonstrava ser leal às pessoas próximas, só não podendo dar a eles o que esperavam, para tanto, relativizava as relações, dependendo do seu grau de interesse. Acreditava que deveria ter como lema: conquistar para arrebanhar. Era mais espírito e de ligações humanas normais, nesse ponto adotava uma postura nobre e superior, demonstrando muito autocontrole e segurança. Talvez por isso era que detivesse fontes de carismas, além de ser pessoa que tinha uma missão superior de vida para ser cumprida ou que não se importasse com nada disso, apenas estar bem. Nesse aspecto faltava ambição no plano pessoal e político, parecendo dar abertura ao “primitivo” e ao mundo da fantasia. Aparentava ter bom gosto e um dos seus maiores inimigos talvez fosse a dependência da busca pelo prazer. E quanto a isso ele próprio tinha que procurar boas influências para não ficar escravo dos desejos e paixões. As amizades tinham um significado especial, nisso procurava uma razão superior para viver, talvez a terra do nunca. Então, poderíamos contar com nosso protagonista para que nosso “Plano” realmente fosse implantado naquele governo?
Depois de alguns cumprimentos iniciais fomos sentar e Jorge Xavier passa a fazer um meio discurso sobre a importância do momento. Nesse instante fui até o banheiro e quando retornei fiquei em dúvida onde sentar, ou seja, ao lado do Júlio Teixeira onde havia uma cadeira vazia ou na sua frente. Nesse instante minha dúvida é serenada porque Wilmar Domingues me pediu para eu sentar no seu lugar, ao lado do Deputado Gilmar Knaesel. Inicialmente resisti, mas logo acabei aceitando. E assim o pessoal ficou distribuído: de uma lado: “Cesinha”, Krieger, Knaesel, Felipe e Wilmar; e no outro lado da mesa: Júlio, uma cadeira vazia, Jorge, Garcez e Cláudio.
A seguir Jorge Xavier, como se quisesse quebrar um pouco a formalidade que se instaurou no ambiente, passou a explicar que aquele encontro teve como principal objetivo, além da continuidade do outro jantar no mesmo local, também prestar solidariedade a Júlio Teixeira, mesmo porque o Gilmar Knaesel também era protagonista do nosso “Plano”.
E todos bem refrigerante, à exceção de mim que arrisquei uma gelada.
“Aramis...?”:
Gilmar Knaesel fez um trocadilho com Dumas, citando os três (na verdade eram quatro os duelistas a serviço do Cardeal Richelieu), no nosso caso, Knaesel, Júlio, Jorge e ... Passou a “discursar” como um intrépido sobrevivente, teceu comentários ao momento político, a preocupação de Amin em inovar, sair da mesmice.... Afirmou que esteve com Amin recentemente e mais uma vez ele deixou claro que quer algo novo e nesse sentido o nosso “Plano” viria ao encontro dos interesses do novo governo. Deixou claro que o que puder ser feito para ser viabilizado o nosso “Plano” seria feito e que nós poderíamos contar com ele nesse sentido... Seríamos tão pequenos assim para ser feito de bobos?
Depois de ouvir essas palavras fiquei me perguntando qual seria a diferença principal entre Júlio Teixeira e Gilmar Knaesel? Ambos, com seus discursos cheios de volúpia regada a ouvintes receptores e muita fartura.
Resolvi perguntar para Knaesel sobre o Delegado Antonio da sua cidade (Pomerode):
- Nem fala, tu nem imagina o que o Antonio me aprontou lá em Pomerode. Ele conseguiu para o Heitor Sché duzentos e seis votos e tu vê, isso uma ou duas semanas antes ele estava quieto e eu pensei que contava com ele, esperava contar com o apoio dele ou mesmo o Júlio, mas aí... Acho que ele fez isso com medo de sair de lá, ele já está há anos em Pomerode.
“A Palavra de Júlio Teixeira”:
Na sequência o ainda Deputado Júlio Teixeira passou a discursar sobre o momento político e que Heitor Sché logo após o resultado das eleições telefonou para ele em Rio do Sul querendo convidá-lo para conversarem. No entanto, disse que não aceitou, pois possuía uma gravação de uma entrevista dada por Heitor a uma rádio lá de Rio do Sul e que era coisa imperdoável, onde perguntaram quem ele apoiaria da região para ocupar uma cargo no primeiro escalão do governo Amin e ele respondeu que não apoiaria ninguém porque ele é que seria o Secretário de Segurança Pública:
- Eu já falei com o Kleinubing sobre essa entrevista e vou entregar uma cópia para ele.
Júlio Teixeira frisou que era preciso segurar o Heitor Sché e que nesse sentido foi importante a eleição de João Rosa. Também, que aquilo se constituía num grande trunfo, mesmo porque havia trazido equilíbrio de forças na área de segurança pública. Quanto a Pacheco, ponderou que ele não tinha poder para indicar ou pretender ocupar espaços, entretanto, tinha poder de veto. Disse, ainda, que Pacheco poderia ter uma importante participação nesse processo, mesmo porque havia ainda resquícios antigos de Pacheco com Heitor, quando da sua exoneração do Comando-Geral da PM (Amin era Governador em 1983 e ele era o Secretário de Segurança).
Quando ouvi essa afirmação de Julio Teixeira sobre o real “poder de veto” do Coronel Pacheco fiquei imaginando se não teria sido ele quem havia vetado meu nome para Amin quando soube que eu estava participando do grupo de trabalho do futuro governo? Aliás, seria muito fácil o Coronel Pacheco ter dito para o futuro governador (ou mandado dizer por meio de Wanderley Redondo...) que eu não era “confiável”, que havia o traído na época que era secretário de Segurança Pública quando da derrubada dos PMs das funções de Delegados de Polícia na lei complementar cinquenta e cinco de 1992 (emenda do Deputado Jair Silveira apresentada a meu pedido na Comissão de Constituição e Justiça). Na verdade Pacheco não poderia me chamar de traidor porque eu estava defendendo o sistema de entrâncias, totalmente incompatível com pessoas estranhas às funções de Delegado de Polícia, especialmente, em razão das lotações, dos processos de remoção horizontal e promoção vertical. Outro fator, em se tratando de “traição” foi o fato do Cel. Pacheco, durante as eleições de 1986, em cuja ocasião tínhamos um pacto (leia-se: Delegados e Oficiais da PM, nas campanhas a deputados estadual e federal, iriam juntos do início ao fim até a vida ou morte). Durante o processo descobri que o Cel. Pacheco havia feito vários acertos com candidatos à Federal (menos comigo) impondo aquele o que poderia ser definido como “chute”. Acredito que foi por esse motivo que o Coronel Freitas saiu daquela nossa reunião se dizendo “envergonhado”. Tínhamos ido cobrar o cumprimento da palavra dos Coronéis e condenar a “traição” de Pacheco e seu grupo...(pacto celebrado num jantar no Restaurante Candeias...). Registre-se que fui o responsável por levar o Cel. Pacheco para o PFL, ele e seus amigos queriam que fosse o PMDB que não disponibilizou espaços e corríamos o risco de não nos candidatarmos. Apoiei o Cel. Pacheco até o fim (apesar da sua traição) e ele veio a se eleger numa das últimas colocações (por menos de cem votos). Bom, além do meu voto e de minha família e amigos, certamente que conseguimos mais de mil votos para o Cel. Pacheco o que certamente foi fundamental para sua primeira eleição, caso contrário, teria “morrido na praia”. Moral da história: nosso Cel. Pacheco assumiu a cadeira na Assembleia Legislativa e não me procurou para dizer um simples obrigado. Mais, ainda, depois que assumiu seu mandato sempre procurou me ignorar (fui diversas vezes no seu gabinete como Procurador e para tratar da Constituinte de 1988), me tratando com desconfiança, talvez, para que não lhe “pedisse” qualquer favor. Era plenamente compreensível as revoltas dos Coronéis Freitas e Guido Zimermann que comandaram a PM-SC (entre 1991 a 1995), sem falar dos traumas do ex-Delegado-Geral Jorge Xavier. Quando a mim, bom, acredito que jamais poderia ser chamado de “traidor” porque fui responsável pela derrubada dos “Delegados” cabos eleitorais do Deputado-Coronel Pacheco, considerando que só estava defendendo a implantação do “sistema de entrâncias” e o fim desses “Delegados Calças-Curtas” que usurpavam funções e tinham como finalidade atuar em campanhas políticas.
Voltando à tona, quanto ao nome provável do futuro Titular da Pasta da Segurança, Júlio Teixeira disse que não havia nomes ainda, mas que estava sendo trabalhado para que um terceiro nome viesse a ocupar esse espaço e que manteria com ele boas ligações para que fosse viabilizado o nosso “Plano”. Entretanto, não poderia adiantar mais nada porque havia apenas cogitações, nada é definido ainda e pediu que guardássemos reserva sobre o assunto, no que todos em coro concordaram.
Aproveitei a abertura para ponderar que o nosso “Plano” já estaria comprometido em razão da necessidade do governo Amin fazer acordos políticos e abrir espaços partidários e suprapartidários a nomes para ocupar Pastas, como exemplo a da Justiça onde se cogita o nome do ex-Deputado Kuster. Além disso, havia o fator Polícia Militar, pois se sabe que o Cel. Backes tinha tudo para ser o futuro Comandante-Geral da Polícia Militar e deseja assegurar àquela corporação o ‘status’ de Secretaria de Estado. Com isso, o nosso “Plano” somente poderia ser implementado a partir da atual estrutura e organização da Secretaria de Segurança Pública.
Júlio Teixeira contrariou essa minha assertiva, afirmando que se a vontade de Amin fosse implementar o nosso projeto o Cel. Backes não ousaria contrariar o governador, sob pena de ser chamado a atenção.
Após muita conversa jogado fora, ouvi Júlio Teixeira dizer:
- Mas vocês souberam, o Carlos Dirceu na mesma semana que saiu o resultado das eleições deixou o PMDB.
- Como é Júlio? (Felipe)
- O Carlos Dirceu, na mesma semana em que perdeu as eleições deixou o PMDB.
- Sim, e qual o destino dele agora? (Felipe)
- Não sei, acho que está sem partido. (Julio)
- Ele tem cara de PSDB. (Felipe)
- Parece que ele ficou descontente com aquela Diretoria do Interior, disse que não deram espaço para ele. (Júlio)
- Não. Isso não é possível. Pois levaram a Diretoria de Polícia do Interior para Lages para favorecê-lo e deixaram sob o seu comando todas as Delegacias Regionais do Interior e do Litoral. (Felipe)
Júlio Teixeira bastante inconformado ainda lembrou que em Rio do Sul o Delegado Roberto Schulzle (vereador) apoiou Heitor Sché, prejudicando a sua eleição:
- Eu que fiz aquele guri, ajudei ele na Delegacia Regional e olha o que ele me aprontou.
“Bingo!”
Gilmar Knaesel ainda disse que a construção dos imóveis que a administração do PMDB implementou não teve nada de extraordinário, porque foram com recursos do Fundo da Segurança Pública que foi originado no início do governo Kleinubing. E Jorge Xavier imediatamente retrucou:
- Espera aí, o fundo foi criado bem antes, foi no governo Pedro Ivo, o Felipe taí e foi o mentor desse fundo.
Pensei comigo: “Bingo!” Fiquei feliz, coisa muito rara, porque Jorge Xavier nunca tinha dito isso publicamente e a gente sabia como existia inveja no meio policial, entre Delegados, grupos... Aquele reconhecimento era coisa muito difícil, só mesmo entre amigos e aquilo nas internas lavou a minha alma. Sim, havia sido eu que na época correu atrás para fazer o projeto e viabilizar a sua aprovação (durante a gestão do Delegado Antonio Abelardo Bado que deu todo apoio).
“Paralelismos do Garcez”:
Enquanto Jorge Xavier, Krieger e Júlio Teixeira conversavam captei no ar Garcez puxando uma conversa paralela com Gilmar Knaesel que continuava ao meu lado. Como resumo, a conversa começou com “rock” e acabou numa “valsa”:
“(...)
- E agora ainda tem a “Emenda Constitucional Dezenove” (1998) que suprimiu o art. 241 da Constituição Federal, com essa mudança os Delegados deixaram de se constituírem carreira jurídica.
- Como é que? (Knaesel)
- O Garcez esta conjecturando Gilmar (Felipe)
- Não. É verdade, deixamos de ser carreira jurídica. (Garcez)
- Garcez, o que é ruim a gente deixa pra lá, vamos falar do que é bom, do futuro. (Felipe)
- Mas que pena, eu não sabia disso. (Knaesel)
- Isso está sendo consertado, já existe uma emenda do Senador Tuma que vai restaurar tudo novamente. (Wilmar Domingues)
(...)”.
“Depois desse Imbróglio à Petiz”:
Knaesel lançou uma pergunta :
- Quantos Delegados têm atualmente?
- Hoje é cerca de trezentos e oitenta. (Felipe)
- E está bom o número, não faltam Delegados? (Gilmar)
- Está bom, porque existem vários cargos em vacância. (Felipe)
- Faltam uns quarenta cargos, não está muito bom não. (Wilmar Domingues)
- E o salário como é que está, bom, vocês estão no teto, o Delegado Especial é quatro mil quatrocentos... (Knaesel)
- Sim, é isso aí.
(...)
Aproveitei para falar quase que ao pé do ouvido de Knaesel:
- Olha Gilmar, nessa disputa por espaço com o Heitor eu sou neutro, defendo uma aproximação, sou contra agressões, acho que a instituição está em primeiro lugar e isso exige conciliação para vencer muitos desafios que virão.
- É verdade. (Gilmar)
Finalmente, sugeri que fizéssemos outros encontros e que de preferência fossem precedido de um futebol de salão. Julio Teixeira concordou e Gilmar Knaesel disse que seria melhor nas terças ou quartas-feiras.
Mais ao final chegou Geraldo, que estava financiando o almoço, com aquele seu jeito de quem chega devagarinho, como quem não quer nada com nada e quando o pessoal se dá conta ele já voltou há muito tempo.
Gilmar e Júlio deixaram o local por volta de quatorze horas, tendo “Cesinha” acompanhado os dois deputados até a porta. Quanto a nós, ficou a avaliação de que tinha sido muito bom o encontro, um grande acontecimento e me despedi também do pessoal, tendo Jorge Xavier dito que depois nós conversaríamos, no que concordei.
Como Garcez também estava de saída, perguntei se ele queria uma carona e ele disse que estava de carro, um Fiat.
“O Projeto do Nunca?”:
Durante o meu trajeto até o centro de Florianópolis fiquei fazendo uma revisão de tudo o que conversamos, com a certeza de que nada estava certo, de frente ao desconhecido, depois desse almoço, na verdade mais uma confraternização com vistas à reeleição de Gilmar Knaesel. Nada foi resolvido, ninguém se comprometeu com nada e constatei que restaram muitas incertezas, pairavam dúvidas e o jeito era se continuar aguardando um projeto mais para o nunca. Tudo parecia indicar que Júlio Teixeira não seria mais o Titular da Pasta, essa certeza eu já tinha naquele momento. Quem estaria no páreo seria então Heitor Sché que certamente corria atrás da sua nomeação e tomei conhecimento que já havia um terceiro elemento, alguém correndo por fora e que segundo o Júlio Teixeira seria um parlamentar. Fiquei pensando no João Rosa.
Lembrei que praticamente Wilmar Domingues e Cláudio Moura não falaram durante quase todo o encontro. Garcez fez pequenas incursões. Krieger limitou-se a comentar seu curso no exterior com o Gilmar, além de outras colocações relativas às suas atividades atuais e da empresa em que sua esposa trabalhava (a Cassol).
“Fast track?”
Krieger, dotado de visão de vanguarda, em determinado momento citou a via rápida de Gerhard Schroeder (havia sido eleito premiê alemão) e eu contra-argumentei citando Tony Blair com a sua “terceira via”, a meu ver, mais à esquerda e menos nacionalista. E, por último, chegamos a uma “fast track” e a par disso passei a interpretar as palavras de Júlio Teixeira a respeito de um possível terceiro nome para assumir a Segurança Pública, ou seja, nem ele, nem Sché, mas um terceiro (quem poderia ser?) e conclui que por uma via rápida só poderia ser João Rosa.
E como sobremesa, fiquei também pensando no nosso anfitrião-mor, sim o “Cesinha” que correndo por fora havia feito o trabalho externo de recepção e despedida de nossos convidados, quando deveria ter sido o próprio Jorge Xavier, então, foi aí que entendi porque no final havia solicitado a Jorge Xavier que acompanhasse os dois parlamentares até seus veículos e, para a minha surpresa, lá foi o “Cesinha”.
E fiquei pensando naquele pequeno e importante detalhe que teimava em pulular meus pensamentos, certamente um cheiro de “Cesinha” no ar e que já contrastava com um panorama quase exangue àquelas alturas (não tive como não lembrar do meu papel de conduzir Luiz Borges D’Urso até o Aeroporto, coisa articulada pelo Jorge Xavier, com o seu papel de articular, maestro... a moda tupiniquim, enfim, tinha o lado divertido nesses nossos papéis...).
“Karvansarãi”:
Depois do "Candeias", já no trajeto para o centro de Florianópolis um verdadeiro “Caravanserai” passou a povoar a minha mente. Os acordes vinham do CD de Carlos Santana com aquela melodia do Tom Jobim... e na capa aqueles camelos, um deserto em todas as direções, um sol escaldante, o azul celeste... Nunca estive tão próximo “do lugar nenhum”, “do beco sem saída”, “ideias sem qualquer sustentação”, “do nada, dos abismos” e sinais de quem parece querer acordar de um sonho, antes mesmo que ele se tornasse pesadelo, sinais de passagens, poeira, do que ficou para trás e de fazer um descarrego que parece muito longe de acontecer enquanto tiver história para ser registrada!